Acórdão nº 50003675520178210042 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 31-01-2023

Data de Julgamento31 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50003675520178210042
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003094527
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000367-55.2017.8.21.0042/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de Energia Elétrica

RELATOR: Desembargador MARCELO BANDEIRA PEREIRA

APELANTE: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

APELADO: EDER GERKE ROJAHN (AUTOR)

RELATÓRIO

A COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D interpõe recurso de apelação da sentença que, nos autos da ação de obrigação de fazer e indenização por danos morais ajuizada por EDER GERKE ROJAHN, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos (Evento 3, PROCJUDIC5, p. 11/19):

Diante do exposto, com base no art. 487, inciso l, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por EDER GERKE ROJAIN em face da COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D, ao efeito de:

a) CONFIRMAR a liminar deferida à fl. 53, ao passo de CONDENAR a demandada a adequar a tensão da energia elétrica fornecida à unidade habitacional do autor aos padrões estabelecidos pela ANEEL:

c) CONDENAR a requerida a pagar indenização por danos morais no valor de R$5.000,00, quantia que deverá ser corrigida monetariamente pelo IGP-M e acrescida de juros de mora na proporção de 1% ao mês, ambos a contar da data da sentença.

Sucumbente, condeno a parte demandada ao pagamento das custas processuais e honorários advocaticios ao patrono da parte adversa, o que fixo em 20% do valor da condenação observados os vetores do $2º do artigo 85 do Código de Processo Civil.

Para evitar tautologia, adoto o relatório do apelo contido no parecer do Ministério Público:

A Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica – CEEE-D, em suas razões (Processo 5000367- 55.2017.8.21.0042/RS, Evento 3, PROCJUDIC5, Páginas 30 e ss.), de início, sustenta a tempestividade do recurso e, a seguir, empreende síntese da lide. Alega que a realização da obra de adequação de níveis de tensão para patamares corretos já foi realizada, tendo sido concluída em 01/10/2019. Destaca que, segundo a sentença, o fornecimento de energia em níveis inferiores aos recomendados pela ANEEL é situação que exorbita o mero dissabor cotidiano, considerando a dependência que a sociedade contemporânea possui do serviço de prestação de energia elétrica para mantença de necessidades básicas. Afirma que o recorrido não restou sem fornecimento de energia elétrica, sendo que a mera oscilação de níveis de tensão da unidade não é situação que atinge a dignidade do autor da ação. Frisa que, logo que tomou conhecimento da situação de irregularidade de níveis de tensão, providenciou a regularização da situação, executando obras de melhoria da rede elétrica. Refere que os danos morais não decorrem da simples demora de realização de serviços, fazendo-se necessária a comprovação do abalo moral sofrido, o que não ocorreu no caso. Aponta o art. 927 do CCB e o art. 373, inc. I, do CPC, consignando que o caso não é de dano moral in re ipsa, devendo existir prova mínima de abalo psíquico. Assegura que a demora na execução do projeto não ocorreu por má-fé da apelante, tendo reconhecido a necessidade de realizar a obra, não havendo, no mais, na situação, aborrecimentos significativos para causar danos à personalidade do apelado. Assevera que não há nexo de causalidade entre o suposto dano suportado e a conduta da CEEE-D (ação ou omissão). Discorre sobre a reponsabilidade civil, citando a Resolução n. 61/2004. Pondera sobre o cumprimento de determinações do CDC, atentando para seu art. 6º. Observa que o dano moral deve servir de alento à dor, e não como meio de enriquecimento ilícito, referindo, ademais, que a parte recorrida jamais comprovou ter sofrido situação de vexame ou de humilhação, o que seria necessário para configuração do dano moral (lesão à dignidade da pessoa). Informa que meros dissabores ou transtornos do cotidiano, como os que se deram em caso, não são aptos a gerar a indenização pretendida. Narra que, não tendo ocorrido qualquer prejuízo moral, não há fundamentos para pagamento de valores em tal sentido. Defende que, mantida a condenação, os valores fixados para danos morais devem, pelo menos, ser reduzidos, já que a verba deve levar em conta a moderação, servido de alento aos sofrimentos causados, sem propiciar enriquecimento sem causa. Tece comentários sobre critérios para quantificar danos morais. Atenta para a atividade realizada pela CEEE-D, que exige investimentos altos para qualificar o serviço público, concluindo que indenizações de grande porte comprometem a destinação de recursos para melhoria da prestação do serviço. Compreende, pois, que o valor da indenização deve ser arbitrado em patamar adequado, devendo, assim, ser reduzido o valor estipulado para indenização por dano morais. Entende que os honorários advocatícios também foram fixados em patamares elevados – 20 % sobre o valor da condenação -, destacando que devem ser reduzidos, pois a demanda se mostra simples e repetitiva. Colaciona julgados. Pugna pelo provimento do recurso para que os pedidos da inicial sejam julgados improcedentes, invertendo-se, em decorrência, os ônus sucumbenciais.

