Acórdão nº 50004156320218210142 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 12-05-2023

Data de Julgamento12 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50004156320218210142
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003602462
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000415-63.2021.8.21.0142/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATORA: Desembargadora MARIA DE LOURDES GALVAO BRACCINI DE GONZALEZ

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra RAFAEL DA SILVEIRA, nascido em 08/10/1997, com 22 anos de idade, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155, caput, na forma do artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

“[...].

Ao dia 7 de abril de 2020, por volta das 19h25min, na Rua Humberto Campos, 293, Igrejinha/RS, o denunciado iniciou a execução para subtrair, para si, bens móveis pertencentes a Joel Naumann, crime que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade.

À ocasião, o denunciado pulou o muro existente no local e iniciou a execução para tentar subtrair, para si, bens móveis de expressão econômico-financeira ali existentes (uma edificação ainda em construção), mais especificamente canos de cobre de instalações de ares condicionados existentes na parte superior do imóvel.

Ocorre que o denunciado foi visualizado por Joel Naumann quando, depois de separados parte dos canos de ares condicionados para a subtração, arrancava outros canos para o mesmo fim, motivo por que fugiu para evitar a identificação e prisão em flagrante — circunstância impeditiva da consumação do furto.

As coisas subtraídas foram avaliadas em R$ 2.000,00, conforme auto de avaliação indireta

[...]."

Sobreveio decisão absolvendo sumariamente o acusado com fundamento no art. 397, inciso III, do Código Penal.

O Ministério Público interpôs recurso em sentido estrito, argumentando que a conduta descrita na inicial não pode ser entendida como insignificante. Postulou a reforma da decisão, com o recebimento da denúncia e prosseguimento do feito.

A Defensoria Pública apresentou contrarrazões, suscitando preliminar de não conhecimento do recurso.

Nesta Instância, o ilustre Procurador de Justiça, José Pedro M. Keunecke, opinou pela rejeição da preliminar e pelo provimento do recurso ministerial.

Conclusos para julgamento.

VOTO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público em face da decisão pela qual o réu RAFAEL DA SILVEIRA foi absolvido sumariamente com fundamento no art. 397, inciso III, do Código Penal.

Inicialmente, rejeito a preliminar contrarrecursal, uma vez que é plenamente aplicável o princípio da fungibilidade ao caso. Ademais, observo certa impropriedade na decisão recorrida ao absolver sumariamente o réu, quando sequer havia denúncia recebida.

No mérito, assiste razão ao recorrente.

Depois de julgar inúmeros casos versando sobre o princípio da insignificância, o Supremo Tribunal Federal pacificou sua jurisprudência ao delimitar os vetores que devem ser avaliados no caso concreto para que se possa cogitar de aplicação do postulado em questão. São eles: a) a ausência de periculosidade social da ação; b) a mínima ofensividade da conduta do agente; c) a inexpressividade da lesão jurídica causada, e; d) a falta de reprovabilidade do comportamento.

Transcrevo a ementa do julgado paradigma deste tema, relatado pelo Ministro Celso de Mello:

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IDENTIFICAÇÃO DOS VETORES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RECONHECIMENTO DESSE POSTULADO DE POLÍTICA CRIMINAL - CONSEQUENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL EM SEU ASPECTO MATERIAL - DELITO DE FURTO - CONDENAÇÃO IMPOSTA A JOVEM DESEMPREGADO, COM APENAS 19 ANOS DE IDADE - \"RES FURTIVA\" NO VALOR DE R$ 25,00 (EQUIVALENTE A 9,61% DO SALÁRIO MÍNIMO ATUALMENTE EM VIGOR) - DOUTRINA - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF - PEDIDO DEFERIDO. O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL. - O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: \"DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR\". - O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à...

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