Acórdão nº 50005036320188210124 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50005036320188210124
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002888817
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000503-63.2018.8.21.0124/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO VESCIA CORSSAC

APELANTE: JOSE DORNELLES (AUTOR)

APELANTE: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

JOSE DORNELLES e CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS apelam da sentença (evento 14, SENT1) que, nos autos da ação revisional em que litigam as partes, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos:

"Diante do acima exposto, com base no artigo 487, inciso I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na ação revisional por JOSE DORNELLES em desfavor de CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS para DETERMINAR a revisão do contrato entabulado entre as partes no que se refere aos juros remuneratórios, devendo estes serem fixados em 6,462% ao mês ou 112% ao ano, desconstituir os efeitos da mora da parte autora até a liquidação da presente decisão e autorizar a compensação dos valores pagos de forma excedente, com base nos encargos estabelecidos nesta revisão.

Face à sucumbência mínima da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador a demandante, estes arbitrados em 15% sobre o valor da causa, conforme art. 85, §2º, do CPC.

Ademais, com base no artigo 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na reconvenção apresentada por CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS em face de JOSE DORNELLES

Condeno a parte reconvinte ao pagamento das custas processuais, bem como de honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da causa da reconvenção, em atenção ao disposto no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil."

O autor, em suas razões (evento 22, APELAÇÃO1), sustenta que a sentença merece reforma para: a) limitar a taxa dos juros remuneratórios em 12% ao ano, nos termos do Decreto-Lei 22.626/33; b) afastar os encargos da mora, tendo em vista a abusividade contratual; c) subsidiariamente, caso mantida a mora, reduzir os juros moratórios para 1% ao ano, consoante lei Usura; d) afastar a capitalização dos juros, por ausência de previsão contratual. Postula, ao final, o provimento do apelo, com o redimensionamento da sucumbência.

A instituição financeira, por sua vez, sustenta (evento 20, APELAÇÃO1) que os juros remuneratórios devem ser mantidos nos termos do contrato, uma vez que livremente pactuados, e ausente abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem. Refere que a abusividade na cobrança da taxa dos juros remuneratórios não pode ser verificada, tão somente, pela comparação entre a taxa média dos juros divulgada pelo BACEN e as taxas do contrato. Destaca que, diante do não pagamento, não pode ser descaracterizada a mora. Defende a redução dos honorários advocatícios, em razão da simplicidade da demanda. Assevera que a reconvenção deve ser julgada procedente. Postula, ao final, o provimento do apelo para julgar improcedente a demanda.

Intimadas, as partes apresentaram contrarrazões (evento 27, CONTRAZAP1) e (evento 28, CONTRAZAP1).

Vieram-me os autos conclusos para julgamento.

Foram cumpridas as formalidades dos arts. 931 e 934 do CPC.

É o relatório.

VOTO

DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

O presente recurso norteia-se pelas disposições processuais estabelecidas pelo Código de Processo Civil de 2015.

Com fundamento no art. 1010, §3º, in fine, presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos (cabimento e adequação, tempestividade, regularidade procedimental e formal, isenção do preparo do apelo do autor ante a concessão da gratuidade judiciária, ausência de fato extintivo ou modificativo do direito de recorrer, legitimidade e interesse), recebo o apelo em ambos os efeitos.

DA RELAÇÃO CONTRATUAL

DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

O presente recurso norteia-se pelas disposições processuais estabelecidas pelo Código de Processo Civil de 2015.

Com fundamento no art. 1010, §3º, in fine, presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos (cabimento e adequação, tempestividade, regularidade procedimental e formal, isenção do preparo do apelo do autor ante a concessão da gratuidade judiciária, ausência de fato extintivo ou modificativo do direito de recorrer, legitimidade e interesse), recebo o apelo em ambos os efeitos.

DA RELAÇÃO CONTRATUAL / CONTRATO BANCÁRIO

A presente ação tem por objeto o contrato de empréstimo pessoal n.º 033130000165, firmado em 05/05/2015, no valor de R$ 1.750,28, prevendo juros remuneratórios de 14,50% ao mês e 407,77% ao ano

Em caso de mora, incidirão juros remuneratórios de 1% ao mês, que poderão ser capitalizados mensalmente, além de multa de 2% sobre o valor total do débito.

