Decisão Monocrática nº 50003874420158210130 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 04-07-2022

Data de Julgamento04 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50003874420158210130
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002864360
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000387-44.2015.8.21.0130/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR: Desembargador MARCELO CEZAR MULLER

APELANTE: ALICE CAES SILVA (AUTOR)

APELANTE: TAISY SILVA MARQUES (AUTOR)

APELANTE: TARCISO ROSA MARQUES (AUTOR)

APELADO: RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta por ALICE CAES SILVA, TAISY SILVA MARQUES e TARCISO ROSA MARQUES da decisão que julgou a Ação de Indenização movida em desfavor de RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. A sentença teve o seguinte dispositivo:

Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora.

Em face da sucumbência, condeno a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais vão arbitrados em 10% sobre o valor da causa, conforme disposto no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Suspendo a exigibilidade da cobrança, no entanto, em razão da parte litigar ao abrigo da assistência judiciária gratuita.

Constou no relatório:

Tarciso Rosa Marques, Alice Carpes Silva e Taisy Silva Marques, menor impúbere representada por seus pais, ajuizaram ação indenizatória em face de AES Sul Distribuidora Gaúcha de Energia S/A, todos já qualificados nos autos do processo. Narraram que, após um temporal na região onde residem (São Judas Tadeu, Jazidas, Interior de São Sepé/RS), foi interrompido o fornecimento de energia elétrica na residência da família, situação que perdurou por 17 (dezessete) dias consecutivos, no período de 15/10/2015 a 01/11/2015. Aduziram que, em razão da falta de energia elétrica, ficaram sem acesso a três bens de primeira necessidade, quais sejam: luz, água e telefone. Acrescentaram haver indícios de má conservação, por parte da demandada, da rede elétrica existente na localidade em que residem. Destacaram que a responsabilidade da requerida seria objetiva e aduziram que o dano moral sofrido pelo consumidor em situações análogas à descrita seria presumido. Diante de tal plano fático normativo, requereram a condenação da demandada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.500,00 (oito mil e quinhentos reais) para cada autor. Postularam, ainda, o benefício da gratuidade judiciária. Com a inicial (fls. 02-10), juntaram procurações (fls. 11-13) e documentos (fls. 14-27).

Recebida a inicial, foi deferida a AJG (fl. 35).

Citada (fl. 37), a demandada AES Sul apresentou contestação. Impugnou o tempo da interrupção. Referiu que os temporais ocorridos no período reclamado na região de atendimento da concessionária foram de grande intensidade, gerando verdadeira situação de calamidade pública. Informou que devido às fortes chuvas e temporais, vários clientes ficaram sem energia elétrica. Referiu que os prepostos da empresa se encontravam em campo de maneira integral, atendendo inúmeros chamados, o que motivou a demora da ligação do fornecimento de energia elétrica na região. Asseverou que em nenhum momento houve descaso por parte da empresa, pois nessas situações de caso fortuito ou força maior, todo o efetivo de equipes é deslocado para as áreas de risco para atender os clientes de maior urgência. Invocou a ocorrência de caso fortuito, com a consequente inexistência de relação de causalidade entre os danos cogitados e a conduta da concessionária. Aduziu não ter havido comprovação quanto aos danos alegados. Requereu a improcedência do pedido indenizatório. Com a contestação (fls. 38-76), juntou procuração (fl. 77), substabelecimento (fl. 78) e documentos (fls. 79-80).

Houve réplica (fls. 81-86), ocasião em que a parte autora juntou documentos novos (fls. 87-94).

Intimadas as partes acerca das provas que pretendiam produzir, a requerida juntou aos autos mídia para ser utilizada como prova emprestada e novos documentos (fls. 105 e 108-124).

Declarada encerrada a instrução (fl. 127), as partes apresentaram memoriais escritos (fls. 128-131 e 134-137) e o Ministério Público manifestou-se pela improcedência da ação (fls. 138-141).

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório, passo a fundamentar e decido.

Em suas razões, a autora refere que a falta de energia foi por um período de 17 dias, o que se mostra excessivo mesmo diante da existência de intempéries. Aduz que as provas produzidas comprovam os fatos alegados na exordial. Afirma que o dano moral, ao concreto, é in re ipsa, prescindindo de provas. Ressalta que houve falha na prestação do serviço de fornecimento de energia elétrica. Alega que não deve ser considerada a aplicação do caso fortuito na demanda, pois este não restou evidentemente demonstrado nos autos. Menciona que a concessionária ré não demonstrou nos autos motivos para a demora excessiva do restabelecimento da energia elétrica. Colaciona julgados em abono da sua pretensão. Pede o provimento do apelo. Requer a reforma da sentença ao efeito de julgar procedente a demanda condenando a parte ré ao pagamento integral dos danos extrapratrimoniais. Litiga sob o manto da gratuidade da justiça.

