Acórdão nº 50004537320188210015 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 08-04-2022

Data de Julgamento08 Abril 2022
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50004537320188210015
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001792360
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000453-73.2018.8.21.0015/RS

TIPO DE AÇÃO: Rescisão do contrato e devolução do dinheiro

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: RAFAEL RAMOS DA SILVA

APELADO: VP GRAVATAI EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por RAFAEL RAMOS DA SILVA em face da sentença prolatada na ação de resolução de contrato cumulada com pedido de indenização que move contra VP GRAVATAI EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA, com o seguinte dispositivo (fl. 18 do doc. "PROCJUDIC3" do Evento 03 do processo de origem):

Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do CPC, julgo procedentes os pedidos para o efeito de:

a) RESOLVER o contrato entabulado entre as partes;

b) condenar a requerida ao pagamento de indenização à parte autora no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), importância que deverá ser corrigida monetariamente, pela variação do IGPM, a contar da publicação da sentença, e acrescido de juros moratórios, de 1% ao mês, a contar da mesma data, dada a atualidade do valor;

c) restituir os valores pagos pelo autor, em uma única parcela, devidamente corrigidos, pelo IGP-M, a partir de cada pagamento, e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, desde a citação;

d) condenar a requerida ao pagamento de multa de 2% sobre o valor pago pelo autor.

Condeno a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em prol do procurador da parte autora, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, forte no artigo 85, § 2°, do NCPC.

A parte-autora RAFAEL RAMOS DA SILVA, insurge-se contra o quantum indenizatório fixado a título de indenização por danos morais e contra o valor dos honorários advocatícios de sucumbência, reclamando a majoração de ambos. Indica que o atraso na entrega do imóvel superou 03 (três) anos. Salienta que se tratava do sonho da casa própria. Aponta que os honorários de sucumbência foram arbitrados em valor ínfimo. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para majorar o valor da indenização por dano moral e dos honorários de sucumbência.

Embora intimada, não foram apresentadas contrarrazões pela parte-ré (fl. 30 do doc. "PROCJUDIC3" do Evento 03 do processo de origem).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC.

É o relatório.

VOTO

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

A indenização por dano moral encontra amparo no art. 5º, X, da Constituição Federal e arts. 186 e 927, combinados, do Código Civil Brasileiro.

Sérgio Cavalieri Filho1 ensina que “em sentido estrito dano moral é violação do direito à dignidade”; já em sentido amplo dano moral é a “violação dos direitos da personalidade”, abrangendo “a imagem, o bom nome, a reputação, sentimentos, relações afetivas, as aspirações, hábitos, gostos, convicções políticas, religiosas, filosóficas, direitos autorais”.

O inadimplemento contratual, por si só, é insuficiente para configurar dano moral, devendo ser entendido como simples transtorno ou aborrecimento, inerente ao risco do negócio jurídico celebrado entre as partes.

Nesta linha de entendimento, o descumprimento de cláusula contratual pode ensejar indenização por perdas e danos patrimoniais, mas, em regra, não acarreta dano moral.

De outro modo, havendo comprovação de situação excepcional e concreta que tenha causado aflições e angústias a ponto de interferir significativamente no comportamento psicológico do autor, o descumprimento do contrato pode configurar dano moral indenizável.

Nesse sentido, transcrevo precedente do STJ:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. ATRASO NA ENTREGA DAS CHAVES. EXCLUDENTE DE ILICITUDE.

AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA. CADEIA DE CONSUMO. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. DANOS MORAIS RECONHECIDOS. SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.

(...)

4. A respeito dos danos morais, a jurisprudência do STJ possui entendimento no sentido de que "muito embora o simples descumprimento contratual não provoque danos morais indenizáveis, circunstâncias específicas da controvérsia podem configurar a lesão extrapatrimonial" (1.642.314/SE, Relatora a Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 22/3/2017).

5. No presente caso, o Tribunal de origem considerou as peculiaridades no caso concreto para concluir que o fato ultrapassou a esfera dos acontecimentos cotidianos, e que restou configurado o dano moral. Dessa forma, não é possível alterar o entendimento do acórdão recorrido pois demandaria reexame de fatos e provas, o que é vedado em razão do óbice da Súmula 7 do STJ.

6. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1604388/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 12/05/2020).

Na hipótese dos autos, a sentença concluiu que houve substancial e injustificado atraso na entrega do imóvel, ultrapassando a condição de mero dissabor e inadimplemento contratual e alcançando o condão de dano moral indenizável.

Não houve irresignação das partes em relação ao ponto, recaindo a apelação da parte-autora exclusivamente em relação ao quantum indenizatório.

