Acórdão nº 50003985620128210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50003985620128210008
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001809209
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000398-56.2012.8.21.0008/RS

TIPO DE AÇÃO: Recuperação judicial e Falência

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ LOPES DO CANTO

APELANTE: IRMÃOS HOFFMEISTER & CIA LTDA (AUTOR)

APELADO: SUPERMERCADOS A S P LTDA - ME (RÉU)

RELATÓRIO

IRMÃOS HOFFMEISTER & CIA LTDA interpôs recurso de apelação da sentença que, nos autos do pedido de falência movido em face de SUPERMERCADOS A S P LTDA - ME, negou provimento ao pedido.

Nas razões recursais, a parte apelante narrou que o juízo de primeiro grau decretou a revelia da parte ré, no entanto, não acolheu o pedido de falência com base nos títulos protestados apresentados, sob o argumento de não constar a identificação da pessoa que recebeu os protestos.

Aduziu a impossibilidade de o juiz conhecer, de ofício, de eventual vício no título protestado ou em seu instrumento, considerando que a lei exige iniciativa da parte demandada para tanto, o que é vedado, de acordo com o art. 141, do Código Civil.

Requereu o provimento do recurso, com a reforma da sentença de primeiro grau, a fim de que seja julgado procedente o pedido de falência.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade e objeto dos recursos

Eminentes colegas, os recursos intentados objetivam a reforma da sentença de primeiro grau que julgou improcedente o pedido de falência da demandada.

Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizado o recurso cabível, há interesse e legitimidade para recorrer, é tempestivo e está devidamente preparado, inexistindo fato impeditivo do direito recursal, noticiado nos autos.

Assim, verificados os pressupostos legais, conheço dos recursos intentados para a análise das questões suscitadas.

Matéria discutida no recurso em análise

Com relação à questão de fundo do recurso não merece guarida a pretensão da parte autora, devendo ser mantida a sentença de primeiro grau pelas razões a seguir alinhadas.

Note-se que a parte postulante fundamenta o seu pedido na impontualidade disposta no artigo 94, inciso I, da LRF, implicando a falência do devedor que, sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados, cuja soma ultrapasse o equivalente a quarenta (40) salários mínimos na data do pedido de falência, ou seja, com base na impontualidade.

No entanto, diante das graves consequências advindas do decreto falência, é necessário que estejam preenchidos todos os requisitos legais, dentre os quais está a intimação regular do protesto, a qual não restou atendida de forma adequada.

Aliás, sobre o tema em lume é oportuno trazer à baila os ensinamentos do ilustre professor Fazzio1 em sua obra, Lei de Recuperação e Falência, transcritos a seguir:

Ato extremado, o encerramento das atividades econômicas do inadimplente só deve ser decretado se comprovado de forma inquestionável sua impossibilidade de solver; e, para que se tenha como caracterizado esse estado, imprescindível é que, na extração do protesto do título que a configura, seja guardada irrestrita obediência ao rigorismo formal reclamado pela lei específica.

A certidão será de inteiro teor do protesto, quer dizer, não mero relatório nem singela certificação. Afinal, tanto o órgão judiciário deverá examinar sua regularidade, como o próprio devedor poderá fazê-lo ao defender-se, trazendo à luz sua eventual nulidade.

Nesse passo, instrumentos de protesto que não identifiquem a pessoa que recebeu a carta intimatória pretensamente entregue à devedora, ausente qualquer documento positivador da existência de real e efetiva intimação, restam visceralmente maculados de irregularidade, não autorizando o acolhimento da postulação falencial, em face da ausência de pressuposto essencial à constituição válida e regular da relação processual.

É absoluta a necessidade de identificação, na certidão de protesto, da pessoa que, em nome da devedora, recebeu a respectiva comunicação, pois que, somente assim, se poderá aquilatar a efetiva ocorrência da intimação pessoal exigida em lei.

Portanto, em se tratando de pedido de falência com base na impontualidade, para que seja reconhecida a regularidade do protesto, é imprescindível que haja no instrumento que deu ciência deste a indicação do nome da pessoa que recebeu a intimação, bem como a assinatura desta, sendo despicienda a exigência de que a pessoa que foi cientificada tenha poderes de representação da empresa, pois esta se presume, consoante teoria da aparência.

No caso em exame, da análise dos instrumentos de protesto insertos nos autos, juntados ao evento evento 3, DOC1, às fls. 15/46, denota-se que naqueles, além de não conterem nenhuma assinatura, não é possível a identificação da pessoa que recebeu a intimação, de que sorte que os protestos em questão não estão aptos a instruírem o pedido de falência com base na impontualidade.

