Acórdão nº 50004454020178210045 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50004454020178210045
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001675360
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000445-40.2017.8.21.0045/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR: Desembargador ALTAIR DE LEMOS JÚNIOR

APELANTE: COOPERATIVA DE CREDITO CENTRO LESTE - SICREDI CENTRO LESTE RS (AUTOR)

APELADO: FRANCISCO LUIZ DA SILVEIRA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela COOPERATIVA DE CRÉDITO CENTRO LESTE - SICREDI CENTRO LESTE RS da sentença que acolheu os embargos à monitória e julgou extinta a ação ajuizada contra a SUCESSÃO DE FRANCISCO LUIZ DA SILVEIRA.

Eis o relatório da sentença:

"(...)

COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DE ASSOCIADOS CENTRO LESTE - SICREDI CENTRO LESTE ajuizou ação monitória em face de FRANCISCO LUIZ DA SILVA, ambos qualificados. Aduziu que o requerido possuía limite de crédito pré-aprovado, sendo que contratou empréstimos, via caixa eletrônico, nos valores de R$ 3.000,00 (BS0931389-0) e R$ 7.000,00 (BS0931393-9), no entanto efetuou somente o pagamento parcial do débito, restando inadimplido o valor de R$ 18.193,24 (atualizado). Postulou, em caso de não pagamento ou manifestação no prazo de 15 dias, a conversão do mandado de citação em mandado executivo de título executivo judicial. Juntou documentos.

Citado, o demandado apresentou embargos. Preliminarmente, arguiu a falta de interesse, ausentes documentos firmados pelas partes. No mérito, sustentou a abusividade das cláusulas contratuais - juros remuneratórios, capitalização mensal, mora, juros moratórios, multa, correção monetária e comissão de permanência, bem como TAC, TEC, IOF e cláusula de mandato. Arguiu a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova. Requereu a revisão das cláusulas contratuais e a repetição de indébito. Pediu AJG.

Houve réplica.

Intimadas as partes a se manifestarem quanto ao interesse na produção de provas, ambas requereram o julgamento do feito.

Sobreveio certidão de óbito do réu.

Alterado o polo passivo da ação, passando a constar SUCESSÃO DE FRANCISCO LUIZ DA SILVEIRA.

Citada, a Sucessão apresentou embargos. Preliminarmente, arguiu a ilegitimidade passiva. Postulou a procedência dos embargos. Pediu AJG: Juntou documentos.

Rejeitada a preliminar de ilegitimidade.

Intimadas as partes a se manifestarem quanto ao interesse na produção de provas, ambas postularam o julgamento antecipado do feito.

Vieram os autos conclusos para sentença.

(...)."

Assim constou no dispositivo:

"Diante do exposto, com fundamento no art. 485, IV, do CPC, ACOLHO os embargos à monitória apresentado pela SUCESSÃO DE FRANCISCO LUIZ DA SILVEIRA em face da COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DE ASSOCIADOS CENTRO LESTE - SICREDI CENTRO LESTE para o fim de julgar extinta a presente ação.

Sucumbente, condeno o autor ao pagamento de honorários ao FADEP, em 10% do valor da causa, com fundamento no art. 85, §2º, do CPC, dentre eles o lugar de prestação do serviço, a natureza da causa (que não exigiu ampla instrução probatória), o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço (que tiveram maiores delongas); verba atualizada pelo IGP-M a contar desta data, acrescida de juros moratórios de 1% ao mês a contar do trânsito em julgado (art. 85, §16, do novo caderno processual civil).

Em suas razões recursais, em síntese, a parte apelante aduziu que os empréstimos foram contratados em caixa eletrônico, o qual ocorre com inserção de cartão e senha pessoal, de modo que não há um documento assinado pela parte apelada. Sustentou que os extratos juntados comprovam que foram disponibilizados os valores do empréstimo à parte autora. Destacou que, em nenhum momento, houve a negativa de que tivesse sido obtido o crédito. Ao final, requereu o provimento do recurso e a reforma da sentença, com a condenação da parte apelada à integralidade dos ônus de sucumbência (processo Judicial 4 - fls. 26-33).

Foram apresentadas contrarrazões (Processo Judicial 4 - fls. 35-41).

Cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 934 do CPC.

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Apresentada dentro do prazo recursal previsto no artigo 1.003, § 5°, do CPC, bem como comprovado o seu preparo (Processo Judicial 4 - fl. 34), presentes, portanto, os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação no duplo efeito.

OBJETO DA AÇÃO MONITÓRIA

Inicialmente, cabe informar que são objeto da ação monitória os seguintes contratos (Processo Judicial 1 - fls. 6-19):

- Contrato de Concessão de Limite de Crédito Pré-Aprovado nº B50931389-0, datado de 30.09.2015, no valor de R$ 3.000,00, com juros remuneratórios de 4,69% ao mês, capitalizados mensalmente, a ser pago em 6 parcelas ;

- Contrato de Concessão de Limite de Crédito Pré-Aprovado nº B50931393-9, datado de 30.09.2015, com juros remuneratórios de 4,69% ao mês, capitalizados mensalmente, no valor de R$ 7.000,00, a ser pago em 14 parcelas.

