Acórdão nº 50003721320178210128 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 09-12-2022

Data de Julgamento09 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50003721320178210128
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003050846
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000372-13.2017.8.21.0128/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: DELMINA CAPELETTI DE ROSSO (AUTOR)

APELANTE: ESPÓLIO DE ORLANDO DE ROSSO (AUTOR)

APELANTE: MARIA REGINA DE ROSSO POLO (AUTOR)

APELADO: IARA REJANE MACHADO BERBIGIER (RÉU)

APELADO: VITORIO JOSE DE ROSSO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por DELMINA CAPELETTI DE ROSSO, ESPÓLIO DE ORLANDO DE ROSSO e MARIA REGINA DE ROSSO POLO contra a sentença proferida nos autos da ação anulatória ajuizada em face de IARA REJANE MACHADO BERBIGIER e VITORIO JOSE DE ROSSO, com o seguinte dispositivo (Evento 37, SENT1 origem):

Isto posto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pelo Espólio de Orlando De Rosso e Delmina Capeletti De Rosso nos autos desta Ação Anulatória proposta em face de Vitório José De Rosso e Iara Rejane Machado Berbigier.

Sucumbentes, os autores arcarão com a taxa única e demais despesas processuais, integralmente. Fixo honorários advocatícios devidos às procuradoras do réus em 10% sobre o valor atualizado da causa, atentando ao trabalho desenvolvido, à complexidade da lide e ao tempo de tramitação do processo, conforme o artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. Os honorários deverão ser corrigidos pelo IGP-m a partir desta decisão, e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar do trânsito em julgado. Resta suspensa a exigibilidade dos autores enquanto litigarem sob o amparo da gratuidade da justiça.

A parte-autora, declinando suas razões, requer a reforma da sentença para fins de procedência do pedido, sobretudo porquanto o imóvel foi negociado por preço muito abaixo do seu verdadeiro valor de mercado, conforme indicado também no laudo pericial produzido por perito da confiança do juízo. Diz que o dolo ficou comprovado também pelos pagamentos esporádicos na conta bancária da apelante DELMINA, sendo que os apelantes são pessoas simples e de pouca instrução. Aduz que a prova oral, a partir dos depoimentos de Antoninho e Remi, demonstram o vício de consentimento. Ao final pugna pelo provimento do recurso, invertendo-se a sucumbência.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 51, CONTRAZ1 origem).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC.

É o relatório.

VOTO

RELAÇÃO JURÍDICA LITIGIOSA.

Para melhor compreensão da controvérsia, transcrevo relatório da sentença recorrida:

ORLANDO DE ROSSO e DELMIRA CAPELETTI DE ROSSO, devidamente qualificados nos autos, ajuizaram Ação de Declaratória de Nulidade em face de VITÓRIO DE ROSSO e IARA REJANE MACHADO BERBIGIER, também qualificados, dizendo serem proprietários do imóvel de matrícula nº 7.076 do Registro de Imóveis desta Cidade, com área de 54.665m². Mencionaram terem vendido ao primeiro réu, irmão do primeiro autor, o total de 5.000m² daquela área em 23 de agosto de 2001, formando-se condomínio. Argumentaram que os réus os contataram para que fosse promovida a extinção do referido condomínio no ano de 2013, junto ao Tabelionato de Notas desta Cidade de São Marcos, o que foi aceito. Alegaram terem sido surpreendidos com a notícia de que, no mês de julho de 2013, ao invés da extinção de condomínio, firmaram escritura pública de compra e venda de 17.000m² do bem aos réus, por valor irrisório, não recebido, inclusive. Indicaram o valor de mercado do bem à época do suposto negócio. Relataram a ocorrência de dolo no negócio jurídico, praticado em virtude da pouca instrução que possuíam, dizendo ser ele anulável. Teceram comentários sobre o direito que entendem cabível. Requereram a procedência do pedido, com a anulação do negócio jurídico e a consequente retificação da área dos imóveis criados em razão daquele. Juntaram documentos (docs. 2/11 do Evento 2).

[...]

