Acórdão nº 50003454920138210070 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 08-04-2022
Data de Julgamento | 08 Abril 2022 |
Órgão | Décima Nona Câmara Cível |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50003454920138210070 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001762368
19ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5000345-49.2013.8.21.0070/RS
TIPO DE AÇÃO: Esbulho / Turbação / Ameaça
RELATOR: Desembargador EDUARDO JOAO LIMA COSTA
APELANTE: MARIA PAULINA RODRIGUES (RÉU)
APELADO: MARCOS ANDRE GUIMARAES RODRIGUES (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto por MARIA PAULINA RODRIGUES contra a sentença que julgou procedente a Ação de Reintegração de Posse n. 070/11300039410 ajuizada por ESPÓLIO DE MARCOS ANDRÉ GUIMARÃES RODRIGUES.
O dispositivo da sentença está assim redigido (fl. 158 da origem):
"Ante o exposto, confirmo a tutela antecipada e forte no art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado pelo ESPÓLIO DE MARCOS ANDRÉ GUIMARÃES RODRIGUES em face de MARIA PAULINA RODRIGUES.
Sucumbente, condeno a ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo na razão de 10% sobre o valor da causa, nos termos balizadores do art. 85, §2º, do CPC.
A apelante MARIA PAULINA RODRIGUES, em suas razões, sustenta que, ainda que reconhecida a revelia em sentença, foram juntados documentos demonstrando que o finado Marcos André não era o proprietário do imóvel, mas mero avalista de contrato bancário que tem o lote urbano como garantia do mútuo.
Aduz que deve ser observado o direito a moradia.
Postula o provimento do apelo e a concessão da gratuidade judiciária.
Contrarrazões apresentadas (item 10 do evento 3 da origem), sem inovar no debate.
Intimada, a parte apelante acostou documentos acerca da necessidade de concessão da gratuidade da justiça (evento 14).
Remetidos os autos ao Ministério Público, opinou pelo desprovimento do apelo (evento 15).
Houve a intimação da Defensoria Pública para manifestação nos autos, considerando que Marcia Bierleski ingressou como terceira interessada, sobrevindo manifestação de que a ação de reconhecimento de união estável foi julgada improcedente, não havendo mais interesse da parte no presente feito.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Conheço do recurso, pois presente seus requisitos de admissibilidade.
FATO LITIGIOSO
O autor, ESPÓLIO DE MARCOS ANDRÉ GUIMARÃES RODRIGUES, representado pelo inventariante ROBERTO MATHEUS DA CRUZ RODRIGUES, requereu a reintegração na posse do imóvel matriculado sob n. 49.155 do Registro de Imóveis da cidade de Taquara/RS:
Diz o autor que ao tentar ter acesso ao imóvel, foi bloqueado por terceiros, ora demandados, os quais passaram a residir no local, após o falecimento de Marcos André, em 16.02.2013.
Menciona que os demandados não fazem parte da sucessão hereditária, não havendo justificativa para estarem residindo no local.
A presente demanda foi ajuizada em face de Maria Paulina Rodrigues, Paulo Roberto Guimarães Rodrigues e Daniel Tiago Guimarães Rodrigues.
Realizada audiência de conciliação (fl. 34), foram excluídos do polo passivo da lide os réus Paulo Roberto e Tiago Daniel, por não estarem residindo no bem.
O feito seguiu tramitação em relação a requerida Maria Paulina.
Deferido o pedido liminar de reintegração de posse, no curso da lide, conforme despacho saneador de fls. 74/77.
No curso da lide, MARCIA BIELESKI, peticionou requerendo a sua inclusão nos autos como terceira interessada, diante do ingresso de ação de reconhecimento de união estável com o falecido Marcos Andre (fl. 83). Em despacho saneador, o julgador deferiu a habilitação de Marcia como assistente simples dos demandados. E consta do cadastro do processo que Marcia Biesleski como assistente (fl. 124).
A presente ação foi julgada procedente.
A demandada MARIA PAULINA, embora revel, apela.
Enfrento a tese.
EFEITOS DA REVELIA
É sabido que, uma vez caracterizada a revelia, existe a presunção de veracidade dos fatos alegados pela parte autora, pois é essa a regra geral. Entretanto, como acima asseverado, por se tratar de presunção relativa, poderá ela ceder diante do conjunto probatório existente nos autos.