Foram apresentadas as contrarrazões.

Subiram os autos e vieram-me conclusos para julgamento.

Registra-se que foi observado o disposto nos artigos 931 e 934 do CPC, em face da adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

A parte autora sustenta ter havido interrupção no fornecimento de energia elétrica entre os dias 15-10-2015 e 01-11-2015. Postula, pelo ocorrido, reparação por danos morais.

A sentença foi de improcedência, em razão do reconhecimento da excludente de caso fortuito.

O Ministério Público, sem enfrentamento do mérito, devolve os autos para regular prosseguimento do feito.

Esclarecidos os fatos, passo ao exame da questão.

Responsabilidade da concessionária de serviço público.

O desenvolvimento da sociedade, na qual as relações passaram a tomar as mais diversas formas e espécies, exigiu outros meios para enfrentar a presença de danos causados às pessoas.

A lei, em determinadas situações, prevê a reparação do dano sem exame do elemento subjetivo do agente causador. Isto é, não exige a presença de culpa, contentando-se com a prática da conduta, existência do prejuízo e do nexo de causalidade.

Justifica-se a responsabilidade objetiva pela teoria do risco, porque o agente ao exercer atividade que provoca a existência de risco de dano, deve responsabilizar-se pelo prejuízo causado.

A regra do art. 37, § 6º, da Constituição Federal constitui o fundamento para a responsabilidade do Estado, com base na responsabilidade objetiva para os atos comissivos e que, em princípio, abrange qualquer função pública.

Os atos praticados por concessionária de serviço público, delegada de função pública, sociedade de economia mista e empresa pública (no desempenho de serviço público propriamente dito) estão abrangidos nessa espécie de regramento. Isso decorre da circunstância que, nesses casos, a atividade tem origem em ato que caberia ao Estado e este outorgou a permissão para que outra pessoa o praticasse.

Como exemplo de responsabilidade objetiva podem ser citadas estas regras legais: CC, arts. 936, 937, 938, 929, 930, 939, 940, 927, parágrafo único, e 933; Lei de acidente de trabalho; Código Brasileiro de Aeronáutica; Lei 6.453/77; Decreto legislativo nº 2.681/1912 (estradas de ferro); Lei nº 6.838/81; o Código de Defesa do Consumidor; e a CF, art. 37, § 6º.

Dessa maneira, no geral, são pressupostos para a obrigação de indenizar o defeito do produto ou serviço, a imputação, o dano e o nexo causal.

Nexo de causalidade.

A responsabilização do agente tem como requisito a relação de causalidade entre o ato praticado e o prejuízo ocasionado à vítima.

Com pertinência à conduta do agente, são abrangidos o ato próprio (responsabilidade direta), com culpa ou dolo, comissivo ou omissivo, de terceiro (responsabilidade indireta), pelo qual tenha responsabilidade, a falha de serviço e o prejuízo originário de coisa inanimada ou de animal, que possua a guarda.

No que diz respeito ao dano, deve ter origem ou resultar do comportamento do agente, de ato de terceiro, da falha de serviço, de coisa inanimada ou de animal. Isto é, a conduta, comissiva ou omissiva, deve ter provocado o prejuízo à vítima.

A doutrina esclarece:

O direito só pode gerar responsabilidade quando seja possível estabelecer um nexo causal entre ele e seu autor, ou seja, quando se esteja diante de uma relação necessária entre o fato incriminado e o prejuízo.

(Carlos Roberto Gonçalves, Direito das Obrigações, Parte Especial, Responsabilidade Civil, volume 6, tomo II, Sinopses Jurídicas, Editora Saraiva, 3ª edição, p. 81)

O Código Civil, no art. 403, ao que tudo indica, adotou a teoria dos danos diretos e imediatos. Somente o dano originado de modo direto e imediato com o fato do agente deve ser reparado.

Como regra geral, o nexo de causalidade deve ser analisado no caso concreto e a demonstração da presença do vínculo entre a ação e o resultado cabe à parte autora.

Não é suficiente a mera possibilidade de o evento ter origem no fato narrado pela parte autora.

O caso fortuito e força maior podem excluir a responsabilidade do agente, de acordo com o art. 393 do CC. O caso fortuito tem origem nas forças da natureza. A força maior decorre de atos humanos, como guerras, revoluções, greves, fato do príncipe, etc. Nessas situações ocorre o rompimento do nexo causal, porque o evento é inevitável para o agente.

Dois elementos devem estar presentes, conforme lição de Sílvio Rodrigues, Direito Civil, volume 2, Editora Saraiva, 23 ª edição: “a) um elemento subjetivo, representado pela ausência de culpa; b) um elemento objetivo, constituído pela inevitabilidade do evento.” (p. 284)

No atual...

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