Acórdão nº 50005589320198215001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
ÓrgãoNona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50005589320198215001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002209185
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5000558-93.2019.8.21.5001/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador TASSO CAUBI SOARES DELABARY

EMBARGANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos contra acórdão desta Câmara, que julgou Apelação Cível, figurando como embargante BANCO BRADESCO S.A. e como embargado LUCAS MONTEIRO CAES.

Em suas razões recursais, após breve resumo dos fatos, a parte embargante alega a ocorrência de omissão no julgado acerca do exame das circunstâncias dos autos e a prova carreada, em especial quanto ao momento em que acontecido o assalto em uma de suas agências, pretendendo, ainda, o prequestionamento de dispositivos legais para fins de interposição de recursos às instâncias superiores. Postulou o suprimento dos vícios apontados e o acolhimento dos embargos opostos.

Vieram-me os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Conheço do recurso uma vez que presentes os pressupostos de admissibilidade.

Com efeito, cabem embargos de declaração quando o julgado apresentar, omissão, contradição ou obscuridade, nos estreitos limites da previsão do artigo 1.022 do Código de Processo Civil.

Ensina Nelson Nery Jr., na obra Comentários ao código de processo civil [livro eletrônico], São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, em nota ao art. 1.022:

Os EDcl têm finalidade de completar a decisão omissa ou, ainda, de aclará-la, dissipando obscuridades ou contradições. Não têm caráter substitutivo da decisão embargada, mas sim integrativo ou aclaratório. Prestam-se também à correção de erro material. Como regra, não têm caráter substitutivo, modificador ou infringente do julgado (nesse sentido, os embargos têm sido recebidos pela jurisprudência como agravo interno – v. coments. CPC 1021 ). Não mais cabem quando houver dúvida na decisão (CPC/1973 535 I, redação da L 8950/94 1.º).

Destaco que há obscuridade quando o pronunciamento judicial não fixa a certeza jurídica a respeito da lide ou da questão decidida.

De outro vértice, a contradição que enseja saneamento na via dos embargos é somente aquela interna do julgado, não a verificável entre este e a lei, ou com a tese defendida pela parte, ou com decisão proferida em outro caso concreto.

Ademais, o julgador não está obrigado a reportar-se a todos os argumentos trazidos pelas partes, quando já tenha encontrado fundamento suficiente para sua conclusão, nem tampouco responder cada um deles. Também é desnecessária a citação, no decisum embargado, dos dispositivos legais ou constitucionais ou infraconstitucionais invocados pelos embargantes.

O Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento sobre a matéria:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. ADMISSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE. EMBARGOS ACOLHIDOS.

I - O prequestionamento implícito consiste na apreciação, pelo tribunal de origem, das questões jurídicas que envolvam a lei tida por vulnerada, sem mencioná-la expressamente. Nestes termos, tem o Superior Tribunal de Justiça admitido o prequestionamento implícito.

II - São numerosos os precedentes nesta Corte que têm por ocorrente o prequestionamento mesmo não constando do corpo do acórdão impugnado a referência ao número e à letra da norma legal, desde que a tese jurídica tenha sido debatida e apreciada.

(EREsp 155621/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, CORTE ESPECIAL, julgado em 02/06/1999, DJ 13/09/1999 p. 37)

No ponto, inexiste qualquer fundamento a autorizar o acolhimento dos aclaratórios opostos, sobremaneira quando os fundamentos esgrimidos almejam, à evidência, uma nova reavaliação da situação controvertida. Nada mais.

Com efeito, (re)analisando a situação dos autos no que diz respeito aos embargos opostos, registro que não houve qualquer vício no enfrentamento da análise da situação controvertida e a prova dos autos, como ora sustentado, sobretudo porque constou expressamente na fundamentação do julgado acerca das razões do provimento do recurso da parte contrária pela falha na prestação do serviço bancário pelo demandado a ensejar o dever de reparação à parte adversa, ora embargada. A mera leitura do julgado espanca as alegações suscitadas, restando referido, de modo expresso, sobre os motivos que conduziram ao resultado do julgamento ora combatido.

Veja-se que, quanto a isso, o julgado foi expresso ao, destacando a ineficiência (ou a sua falta) do serviço de vigilância e de segurança aos usuários do seu serviço, inclusive em relação aqueles que utilizam dos caixas bancárias fora do horário de expediente bancário, reconhecer a sua responsabilidade pelo evento, inclusive com destaque de outros julgados desta Corte e do c. STJ retratando eventos havidos fora do expediente, não subsistindo, com isso, as inferências agitadas pelo ora embargante.

No ponto, vale destacar o consagrado no julgado embargado:

"(...)

Quanto ao mérito, imperativo asseverar que o assalto ocorrido na agência bancária e a presença do autor no local restou suficientemente demonstrado pela prova carreada, sobretudo pelo extrato bancário acostado [Evento 1, EXTR4], o registro de ocorrência policial realizado poucos minutos após o evento criminoso [Evento 1, OUT3] e, também, pelo próprio depoimento da testemunha Deoclides Diniz ouvida durante a instrução processual, que presenciou os fatos e confirmou a presença do autor no local e a atuação criminosa sofrida na agência bancária [Evento 126, TERMOAUD1]. Portanto, incontroverso o assalto e a presença do autor na agência bancária, passo à análise da responsabilidade civil do banco demandado e os danos reclamados pelo autor.

Relativamente à responsabilidade civil, tratando-se de pretensão indenizatória cuja causa de pedir se baseia na alegação de falha do serviço, a responsabilidade da instituição financeira pela reparação de eventuais danos ocorridos é objetiva, exigindo-se apenas a comprovação do defeito na prestação do serviço, os danos, e o nexo causal entre eles, conforme disposto no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, eximindo-se da responsabilidade se comprovadas as excludentes previstas nos incisos I e II de seu §3º, verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Nesses termos, não se cogita de culpa do demandado, bastando à parte autora a prova do evento e do prejuízo sofrido, ônus do qual se desincumbiu satisfatoriamente, mormente considerando o fato incontroverso do assalto sofrido, devidamente comprovado nos autos.

Portanto, ao não disponibilizar sistema de segurança adequado e eficiente em suas instalações - mister que lhe cabia - contribuindo para o surgimento dos gravames reclamados, caracterizado está o defeito do serviço, a teor do disposto no artigo 14, § 1º, do CDC.

As instituições financeiras, justamente por movimentarem significativas quantias em dinheiro todos os dias, têm o dever de prestar vigilância, garantindo a segurança interna de seus empregados e usuários, até porque é da própria essência do negócio desenvolvido, conforme determina o artigo 2º1 da Lei nº 7.102/1983, norma que regulamenta os requisitos de segurança das instituições financeiras.

A prática de golpes, furtos e roubos em estabelecimentos bancários é cada vez mais uma realidade tristemente percebida em nosso dia-a-dia, configurando, pois, situação amplamente previsível e por isso mesmo remediável, não se podendo então cogitar de caso fortuito ou força maior, tampouco culpa exclusiva de terceiro.

Aliás, considerando que a atividade desempenhada pelo demandado é eminentemente de risco, o assalto em estabelecimentos bancários, à evidência, que é fato previsível, constituindo-se típica situação de fortuito interno e, portanto, não havendo que se falar em hipótese de excludente de responsabilidade, sequer sob o prisma do fato ter acontecido fora do expediente bancário, mormente considerando a disponibilização dos seus serviços pela instituição financeira aos clientes, de sorte que, também por isso - disponibilização dos serviços - deve garantir a segurança dos consumidores que se utilizam dos caixas eletrônicos.

Nesse sentido, importante enfatizar os ensinamentos de Sérgio Cavallieri Filho a respeito da teoria do risco-proveito, verbis:

“[...] O banco tem o dever legal de garantir a segurança de todas as pessoas, clientes ou não, que acorrem ao seu estabelecimento em horário em que, por profissão e destinação, se abre ao público. A Lei nº 7.102/83 [...] impõe aos bancos oficiais e privados, e aos estabelecimentos financeiros em geral, a obrigação de manter um sistema de segurança aprovado pelo Banco Central do Brasil. Esse sistema de segurança inclui pessoas adequadamente preparadas – vigilantes; alarme capaz de permitir, com segurança, comunicação entre o banco e o órgão policial mais próximo ou empresa de vigilância; equipamentos eletrônicos e de filmagem que possibilitem a identificação...

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