Acórdão nº 50004657020128210024 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 17-02-2023

Data de Julgamento17 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50004657020128210024
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003217358
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000465-70.2012.8.21.0024/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro (art. 213)

RELATORA: Juiza de Direito CARLA FERNANDA DE CESERO HAASS

RELATÓRIO

Na Comarca de Rio Pardo/RS, o Ministério Público ofereceu denúncia contra E. dos S. C., nascido em 05/12/1969, com 42 anos de idade ao tempo do fato, dando-o como incurso nas sanções do artigo 217-A, do Código Penal.

Narra a peça vestibular acusatória, in verbis (3.1):

No dia 07 de fevereiro de 2012, por volta de 18 horas, na rua General Câmara, n° 296, Bairro Fortaleza, nesta cidade, o denunciado praticou ato libidinoso com N. S. C., de 12 anos de idade (fl. 18).

Na oportunidade, o denunciado e a vítima encontravam-se no interior da casa de Sônia M. dos S. C., no endereço supracitado, sendo ela parente em comum dos dois, estando o menino a assistir a um filme, ocasião em que o denunciado pegou-o pelo braço, fazendo-o abaixar-se, tirou a bermuda da vítima, deixando-a apenas de cueca e introduziu o pênis no meio das pernas de N.

Recebida a denúncia em 09/11/2012 (3.1, fl. 45), o réu foi citado em 18/01/2013 (3.1, fl. 50) e, por advogado constituído, apresentou resposta à acusação (3.2, fls. 01/07).

Determinada, em 25/07/2013, a instauração de Incidente de Insanidade Mental e a suspensão do processo com fulcro no art. 149, §2º, do CPP, (3.2, fl. 39).

Processado o incidente e homologado o laudo pericial (3.5, fls. 46/50, e 3.6, fls. 01/29), a Magistrada de piso, em 24/03/2016, entendendo não ser o caso de absolvição sumária, designou audiência de instrução (3.2, fl. 42). No prosseguir, em ato realizado no dia 28/06/2016, foram ouvidas a vítima e as testemunhas (3.3, fl. 26), ao final, interrogado o réu (3.3, fl. 50).

Certificados os antecedentes criminais do acusado (3.4, fls. 01/04), o Ministério Público e a defesa apresentaram memoriais em substituição a alegações finais orais (3.4, fls. 13/15 e 18/24).

Em 28/03/2019 sobreveio sentença, publicada em 10/04/2019 (3.4, fls. 25/29 e 30), julgando procedente a ação penal e condenando o réu como incurso nas sanções do artigo 217-A do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 05 (cinco) anos e 03 (três) meses de reclusão, em regime fechado. Custas pelo réu, com exigibilidade do pagamento suspensa.

Intimada (3.4, fl. 30), a Defesa constituída, por petição protocolada em 15/09/2019, pugnou pela devolução do prazo, bem como a intimação do réu para constituir novo advogado (3.4, fls. 32 e 33).

Intimado, em 19/08/2019, acerca do veredicto e do prazo de 10 dias para constituir novo procurador, o réu declarou-se analfabeto, assinando o mandado, a rogo, a sua irmã Sônia M. dos S. C. (3.4, fls. 38 e 39). No prosseguimento, a Defensoria Pública interpôs recurso de apelação, trazendo aos autos declaração do sentenciado, manifestando interesse em apelar e ser assistido pela aludida instituição (3.4, fl. 42).

Em suas razões recursais, a defesa requereu a absolvição do réu por insuficiência de provas para a condenação. Destacou a existência de animosidade entre o réu e Sílvia, mãe da vítima, a qual, pontuou, intentava afastá-lo da família, fins de osbtruir direito seu à eventual herança. Ressaltou o testemunho prestado por Sonia, irmã de criação do increpado, presente no local do fato, afirmando nada ter percebido de estranho na data dos acontecimentos. Ainda, ressaltando superficiais os relatos do ofendido e e negativa de autoria sustentada pelo acusado, invocou a aplicação da máxima do in dubio pro reo. Subsidiariamente, pediu o redimensionamento da reprimenda, com a redução da basilar (3.4, fls. 45/50, e 3.5, fls. 01/06).

Apresentadas as contrarrazões (3.5, fls. 09/12), o novo procurador constituído (3.5, fls. 15/16 e 17/18), em complementação às razões recursais apresentadas pela Defensoria Pública, reiterou o pleito de absolvição por insuficiência de provas para a condenação, pugnando, ainda, pelo reconhecimento da tentativa (3.5, fls. 20/38).

Remetidos os autos a esta Corte, manifestou-se a Procuradoria de Justiça pelo imrovimento do apelo defensivo (12.1).

Conclusos os autos para julgamento.

Esta Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, sendo observado o disposto no art. 207, inc. II, do RITJRS e no art. 609 do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

O voto, adianto, vai no sentido de prover em parte o recurso defensivo.

Da suficiência de provas para a condenação pelo crime de estupro de vulnerável.

