Acórdão nº 50005244120208210036 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50005244120208210036
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001689076
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000524-41.2020.8.21.0036/RS

TIPO DE AÇÃO: Edital

RELATOR: Desembargador RICARDO TORRES HERMANN

APELANTE: PREFEITO - MUNICÍPIO DE FONTOURA XAVIER - FONTOURA XAVIER (IMPETRADO)

APELANTE: MUNICÍPIO DE FONTOURA XAVIER (INTERESSADO)

APELADO: SHARK MAQUINAS PARA CONSTRUCAO LTDA (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Vistos.

MUNICÍPIO DE FONTOURA XAVIER interpõe recurso de apelação nos autos do mandado de segurança impetrado por SHARK MAQUINAS PARA CONSTRUCAO LTDA., em face de sentença que, nos seguintes termos, concedeu a segurança:

Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido para conceder a segurança pleiteada por SHARK MAQUINAS PARA CONSTRUCAO LTDA contra ato do Prefeito - MUNICÍPIO DE FONTOURA XAVIER - Fontoura Xavier, para DECLARAR o direito da impetrante à habilitação na Licitação de Pregão Presencial n° 003/2020 (ato este identificado no Evento 17, ATA2) e, por via de consequência, decretar a nulidade de todos os atos posteriores à decisão de inabilitação, determinando a instauração de nova fase de abertura das propostas comerciais.

Isento o impetrado do pagamento da taxa única (art. 5°, inc. I da Lei n° 14.634/2014). Condeno-o ao pagamento integral das despesas processuais (arts. 14 e 16 da Lei n° 14.634/2014).

O impetrado deverá reembolsar eventuais taxa única e despesas antecipadas pela impetrante, da seguinte forma (Lei n° 14.634/2014, art. 5º, parágrafo único, parte final):

a) com correção pelo IPCA-E (admitida a deflação, preservado o valor nominal, conforme o Tema n° 678 do STJ) a contar da data de cada desembolso;

b) com juros moratórios à taxa aplicada à caderneta de poupança (art. 12, inc. II da Lei Federal n° 8.177/1991), a contar do trânsito em julgado desta decisão.

Sem condenação ao pagamento de verba honorária, consoante o disposto na Súmula 512 do Supremo Tribunal Federal, na Súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça e no art. 25 da Lei n° 12.016/2009.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o decurso do prazo recursal, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça para reexame necessário (art. 14, § 1°, da Lei 12.016/09).

Oficie-se à autoridade coatora, bem como à pessoa jurídica interessada, informando-os sobre o conteúdo desta decisão, nos termos do artigo 13 da Lei 12.016/09.

Em suas razões, a parte apelante argumenta sobre a perda objeto pelo encerramento do procedimento e adjudicação do contrato. Aduz inexistir óbice legal para que a Administração formule, nos editais de licitação, exigências restritivas à participação, desde que se afigurem relevantes para o interesse público. Refere que as exigências questionadas, tem amparo legal no art. 30 da Lei nº 8.666/93, que cuida da qualificação técnica. Diz que a exigência de um Engenheiro Mecânico tem por objetivo assegurar a manutenção da assistência técnica (pessoal técnico especializado e peças de reposição) para atender aos chamados da Administração, no caso dos equipamentos licitados apresentarem defeitos, mormente durante o período de garantia, mas também depois, em caso do Município necessitar de manutenção, a qual não pode ser adequadamente atendida com a comprovação de existência de profissional junto ao fabricante, já que as fábricas podem estar localizadas em cidades muito distantes da sede do município, até em outros países. Pede o provimento do apelo.

São apresentadas contrarrazões.

O Ministério Público manifesta-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo.

Vêm os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Eminentes colegas.

A questão discutida no mandado de segurança veio ao conhecimento deste Tribunal de Justiça, oportunidade em que, interposto agravo de instrumento (5024272-65.2020.8.21.7000/RS) pela impetrante, o recurso foi provido à unanimidade. O julgamento, cujo voto condutor foi lavrado pelo saudoso Des. Sérgio Luiz Grassi Beck, recebeu a seguinte ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR DE SUSPENSÃO DO CERTAME. REQUISITOS CONFIGURADOS.

1. A LEI Nº 12.016/09, QUE DISCIPLINA O MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL E COLETIVO, EM SEU ART. 7º, INCISO III, DISPÕE QUE, PARA A CONCESSÃO DA LIMINAR DE SUSPENSÃO DO ATO PRATICADO PELA AUTORIDADE COATORA, DEVEM CONCORRER DOIS REQUISITOS: A RELEVÂNCIA DOS FUNDAMENTOS EM QUE SE ASSENTA O PEDIDO E A POSSIBILIDADE DE LESÃO IRREPARÁVEL AO DIREITO DO IMPETRANTE SE DO ATO IMPUGNADO PUDER RESULTAR A INEFICÁCIA DA MEDIDA, CASO FINALMENTE DEFERIDA.

2. VISLUMBRA-SE O FUMUS BONI IURIS, UMA VEZ QUE O SUBITEM 7.1.6, ALÍNEA “B” DO EDITAL, AO EXIGIR VÍNCULO EMPREGATÍCIO DE FORMA PERMANENTE DO PROFISSIONAL TÉCNICO COM A EMPRESA, RESTRINGE A PREVISÃO DO ART. 30 DA LEI Nº 8.666/93, UMA VEZ QUE ESTE, AO MENCIONAR “QUADRO PERMANENTE”, ESTÁ, EM VERDADE, SE REFERINDO A UM VÍNCULO DE OBRIGAÇÃO GENÉRICA, QUE DEMONSTRE À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA QUE O RESPONSÁVEL TÉCNICO INDICADO PELO LICITANTE ESTEJA EM CONDIÇÕES DE PRESTAR OS SERVIÇOS EFETIVAMENTE DO INÍCIO AO FIM DO CONTRATO OBJETO DA LICITAÇÃO.

