Acórdão nº 50004037720188210102 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50004037720188210102
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001893962
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000403-77.2018.8.21.0102/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Moral

RELATORA: Desembargadora ISABEL DIAS ALMEIDA

APELANTE: NELSON ZANUZO (AUTOR)

APELADO: RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por NELSON ZANUZO e RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra a sentença do evento 05 do feito originário (PROCJUDIC11, fls. 07-17) que, nos autos da ação de indenização ajuizada pelo primeiro em desfavor da segunda, restou proferida nos seguintes termos:

Pelo exposto, julgo PROCEDENTE o pedido formulado por Nelson Zanuzo em face da RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., extinguindo o feito, com resolução do mérito, na forma do art. 487, inc. I, do CPC, para condenar a parte ré ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), corrigido monetariamente pelo IGP-M a contar da data da sentença e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês a contar da citação (art. 405 do Código Civil).

Diante do resultado do julgamento, condeno a parte ré ao pagamento das custas e das despesas processuais. Ainda, condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, os quais, observado o disposto no art. 85, § 2º, do CPC, fixo em 10% sobre o valor da condenação.

Em suas razões (evento 05 do feito originário - PROCJUDIC11, fls. 20-25), a parte autora elabora relato dos fatos e sustenta que o valor arbitrado a título de indenização pelos danos morais alegados não leva devidamente em consideração a extensão do dano. Discorre sobre a gravidade dos eventos mencionados. Destaca o potencial econômico da apelada como elemento para majoração da verba indenizatória. Arrola jurisprudência ao encontro de seus argumentos. Postula a reforma da sentença, com a majoração do quantum indenizatório para o montante entre R$ 8.000,00 e R$ 10.000,00. Requer o provimento do recurso.

A parte ré, por sua vez, em suas razões (evento 05 do feito originário - PROCJUDIC11, fls. 28-50; PROCJUDIC12, fls. 01-09), elabora relato e alega a inexistência de comprovação dos fatos alegados pela autora, seja referente à alegada interrupção de fornecimento de energia elétrica, seja referente ao abalo moral sofrido pela parte. Argumenta pela ocorrência de excludente de responsabilidade por conta de caso fortuito/força maior quanto à interrupção de outubro de 2017. Discorre sobre os critérios da ANEEL quanto aos limites temporais toleráveis de interrupção do fornecimento de energia. Busca afastar a caracterização de dano moral aduzindo a ausência de comprovação do mesmo no caso em tela. Subsidiariamente, pede a redução do quantum indenizatório e a reforma do termo inicial dos juros moratórios sobre a condenação. Colaciona jurisprudência. Requer a redistribuição sucumbencial, afirmando haver decaimento significativo da pretensão inicial da autora. Pleiteia o provimento do recurso.

Intimadas, as partes ofereceram contrarrazões (evento 05 do feito originário - PROCJUDIC13, fls. 05-33; PROCJUDIC13, fls. 37-43).

Ascenderam os autos a esta Corte, sendo a mim distribuídos.

Foram observados os dispositivos legais, considerando a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

Os recursos se revelam adequados e tempestivos. O recurso da autora é dispensado de preparo, tendo em vista a parte litigar sob abrigo da gratuidade judiciária (evento 05 do feito originário - PROCJUDIC1, fl. 35). Quanto ao recurso da requerida, está devidamente acompanhado do comprovante de pagamento das custas de preparo (evento 05 do feito originário - PROCJUDIC13, fl. 04). Assim sendo, passo ao exame de forma conjunta.

Melhor delimitando o objeto da controvérsia, adoto o relato da sentença, vertido nos seguintes termos:

Nelson Zanuzo ajuizou ação ordinária de indenização por dano moral por fato do serviço em face de RGE Sul Distribuidora de Energia S.A. Relatou os problemas enfrentados ao longo dos anos com o serviço de energia elétrica fornecido pela ré em sua propriedade rural. Argumentou que o problema com a falta de energia ocorreu reiteradamente no ano de 2017, em alguns dias do mês de outubro (01 a 06), em especial no interior de Guarani das Missões. Elencou os transtornos e danos experimentados diante da demora no restabelecimento da energia elétrica. Discorreu acerca da responsabilidade da requerida e de sua desídia em resolver o problema. Destacou a prática reiterada de descumprimento da lei e contrato de concessão por parte da requerida. Sustentou a ocorrência de dano moral. Requereu a inversão do ônus da prova e a concessão da gratuidade processual. Ao final, postulou a condenação da parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais entre dez e quinze salários-mínimos (fls. 02/11). Juntou documentos (fls. 12/18).

