Acórdão nº 50005464020138210135 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50005464020138210135
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002983228
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000546-40.2013.8.21.0135/RS

TIPO DE AÇÃO: Posse

RELATOR: Desembargador CARLOS CINI MARCHIONATTI

APELANTE: AMARILDO RIGON (AUTOR)

APELANTE: SHANA COMPARIN (AUTOR)

APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)

APELADO: LEONIR DONGENSKI (RÉU)

APELADO: NAIR LIBERA DONGENSKI (RÉU)

RELATÓRIO

A sentença julgou improcedente a ação anulatória ajuizada por AMARILDO RIGON e SHANA COMPARIN a BANCO BRADESCO S.A., LEONIR DONGENSKI e NAIR LIBERA DONGENSKI, assim:

Vistos etc.

SHANA COMPARIN e AMARILDO RIGON propuseram nominada AÇÃO ANULATÓRIA DE GARANTIA C/C CANCELAMENTO DE AVERBAÇÃO E REGISTRO EM CERTIDÃO IMOBILIÁRIA em face de BANCO BRADESCO S/A, LEONIR DONGENSKI e NAIR LIBERA DONGENSKI, todos qualificados à fl. 02. Aduziram, em síntese, que Amarildo firmou com a instituição ré cédula de crédito bancário, modalidade “crédito pessoal”, dando como garantia, em alienação fiduciária, um imóvel rural (matrícula 1493, R35 e R39, do Registro de Imóveis de Tapejara). Que a cédula foi assinada pelo autor com a qualificação de separado judicialmente, fato que na época não mais perdurava, tendo noticiado essa situação o banco, que ignorou a informação. Referiu que muito antes da assinatura do contrato havia retomado o relacionamento com a ex-esposa Shana, nascendo dessa união a filha Pietra Rigon. Que à época Amarildo possuía uma pequena fábrica de confecções e usou o crédito para saldar dívidas, logo encerrando as atividades. Relataram que a área dada em garantia (12.100 m²) é explorada economicamente pelos autores. Que na área lindeira, de 4.000 m², registrada em nome de Shana (matrícula 1493, R40), está construída a residência do casal. Afirmaram que residem sobre a área e dela retiram o sustento, arguindo a impenhorabilidade por ser bem de família, bem como por se tratar de pequena propriedade rural. Sustentaram que a área não foi adquirida em virtude do crédito disponibilizado pelo banco, postulando a anulação da garantia prestada e seus efeitos. Alternativamente, requerem o resguardo da meação da autora, pois a garantia foi prestada sem a outorga de Shana e o crédito não reverteu à entidade familiar. Por fim, se indeferidos os pedidos anteriores, que os réus sejam condenados a indenizar a edificação e as benfeitorias realizadas anteriormente a assinatura da cédula (fls. 02/14). Juntaram procuração e documentos (fls. 15/53 e 55/77).

Deferiu-se a AJG aos autores e determinou-se o apensamento do feito 135/1.12.0002110-7 (fl. 78).

O Banco Bradesco S/A contestou às fls. 82/85 arguindo que é perfeitamente legal a penhora de imóveis dados em garantia hipotecária. Ainda, sustentou que o autor, no ato da assinatura do contrato, não informou que estava casado e sim forneceu documentos hábeis a comprovar sua separação judicial, incorrendo em grave má-fé junto à instituição. Que ofereceu em garantia bem livre de quaisquer ônus ao empréstimo, restando nítida a intenção de levar o banco requerido a erro. Postulou a improcedência dos pedidos. Juntou documentos (fls.

Leonir Dongenski e Nair Libera Dongenski contestaram às fls. 99/104 referindo que adquiriram o imóvel pelo valor de R$ 77.000,00, em meados de 2012, por meio de leilão promovido pelo Bradesco. Que são adquirentes de boa-fé e desconhecem eventuais vícios supostamente existentes no negócio realizado entre os autores e o Banco réu, postulando a improcedência dos pedidos.

Houve réplica (fls. 107/109).

As partes foram instadas a respeito do interesse na dilação probatória (fl. 110).

Os réus postularam a juntada de cópia da ação de separação e/ou divórcio dos autores (fl. 113), sendo deferido o pedido à fl. 129, com a juntada dos documentos nas fls. 153/213.

Os demandantes, por sua vez, arrolaram testemunhas (fls. 114/115) e juntaram notas fiscais de produtor rural (fls. 116/128).

Realizou-se audiência de instrução (fls. 147/151).

O julgamento do feito foi convertido em diligência à fl. 225.

As partes apresentaram memoriais às fls. 228/241, 243/247 e 248/249.

Vieram os autos conclusos para sentença.

É O RELATÓRIO.

PASSO A FUNDAMENTAR.

Não havendo nulidades ou irregularidades a sanar, passo ao exame do mérito.

Trata-se de analisar pedido de anulação de constituição de garantia fiduciária e demais atos jurídicos subsequentes, relativos ao imóvel matriculado sob o nº 1493, R.35, no Registro de Imóveis desta Comarca (fração ideal de 12.100 m²).