Releva ponderar, ainda, que o Superior Tribunal de Justiça pacificou o tal entendimento, ao editar a Súmula n.º 361, publicada em 22 de setembro de 2008, in verbis:

Súmula 361. A notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a identificação da pessoa que a recebeu.

Destarte, a ausência de regularidade formal do protesto, a teor do que estabelece o artigo 96, inciso VI, da Lei 11.101/2005, descaracteriza a impontualidade exigida pela lei falimentar, a fim de gerar a presunção de insolvabilidade decorrente da prova oficial da mora.

Dessa forma, deve ser mantida a decisão de primeiro grau, que julgou improcedente o pedido de falência, com fundamento no art. 487, inciso I, da legislação processual.

A esse respeito, já me manifestei na condição de relator, sendo acompanhado pelos demais membros do Colegiado desta Câmara, conforme o aresto que segue:

APELAÇÃO CÍVEL. PEDIDO DE FALÊNCIA. DECRETAÇÃO DA QUEBRA. IMPOSSIBILIDADE. IRREGULARIDADE FORMAL DO PROTESTO. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS NECESSÁRIOS AO AJUIZAMENTO DA DEMANDA. 1. Em se tratando de pedido de falência com base na impontualidade, para que seja reconhecida a regularidade do protesto, é imprescindível que haja no instrumento que deu ciência deste a indicação do nome da pessoa que recebeu a intimação, bem como a assinatura deste, sendo despicienda a exigência de que a pessoa que foi cientificada tenha poderes de representação da empresa, pois esta se presume, consoante a teoria da aparência. 2. Da análise dos instrumentos de protesto insertos nos autos, denota-se que inexiste a identificação da pessoa que recebeu a intimação, de que sorte que o protesto em questão não está apto a instruir o pedido de falência com base na impontualidade. Inteligência da Súmula n. 361 do STJ. 3. Comprovada a ausência de regularidade formal do protesto, a teor do que estabelece o artigo 96, inciso VI, da Lei 11.101/2005, o que descaracteriza a impontualidade exigida pela lei falimentar, a fim de gerar a presunção de insolvabilidade decorrente da prova oficial da mora. 4 Por outro lado, verifica-se que a parte apelada foi condenada ao pagamento de multa por litigância temerária, tendo sido fixada em 3% sobre o valor da causa, bem como arcar com os consectários legais. Entretanto, na sentença recorrida nada constou acerca da condenação em que pese tenha ocorrido, devendo, assim, contar no título para possibilitar a respectiva execução pela parte autora. Dado parcial provimento ao recurso.(Apelação Cível, Nº 70082144171, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em: 28-08-2019)

No mesmo diapasão, esta Corte tem se manifestado reiteradamente como segue:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA. PEDIDO DE FALÊNCIA. DECRETAÇÃO DA QUEBRA. PEDIDO DE SUSPENSÃO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RAZÃO DE TRANSAÇÃO REJEITADO. PRESSUPOSTOS PARA A INSTAURAÇÃO DO ESTADO DE FALÊNCIA VERIFICADOS. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 94, I, DA LEI 11.101/05. AUSENTE RELEVANTE RAZÃO DE DIREITO PARA O INADIMPLEMENTO DE OBRIGAÇÃO LÍQUIDA MATERIALIZADA EM TÍTULOS EXECUTIVOS PROTESTADOS. 1. DE INÍCIO, O PEDIDO DE SUSPENSÃO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO ATÉ O FINAL DO PARCELAMENTO DO PAGAMENTO DO DÉBITO ASSUMIDO PELA DEVEDORA EM ACORDO CELEBRADO COM A AGRAVADA NÃO COMPORTA ACOLHIMENTO. ISSO PORQUE, EM TENDO JÁ OCORRIDO A DECRETAÇÃO DE FALÊNCIA PELO JUÍZO DE ORIGEM, A NOMEAÇÃO DE ADMINISTRADOR JUDICIAL PARA REPRESENTAÇÃO DA MASSA FALIDA, A MANIFESTAÇÃO DE OUTROS CREDORES NO PROCESSO FALIMENTAR, BEM COMO O RECEBIMENTO DO PRESENTE RECURSO SEM A CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO, EXISTE POSSIBILIDADE DE ÓBICE À HOMOLOGAÇÃO DO ACORDO PELO JUÍZO DE ORIGEM. 2. NÃO SE ADENTRA...

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