3. POR SUA VEZ, O PERICULUM IN MORA DECORRE DA POSSIBILIDADE DE, COM O INÍCIO DA EXECUÇÃO CONTRATUAL, CONFIGURAR-SE A INEFICÁCIA DA MEDIDA POSTULADA NA ORIGEM, NÃO SE COGITANDO, POR OUTRO LADO, DA IRREVERSIBILIDADE DA LIMINAR.

4. PRESENTES OS REQUISITOS LEGAIS AUTORIZADORES DA MEDIDA PRETENDIDA, A TEOR DO QUE DISPÕE O INCISO III DO ART. 7º DA LEI Nº 12.016/2009, IMPÕE-SE A REFORMA DA DECISÃO PROFERIDA PELO JUÍZO DE ORIGEM, PARA O FIM DE DETERMINAR A SUSPENSÃO DO PROCESSO LICITATÓRIO DECORRENTE DO EDITAL DE LICITAÇÃO PREGÃO PRESENCIAL Nº 003/2020 DO MUNICÍPIO DE FONTOURA XAVIER.

RECURSO PROVIDO.

A despeito da fundamentação que embasou tal julgamento e respeitosamente, consigno encaminhar voto no sentido do provimento do apelo interposto, denegando a segurança vindicada.

Com relação à perda do objeto, tese preliminar recursal, tenho por desacolher. Isso porque, na esteira do entendimento já referendado pelo e. STJ a superveniente adjudicação não importa na perda de objeto do mandado de segurança, pois se o certame está eivado de nulidades, estas também contaminam a adjudicação e posterior celebração do contrato:

MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. SUPERVENIENTE ADJUDICAÇÃO. PERDA DO OBJETO NÃO CONFIGURADA. PRESERVAÇÃO DO INTERESSE DE AGIR.
I - Na origem, trata-se de mandado de segurança objetivando a declaração de nulidade da decisão administrativa que rejeitou seu recurso administrativo e manteve a habilitação da licitante concorrente, tendo em vista ter sido o recurso administrativo julgado pelo Presidente da Comissão Permanente de Licitações, e não pelo Prefeito do Município, consoante estabelecido no edital de licitação.

II - Na Primeira Instância, o mandamus foi julgado extinto sem resolução de mérito, em razão do reconhecimento da carência, superveniente, do interesse processual da sociedade empresária autora, à consideração de que a vencedora do certame já estaria em franca operação.

III - O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em grau recursal, negou provimento ao recurso de apelação, mantendo incólume a decisão de primeiro grau.

IV - Em relação à alegada ofensa aos arts. 17 e 458, IV, do CPC/2015, e ao art. 49, § 2º, da Lei n. 8.666/1993, constata-se que o decisum recorrido encontra-se em dissonância com o entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, no sentido de que
"a superveniente adjudicação não importa na perda de objeto do mandado de segurança, pois se o certame está eivado de nulidades, estas também contaminam a adjudicação e posterior celebração do contrato administrativo". A esse respeito, os seguintes julgados desta Corte: RMS n. 49.972/PR, relator Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgamento em 2/6/2020, DJe 9/6/2020 e REsp n. 1.643.492/AM, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgamento em 14/3/2017, DJe 20/4/2017.
V - Nesse passo, o dissídio jurisprudencial suscitado também comporta acolhimento.

VI - No que diz respeito à alegação de existência de trânsito em julgado de ação popular com o mesmo objeto, ou nulidade do acórdão objurgado, destaque-se que é inviável a análise de tese não suscitada no recurso especial, ou em contrarrazões, por se tratar de evidente inovação recursal (AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.496.470/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 31/8/2020, DJe 3/9/2020).

VII - Da mesma forma, o STJ possui firme entendimento no sentido de ser incabível inovação recursal, em agravo interno, com base em alegação de fato novo, especialmente em se considerando que tais alegações, in casu, poderão ser dirigidas às instâncias de origem.

Precedentes: STJ, AgRg no AREsp n. 761.207/RJ, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 29/4/2016; AgRg no Ag 1.424.188/DF, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 23/2/2012; AgInt nos EDcl no MS n. 24.834/DF, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 1º/9/2020, DJe 9/9/2020.

VIII - Por fim, cumpre salientar que o Ministério Público foi cientificado da decisão, conforme termo de ciência de fl. 1142, não havendo manifestação contrária quanto o decisum vergastado.

IX - Agravo interno improvido.

(AgInt no AREsp 1526230/SP, Rel.
Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2021, DJe 15/03/2021) (grifos meus)

Superada a prefacial, ao que se verifica, a questão discutida nos autos relaciona-se a item do do Pregão Presencial nº 003/2020, no âmbito do Município de Fontoura Xavier/RS, o qual estabeleceu a exigência de profissional técnico, com registro no CREA e vínculo de emprego com a empresa licitante, que, impugnados, foram mantidos pela autoridade coatora, motivando a insurgência do impetrante. A sentença concedeu a segurança, dando azo à interposição...

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