Acórdão nº 50003595520138210095 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 09-03-2023

Data de Julgamento09 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50003595520138210095
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002980196
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000359-55.2013.8.21.0095/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro (art. 213)

RELATOR: Desembargador JOSE RICARDO COUTINHO SILVA

APELANTE: DELMAR AMARILHO (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra D. A., com 49 anos de idade à época do fato, dando-o como incurso nas sanções do art. 217-A, caput, do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

"Em circunstâncias não bem esclarecidas de tempo, porém entre o mês de dezembro de 2011 até o mês de setembro de 2012, na Rua Manaus, n.° 567, Bairro Lago Azul, na cidade de Estância Velha - RS, o denunciado D. A., impelido pela conveniência da situação, motivado pela satisfação dos seus instintos sexuais, praticou, de modo continuado, conjunção carnal com a criança K. F. S., na época, menor de 14 (catorze) anos de idade, nascida em 20/05/2002 (consoante Certidão de Nascimento da fl. 16).

Na oportunidade, em data e horário não esclarecido, no interior da casa onde ambos residiam, o denunciado, prevalecendo-se da sua condição de sogro da genitora da vítima e de sua tenra idade, objetivando saciar doentia libido, praticou relações sexuais com a menor.

Conforme fotos acostadas à fl. 09 a vítima retornou da casa de sua genitora para casa de sua pai, com escoriações no braço direito, motivo que levou o pai a suspeitar do que havia acontecido. Este procurou a psicóloga da APAE. A vítima relatou para a psicóloga que o denunciado vinha atrás dela, passava a mão nela, que ele tirou sua roupa, depois deitou sobre a mesma (fl. 08). Ainda conforme termo de informações, acostado à fl. 15, K., relata que sofreu abusos por diversas vezes, consistentes em penetração vaginal e atos libidinosos."

A denúncia foi recebida em 06.10.2015 (evento 3, PROCJUDIC2, fl. 39/40).

Citado (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 49/50 e evento 3, PROCJUDIC3, fl. 01), o acusado apresentou resposta à acusação através de defensor constituído (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 43/45).

Durante a instrução, foi ouvida a vítima, as testemunhas e interrogado o réu (evento 3, PROCJUDIC3, fls. 15/16, 50 e evento 3, PROCJUDIC4, fls. 01 e 21/22).

Convertido o debate oral em memoriais, foram esses apresentados no evento 3, PROCJUDIC4, fls. 37/43 e 46/50 com continuação no evento 3, PROCJUDIC5, fls. 01/09.

Sobreveio sentença, considerada publicada em 16.06.2020 (evento 3, PROCJUDIC5, fl. 33), julgando procedente a ação penal para condenar o réu como incurso nas sanções do art. 217-A, caput, do Código Penal, à pena, de 10 anos e 06 meses de reclusão (09 anos + 1/6, pela continuidade delitiva), em regime inicial fechado (evento 3, PROCJUDIC5, fls. 10/32).

Irresignada, a defesa interpôs apelação arguindo, preliminarmente, a nulidade da sentença, diante da falta de fundamentação da decisão. No mérito, alegou insuficiência probatória para condenação do réu, uma vez que esse não ficava sozinho com a vítima. Referiu que a versão apresentada pela vítima e testemunhas, todas seus familiares, não se coaduna com os fatos ocorridos, demonstrando manipulação do pai da ofendida, que jamais aceitou que estivesse na guarda mãe, tampouco o fim do relacionamento de sua ex-companheira que mantém relacionamento de união estável com o filho do réu. Mencionou que os depoimentos prestados, com exceção do pai da ofendida, demonstram que a acusação é inverídica. Referiu que a menor fantasiou a história, inexistindo provas da autoria e materialidade do crime, destacando, também, as condições pessoais favoráveis do paciente. Pugnou, portanto, pela absolvição do acusado e, subsidiariamente, a desclassificação para o delito de importunação sexual (evento 3, PROCJUDIC6, fls. 34/50 com continuação no evento 3, PROCJUDIC7, fls. 01/22).

O Ministério Público apresentou contrarrazões (evento 3, PROCJUDIC7, fls. 25/32).

Em parecer, a Procuradoria de Justiça opinou pelo improvimento do apelo (evento 8, PARECER1).

Esta Câmara adotou o procedimento informatizado e foi observado o art. 613, inc. I, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Quanto à preliminar de nulidade da sentença, não assiste razão à defesa, eis que devidamente fundamentada a decisão, permitindo-se verificar, plenamente, as razões que levaram à conclusão pelo juízo condenatório.

Logo, inocorrente nulidade, rejeito a preliminar.

No mérito, a materialidade e a autoria delitivas foram bem analisadas pela ilustre Juíza de Direito, Dra. Débora Sevik, ao proferir a sentença, não sendo verificada qualquer inovação em sede de apelação em relação aos pontos analisados em primeiro grau, pelo que adoto seus fundamentos para evitar inútil tautologia (evento 3, PROCJUDIC5, fls. 10/32):

"(...)