Os réus apresentaram contestação arguindo, preliminarmente, vício na representação ante a ausência de documentos capazes de indicar a representação do espólio por Maria Regina De Rosso Polo. No mérito, destacaram que o mencionado negócio jurídico realizou-se por escritura pública, sendo firmado no Tabelionato de Notas desta Cidade, perante tabelião que atestou a capacidade das partes, certificou a vontade e leu o documento às partes. Ressalvaram que foi o próprio de cujus que ofereceu o bem à venda, propondo o pagamento conforme disponibilidade. Aludiram que a área era acidentada e com muito mato, local onde foi aberta estrada para o acesso à moradia que fizeram. Sustentaram que Secretaria da Fazenda Municipal avaliou o imóvel em R$ 15.000,00 (quinze mil reais), restando acordado a compra pelo valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), o que ocorreu por depósito bancário na conta da autora Delmira. Argumentaram não existir prova do vício de consentimento. Aludiram que a propositura da ação ocorreu por interferência da filha Maria Regina, a qual não aceitava a venda de bens pelos genitores. Requereram a improcedência do pedido. Também juntaram documentos (docs. 15/21 do Evento 2).

A parte-autora apela, sob a alegação central da ocorrência de venda por preço vil a configurar o dolo, a nulidade do negócio de compra e venda do impovel litigioso.

NULIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. ÔNUS DA PROVA.

A validade do negócio jurídico, nos termos do art. 104 do CC, requer agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei.

Com efeito, os elementos necessariamente integrantes do contrato de compra e venda são o consentimento, a coisa e o preço.

O art. 171 do Código Civil, por sua vez, em seu inciso II, traz como causa de anulabilidade do negócio jurídico, os vícios de consentimento decorrentes de erro, dolo, coação, estado de perito, lesão ou fraude contra credores.

Conforme o dispositivo:

Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:

I - por incapacidade relativa do agente;

II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.

Os negócios jurídicos formalizados com dolo são anuláveis, conforme previsão normativa do artigo 145 do CCB, in verbis:

Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.

Em relação ao dolo, enquanto vício de consentimento, transcrevo doutrina de José Augusto Delgado 1:

O dolo é entidade jurídica que tem sua presença considerada em todos os ramos do direito.

No âmbito do Direito Civil ele, quando for a causa do negócio jurídico, determina a sua anulabilidade.

A doutrina o conceitua, em sentido amplo, como sendo qualquer tipo de artifício empregado por uma das partes vinculadas a uma relação jurídica para enganar alguém. É, em outras palavras, conduta astuciosa empregada para induzir alguém à prática de um negócio jurídico, levando-o a ser enganado pela caracterização de um erro que o conduz a expedição de manifestação de vontade que não se consumaria se o embuste não existisse.

Outrossim, incumbe à parte-autora o ônus de comprovar o vício de consentimento alegado para fins de caracterização da nulidade do contrato (art. 373, I, do CPC).

Nesse sentido, transcrevo:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. CONFISSÃO DE DÍVIDA. FUMO EM FOLHA. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REPETIÇÃO DE VALORES. TAXAS. CAPITALIZAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA. JUNTADA DE CONTRATO: É rejeitada a tese exposta no apelo, quando os documentos firmados entre as partes foram juntados com a peça de defesa. Aliás, houve intimação da parte autora acerca da necessidade de produção de novas provas, nada requerendo. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: A questão, neste ponto, é de somenos importância, eis que a simples incidência do Código de Defesa do Consumidor não implica em eventual nulidade ou abusividade a ser declarada de ofício, porquanto há que se respeitar a Súmula n. 381 do STJ. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA: É da parte autora o ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito (vício de consentimento), nos termos do que dispõe o artigo 333, I do Código de Processo Civil, do qual não se desincumbiu. ENRIQUECIMENTO INDEVIDO: O princípio pacta sunt servanda só deve ceder diante da existência de nulidade ou de anulabilidade decorrente de vício de consentimento. No caso, não se verifica nenhum vício de consentimento para nulificar a Confissão de Dívida, não demonstrando a parte autora da cobrança indevida ou irregular pela Alliance. Não demonstrou o autor a cobrança de valores a maior pela ré, não havendo que se falar em enriquecimento injustificado. REPETIÇÃO DE VALORES. TAXAS. CAPITALIZAÇÃO: Deixo de conhecer o apelo, no ponto, porquanto se trata de inovação recursal. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA: Diante do desprovimento do apelo da parte autora, fica prejudicado o pedido de antecipação dos efeitos da tutela formulado em razões recursais. SUCUMBÊNCIA RECURSAL: O art. 85, §11º, do CPC estabelece que o Tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal. Sucumbência recursal reconhecida e honorários fixados em prol do procurador da parte ré majorados. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO, NA PARTE CONHECIDA.(Apelação Cível, Nº 70085193837, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 26-08-2021)

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO E CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. ALEGAÇÃO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. A inversão do ônus da prova em favor do consumidor prevista no art. 6º, VIII, do CPC, opera-se ope judicis, ou seja,...

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