Acórdão nº 50005137420178210017 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50005137420178210017
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003098098
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000513-74.2017.8.21.0017/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATORA: Desembargadora ISABEL DIAS ALMEIDA

APELANTE: JORGE RICARDO DECKER (AUTOR) E OUTRO

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações cíveis interpostos pelas partes contra a sentença objeto do evento do evento 39, SENT1 que, nos autos da ação revisional c/c repetição de indébito ajuizada por JORGE RICARDO DECKER em desfavor de BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS, restou proferida nos seguintes termos:

ANTE O EXPOSTO, julgo IMPROCEDENTE a AÇÃO DECLARATÓRIA proposta por JORGE RICARDO DECKER contra BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS, todos qualificados, para o efeito de manter hígidas todas as cláusulas e incidências referentes ao contrato indicado nos autos. Condeno o autor ao pagamento das despesas processuais, bem como honorários advocatícios ao procurador do requerido que fixo em 10% sobre o valor da causa atualizado monetariamente do aforamento à efetiva liquidação, nos termos do art. 85 e seg., do CPC/2015.

Em suas razões de apelo, o autor (evento 57, APELAÇÃO1) relata os fatos e alega a adesão ao Seguro Ouro Vida em Grupo, apólice 12114, em 2002. Dispõe que não foi devidamente comunicado acerca da existência da cláusula que prevê o reajuste do prêmio em função do reenquadramento etário, bem como que a previsão nas condições gerais da apólice não suprem a diligência. Menciona que nunca teve acesso aos documentos anexados pela ré na contestação, de modo que não teve acesso aos termos nele constante quando da contratação. Suscita a ocorrência de violação ao estabelecido nos arts. 6, III, 31,46 e 54, §§ 3º e 4º, todos do CDC. Faz breves considerações sobre a manifesta desproporcionalidade nos reajustes dos prêmios e do capital segurado, referindo que as cláusulas contratuais 11.1 e 11.2 colocam o consumidor em excessiva desvantagem, o que implica na nulidade destas, nos termos do art. 51, do CDC. Assevera que a lei que regulamenta os planos de saúde é inaplicável aos contratos de seguro de vida, de acordo com o entendimento do Eg. STJ. Pugna pela reforma da sentença para que seja determinado que o prêmio do seguro seja restabelecido ao valor vigente à época do inicio da contratação, com reajuste apenas pelo IGP-M, sem aplicação do reenquadramento etário. Pede também que a seguradora seja compelida a devolver os valores pagos a maior. Colaciona jurisprudência. Requer o provimento do apelo.

No recurso adesivo (evento 56, PET1), a ré elabora relato dos fatos e sustenta que os honorários advocatícios devem ser fixados em percentual sobre o proveito econômico obtido, a fim de garantir equidade entre os patronos das partes nos casos de improcedência (benefício econômico) ou procedência (valor da condenação). Conclui que a aplicação do valor da causa é subsidiária ao critério do proveito econômico. Esclarece que eventual procedência da demanda corresponderia a R$ 78.965,70. Requer o provimento do recurso.

Apresentadas contrarrazões (evento @@@ da origem), no sentido do desprovimento do recurso, subiram os autos a esta Corte, vindo conclusos para julgamento.

Foram observados os dispositivos legais, considerando a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

O recursos são próprios, tempestivos e estão acompanhados dos comprovantes de pagamento dos respectivos preparos (evento 59 e evento 56, CUSTAS3). Sendo assim, passo ao enfrentamento, de forma conjunta.

Melhor situando o objeto da controvérsia, adoto o relato da sentença, vertido nos seguintes termos:

Vistos etc.

JORGE RICARDO DECKER, qualificado nos autos, ingressou com AÇÃO DECLARATÓRIA contra BRASILSEG COMPANHIA DE SEGUROS, também qualificado. Narrou que mantém com o requerido contrato de "Seguro Ouro de Vida em Grupo" desde 14/08/2002, apólice nº 12114, tendo como estipulante a FENAB. Ressaltou que o contrato de seguro de vida está em plena vigência em razão das sucessivas renovações automáticas. Sustentou que há desproporcionalidade do reajuste acumulado aplicado para definição dos prêmios mensais em relação ao reajuste acumulado dos capitais segurados, havendo uma flagrante distorção, pois o valor do prêmio mensal sofreu reajuste de 14/08/2002 a 14/08/2016 de 792,917% e o valor dos capitais foram reajustados tão somente em 191,961%. Mencionou que essa desproporcionalidade aumentou quando completou 51 anos de idade, ocorrendo reajustes desproporcionais aos aplicados para os capitais segurados, com excessiva desvantagem, configurando um reajuste abusivo e ilegal. Desse modo, requereu a procedência da demanda, para o efeito de declarar a nulidade do reajuste etário do prêmio mensal, a fim de que se restabeleça o valor do prêmio mensal desde a data da contratação, reajustado pelo IGP-M. Postulou subsidiariamente, caso ocorra a manutenção do atual prêmio mensal, a atualização dos valores dos capitais segurados com a observância do mesmo percentual aplicado na quantificação do prêmio mensal. Juntou documentos (evento 01 "INIC2").