Não foram apresentadas contrarrazões.

Nesta instância, o Ministério Público opina pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

De início, importa destacar que a relação entre a concessionária fornecedora de energia elétrica e o usuário enquadra-se perfeitamente em típica relação de consumo, devendo ser aplicadas as normas de proteção ao consumidor.

Com efeito, não há dúvidas de que as partes dos contratos de energia elétrica, ou seja, concessionária e usuário, amoldam-se aos conceitos de “fornecedor” e “consumidor” estampados pelo Código do Consumidor. Isso porque os usuários de serviços públicos, no caso, de energia elétrica, podem e devem ser considerados “consumidores” de serviços, uma vez que utilizam os serviços públicos como destinatários finais (art. 2°, caput, do CDC). Já as concessionárias que prestam serviços públicos, especificamente fornecimento de energia elétrica, enquadram-se no conceito de “fornecedor”, visto que distribuem e comercializam serviços a um número indeterminado de pessoas, de forma habitual e mediante remuneração, pois seus usuários pagam pelo fornecimento do serviço, sendo a atividade, inclusive, voltada ao lucro. Assim, tem-se que a relação existente entre as partes configura relação de consumo.

Assim, a responsabilidade da Concessionária fornecedora de energia elétrica é objetiva, visto que ela responde pela reparação dos danos causados aos consumidores na prestação do serviço, independentemente da existência de culpa, conforme dispõem os arts. 37, §6°, da CF, e 14, caput, do CDC.

Caracterizada a relação de consumo, a inversão do ônus da prova se opera automaticamente (ope legis), tornando-se desnecessária a análise da vulnerabilidade do consumidor, que, no caso, é presumida.

No mesmo sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. ENERGIA ELÉTRICA. FRAUDE NO MEDIDOR. PEDIDO DECLARATÓRIO DE INEXISTÊNCIA DO DÉBITO. FRAUDE NÃO PROVADA. 1. Relação de consumo, responsabilidade objetiva e ônus da prova. Tanto nos produtos (CDC, arts. 12-3) quanto nos serviços (art. 14, caput), a responsabilidade do fornecedor é objetiva; logo, a inversão do ônus da prova ocorre ope legis. É subjetiva apenas aos profissionais liberais (art. 14, § 4º), caso em que, provadas a verossimilhança do pedido e a hipossuficiência do consumidor, inverte-se ope judici do ônus da prova (CDC, art. 6º, VIII). 2. Fraude não provada. 2.1 - Fornecedora que não se desincumbiu do ônus de provar alegada fraude no aparelho medidor de energia elétrica, nem pelo art. 72 da Resolução 456/00, vigente à época dos fatos, nem pelo art. 129 da atual Resolução 414/10, da ANEEL, esta inclusive mais rigorosa quanto ao procedimento administrativo. 2.2 - Termo de Ocorrência de Irregularidade que constatou apenas violação dos lacres, o que, por si só não interfere no regular funcionamento do medidor, haja vista perícia administrativa aprovando-o em todos os itens. 3. Dispositivo. Apelação desprovida. (Apelação Cível Nº 70057570970, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, Julgado em 26/11/2014)

Ainda, sabe-se que a distribuidora é responsável, além das obrigações que precedem o início do fornecimento, pela prestação de serviço adequado a todos os seus consumidores, assim como pelas informações necessárias à defesa de interesses individuais, coletivos ou difusos, bem como serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas. Outrossim, a atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, assim como a melhoria e expansão do serviço (artigo 140, §§1º e 2 º da Resolução nº 414/10 da ANEEL).

E, no presente feito, a Concessionária não se desincumbiu de demonstrar a prestação adequada do serviço, nem mesmo a alegada ausência de dano causada ao consumidor.

No caso, caberia à concessionária adequar o fornecimento de energia, nos termos em que determinado pelo artigo 22 do CDC, já que, segundo o laudo técnico apresentado pelo autor (Evento 3, PROCJUDIC1, p. 25/30), os níveis de tensão não estavam adequados:

Conforme solicitado pelo senhor Eder Gerke Rojahn, instalação elétrica n° 6973156 0, estive em sua residénicia, localizada na Colônia Palma, 5° Distrito, Canguçu, RS, para avaliar as condições de funcionamento de suas instalações elétricas.

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