Acórdão nº 50004784020208210137 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Terceira Câmara Cível, 24-02-2022

Data de Julgamento24 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50004784020208210137
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001706177
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

13ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000478-40.2020.8.21.0137/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATORA: Desembargadora ELISABETE CORREA HOEVELER

APELANTE: JOAO GUSTAVO SONNEMANN MARTINS (AUTOR)

APELANTE: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações cíveis reciprocamente interpostas pelas partes, contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos da ação revisional que JOAO GUSTAVO SONNEMANN MARTINS move em face de OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO. Referido decisum (evento 77 - SENT1) teve o dispositivo assim redigido:

Ante o exposto, na forma do art. 487, inc. I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por JOÃO GUSTAVO SONNEMANN MARTINS em face do OMNI S.A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO e INVESTIMENTO para o fim de:

(a) FIXAR as taxas de juros remuneratórios em 23,79% ao ano; e

(b) AUTORIZAR a repetição de indébito na forma simples ou a compensação de valores.

Sucumbente, em razão da parcial procedência da ação, condeno as partes ao pagamento de 50% da Taxa Única dos Serviços Judiciais (TUSJ) e de honorários advocatícios em favor do patrono da parte contrária, os quais arbitro em 15% do valor atualizado da condenação, em consonância com o disposto no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Exigibilidade suspensa do autor em razão de litigar ao abrigo de AJG.

Em seu apelo (evento 82) a parte autora afirmou ser indevida a cobrança da tarifa de cadastro. Postulou o provimento do apelo.

Nas suas razões de apelação (doc. 33 - evento 86) a parte ré alegou que não há falar em excessividade quanto aos juros remuneratórios praticados. Rechaçou a compensação de valores e a repetição do indébito. Prequestionou matéria legal. Postulou o provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões pela parte ré (evento 87) e pela parte autora (evento 92)

Subiram os autos à Corte.

Vieram conclusos.

VOTO

Atendidos os requisitos de admissibilidade, recebo o presente recurso.

DO CONTRATO

Cuida-se da Cédula de Crédito Bancário n.1.01254.0000612.17, garantida por cláusula de alienação fiduciária, firmada pelas partes em 13 de julho de 2017 (doc. 18 - evento 25).

JUROS REMUNERATÓRIOS

Os juros remuneratórios são devidos como compensação ao mutuante pela disposição do dinheiro ao mutuário, sendo lícita a sua incidência. A discussão, pois, diz respeito ao limite de tais juros e sua abusividade, ou não.

O Sistema Financeiro Nacional (SFN) tem como regra a não aplicação das restrições da Lei da Usura (Decreto nº 22.626 de 1933), em se tratando de instituições financeiras, não as sujeitando, pois, à limitação dos juros remuneratórios. Ademais, o §3º do artigo 192 da Constituição Federal, que dispunha sobre a limitação dos juros, foi revogado pela Emenda Constitucional nº 40, de 29/05/2003.

A jurisprudência, com o tempo, encaminhou-se, maciçamente, pela livre pactuação, com restrições pontuais em casos de prova inarredável de abusividade (Resp nº 915.572/RS). Nesse sentido a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.

E mais recentemente, o REsp nº 1.061.530/RS - julgado de acordo com o rito dos recursos repetitivos - consolidou o posicionamento no sentido de que a taxa de juros remuneratórios somente se caracteriza como abusiva quando significativamente destoante da média do mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil (BACEN) à época da contratação.

Na sedimentação sobre o critério a ser adotado, por seu turno, também indicou o egrégio tribunal superior que a análise deve ocorrer de forma casuística.

Assim aquilatadas as diretrizes supra, entendo que no caso dos autos afiguram-se abusivos os juros remuneratórios pactuados (67,07% ao ano – doc. 18), porquanto ultrapassam o dobro da taxa média de mercado estabelecida pelo BACEN para a data da contratação (23,79%a.a.1, em julho/2017), critério esse que vem sendo amplamente aceito pelo Superior Tribunal de Justiça.

Nada a alterar da sentença a quo no ponto, destarte.

TARIFA DE CADASTRO

O STJ sedimentou entendimento no julgamento dos Resp n.ºs 1.251.331/RS e 1.255.573/RS, os quais seguiram o rito dos recursos repetitivos nos termos do artigo 543-C do antigo Código de Processo Civil, no sentido de ser legal a tarifa de cadastro, consoante se verifica na seguinte tese:

“Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC:

[...]

- 2ª Tese: Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem respaldo legal a contratação da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e da Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira.”

Sedimentando a matéria, foi editada pelo egrégio STJ a Súmula n.º566, segundo a qual “Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira”

No caso dos autos, o contrato foi celebrado após 30/04/2008, data da entrada em vigor da Resolução 3.518/2007 do CMN. Sendo assim, não há falar em abusividade da tarifa de cadastro pactuada, prevista em valor razoável e cobrada no início da relação consumerista. Nesses termos, descabe falar em restituição de valores em relação a essa rubrica.


COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS E REPETIÇÃO DO INDÉBITO

De plano, vale ressaltar o cabimento da compensação de créditos e débitos líquidos e recíprocos entre as partes, quando reconhecida a ilegalidade de cláusulas contratuais e não estando quitado o contrato. Apurando-se valores pagos a maior em determinadas rubricas e havendo ainda saldo devedor por parte do consumidor, deverá ocorrer a devida compensação, na forma do artigo 368 do Código Civil.

Na hipótese de estar...

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