Acórdão nº 50004239720128211001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50004239720128211001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002355384
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000423-97.2012.8.21.1001/RS

TIPO DE AÇÃO: Sucumbência

RELATORA: Desembargadora WALDA MARIA MELO PIERRO

APELANTE: JOAO ALBERTO RIBEIRO DO AMARAL (AUTOR)

APELANTE: CLEUNICE DAS CHAGAS AMARAL (AUTOR)

APELANTE: CARLOS ROBERTO DA SILVA (RÉU)

APELADO: CASSIO MARCELO BRITTO ELY (RÉU)

APELADO: MARIA LUIZA DE SOUZA MASCARENHAS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por CARLOS ROBERTO DA SILVA e JOÃO ALBERTO RIBEIRO DO AMARAL E OUTRA em face da sentença que, nos autos da ação redibitória cumulada com pedido de reparação de danos e indenização por dano moral movida pelos primeiros contra os segundos, julgou-a procedente, para:

"(...) determinando a rescisão do contrato firmado entre as partes e, consequentemente determinar a condenação dos réus, de forma solidária, a devolução dos valores pagos referente a transação, correspondente ao valor pago a título de arras, entrada, comissão de permanência, bem como as parcelas pagas desde agosto de 2011 à Caixa Econômica Federal até a presente data, devidamente corrigidas pelo IGP-M, desde o desembolso e acrescido de juros legais a contar da citação, bem como a condenação pelos danos morais sofridos, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a cada autor, a título de danos morais, nos termos da fundamentação, montante a ser corrigido pelo IGP-M a contar desta decisão e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

Condeno a parte ré, de forma solidária, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do autor, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, com fundamento no artigo 85, §2º, do CPC, considerando o trabalho realizado pelo profissional, o local da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa."

Em suas razões, o réu suscita preliminar de decadência. Refere que o imóvel foi adquirido em 14/04/2011 e a demanda proposta somente em 23/05/2012, ou seja, mais de ano e dia após a aquisição. No mérito, sustenta que não há qualquer vício oculto no imóvel, pois as rachaduras nas paredes eram aparentes ao tempo do negócio. Menciona que as fotografias juntadas aos autos demonstram que as rachaduras nas paredes são de dimensões e espessuras largas, incapazes de serem ocultadas somente com uma pintura. Aduz a omissão e negligência dos compradores, que não tomaram as precauções antes da compra, tendo, inclusive, visitado o imóvel somente uma vez, à noite. Pretende a modificação da sentença no que diz respeito ao dano material, tendo em vista a retirada de uma parede, o que contribuiu para a situação do imóvel. Ressalta que não restou demonstrada a ocorrência de dano moral, pretendendo, alternativamente, a redução do quantum indenizatório. Pugna pelo redimensionamento dos ônus sucumbenciais.

Por sua vez, os autores alegam que a sentença deixou de analisar a questão relativa aos danos materiais - gastos com documentação (R$ 3.845,89); impostos e taxas (R$ 3.391,94); contratação de seguro de vida (R$ 1.053,75); parcelas do financiamento junto à Caixa Econômica Federal que se vencerem após a sentença. Mencionam a necessidade de manutenção dos efeitos da antecipação de tutela para além da sentença. Pretendem a majoração do valor fixado a título de indenização por dano moral.

Devidamente intimados, somente os autores apresentaram contrarrazões.

Por redistribuição, vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Da análise dos autos, depreende-se que se trata de ação redibitória cumulada com pedido de rescisão contratual, restituição de danos materiais e indenização por dano moral, alegando a parte autora a existência de vícios ocultos no imóvel (rachaduras).

De pronto, merece ser afastada a preliminar de decadência suscitada pelo réu.

Dispõe o art. 445 do Código Civil:

"O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade.

§ 1º. Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se tratando de bens móveis, e de um ano, para os imóveis."

Assim, o prazo decadencial tem como termo inicial o momento em que o adquirente tiver ciência do defeito. No caso, evidente que quando da aquisição do imóvel as rachaduras não eram visíveis, devendo ser contado referido prazo da data em que foi emitido laudo pela seguradora com a negativa de cobertura (22/02/2012).