Nesse sentido, NÉLSON NERY JÚNIOR observa que:
"A presunção de veracidade dos fatos alegados, em conseqüência da revelia, não é absoluta, podendo ceder ante a evidência dos autos, de acordo com o princípio do livre convencimento do juiz (RSTJ 50/259). Neste sentido: CPC 277 § 2º" ("Código de Processo Civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor", 6ª edição, Editora RT, 2002, p. 681).
Sendo assim, tratando-se de presunção relativa, pode o juiz julgar de acordo com o princípio do livre convencimento motivado, eis que os efeitos da revelia não incidem sobre o direito da parte, mas tão-somente quanto à matéria de fato.
Desta forma, o feito será analisado com base nos documentos e provas anexadas aos autos.
REIVINDICAÇÃO.
Em sentença, o julgador singular ponderou se tratar de ação reivindicatória, diante dos argumentos lançados e discussão acerca da propriedade do bem, nos termos do artigo 1.228 do Código Civil, modo pelo qual alterou a lide possessória para natureza petitória, cujo apelo da parte demandada não questiona essa conduta judicial.
A ação reivindicatória possui fundamento no art. 1.228 do Código Civil, o qual determina que "o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha".
A ação reivindicatória representa o direito de pedir judicialmente que a coisa, sob o seu domínio, que esteja na posse de terceiros lhe seja entregue. Costuma-se dizer, ainda, que é a ação do proprietário não-possuidor contra o possuidor não-proprietário, desde que este último tenha a posse sem causa jurídica eficiente.
Nesse contexto, o proprietário encontra-se autorizado a intentar ação reivindicatória contra qualquer pessoa que detenha o bem em seu poder e não só contra o possuidor de má-fé, mas também o de boa-fé, não importando o título que encontra em seu poder, já que o domínio é um direito real, oponível em face de qualquer pessoa que lhe oponha obstáculo à titularidade, isto é, a usar, gozar e dispor do que lhe pertence.
No caso dos autos, demonstrado a invasão praticada pela demandada. E, ao contrário do que alega a parte apelante, há prova da propriedade em nome do falecido Marcos André, quem adquiriu o terreno ainda em 21.01.2010.
Ainda que tenha dado o bem em garantia como avalista em contrato bancário, a matrícula anexada deixa claro que o imóvel lhe pertencia, o que afasta a tese da apelante.
Aliás, mesmo tendo arrolado testemunha quando da intimação para a produção de provas (fl. 132), houve posterior desistência da prova requerida, com pedido expresso de cancelamento da audiência de instrução (fl. 14). Assim, evidente que deixou a demandada de produzir qualquer prova do alegado, a fim de demonstrar a posse de boa-fé.
Além disso, as invasões não podem ser admitidas sob o pretexto de direito a moradia e dignidade da pessoa humana, tendo em vista o direito do particular de usar, gozar e dispor da sua propriedade.
Dessa forma, estão presentes os requisitos necessários ao reconhecimento do direito da parte autora à "reintegração da posse/reivindicação" sobre o imóvel objeto da ação, o que culmina na procedência, sob pena de gerar-se o abuso de direito pela parte, o que encontra expressa vedação em nossa Magna Carta.
Para evitar tautologia, transcrevo e incorporo às razões de decidir deste voto a fundamentação do parecer de lavra da ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Valéria Bastos Dias, que fez uma detalhada análise dos fatos debatidos nos autos, nos seguintes termos:
Em suma, a exordial minudencia que o Sr. Marcos André Guimarães Rodrigues, falecido em 16/02/2013 (Evento 3, INIC E DOCS2, Página 12 dos autos originários), havia adquirido em 21/01/2010 a propriedade do imóvel matriculado sob o nº 49.155, junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Taquara/RS (Evento 3, INIC E DOCS2, Páginas 27 a 29 dos autos originários).
Após o falecimento, foi ajuizada ação de inventário, autuada sob o nº 070/1.13.0000623-7, figurando como inventariante a parte autora (Evento 3, INIC E DOCS2, Página 15 dos autos originários), enquanto único filho do de cujus (Evento 3, INIC...
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