Acórdão nº 50005437220188210018 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 28-04-2022

Data de Julgamento28 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50005437220188210018
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002005724
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000543-72.2018.8.21.0018/RS

TIPO DE AÇÃO: Bancários

RELATOR: Desembargador PAULO SERGIO SCAARO

APELANTE: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: GILDA MARIA FLORES BARBOSA (AUTOR)

RELATÓRIO

De início, adoto o relatório da sentença a quo (evento 3/ procjud5/ fls. 26-33):

GILDA MARIA FLORES BARBOSA, já qualificada, por sua procuradora, ajuizou o que denominou de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA, em face de FACTA FINANCEIRA S/A, também já qualificada. Alegou que é servidora pública estadual e que contratou empréstimos consignados com a requerida, mediante descontos em sua folha de pagamento, conforme Cédulas de Crédito Bancário nº 617560005, 755060008 e 832930008, nos valores mensais de R$ 144,35, R$ 56,00 e R$ 38,30, respectivamente, além de uma taxa de financiamento da modalidade Educredi, no valor de R$ 20,00 mensais. Referiu que já possuía outros contratos de empréstimo sob os nº 2016028330140155000189 e 2016028330150215000064, totalizando R$ 349,77. Aduziu que o valor descontado mensalmente, originário de todos os contratos firmados, ultrapassa a margem legal de 30% de seus rendimentos brutos. Sustentou que os descontos aplicados comprometem substancialmente seu salário, situação que está levando a autora a não conseguir atender as suas necessidades básicas de subsistência. Citou legislação e jurisprudência a embasarem seu pedido. Requereu a concessão do benefício da gratuidade da justiça. Em antecipação de tutela, postulou a suspensão dos descontos mensais em sua conta bancária, com o deferimento da limitação de pagamento a 30% de seus vencimentos brutos, mediante depósito judicial. No mérito, postulou a procedência dos pedidos, confirmando os efeitos da medida liminar, limitando os descontos consignados ao patamar de 30% de seus rendimentos. Juntou documentos (fls. 12/28).

Concedido o benefício da gratuidade judiciária, deferida a antecipação de tutela postulada e determinada a citação (fls. 30/31).

Citada (fls. 32/32v), a ré ofereceu contestação (fls. 34/41), pugnando, preliminarmente, pela denunciação da lide ao Banco Banrisul, que também figuraria como credor dos financiamentos contraídos pela autora. No mérito, defendeu a legalidade das contratações e descontos efetivados. Alegou que o Decreto nº 43.574/05 e a Lei nº 10.098/94 autorizam e estabelecem o limite de desconto em folha de pagamento referente a empréstimos consignados, no patamar de 70% dos rendimentos brutos do contraente, e não limitado a 30%, como requer a autora. Arguiu a impossibilidade de aplicação analógica da Lei Federal nº 10.820/2003. Salientou ser inviável a suspensão dos descontos sem a prévia anuência da parte credora. Postulou a improcedência dos pedidos de mérito. Juntou documentos (fls. 42/52).

Interposto Agravo de Instrumento pela demandada (fls. 54/62), a este foi negado provimento, conforme teor do acórdão nº 70077998938, proferido pela 17ª Câmara Cível do TJ-RS (fls. 75/80).

Houve réplica (fls. 89/93).

Em saneamento, restou afastada a preliminar de denunciação da lide (fl. 99).

Instadas as partes acerca do interesse na dilação probatória (fl. 99), a parte ré requereu o julgamento antecipado da lide (fl. 102).

Sobreveio sentença em cujo dispositivo constou:

Isso posto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos constantes da presente AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA, ajuizada por GILDA MARIA FLORES BARBOSA em face de FACTA FINANCEIRA S/A, para confirmar a antecipação de tutela inicialmente deferida, determinando a limitação dos descontos em folha de pagamento da autora, decorrentes dos empréstimos consignados contraídos com a requerida, ao patamar de 30% dos vencimentos brutos recebidos, nos termos da fundamentação.

Sucumbente, condeno a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios em favor da procuradora da parte autora, os quais fixo em 20% sobre o valor atualizado da causa, observados os critérios do art. 85, § 2º, do CPC.

A parte ré interpôs recurso de apelação (evento 3/ procjud5/ fls. 34-43).

Em suas razões recursais, alega que, no caso de servidor estadual, os descontos podem alcançar 70% dos vencimentos. Sustenta a inaplicabilidade do percentual de 30% aplicável aos empregados regidos pela CLT. Assevera que a adoção do percentual de 30% para fins de limitação de descontos coloca o servidor em um ciclo vicioso. Nesses termos, requer a reforma da sentença de origem.

A parte autora apresentou contrarrazões recursais (evevento 3/ procjud6/ fls. 01-06).

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de ação ajuizada pelo mutuário contra a instituição financeira mutuante, visando à limitação do somatório dos descontos lançados em sua folha de pagamento a 30% do valor de sua remuneração mensal líquida.

Cabe registrar que, no que diz com os descontos consignados em folha de pagamento, em se tratando de servidores públicos e pensionistas estaduais, tais descontos devem ser praticados dentro dos limites estabelecidos na legislação em vigor, a saber, no máximo 70% da remuneração mensal bruta (art. 15 do Decreto estadual n. 43.337/2005, com redação dada pelo Decreto n. 43.574/2005)1.

Inobstante isso, impõe-se considerar a existência de um segundo limitador, nos termos da jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.

Com efeito, a orientação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – cuja função constitucional precípua é a uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional (Constituição da República, art. 105, inc. III) – é que, em atenção ao princípio da razoabilidade, dignidade e do caráter alimentar dos vencimentos, os descontos em folha de pagamento do servidor público devem ser limitados em 30%.

Saliento, ainda, que no caso específico do Estado do Rio Grande do Sul, ao qual a legislação estadual autoriza desconto de 70%, esta Corte Superior firmou que o limite de 30% para os descontos dessa natureza não importa em confronto da norma federal e estadual (AgRg no RMS 30.070/RS)2

Confiram-se, a propósito, os seguintes precedentes:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDORA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL. EMPRÉSTIMO COM DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. ABUSIVIDADE. LIMITAÇÃO A 30 POR CENTO DA REMUNERAÇÃO.PRECEDENTES.

1. Consoante a jurisprudência sedimentada neste STJ, o desconto em folha de pagamento de prestações referentes a contrato de empréstimo pessoal de servidor com instituições...

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