A existência delitiva veio demonstrada pelo boletim de ocorrência nº 1156/2012/151151, registrado em 28/02/2012, e pela certidão de nascimento da vítima (3.1, fls. 10/11 e 22, respectivamente), bem ainda pela prova oral coligida ao feito. No ponto, de se destacar, a palavra da vítima é meio probatório válido ao fim de demonstração do fato existencializado, sobretudo quando executado na clandestinidade e sem deixar vestígios. De relevo, a imputação em análise, referindo-se ao contato corporal lascivo do abusador, à saciedade restou comprovada, notadamente pelas narrativas do menor ofendido.

No tocante à autoria criminosa, o réu, no cursivo investigativo, negou a acusação, atribuindo o falso à genitora do ofendido (3.1, fl. 31). Em Pretório, o réu rechaçou a prática criminosa, refutando, outrossim, ocorrido qualquer desentendimento pretérito com o ofendido ou sua genitora. Em específico, quanto ao caso, afirmou que estavam sentados tomando chimarrão, nada recordando acerca do aludido fato. Ato seguinte, sustentou residir o "problema" no fato de que sua mãe de criação teria vendido uma propriedade e que a genitora do ofendido ficara revoltada, pretendendo fosse a ela destinada a sua parte (audiências do processo).

A despeito versão exculpatória escandida em Juízo e da negativa extrajudicial, a responsabilidade penal do acusado pelo fato narrado denúncia desponta certeira nos autos.

A propósito, adoto excerto da decisão recorrida, no ponto em que esmiuçou a prova oral coligida, como razão de decidir (3.4, fls. 25/29 ):

A vítima N. mostrou-se muito nervosa durante sua oitiva, inclusive se retirando da sala de audiências em uma oportunidade. Disse ser verdade o fato descrito na denúncia.

S. S. C., genitora da vítima, disse que na época pousaram na residência de parente nesta cidade. Disse que também havia sido abusada pelo réu na infância. Mencionou que no dia dos fatos ouviu um barulho no interior da casa, momento em que foi ver o que havia ocorrido e avistou o réu saindo do local. Relatou que, passado algum tempo, houve modificação no comportamento da vítima, razão pela qual buscou auxílio, quando descobriu o ocorrido. Relatou que N. disse que o réu teria abaixado suas calças e colocado o pênis entre suas pernas.

MARIUZA MADRUGA SARAIVA, assistente social, disse ter atendido a genitora da vítima, em razão de problemas escolares desse último. Disse que tomou conhecimento dos fatos através da genitora, que lhe questionou acerca do atendimento à vítima em razão do abuso perpetrado pelo réu. Por fim, relatou os atendimentos à família e comportamento da vítima durante os atendimentos, relatando não acreditar que a vítima estivesse mentindo sobre o ocorrido.

O réu, por seu turno, negou a prática do ato delitivo, dizendo que "não lembra de nada". Por fim relacionou a acusação a supostas disputas de herança entre si e a mãe da vítima.

Ressabido, em crimes contra a dignidade sexual, amiúde perpetrados na clandestinidade, a palavra da vítima, alhures referido, apresenta validade probatória e se mostra apta a formar o convencimento do julgador, sobremodo quando não infirmada por outros elementos. A respeito, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, em razão das dificuldades que envolvem a obtenção de provas de crimes contra a liberdade sexual - praticados, na maioria das vezes, longe dos olhos de testemunhas e, normalmente, sem vestígios físicos que permitam a comprovação dos eventos - a palavra da vítima adquire relevo diferenciado (AgRg no REsp n. 1.774.080/RS, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 15/02/2019).

Na espécie, cumpre ressalvar, o ofendido, nascido em 13/10/1999, foi ouvido na Delegacia de Polícia, em 27/02/2012, aos 12 anos de idade, pela Inspetora de Polícia Débora de A. Berny, na presença da Assistente Social Mariuza Saraiva (3.1, fl. 21). Acerca do fato, ocorrido no dia 07/02/2012, noticiou ele que estava na casa da tia Sônia, na cidade de Rio Pardo, na sala olhando um filme de DVD quando um homem mais velho, magro, baixo, cabelo escuro, branco o pegou pelo braço direito, apertou e o fez se abaixar. O cara abaixou sua bermuda o deixando de cueca. O homem baixou a roupa dele próprio e colocou o tico no meio de suas pernas “se esfregando”. Perguntado se o homem havia sujado sua roupa o menino respondeu que não, quando ele parou “o tico dele estava duro”, O homem falou que não era para contar o que tinha ocorrido para ninguém. Indagado de onde estava a mâe quando este fato ocorreu, Natanael respondeu que estava conversando com a tia na frente da casa.

Em Juízo, já contando 16 anos, depois de iniciada a arguição e afirmado verdadeiros os fatos contidos na denúncia, o vitimado, denotando nervosismo, tal como afirmado em sentença, repentinamente, levantou-se e saiu da sala, em plena arguição. Contudo, ao retomar o depoimento, N. S. C. respondeu afirmativamente quando indagado se o réu teria abaixado sua bermuda e colocado o pênis no meio das suas pernas contra sua vontade (8.2 e 8.3).

No tópico, tenho que o nervosismo do vitimado, no reverso das arguições defensivas, não denota sinais de indução ou coação por parte da genitora, evidenciando, isso sim, sua dificuldade em expor os fatos, deixando...

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