Acórdão nº 50004627520158210068 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 06-04-2022

Data de Julgamento06 Abril 2022
ÓrgãoNona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50004627520158210068
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001957602
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000462-75.2015.8.21.0068/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR: Desembargador EDUARDO KRAEMER

APELANTE: TIAGO RODRIGO ALMEIDA NUNES (AUTOR)

APELADO: ROSA MARIA BERVIAN (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por TIAGO RODRIGO ALMEIDA NUNES, inconformado com a sentença (Evento 3 - PROCJUDIC2, Páginas 22/34, origem) que julgou improcedente a ação de indenização por danos morais movida em face de ROSA MARIA BERVIAN.

Em suas razões (Evento 3 - PROCJUDIC2, Páginas 36/42, origem), pugna pela reforma da sentença, sustentando que o fato descrito na exordial é incontroverso, sendo, inclusive, objeto de confissão pela parte ré, do que decorre o dever de indenizar. Discorre sobre os danos morais experimentados com a atitude da requerida, que caluniou o autor, sem provas, ao acusá-lo de furto de jóias durante o tempo em que esteve prestando serviços como eletrecista em sua residência. Pontua que a ré admitiu ter ligado para a esposa do autor e, também, para o seu parceiro comercial que indicou-o como prestador de serviços basedo na confiança. Tece considerações acerca da prova testemunhal, amparando a pretensão, requerendo, ao fim, o provimento do recurso.

Ofertadas contrarrazões (Evento 3 - PROCJUDIC2, Páginas 44/47, origem), vieram-me conclusos.

Registro terem sido cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 934, do CPC/2015, considerando a adoção do sistema informatizado por este Tribunal (Ato n° 24/2008-P).

É o breve relatório.

VOTO

Recebo o recurso porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Para melhor exame da controvérsia, adoto o relatório da sentença, a seguir reproduzido:

TIAGO RODRIGO ALMEIDA NUNES ajuizou a presente AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS contra ROSA MARIA BERVIAN, visando obter provimento jurisdicional que condenasse a ré a lhe alcançar danos morais, porque ela o havia caluniado, ao lhe imputar, sem provas, o crime de furto de joias em sua casa, durante o tempo em que para ela estivera a prestar serviços como eletricista, sendo que, na verdade, o crime havia sido cometido por um pedreiro que também trabalhava em sua casa na mesma época, sendo que a imputação, como aduziu, lhe causara abalo emocional e psíquico, passível de indenização.

Citada, a ré veio contestar a ação, pugnando pela sua improcedência, porque se limitara a questionar os três pedreiros que estavam a trabalhar em sua casa e o autor, através da pessoa que o havia indicado para o serviço em sua residência, se haviam sido eles a furtar suas joias e relógios, registrando ocorrência de furto, pelo que se limitara a exercer um legítimo direito seu, ocasião em que mostrou que, como o autor não lhe havia endereçado queixa-crime, também por isso a indenização não poderia prosperar.

Com vista, replicou a parte autora.

Seguiram-se o despacho de fl.30 , a certidão do distribuidor de fl.31 e o despacho de fl.32.

Durante a instrução, foi colhido o depoimento pessoal da ré e inquiridas três testemunhas.

Em memoriais, a parte ré reeditou suas postulações pretéritas.

Consoante se observa, portanto, cuida-se de ação indenizatória em que pretende o autor a reparação pelos prejuízos experimentados em razão de imputação falsa da prática de crime de furto de objetos (jóias e relógio) de propriedade da ré, ao final julgada improcedente.

Adianto que o recurso não comporta provimento.

A responsabilidade civil emerge a partir do ato ilícito e, conforme dispõe o art. 927, do Código Civil, “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. O parágrafo único assim estabelece: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Já o art. 186 do Código Civil assim dispõe: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Para que se configure o dever de indenizar, portanto, é necessário que se encontrem presentes os seguintes requisitos: ação ou omissão; dolo ou culpa; nexo de causalidade; e o dano.

Assim, de acordo com o que dispõe o art. 373 do Novo Código de Processo Civil, incumbe à parte autora o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito (inciso I) e, à parte ré, o ônus da prova quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte autora (inciso II).

Com efeito, da análise das provas constantes nos autos, verifica-se que não houve dolo, culpa grave ou má-fé na conduta da ré que, acreditando ser vítima de furto, no momento em que se encontrava sozinha em casa na presença de quatro prestadores de serviço (03 pedreiros e 01 eletrecista, no caso, o autor), inquiriu-os acerca do ocorrido, na tentativa de esclarecer os fatos. Como o autor não atendeu à ligação da ré, esta acabou contatando o proprietário da loja que indicou o profissional. Após esclarecidos os fatos (na verdade, foi um dos pedreiros que havia furtado), tornou a ligar para ambos, pedindo escusas.

A sentença examinou a matéria com acuidade, conferindo aos fatos adequada aplicação do direito, razão pela qual, a fim de evitar desnecessária tautologia, adoto, como fundamentos de decidir, os seguintes excertos, na parte que transcrevo:

"(...) a calúnia só se configura, quando se fizer presente o dolo específico, ou seja, a vontade consciente de ofender a honra ou a dignidade de uma pessoa, devendo ficar comprovada a intenção de se beneficiar com a ofensa, seja por mera disputa/rivalidade, retaliação/revide, vingança, rancor ou maldade.

Na hipótese sub judice, contudo, o autor não provou que a suplicada tenha agido dolosamente, isto é, com o ânimo de ofender sua honra e sua dignidade, movida por pura maldade, rancor, vingança, revide ou disputa.

Não demonstrado pelo suplicante, portanto, que a ré, mesmo sabendo ser ele inocente, o tenha acusado de furto, a ação não tem como prosperar.

Veja-se, ademais, que, nos termos do disposto no artigo 160, inciso I, do CC, não constituem atos ilícitos os praticados em legítima defesa, ou no exercício regular de um direito reconhecido.

Não fora isso, o inciso III do artigo 23 do Código Penal considera o exercício regular de direito e o estrito cumprimento de dever legal como causas de exclusão da antijuridicidade, o que importa em dizer que a pessoa que age sob o manto de tal excludente não responderá por nenhuma crime.

O registro de crime, por exemplo, só será punível se vier acompanhado de dolo e má-fé, o que não ficou demonstrado nos autos.

(...)

Limitando-se a autora a suspeitar que houvesse sido o autor o agente do furto e a questionar a esposa do autor e o dono da loja de materiais elétricos que lhe havia recomendado o autor como eletricista sobre tais suspeitas, não se tem como consubstanciado o dolo de caluniar, o que leva à improcedência da demanda."

Percebe-se, assim, que a requerida, ao tentar esclarecer os fatos a partir de sua suspeita, e contatar com a esposa do autor (já que este não atendia às ligações) e, também, com a pessoa que indicou os serviços, agiu dentro do seu exercício regular de direito.

Em hipóteses como a do caso em tela, para que se configure o ilícito indenizável, imprescindível a demonstração do excesso no agir, notadamente, pela má-fé ou culpa grave daquele que denuncia o suspeito1 – o que resta comprovado não ter ocorrido.

Nesse sentido, destaco julgados desta Corte em casos análogos, cujas ementas colaciono:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS. CALÚNIA E DIFAMAÇÃO. FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO DA...

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