O processo teve tramitação regular, inexistindo nulidades para serem decretadas. Estão presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, não havendo preliminares a enfrentar.

A existência do fato restou demonstrada pela ocorrência policial das fis. 07-08, parecer psicológico da fl. 10, certidão de nascimento da fl. 18, auto de exame de corpo de delito das fis. 62-63, avaliação psíquica das fis. 64-69, bem como pela prova oral angariada nos autos.

A autoria, de igual modo, restou comprovada nos autos, especialmente pelos relatos da vítima K. e do informante J..

Vejamos.

A vítima K. F. S., quando inquirida (CD da fl. 129), ao ser questionada, disse que conhece Nei (réu) desde pequena, quando morava com sua mãe. Relatou que teve uma época que estava morando com sua mãe e que todo mundo ia trabalhar e a depoente ficava sozinha com ele em casa, sendo que, quando estava dormindo no quarto da sua tia (mãe do seu padrasto), de vez em quando o réu ia lhe inticar, quando sua tia estava dormindo do lado. Referiu que certo dia trancou a porta do quarto sem querer e, não sabe o que ele fez, abriu a porta e começou a ir para cima da depoente, queria tirar sua roupa, ocasião em que disse para ele parar, ao passo que de noite sua mãe saiu e ele fez a mesma coisa com a depoente, sendo que, quando ela voltou, saiu correndo para o banheiro pelada e ela lhe perguntou o que aconteceu que estava pelada, oportunidade em que ihe disse “oh mãe, o N. fez isso, isso, isso comigc“. a qual lhe explicou, foi ver se não aconteceu nada e disse que não. Relatou que, depois de alguns dias, sua mãe brigou com seu pai e disse que a depoente estava atrapalhando o casamento dela, que a depoente estava inventando várias mentiras para eia, e que não aguentava mais ficar com a depoente, tendo lhe largado com seu pai. Questionada, disse que o réu chegou a tirar a roupa, mas que não introduziu o pênis "lá”, só em cima, mas que ele tentou, e que a depoente era virgem na época, nunca tendo feito coisas a mais assim, uma vez que não gosta que lhe toquem. Indagada, disse que ele tentou, duas vezes, que não chegou a fazer "aquilo”, mas que chegou próximo a isso. Referiu que tinha medo de contar para sua mãe na época, e que ela não acredita na depoente, que contou a verdade para ela, que ela sabe disso, mas que ela quer defender o pai do seu padrasto por ter feito isso com a depoente. Questionada, disse que tinha seu próprio quarto na casa do réu, que estudava de manhã e de tarde ficava em casa, e que os fatos foram uma vez de tarde e outro de noite, quando estava todo mundo trabalhando.

O informante J. A. S. P., genitor da vítima, quando inquirido (CDs das fls. 103 e 128), relatou que em 2011 sua filha foi morar com a mãe e, no decorrer do ano, começou ficar muito estranha na escola, motivo pelo qual a professora chamou para ver porque ela estava estranha, diferente (não falava, ficava quieta) e, então, o depoente perguntou se não tinha atendimento psicológico na escola, ocasião em que lhe responderam que não e recomendaram a APAE. Referiu que sua filha fez tratamento na APAE até final do ano de 2011, onde estava apresentando esses comportamentos diferentes, ficava quieta, calada, ao passo que, no ano de 2012, nas férias de fevereiro, a mãe dela lhe ligou dizendo que era para levar K. morar com o depoente, porque ela ia acabar com o casamento de A., sem muita explicação, motivo pelo qual o depoente matriculou ela de novo, mas ela continuava estranha na escola, não tinha foco, fazia desenhos estranhos, muito escuros, muito preto, desenhos tristes, mas não tinham conotação sexual. Relatou que no contraturno sua filha ia no SESI fazer atividades e, no meio do ano, ela relatou para as professoras sobre esse ocorrido, as quais chamaram o depoente, ocasião em que a coordenadora lhe disse que o sogro da mãe dela havia abusado dela, manipulado, abuso sexual, mais de uma vez. Relatou que conversou com K. e ela confirmou, ao passo que o depoente falou com a mãe dela, a qual ficou meio assim, e então fez a ocorrência e foi na APAE, onde fizeram um relatório depois sobre isso. Referiu que, do que sua filha lhe passou e passou para a companheira do depoente, não houve conjunção carnal, mas sim manipulação, que o réu se esfregou, fez alguma coisa, um abuso. Relatou que C. tem síndrome de rokitansky, não tem útero e tem a cavidade vaginal muito pequena, de modo que se tivesse penetração ela estava morta. Indagado, disse que a mãe de sua filha sempre defendeu o sogro, nunca defendeu a filha; que K. está com o depoente desde 2012, quando tinha aproximadamente 09 anos; que ela ia na APAE porque não prestava atenção na escola; e que agora ela começou tratamento com neurologista. Relatou que falou para K. que isso é coisa séria, que não era brincadeira, e pediu se era tudo aquilo que ela relatou, a qual lhe disse "é pai". Referiu que ela está na APAE desde que ela...

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