Acórdão nº 50004387720208210163 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 14-06-2022

Data de Julgamento14 Junho 2022
ÓrgãoSexta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50004387720208210163
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002118422
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000438-77.2020.8.21.0163/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR: Juiz de Direito FELIPE KEUNECKE DE OLIVEIRA

APELANTE: OI MOVEL S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL (RÉU)

APELADO: FLAVIA TRESBACH TORRES (AUTOR)

RELATÓRIO

A Autora/Apelada, FLÁVIA TRESBACH TÔRRES, ajuizou Ação de Obrigação de Fazer, cumulada com indenização por danos morais, inicialmente em face de OI S.A. - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, parte Ré (evento 1, INIC1, do processo originário).

Conforme relatado na sentença recorrida, a Autora narrou que "foi surpreendida ao tentar solicitar financiamento para a aquisição de um veículo em razão da existência de inscrição do seu nome nos órgãos de proteção ao crédito pela demandada por um débito no valor de R$ 50,02, vencido em 11/02/2019. Disse que o débito se refere a um contrato de telefonia móvel, pactuado na cidade de Brasília/DF. Asseverou não ter realizado nenhuma contratação com a requerida, tendo ocorrido algum equívoco por parte da ré, sendo o débito indevido. Requereu a tutela de urgência para retirar o nome da autora do cadastro de inadimplentes. Postulou a procedência da pretensão para, confirmando a decisão liminar, declarar a ilegalidade da negativação e condenar a ré ao pagamento de danos morais no valor de R$10.000,00. Pediu a concessão do benefício da gratuidade judiciária e a inversão do ônus da prova" (evento 26, SENT1, do processo originário).

A inicial foi recebida, sendo concedido o benefício da gratuidade da justiça e invertido o ônus da prova, com fundamento no art. 6º, VIII, do CDC, mas indeferida a liminar postulada (evento 3, DESPADEC1, do processo originário).

A parte Ré foi citada (evento 7, AR1, do processo originário) e apresentou sua contestação, na qual requereu preliminarmente a alteração do polo passivo da demanda (evento 10, CONT1, do processo originário), seguida de réplica da Autora (evento 14, RÉPLICA1, do processo originário).

A preliminar de alteração do polo passivo foi acolhida pelo Juízo de origem, de modo que passou a constar como demandada a OI MÓVEL S.A. - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, parte Ré, ora Apelante (evento 16, DESPADEC1, do processo originário).

A Autora/Apelada interpôs, ainda, recurso de Agravo de Instrumento contra a decisão que indeferiu a tutela provisória de urgência (evento 1, INIC1, do agravo de instrumento nº 5047336-07.2020.8.21.7000/TJRS), no qual foi concedida a tutela recursal liminar requerida (evento 4, DESPADEC1, do agravo de instrumento nº 5047336-07.2020.8.21.7000/TJRS), mas que posteriormente foi julgado prejudicado pela perda do objeto (evento 13, DECMONO1, do agravo de instrumento nº 5047336-07.2020.8.21.7000/TJRS).

Instruído o feito, sobreveio sentença, proferida pelo Juízo da Vara Judicial do Foro da Comarca de Terra de Areia/RS, que julgou procedentes os pedidos formulados pela Autora e concedeu a tutela provisória de urgência, com o seguinte dispositivo:

"(...)

Diante do exposto, na forma do art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos veiculados por FLAVIA TRESBACH TORRES na ação que move em face de OI MOVEL S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL para DECLARAR indevida a dívida inscrita; DETERMINAR a retirada do nome da autora dos cadastros negativos de crédito e CONDENAR a ré ao pagamento de indenização, em razão dos danos morais causados, no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), corrigidos monetariamente pelo IGP-M e acrescido de juros moratórios de 1%, ambos a contar da presente data.

Condeno a requerida ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor corrigido da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, dado o zelo e providências tomadas nos autos, não tendo havido maiores intercorrências ou necessidade de muitas manifestações.

Com base no julgamento, concedo neste momento o pedido de tutela de urgência para determinar a intimação do réu para a imediata exclusão do nome da parte autora dos órgãos de proteção ao crédito, independente do trânsito em julgamento da presente decisão" (sic - evento 26, SENT1, do processo originário).

Irresignada com a sentença, a parte Ré interpôs o presente recurso de Apelação (evento 34, APELAÇÃO1, do processo originário) e, em suas razões, requer a reforma da sentença, sustentando, em síntese: a regularidade do débito existente no nome da Autora, que seria por ela devido; a inexistência de responsabilidade da Ré, em razão da inadimplência da Autora, que, ao não efetuar o pagamento devido, assumiu o risco de ter seu nome inscrito nos cadastros desabonadores; e a inocorrência de danos morais no caso concreto. Alternativamente, requer a redução do quantum indenizatório fixado em decorrência do dano extrapatrimonial, em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Nesses termos, requer o provimento do recurso.