O autor Amarildo Rigon firmou com o réu Bradesco Cédula de Crédito Bancário nº 237/0966/01062010-1, para concessão de crédito pessoal, obrigando-se a pagar 90 (noventa) prestações sucessivas, no valor de R$ 1.446,26, desde 01/07/2010 até 01/12/2017, conforme documento acostado às fls. 19/31.

Da mesma forma, ficou ajustado que os valores das parcelas seriam debitadas em conta-corrente do emitente, nas datas previstas no contrato, como forma de saldar mensalmente as parcelas, bem como que o emitente se obrigava a manter saldo suficiente na conta-corrente indicada ao credor, para acatar os débitos autorizados na cédula, conforme cláusula “6 - Débito em Conta” (fl. 24).

Outrossim, no referido contrato, as partes estabeleceram, com o escopo de assegurar o cumprimento das obrigações assumidas, hipoteca/alienação fiduciária (garantia real) sobre o bem imóvel informado na exordial, fl. 22.

Ainda, não é demais ressaltar, as previsões da “cláusula 7.2, II.11/12, II.15 e II.18” (fl. 27) onde, no caso de inadimplemento de alguma prestação, restou estabelecido o prazo de carência de 15 dias para pagamento. Após, decorrido o prazo mencionado, restou estabelecida a necessidade de intimação do emitente, na forma da lei, para que, no prazo de 15 dias, satisfizesse a prestação/obrigação vencida, acrescidos dos encargos contratuais e legais sob pena de reputar-se em mora. Por fim, em caso de não purgação da mora, no prazo assinalado, o Oficial do Registro de Imóveis, certificando esse fato, promoveria a averbação na matrícula do imóvel da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário.

Foi o que ocorreu no caso dos autos, restando perfectibilizada a consolidação da propriedade em nome do Bradesco, averbada no RI em 07/05/2012 (fl. 43), com posterior alienação do bem aos réus Leonir e Nair (fl. 43-v).

Feitas tais observações, analiso as matérias veiculadas na inicial.

IMPENHORABILIDADE – BEM DE FAMÍLIA – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL:

A pretensão dos autores não prospera.

A cédula de crédito bancário nº 237/0966/01062010-1 prevê cláusula de garantia de alienação fiduciária de bem imóvel (garantia real), sendo que a própria legislação – art. 3º, V, da Lei nº 8.009/90 – excepciona a impenhorabilidade quando o imóvel é dado em garantia real.

Ora, considerando-se que o autor Amarildo estipulou livremente na contratação que o gravame de garantia real recairia sobre o imóvel em que residia e/ou explorava economicamente, sendo objeto da cédula de crédito bancário (hipoteca/alienação fiduciária do bem imóvel) e bem assim, da presente ação, não prospera a alegação da respectiva impenhorabilidade, porquanto há que ser entendido que ao estipular a alienação fiduciária sobre o bem, abriu mão da garantia prevista na Lei 8.009/90. Ainda, em nada importa se a área foi ou não adquirida em virtude do crédito disponibilizado.

Neste sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. EXONERAÇÃO DE FIANÇA. IMPOSSIBILIDADE. IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA. NÃO CONFIGURADA. EXCEÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 3, INCISO V DA LEI 8.009/90. BEM DADO EM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Mérito. No caso concreto, descabe atender a tese recursal de que o imóvel seria impenhorável por ser bem de família. Isso porque, o bem dado em garantia de alienação fiduciária perde o caráter da impenhorabilidade, nos termos do inciso V, do artigo 3º, da Lei n. 8.009/90. Entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e da nossa Egrégia Corte Gaúcha. Sentença de improcedência mantida. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70065609588, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alexandre Kreutz, Julgado em 05/07/2017)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE CANCELAMENTO DE HIPOTECA. TUTELA DE URGÊNCIA. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMILIA. ART. 3º, V, DA LEI 8.009/90. CONTRATAÇÃO DE EMPRESTIMO POR PESSOA JURÍDICA. EMPRESA INDIVIDUAL. PRESUNÇÃO DE REVERSÃO DO BENEFÍCIO EM FAVOR DA ENTIDADE FAMILIAR. LEILÕES MANTIDOS. Nos termos do art. 3º, V, da Lei 8.009/90, é inoponível a impenhorabilidade do bem quando este é ofertado como garantia real hipotecária de obrigação revertida em benefício da entidade familiar. No caso dos autos, a parte agravante, na qualidade de empresária individual, contraiu em nome da pessoa jurídica empréstimo bancário para obtenção de capital de giro, figurando na contratação como avalista, dispondo livremente dos bens dados como garantia em alienação fiduciária. Portanto, é possível presumir-se que o benefício obtido com o empréstimo contraído reverteu em favor da agravante. Mantença das datas dos leilões. AGRAVOS DE INSTRUMENTO DESPROVIDOS. (Agravo de Instrumento Nº 70075249706, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudia Maria Hardt, Julgado em 26/04/2018)

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. Constatada a abusividade da taxa de juros ajustada, impõe-se sua redução à média da taxa mensal praticada pelas instituições financeiras nacionais ao tempo da contratação. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. DESCABIMENTO. É penhorável o bem imóvel entregue espontaneamente em garantia a...

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