Na hipótese de inadimplemento, prevista a cobrança dos encargos de inadimplência à taxa de mercado, vigente à época do inadimplemento ou mora e multa de 2% sobre o total devido (Processo Judicial 1 - fl. 12).

APELAÇÃO

INÉPCIA DA INICIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. PROVA ESCRITA. JUÍZO DE PROBABILIDADE.

Entendeu o juízo de origem que o extrato bancário da conta indicando os créditos das quantias de R$ 7.000,00 e R$ 3.000,00 em seu saldo (fl. 10), por si só, não se constitui em documento representativo de dívida, mostrando-se insuficiente para amparar a presente ação monitória, razão pela qual extinguiu a presente ação monitória, com base no art. 485, IV, do CPC

A parte autora recorre, aduzindo que os empréstimos foram contratados em caixa eletrônico, o qual ocorre com inserção de cartão e senha pessoal, de modo que não há um documento assinado pela parte apelada. Além disso, sustenta que os extratos juntados comprovam que foram disponibilizados os valores do empréstimo à parte apelada. Ademais, destaca que, em nenhum momento, houve a negativa de que tivesse sido obtido o crédito.

Com efeito, a ação monitória possibilita que o credor, com fundamento em prova escrita sem eficácia de título executivo, requeira o pagamento de quantia em dinheiro, a entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel, e o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer, conforme art. 700 do CPC.

Tal prova escrita, entretanto, não significa que o documento seja líquido e certo, sendo suficiente que demonstre a existência de probabilidade do direito alegado.

Nesse sentido, lecionam Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, in Código de Processo Civil comentado artigo por artigo, 2ª edição, Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 932:

7. Conceito de Prova Escrita. Não há no Código de Processo Civil qualquer indicativo do conceito de prova escrita. O legislador não definiu o conceito de prova escrita ou enumerou determinadas provas, atribuindo-lhes o qualificativo de prova escrita. O conceito de prova escrita, à semelhança do que ocorre com outros conceitos fundamentais para o direito processual civil, é um conceito eminentemente doutrinário-jurisprudencial. (...). A prova escrita não é a prova que deve fazer surgir direito líquido e certo, isto é, não é a prova que deve demonstrar, por si só, o fato constitutivo do direito afirmado pelo autor. A prova escrita relaciona-se apenas a um juízo de probabilidade. Não há que se falar em certeza quando se está diante de prova escrita. Prova escrita não é sinônimo de prova que pode por si só demonstrar o fato constitutivo do direito. Quando se exige a prova escrita como requisito para a propositura da ação monitória, não se pretende que o credor demonstre o seu direito estreme de dúvida, como se fosse um direito líquido e certo. Ao contrário, a prova escrita necessita fornecer ao juiz apenas certo grau de probabilidade acerca do direito alegado em juízo. (grifado)

Acerca do mesmo tema, assim leciona Heitor Vitor Mendonça Sica in Comentários ao Código de Processo Civil Volume X, Direção Luiz Guilherme Marinoni, coordenação Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, 1ª edição e-book, baseada na 1ª edição impressa, Editora Revista dos Tribunais, nos comentários ao art. 700 do CPC/2015:

2. Prova escrita sem eficácia de título executivo

Exige-se que o titular do crédito disponha de prova escrita acerca da obrigação, a qual não constitui título executivo extrajudicial.97 Aqui se inclui a prova documental; provas que, embora originalmente não documentais, tenham sido documentadas, ainda que por meio de procedimento de produção antecipada de prova (art. 700, § 1.º) e, por fim, a prova emprestada (art. 372).98

A prova escrita deve revelar probabilidade quanto à existência do direito.99 Essa afirmação é corroborada pelo art. 700, § 5.º (que permite ao juiz, caso não se convença da probabilidade de existência da obrigação, determinar a emenda da petição inicial para converter o procedimento em comum), e pelo art. 701, caput (que condiciona a expedição do mandado monitório à demonstração da evidência do direito do autor).100

Outro aspecto a considerar concerne aos requisitos da obrigação espelhada na prova escrita. Resta saber se, a despeito de não caracterizar título executivo extrajudicial, a prova escrita deve retratar obrigação certa, líquida e exigível.

Não há dúvida de que a obrigação objeto da ação monitória deve ser exigível, ou seja, não estar sujeita a termo ou condição. Do contrário, faltará interesse processual. Deve-se observar, por analogia, os arts. 798, I, c e d, que permitem que o autor prove o implemento do termo ou condição, bem como o adimplemento da prestação a que se obrigou, para que possa exigir a contraprestação do réu.101

Quanto aos demais requisitos, o STJ adota posição liberal, aceitando: (a) documento produzido unilateralmente pelo credor;102 (b) notas...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT