Acórdão nº 50005554320198210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 06-02-2023

Data de Julgamento06 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50005554320198210021
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003024173
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000555-43.2019.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE MARASCHIN DOS SANTOS

APELANTE: RUTE SAVINHONE KOOP (AUTOR)

APELADO: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por RUTE SAVINHONE KOOP, em face da sentença proferida nos autos da ação declaratória de inexigibilidade de débito c/c pedido de indenização por danos materiais e morais, que promove em desfavor de FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO e AGIL PROMOTORA, ASSESSORIA E REPRESENTAÇÃO LTDA, cujo dispositivo assim constou:

Isso posto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação, movida por RUTE SAVINHONE KOOP em face de FACTA FINANCEIRA S.A, CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, ambos qualificados nos autos, e com fulcro no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, julgo extinto o feito, sem resolução do mérito, em face da corré AGIL PROMOTORA, ASSESSORIA E REPRESENTAÇÃO LTDA., já qualificada.

Por fim, revogo a liminar concedida no evento 3, despadec1.

Em face da sucumbência, condeno a parte demandante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono o demandando, que fixo em 10% sobre o valor da causa, considerando o trabalho realizado pelo profissional, o local da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, bem como o tempo que se desenvolveu a lide, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC.

Suspendo a exigibilidade dos ônus sucumbenciais impostos em face da parte demandante, tendo em vista ser beneficiária da gratuidade de justiça.

Após o trânsito em julgado e nada mais sendo requerido pelas partes, baixe-se.

(Dra. ANA PAULA CAIMI, Juíza de Direito do Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Passo Fundo/RS).

Em suas razões, a parte autora sustenta, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, uma vez que a perícia grafodocumentoscópica não foi realizada por culpa exclusiva da apelada, pois esta não efetuou o pagamento dos honorários periciais. Afirma que os documentos juntados pela demandada não comprovam a validade da contratação. Aduz a probabilidade de uma simulação contratual, com colagem da sua assinatura eletrônica em documento virtual. Alega que os valores dos contratos foram creditados em conta bancária de terceiro. Discorre acerca da ilicitude das cobranças. Requer o acolhimento da preliminar, com retorno dos autos ao juízo a quo. Postula, caso superada a preliminar, a declaração de inexigibilidade da cobrança dos valores referentes ao empréstimo consignado nº 495680, com a condenação da apelada ao pagamento de indenização por danos materiais e morais.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 128).

Cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 935 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE.

O prazo para interposição de recurso de apelação pela parte autora encerrou em 16/05/2022 (evento 119), sendo o recurso interposto nesta data (evento 123), dispensado de preparo em razão da concessão da gratuidade judiciária. Assim, o recurso foi interposto dentro do prazo recursal previsto no artigo 1003, § 5º, do Código de Processo Civil, qual seja, de 15 dias.

RELATO DOS FATOS.

Trata-se de ação declaratória de inexigibilidade de débito c/c pedido de indenização por danos materiais e morais, na qual narra a parte autora que contratou os empréstimos nº 2010780 e nº 2078155 junto a demandada, mediante desconto em conta corrente. Refere que, desde outubro de 2018, a demandada vem efetuando descontos em seu benefício previdenciário, referente ao contrato nº 4956809, não contratado, a ser pago através de 72 parcelas no valor de R$ 45,26. Argumenta que cédula de crédito bancário nº 4956809 foi firmada em 19/09/2018, no valor de 1.596,48. Refere que se trata de simulação contratual, com colagem da sua assinatura eletrônica em documento virtual. Justifica que não contratou ou recebeu qualquer valor relativo ao contrato nº 4956809. Discorre acerca da necessidade de indenização por danos morais e materiais. Requer a declaração de inexigibilidade da cobrança do empréstimo consignado, com a condenação das rés ao pagamento de indenização pelos danos morais e materiais.

Em sede de contestação, a parte demandada, preliminarmente, postula pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva da demandada Ágil Promotora, tendo em vista que é somente uma correspondente bancária. No mérito, afirma que a autora contratou o empréstimo nº 4956809, no valor de R$ 1.646,04, a ser quitado em 72 parcelas mensais no valor de R$ 45,26, descontado em benefício previdenciário. Alega que o contrato foi devidamente assinado, bem como os valores foram devidamente disponibilizados. Defende a inexistência de danos morais. Discorre acerca da legalidade da contratação. Pugna pela improcedência dos pedidos

Sobreveio sentença de improcedência (evento 115).

Feito um breve relato dos fatos, passo à análise do mérito.

PRELIMINAR. NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA.

Defende a parte autora, em sede de preliminar, a nulidade da sentença diante do cerceamento de defesa, pois a apelada não efetuou o pagamento dos honorários periciais, impossibilitando a realização da prova pericial. Contudo, a referida preliminar confunde-se com o mérito recursal, com o qual será analisada.

EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RESPONSABILIDADE CIVIL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE PROVA DA AUTENTICIDADE DO DOCUMENTO.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 3º, § 2º, incluiu expressamente a atividade de natureza bancária, financeira e de crédito no conceito de serviço:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

O entendimento atual, tanto na doutrina como na jurisprudência dos Tribunais pátrios, é tranquilo acerca da aplicação do CDC nas operações bancárias, o que restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive:

Súmula 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Portanto, a responsabilidade contratual do banco é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, de modo que responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços.

Reza o art. 14 do CDC:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Desta forma, trata-se responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, fundada na teoria do risco do empreendimento ou da atividade empresarial, segundo a qual, consoante doutrina de Sérgio Cavalieri Filho:

“(...) todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos”1

Os requisitos, portanto, para a configuração da responsabilidade objetiva são: falha na prestação do serviço, dano e nexo causal.

Nesse tipo de responsabilidade, o fornecedor somente afasta o dever de reparar o dano se provar (ônus seu) a ocorrência de uma das causas que excluem o próprio nexo causal, enunciadas no § 3º do art. 14 do CDC, quais sejam, a inexistência do defeito (falha na prestação do serviço) e a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Nesse sentido, cumpre mencionar o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Repetitivo n° 1.197.929/PR (Tema 446), segundo o qual "as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros", in verbis:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL.
INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS.
DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO.
1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno.
2. Recurso especial provido.
(REsp 1197929/PR, Rel.
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/08/2011, DJe 12/09/2011) - grifei.

Não bastasse, o Superior Tribunal de Justiça editou a...

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