Relativamente ao quantum indenizatório, saliento que deve ser fixado considerando as circunstâncias do caso, o bem jurídico lesado, a situação pessoal do autor, inclusive seu conceito, o potencial econômico do lesante, a ideia de atenuação dos prejuízos do demandante e o sancionamento do réu a fim de que não volte a praticar atos lesivos semelhantes contra outrem.

Acrescente-se que o valor da indenização deve atender o princípio da razoabilidade, não podendo o dano implicar enriquecimento sem causa.

No caso concreto, a aquisição do imóvel foi contratada pelo valor de R$137.500,00, tendo a parte-autora indicado o pagamento de R$9.000,00, fato incontroverso diante da ausência de impugnação específica da parte-ré em sua contestação (fls. 24-33 do doc. "PROCJUDIC1" e fls. 01-02 e 39-49 do doc. "PROCJUDIC2", todos do Evento 03 do processo de origem).

A previsão de entrega após o término do prazo de tolerância era de 30.06.2017 (fls. 24-33 do doc. "PROCJUDIC1" e fls. 01-02 do doc. "PROCJUDIC2", ambos do Evento 03 do processo de origem).

Quando do ajuizamento da ação em 09.10.2018 as obras sequer haviam sido iniciadas (fl. 01 do doc. "PROCJUDIC1" e fls. 18-22 do doc. "PROCJUDIC2", ambos do Evento 03 do processo de origem).

O autor qualificou-se à inicial como "industriário" e goza da gratuidade da justiça (fl. 02 do doc. "PROCJUDIC1" e fl. 22 do doc. "PROCJUDIC2", ambos do Evento 03 do processo de origem).

Não constam informações acerca da capacidade financeira da parte-ré, apenas indicativos de tratar de sociedade empresária do ramo da construção civil e possuir situação cadastral ativa e processos judiciais decorrentes do atraso na conclusão do empreendimento (fl. 08 do doc. "PROCJUDIC2" e fl. 1 do doc. "PROCJUDIC3", ambos do Evento 03 do processo de origem).

Enfim, observadas as peculiaridades supramencionadas e os parâmetros desta Câmara Cível, o valor indenizatório deve ser majorado à monta de R$ 7.000,00 (sete mil reais), acrescidos de correção monetária pelo IGPM-FGV desde a data deste julgamento e mantidos os demais termos da sentença.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. RETORNO DOS AUTOS DO STJ COM DETERMINAÇÃO DE NOVO JULGAMENTO PARA APLICAÇÃO DA TESE FIRMADA NO TEMA 966. Preliminares. Hígido o Acórdão anterior proferido por esta Câmara quanto às preliminares de revelia e julgamento extra petita, as quais não foram objeto do Recurso Especial interposto pela parte autora/apelante. Atraso na entrega da unidade habitacional. O STJ, no julgamento do Recurso Especial n.º 1.729.593/SP (Tema 996) firmou o entendimento de que o prazo de entrega da obra não pode estar vinculado à concessão do financiamento ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância. Caso concreto em que foi verificado o excesso de prazo na entrega da obra, configurando efetivo atraso. Excludente de Responsabilidade. Moradas Alvorada III-B ou Terra Nova Alvorada – Reserva III-B. Ação Civil Pública n.º 003/1.13.0007141-2. Alegação de excludente de responsabilidade que, ainda que reconhecida em outros casos similares, não abarca o período do atraso na hipótese em comento, pois a data da entrega fixada no contrato é posterior à construção da estação de tratamento de esgoto pela parte ré. Atraso reconhecido, sem incidência da cláusula de tolerância, porquanto ausente notificação com antecedência de 120 dias, conforme condicionante inserida pela própria ré no instrumento contratual. Juros de obra. Comprovado que houve atraso na entrega da obra imputável à ré, e que por tal motivo incidiram juros de obra contra o autor, tais valores, quando referentes ao período do atraso, devem ser ressarcidos. Danos materiais. Aluguel. Admite-se o ressarcimento de locativos pelo período da mora, sempre que comprovada a locação e os pagamentos correspondentes. Caso dos autos em que devidos os valores pagos efetivamente comprovados nos autos, durante o período do atraso. Dano moral. Caracterização. Atraso excessivo na entrega do imóvel, superior a um ano, contado do prazo originário para entrega do empreendimento. Situação que repercute na esfera íntima do consumidor que busca a moradia, sendo apta a lhe afrontar os direitos de personalidade, ensejando a devida reparação. REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES MANTIDA E APELO PROVIDO, EM JUÍZO DE RETRATAÇÃO.(Apelação Cível, Nº 70079805578, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 13-05-2021)

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO C/C DANO MORAL. ATRASO NA ENTREGA. CLÁUSULA DE...

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