PONTOS COMUNS

JUROS REMUNERATÓRIOS

Com relação à revisão dos juros, embora não divirja propriamente quanto à possibilidade de alteração de dispositivos contratuais que se mostrem abusivos, vinha mantendo entendimento mais restritivo quando da identificação das hipóteses de abusividade, conforme reiteradamente sustentado em decisões anteriores, tanto em primeiro quanto em segundo grau. Não obstante isso, considerando as peculiaridades do trabalho colegiado e também com vistas a preservar a unidade do julgamento, nesse tópico, passo a adotar o posicionamento dominante nesta Câmara conforme desenvolvimento que segue.

Embora a questão da incidência do Código de Defesa do Consumidor se encontre superada pela edição do verbete 297 do STJ, tal não significa que a revisão de cláusulas contratuais seja medida imperativa, senão nos casos de comprovada abusividade.

Nessa linha, persiste o princípio da liberdade na fixação dos juros remuneratórios nos contratos de mútuo e negócios bancários em geral, a exceção daqueles regidos por legislação especial.

Desarrazoada, portanto, a pretendida limitação ao percentual de 12% ao ano como requerido.

Aliás, cuida-se de matéria há muito superada no âmbito jurisprudencial, sendo pacífico o entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios que foi estipulada pela Lei de Usura (Decreto nº 22.626/1933), em consonância com a Súmula nº 596/STF, sendo também inaplicável o disposto no art. 591, c/c o art. 406, do Código Civil para esse fim, salvo nas hipóteses previstas em legislação específica. )

Tal questão encontra-se sedimentada na Corte Superior, cujo entendimento é seguido pela jurisprudência majoritária do Tribunal Gaúcho.

Confira-se a Súmula n. 382 do STJ:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.”.

A orientação emanada pelo Superior Tribunal de Justiça pauta-se no sentido de que, comprovada a abusividade na pactuação dos juros, aplica-se a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN para o mês de celebração do instrumento.

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA -
DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DO STJ QUE NEGOU PROVIMENTO AO
RECLAMO.
INSURGÊNCIA DA DEMANDADA.

1. Os juros remuneratórios devem ser limitados à taxa média de mercado quando comprovada, no caso concreto, a significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa de mercado para operações similares, como foi o caso dos autos, não merecendo reforma o aresto recorrido quanto ao ponto.

1.1. Hipótese em que os juros em debate são superiores ao dobro da média praticada em operações financeiras similares.
2. Para afastar a afirmação contida no acórdão atacado no sentido de que a taxa de juros remuneratórios da avença é abusiva, seria necessário promover o reexame do acervo fático-probatório dos autos e a interpretar as cláusulas contratuais, providências vedadas na
via eleita, por força das Súmulas 5 e 7/STJ.

3. Conforme entendimento jurisprudencial consolidado por este Superior Tribunal de Justiça, o reconhecimento da abusividade dos encargos cobrados no período da normalidade contratual traz, como consectário lógico, a descaracterização da mora do devedor.
Incidência da Súmula 83/STJ.

4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1405350 / RS, Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, DATA DO JULGAMENTO 21.06.2021, DJE 01.07.2021) (g.n.)

Nesse contexto, a redução dos juros depende de comprovação da onerosidade excessiva - capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - em cada caso concreto, tendo como parâmetro a taxa média de mercado para as operações equivalentes.

No caso concreto, no Contrato 033130000165, foram pactuados juros remuneratórios de 14,50% ao mês e 407,77% ao ano, sendo que, à época, a taxa média de mercado para a operação da espécie divulgada pelo BACEN (série temporal n.º ) foi de 6,46% ao mês e 112,01% ao ano, o que revela significativa discrepância.

Assim, considerando os parâmetros adotados por essa Câmara, resulta configurado o excesso autorizador da limitação à taxa média de mercado para a operação da espécie vigente à época, conforme reconhecido na sentença.

Apelos das partes desprovidos no ponto.

DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA

Acerca da possibilidade de descaracterização da mora e afastamento dos encargos dela decorrentes, existem orientações do Superior Tribunal de Justiça, extraídas do julgamento do Recurso Especial n. 1.061.530/RS, datado de 10/03/2009, que, para os efeitos do art. 543-C, CPC/73, assim a estabeleceu:

(...)

I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.ORIENTAÇÃO

(...)

ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA

a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora;

b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o...

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