Acórdão nº 50004706120198210149 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 07-04-2022

Data de Julgamento07 Abril 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50004706120198210149
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001847705
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000470-61.2019.8.21.0149/RS

TIPO DE AÇÃO: Denunciação caluniosa (art. 339)

RELATOR: Desembargador JULIO CESAR FINGER

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra CATIANE VIANA DA ROSA TONELLI, já qualificada, como incursa nas sanções do art. 339 do CP, em razão da prática do seguinte fato relatado na denúncia:

No dia 31 de janeiro de 2018, às 14h40min, nas dependências da Delegacia de Polícia de Jóia, a denunciada CATIANE VIANA DA ROSA TONELLI deu causa à instauração de investigação policial e posteriormente de processo judicial contra Paulo Vanderlei Brittes, imputando-lhe crime de que o sabia inocente.

Na oportunidade, a denunciada registrou ocorrência acusando Paulo Vanderlei Brittes, seu ex-companheiro, de ter lhe causado lesões corporais leves, no âmbito da violência doméstica, uma vez que teria lhe agredido na cabeça mediante uso de um pedaço de madeira, fato supostamente ocorrido em 28/01/2018.

Todavia, quando ouvida em Juízo, na audiência de instrução da ação penal instaurada contra Paulo Vanderlei Brittes, a denunciada disse que os fatos não aconteceram, tendo feito o registro de ocorrência porque estava com raiva de seu ex-companheiro, chegando a referir que Paulo sequer estava no local quando foi lesionada, tendo a lesão ocorrido após ter caído de bêbada.

A denúncia foi recebida em 22/05/2019 (fl. 58 - evento 3, DOC2).

Após regular instrução, sobreveio sentença (fls. 84/89 - evento 3, DOC3), publicada em 26/02/2020 (fl. 89-v.), que condenou a ré pela prática do crime previsto no art. 339 do CP à pena de 02 anos de reclusão, em regime inicial aberto, mais pagamento de 10 dias-multa à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato. Foi-lhe concedida a suspensão condicional da pena, nos termos dos arts. 77 e 78, ambos do CP.

A defesa apelou à fl. 90 e, nas razões (fls. 92/96 - evento 3, DOC3), sustenta a insuficiência de provas para a condenação, bem como a ausência de dolo na conduta da acusada, referindo que a versão da acusada de que foi agredida é verossímil, pois o atestado médico da fl. 19 dos autos atesta a presença de lesões. Pugna, assim, pela absolvição da ré com fulcro no art. 386, incs. V e VII, do CPP. Subsidiariamente, postula a aplicação do art. 26, parágrafo único, do CP, sustentando a semi-imputabilidade da acusada, que relatou não saber as consequências de suas ações quando faz uso de drogas. Pugna, ainda, pela fixação da pena aquém do mínimo legal, em vista da aplicação da atenuante da confissão espontânea, e o afastamento da pena de multa.

O Ministério Público apresentou contrarrazões nas fls. 97/99-v. (evento 3, DOC3).

Nestes autos, a Procuradoria de Justiça lançou parecer opinando pelo improvimento do recurso (evento 7, DOC1).

VOTO

I. Admissibilidade

O recurso preencheu os requisitos para a admissibilidade, pelo que vai conhecido.

II. Mérito

A ré foi dada como incursa nas sanções do crime de denunciação caluniosa por ter imputado a Paulo Vanderlei Brittes a prática do delito de lesões corporais, com incidência da Lei Maria da Penha.

Indicativos da prática do crime de denunciação caluniosa decorrem do registro de ocorrência policial (fls. 13/14), da denúncia das fls. 09/10, da degravação da audiência realizada nos autos do processo nº 149/2.18.0000295-0 (fls. 03/06), bem como da prova oral produzida.

Não há dúvida, tampouco, a respeito da autoria, como se vê dos elementos colhidos na instrução, bem destacados pela decisão atacada, de lavra da Dra. Rosmeri Oesterreich Krüger, que passo a transcrever:

(...)

Do boletim de ocorrência juntado às fls. 13/14, datado de 28/01/18, depreende-se que a acusada relata que após uma discussão teria sido agredida por seu companheiro, Paulo Vanderlei Brittes, com um cabo de relho, restando lesionada na cabeça.

A acusada realizou exame médico (fl. 19), no qual constou que apresentava lesão nodular de mais ou menos dois centímetros na cabeça, referindo ter sido provocada por seu ex-companheiro.

Solicitou medidas protetivas de urgência, as quais foram deferidas por este Juízo, em 31/01/2018, conforme despacho prolatado nos autos do processo n° 149/2.18.0000090-7 (fl. 21), sendo confirmadas durante a audiência realizada também naqueles autos (fl. 23).

Outrossim, foi instaurado inquérito policial para apurar o crime de lesão corporal no âmbito da violência doméstica (37/2018/152817), o qual foi remetido a este Juízo em 12/07/2018, conforme cópias acostadas às fls. 40/54, resultando no processo judicial n° 2.18.0000295-0.

Ocorre que, durante a instrução daquele feito, a denunciada Catiane confessou que os fatos que narrou perante a autoridade policial na verdade não teriam ocorrido, sendo que teria feito o registro de ocorrência somente em razão de estar com raiva de seu ex-companheiro, para lhe prejudicar, e que o suposto agressor, inclusive, sequer estava no local na suposta data dos fatos.

Ademais, questionada a ré se sabia que poderia ser processada criminalmente em razão da falsa imputação de crime, referiu que tinha, e que não teria problema, conforme se extrai da degravação acostada às fls. 03/06 (mídia de fl. 07).

Da mesma forma, durante a instrução do presente processo, a denunciada Catiane referiu que teve um relacionamento com a vítima, Paulo Vanderlei Brittes, sendo que brigavam bastante e a relação era bem conturbada. Que fez o uso de drogas (cocaína) até 2018, sendo que atualmente, após o último tratamento, ocorrido em 03/2018, parou de usar. Referiu que após a separação bebia bastante, mas agora tem uma vida normal. Que começou trabalhar na noite e usar drogas após conhecer Paulo. Que atualmente não está mais trabalhando na noite, sendo que está a procura de emprego na cidade de Ijuí. Quanto aos fatos narrados na denúncia, disse ser verdade, alegando que soube que Paulo estava gastando dinheiro em outras boates e, em razão da raiva, registrou a ocorrência, mesmo não sendo verdade. Que mentiu na delegacia, por raiva. Que acredita que ainda estava sob efeito de drogas no dia que compareceu à Delegacia.

A vítima, por sua vez, declarou que teve um relacionamento com a denunciada, sendo que este terminou em 2016. Referiu que foi acusado, mas a acusação é falsa, pois não estava no local (Santa Tecla, que fica há 40 km de onde reside, na Esquina Coronel Lima). Que acredita que a ré fez a acusação para lhe prejudicar. Que só soube da acusação quando foi citado.

(grifei)

Como se vê, a acusada confessou ter inventado os fatos por ela noticiados no boletim de ocorrência das fls. 13/14, quando afirmou ter...

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