Sobre o tema:

APELAÇÃO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÕES CONEXAS. JULGAMENTO CONJUNTO. COBRANÇA REGRESSIVA E RESCISÃO CONTRATUAL. TRESPASSE DE FUNDO DE COMÉRCIO. POSTO DE COMBUSTÍVEL. RESCISÃO FUNDADA EM VÍCIO REDIBITÓRIO. DECADÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO. Tratando-se de ação fundada em vício oculto, o prazo para ajuizar as demandas é decadencial, sendo de 30 dias se a coisa é móvel ou 01 ano se imóvel. Quando o vício só puder ser conhecido mais tarde, conta-se o prazo a partir do momento em que o adquirente tiver ciência do defeito. (...) PRELIMINAR CONTRARRECURSAL DE DECADÊNCIA ACOLHIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. (Apelação Cível, Nº 50131117920158210001, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jucelana Lurdes Pereira dos Santos, Julgado em: 29-04-2021)

No mérito, evidente das provas juntadas aos autos que os problemas apresentados no imóvel decorrem do chamado vício redibitório, disciplinado nos artigos 441 a 446 do Código Civil (defeito oculto da coisa).

No ponto, peço vênia para transcrever parte da sentença proferida pela Dra. Lia Gehrke Brandão, a fim de evitar tautologia:

"No caso concreto, resta evidente os vícios existentes no imóvel, conforme fotografias acostas, além do minucioso laudo pericial realizado (fls.497/526, 599/601 e 538/540), impondo-se a transcrição de alguns trechos do laudo, a fim de elucidar os vícios verificados no imóvel objeto da lide.

“… 4. Considerações Técnicas:

As estruturas colapsadas são estruturas que, por algum motivo, deixaram de atender às funções para as quais foram construídas apresentando, eventualmente, risco para usuários residuais, ou mesmo, nos casos emergenciais, para as ações de resgate.

O imóvel vistoriado apresenta as seguintes sinais de instabilidade de sua estrutura:

*fissuras, trincas, rachaduras, fendas e brechas nas alvenarias (diagonais, verticais e horizontais);

*perda de verticalidade das alvenarias;

*problemas no funcionamento das esquadrias;

*deformações excessivas dos elementos do telhado;

*desnivelamento de pisos.

5. Quesitos dos autores (fls.440/441) …

4- R: As falhas existentes colocam em risco a estabilidade da construção.

5- R: A edificação periciada não possui condições de habitabilidade no estado em que se encontra.

6- R: O desaprumo e as fissuras, trincas, rachaduras, fendas e brechas constatadas nos parâmetros verticais e o desnivelamento dos pisos, indicam que ocorreu recalque na fundação.

6. Quesitos do réu (fls.422)

f) R: A vistoria do imóvel foi realizada em 06.12.2011, e ocorreu o agravamento das manifestações patológicas constatadas naquela data, chegando a situação atual, na qual o imóvel apresenta risco de desabamento.

Apresentados quesitos complementares, sendo confirmado pelo perito a retirada de uma parede que fazia divisória com a cozinha e lavanderia, contudo, ressaltou que as lesões verificadas no imóvel não guardam relações com a modificação realizada no imóvel, conforme se verifica na manifestação de fls. 599/601.

Oportuno salientar que, o imóvel objeto da presente ação possui aproximadamente 9 anos de construção, por tanto, trata-se de imóvel considerado novo, mostrando-se incompatível com a “idade” do mesmo as graves lesões estruturais verificadas.

Diante do exposto, resta incontroversa a falta de condições habitacionais do imóvel adquiridos pelos autores, em virtude dos graves problemas estruturais verificados no bem, sendo, inclusive, determinada a demolição do imóvel, uma vez que suscetível de desmoronamento, conforme vasta documentação acostada ao feito.

Saliento, ainda, a impossibilidade de acolhimento da tese apresentada na defesa, uma vez que pouco crível que o comprador mesmo ciente dos graves problemas estruturais perfectibilizaria a aquisição do bem, frisa-se, pelo valor de mercado, deixando a parte demandada de provar que os autores quando da aquisição tinham ciência dos danos, bem como inexistindo provas nos autos acerca da existência de outras visitas ao imóvel antes da concretização da compra, ônus que incumbia ao demandado, nos termos do disposto no art.373, II, do Código de Processo Civil."

Portanto, inequívoco o descumprimento obrigacional por parte do demandada, e por consequência, possível a rescisão do contrato como pretendido pelos adquirentes.

Com relação aos pedidos de indenização por danos materiais não analisados na sentença, com razão os autores. Com a rescisão do contrato de promessa de compra e venda e retorno das partes ao status quo ante, devido o reembolso dos valores desembolsados pelos adquirentes em função da aquisição do imóvel, quais sejam: gastos com documentação (R$ 3.845,89); impostos e taxas (R$ 3.391,94); contratação de seguro de vida (R$ 1.053,75).

Ainda, cumpre destacar que os autores/apelantes fizeram financiamento imobiliário para pagamento do restante do valor relativo ao imóvel. Evidente que, com a declaração da existência de vícios redibitórios, necessário que os compradores quitem o débito existente com a instituição financeira. Assim, devido o acolhimento do pedido no que diz respeito às...

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