Recebida a inicial, deferida a inversão do ônus da prova, porém, indeferida a tutela provisória (evento 01 "DESP5").

Interposto Agravo de Instrumento pelo autor (evento 01 "AGRAVO8 - AGRAVO9").

O requerido apresentou contestação (evento 01 "CONT E DICS11"). Inicialmente, impugnou o valor dado à causa, haja vista que o autor atribuiu á causa o valor de alçada, porém, o benefício econômico postulado pelo autor perfaz a quantia de R$19.910,71, devendo ser esse valor atribuído à causa. Sustentou ainda a prescrição anual, vez que trata-se do prazo para o segurado exercer sua pretensão junto ao segurador. No mérito, sustentou que no ato da contratação o autor foi devidamente informado sobre a existência da cláusula de reajuste dos prêmios conforme a variação da faixa etária do segurado, não havendo majoração unilateral do valor do prêmio como sugerido pelo autor. Mencionou que lícita a contratação do seguro e o cumprimento do dever de informação quanto ás suas cláusulas contratuais. Referiu que o seguro de vida tem natureza exclusivamente patrimonial e não se relaciona com a proteção da vida ou da saúde do segurado. Desse nodo, requereu a improcedência da demanda, juntando documentos (evento 01 "CONT E DOCS12").

Negado provimento ao Agravo interposto pelo autor (evento 0' "CERTIDÃO18 - CERTIDÃO19").

Replicou o autor (evento 01 "RÉPLICA22"), ratificando e reforçando os termos narrados na inicial.

Em saneamento (evento 01 "DESP23"), onde foi afastada a impugnação do valor da causa, bem como a prescrição e instadas as partes quanto as provas a produzir.

O requerido interpôs Embargos de Declaração (evento 01 "EMBARGOS26"), que foi negado (evento 01 "DESC30").

Interposto Agravo de Instrumento pelo requerido (evento 01 "AGRAVO31").

Manifestação das partes (evento 14, 15 e 18).

É o relatório.

Sobreveio julgamento de improcedência, razão da interposição dos presentes recursos pelas partes.

Inicialmente, consigno que o pacto objeto do presente litígio tem renovação automática a cada ano. Assim, estando esse vigente, pode a parte contratante discutir as cláusulas em juízo, bem como postular a manutenção do pacto nos termos em que originariamente firmado entre as partes, descabendo falar em prescrição do fundo de direito.

A respeito, o seguinte julgado do STJ:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA. SEGURO DE VIDA. CARÁTER ABUSIVO DE CLÁUSULA DE REAJUSTE POR FAIXA ETÁRIA. PRESCRIÇÃO. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a natureza jurídica da ação é definida por meio do pedido e da causa de pedir, não tendo relevância o nome dado à ação pela parte autora.
2. "A jurisprudência desta Corte Superior tem se orientado no sentido de que, por ser o seguro de vida de trato sucessivo, com renovação periódica e automática do contrato, o prazo prescricional para a pretensão de nulidade de cláusula de reajuste prevista em contrato será contado a partir do pagamento de cada parcela indevida, não havendo se falar em prescrição do fundo de direito" (AgInt no REsp 1.677.867/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 21/10/2019, DJe de 23/10/2019).
3. Agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp 1549057/SC, Rel.
Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 18/05/2020)

Quanto à questão de fundo, é de ser ressaltado que o contrato de seguro não dispensa a boa-fé entre as partes contratantes, como está estatuído nos artigos 422 e 765 do Código Civil:

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Art. 765. O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.

E nessa linha o Código de Defesa do Consumidor, que em seu artigo 51 e incisos, inquina de nulas as cláusulas abusivamente redigidas, especificamente o inciso IV e XI, que é do que aqui se trata:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;

XV – estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;

De acordo com os autos, o autor contratou seguro de vida em grupo em 14/08/2002, apólice nº 12114, satisfazendo mensalmente as prestações ajustadas. Em 2011 e 2016 o valor do prêmio foi reajustado devido ao implemento da idade do segurado (51 e 56 anos...

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