Intimada para trazer aos autos comprovante atualizado de rendimentos (fl. 19), a parte autora cumpriu a determinação (fls. 21/23).

Deferida a gratuidade processual, invertido o ônus probatório e determinada a citação da ré (fl. 24).

Citada (fl. 26), a parte ré apresentou contestação (fls. 27/39). Inicialmente, discorreu acerca da conduta dos procuradores da parte autora. Destacou os investimentos efetuados na rede de energia. Alegou que, nos meses de outubro e novembro de 2017, o Estado foi atingido por vários temporais e quantidades expressivas de precipitações pluviométricas, não se tratando de evento corriqueiro, mas de caso fortuito, impossível de ser previsto ou evitado. Citou dados divulgados pela Defesa Civil Estadual referentes ao período em que ocorreram as quedas de energia. Mencionou que as interrupções de energia elétrica ocorreram dentro dos limites fixados pela ANEEL. Sustentou a inexistência de nexo causal entre a data do suposto evento e os danos sofridos e a ausência de falha no serviço prestado. Discorreu sobre o descabimento do pedido de indenização por danos morais e se opôs ao pedido de inversão do ônus da prova. Requereu a improcedência dos pedidos formulados pela parte autora. Arrolou testemunhas e requereu o depoimento pessoal da parte autora Juntou documentos (fls. 40/164).

Houve réplica, oportunidade em que a parte autora requereu a intimação da parte adversa para dizer sobre a possibilidade de fazer uso de prova emprestada em relação a processos que tratam de fatos similares (fls. 165/167).

Determinada a intimação da parte autora para especificar o pedido de produção de prova emprestada e, após, a intimação da ré para se manifestar sobre a pretensão (fl. 168).

A concessionária requerida não se opôs ao pedido exarado pela parte autora de aproveitamento de prova (fls. 171/172).

Em análise, o Juízo informou a existência de processo semelhante com audiência de instrução já realizada, de modo que determinou o traslado da prova testemunhal produzida naquele expediente aos autos da presente ação, bem como a intimação das partes sobre a produção de outras provas. Por fim, indeferido o pedido de depoimento pessoal da parte autora, pois o requerido não indicou a relevância da medida (fl. 173).

Aportaram-se ao feito os documentos referidos sobre a produção da prova testemunhal em outro expediente (fls. 176/177).

A parte autora requereu a juntada da degravação da audiência (fls. 177/189) e a ré deixou transcorrer o prazo sem apresentar manifestação (fl. 190-v).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

Sobreveio julgamento de procedência, contra o qual as partes se insurgem.

A discussão posta nos autos diz respeito, basicamente, ao dever da fornecedora de energia elétrica de ressarcir o prejuízo moral supostamente suportado pelo autor em razão da interrupção do serviço ocorrida dos dias 01-10-2017 a 06-10-2017. No aludido período, segundo informado na inicial, a suspensão deu ensejo ao desligamento dos refrigeradores de alimentos, tal como do sistema de água da comunidade. Ademais, teria ensejado transtornos por impedir que o requerente e sua família utilizassem de outros utensílios domésticos elétricos e eletrônicos.

Pois bem.

Consigno que se aplica à ré a teoria da responsabilidade objetiva, uma vez que presta serviço público de fornecimento de energia elétrica, forte no disposto no art. 37, §6º, da CF/88. Nessa modalidade, a responsabilidade civil independe de demonstração da culpa, bastando a comprovação do dano e do nexo de causalidade entre esse e a ação do agente.

No mesmo sentido, o disposto no art. 14 do CDC, disciplinando que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços

Não bastasse, a demandada, como prestadora de serviço público essencial, enquadra-se na regra do art. 22 da legislação consumerista, segundo a qual os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigadas a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

No tópico, pertinente invocar o entendimento doutrinário que aponta o dever de qualidade nas relações de consumo como um dos grandes nortes instituídos pelo Código de Defesa do Consumidor, impondo sejam asseguradas a eficiência e a segurança dos serviços prestados aos consumidores, especialmente daqueles enquadrados como essenciais, como ocorre in casu.

Sobre o tema, transcrevo lição de Claudia Lima Marques:

Realmente, a responsabilidade do fornecedor em seus aspectos contratuais e extracontratuais, presente nas normas do CDC (arts. 12 a 27), está objetivada, isto é, concentrada no produto ou no serviço prestado, concentrada na existência de um defeito (falha na...

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