O recurso foi contra-arrazoado pela parte Autora (evento 37, CONTRAZAP1, do processo originário).

A Ré/Apelante informou, ainda, o cumprimento da medida liminar que lhe foi imposta (evento 38, PET1, do processo originário).

A Apelação, então, foi remetida a esta Corte, sendo, por fim, redistribuída à minha Relatoria (evento 6, INF1).

Conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço o recurso de Apelação.

Conforme descrito no relatório, trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pela parte Ré, OI MÓVEL S.A. - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL (evento 34, APELAÇÃO1, do processo originário), contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Judicial do Foro da Comarca de Terra de Areia/RS, que julgou procedentes os pedidos formulados pela Autora e concedeu a tutela provisória de urgência, para: a) declarar indevida a dívida questionada nos autos; b) determinar a retirada do nome da Autora dos cadastros negativos de proteção ao crédito; c) condenar a parte Ré pagamento de indenização em favor da Autora, a título de dano moral, no valor de R$ 8.000,00, corrigidos monetariamente pelo IGP-M e acrescido de juros moratórios de 1%, ambos a contar da data de publicação da sentença; e d) condenar a parte Ré ao pagamento das custas judiciais e dos honorários de sucumbência, fixados em 10% do valor corrigido da condenação (evento 26, SENT1, do processo originário).

Adianto que estou votando para negar provimento ao recurso, pelas razões que passo a expor.

Em seu apelo, a parte Ré OI MÓVEL S.A. - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL postula a reforma integral da sentença recorrida, para que se reconheça a regularidade da contratação efetivada e a inexistência de responsabilidade, para que se afaste a determinação de retirada do nome da Autora dos cadastros de proteção ao crédito e a condenação por dano moral reconhecido ou, alternativamente, que seja reduzido o valor fixado da indenização a título de dano extrapatrimonial.

Sem razão.

Inicialmente, registro que não há dúvidas quanto à incidência do CDC no caso concreto, o que não é objeto de controvérsia, sendo que a Apelante sequer questiona a inversão do ônus da prova determinada pelo Juízo de origem (evento 3, DESPADEC1, do processo originário).

Pois bem.

No tocante à regularidade da contratação em debate (contrato nº 38594168), cuja inscrição no serviço de proteção ao crédito por inadimplência foi comprovada pela Autora/Apelada (evento 1, EXTR7, do processo originário), observo, assim como já mencionado na sentença recorrida, a parte Ré não apresentou nenhum documento, contrato ou qualquer outro elemento de prova que demonstre a legalidade do débito inscrito e que dê amparo à sua tese de que dita contratação foi efetuada por meio do call center da operadora de telefonia.

Como se sabe, a inversão do ônus probatório, determinada nos autos, não implica a transferência por completo à parte Ré do ônus de provar todos os pontos controvertidos nos autos, "pois a intenção final do legislador não é isentar o consumidor de produzir provas, mas, tão-somente, facilitar sua defesa em juízo" 1.

No caso concreto, desde o ajuizamento da presente ação, a Autora negou a contratação controvertida, que deu origem à inscrição de seu nome nos cadastros de proteção ao crédito (evento 1, INIC1, do processo originário).

A Ré, por seu turno, não se desincumbiu de demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da Autora - ônus que lhe incumbia, com base no art. 373, II, do CPC -, limitando-se, tanto em contestação, quanto em sede de recurso, a afirmar a regularidade do débito ora em debate, sem, contudo, comprovar sua afirmação.

Assim, ainda que o CDC não tenha adotado a teoria do risco integral, considerando que a responsabilidade da Ré é objetiva no caso concreto, com base no art. 14 do CDC2, não tendo a Apelante demonstrado minimamente a regularidade da contratação debatida, não há que se falar em reforma da sentença neste ponto.

Melhor sorte não assiste à parte Ré no tocante ao pleito de afastamento da condenação por dano moral.

Ao contrário do sustentado pela Apelante (no sentido de que não restou demonstrado no caso concreto a ocorrência do dano extrapatrimonial), é pacífico na jurisprudência do E. STJ que a inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito enseja dano moral in re ipsa, que decorre do próprio fato, não sendo necessária a sua comprovação.

Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA RÉ.

1. Está pacificado nesta Corte Superior que a inscrição indevida em cadastro negativo de crédito, por si só, configura dano in re ipsa. Precedentes.

2. É inviável o acolhimento da tese da ausência de responsabilidade civil da...

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