Acórdão nº 50005647820208210147 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceiro Grupo de Câmaras Criminais, 10-03-2023

Data de Julgamento10 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Número do processo50005647820208210147
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoTerceiro Grupo de Câmaras Criminais

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003318237
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5000564-78.2020.8.21.0147/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATORA: Desembargadora MARIA DE LOURDES GALVAO BRACCINI DE GONZALEZ

EMBARGANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMBARGADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes interpostos por DANIEL MARTINS DA SILVA, através da Defensoria Pública, visando tornar prevalente o douto voto vencido da lavra da eminente Desembargadora Bernadete Coutinho Friedrich.

O ora embargante Daniel foi denunciado por incurso nas sanções do art. 155, §4º, incisos I e IV, combinadas com as do art. 288, parágrafo único, ambos do Código Penal, na forma do art. 69 do Código Penal.

Restou condenado em 1ª Instância juntamente com outros dois indivíduos como incurso nas sanções do art. 155, § 4º, incisos I e IV, do Código Penal, combinadas com o art. 61, inciso I, do Código Penal, à pena de 05 (cinco) anos e 03 (três) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 40 (quarenta) dias-multa, no valor unitário mínimo.

Irresignado com a sentença, o réu apelou.

Em sessão realizada no dia 15/12/2022, a 6ª Câmara Criminal desta Corte, por maioria, deu parcial provimento ao recurso de Daniel para reduzir sua pena privativa de liberdade para três (03) anos e três (03) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, mantidas as demais cominações da sentença, vencida em parte a Desembargador Bernadete Cutinho Friedrich que dava provimento ao apelo em maior extensão, reduzindo sua pena para dois (02) anos e quatro (04) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, acompanhando o relator em todas as demais disposições.

Participaram do julgamento o Desembargador João Batista Marques Tovo, Relator e prolator do douto voto majoritário, o Desembargador Sérgio Miguel Achutti Blattes e a Desembargadora Bernadete Coutinho Friedrich, prolatora do douto voto minoritário.

Aduziu o embargante, em síntese, a necessidade de prevalência do voto minoritário, porquanto dá à questão a melhor solução, dentre as apresentadas, preconizada pelo Direito.

Após transcrever integralmente o voto vencido, asseverou que este apresenta ao caso a melhor solução, devendo ser afastada a qualificadora, pois ausente prova válida da materialidade e adequadas as penas, nos termos do voto divergente.

Pugnou pelo provimento dos embargos infringentes, para que seja tornado prevalente o douto voto minoritário (43.1).

Recebidos os embargos (45.1), estes foram distribuídos a esta Relatora.

Dada vista ao Ministério Público, veio aos autos parecer no sentido do improvimento dos embargos (55.1).

É o relatório.

VOTO

Trata-se de embargos infringentes interpostos por DANIEL MARTINS DA SILVA, através da Defensoria Pública, visando tornar prevalente o douto voto vencido da lavra da eminente Desembargadora Bernadete Coutinho Friedrich.

A denuncia foi assim oferecida:

"1º FATO

Em dia e horário não esclarecido nos autos, porém antes do fato abaixo descrito, em São Leopoldo, os denunciados Wagner dos Santos Ximendes, Daniel Martins da Silva e Rodrigo Gonçalves do Couto, em união de esforços e comunhão de vontades, associaram-se, com uso de armas de fogo, juntamente com outras cinco pessoas não identificadas, para o fim específico de cometer crimes (2º fato e relatórios de investigações de fls.).

Na ocasião, os denunciados Wagner dos Santos Ximendes, Daniel Martins da Silva e Rodrigo Gonçalves do Couto, os quais residem próximos na cidade de São Leopoldo, associaram-se objetivando o cometimento de crimes, dentre eles o fato abaixo descrito.

2º FATO

No dia 02 de agosto de 2020, por volta das 00h40min, no pavilhão 5 da Empresa Pólux, situada na ERS 149, Recanto Maestro, Restinga Sêca, os denunciados Wagner dos Santos Ximendes, Daniel Martins da Silva e Rodrigo Gonçalves do Couto, em união de esforços e comunhão de vontades, juntamente com mais cinco pessoas não identificadas, subtraíram para si ou para outrem, mediante arrombamento, coisa alheia móvel, consistente em 60 aparelhos de televisão smart, da marca Konway, 08 bobinas de fio de cobre pesando 800kg e uma bicicleta 18 marchas da marca Viking pertencentes à empresa Pólux, avaliados em R$ 201.626,28 (duzentos e um mil, seiscentos e vinte e seis reais e vinte e oito centavos) (autos de avaliação indireto e de constatação de dano fls.).

Dois dias antes do fato, qual seja, em 31 de julho de 2020, o denunciado Rodrigo Gonçalves do Couto, funcionário terceirizado da empresa Pólux, foi até o portão de entrada da empresa, a fim de analisar seu modo de funcionamento.

Posteriormente, na ocasião do fato, dois automóveis, um Fiat Uno com placas PXD 5825 e outro Renault Scenic com placas IQR0J19, circularam nas proximidades da empresa, deixando cinco indivíduos, dentre eles os denunciados, os quais desceram dos veículos e ingressaram na empresa por um portão de ferro que não estava chaveado, sendo que o denunciado Rodrigo foi reconhecido pelo cachorro que faz guarda no pátio.

Ato contínuo chega um caminhão VW/30.330, branco e com 3 64-2-147/2021/3534 - 147/2.20.0000731-7 (CNJ:.0000803- 70.2020.8.21.0147) baú, com placas IZQ8C14, novamente com apoio dos outros dois veículos descritos, sendo que entrou no pátio da empresa para que os objetos fossem carregados. Ainda, os denunciados arrombaram a porta lateral e a porta da cozinha para ingressar no pavilhão em que estavam os objetos furtados.

Por fim, após carregarem a res furtiva, os denunciados saíram do local, nos automóveis referidos.”

Reside a presente controvérsia entre os votos majoritário e minoritário, quanto ao afastamento da qualificadora do artigo 155, § 4º, pelo voto minoritário, tendo a Desembargadora Bernadete manifestado entendimento no sentido de que deve ser afastada a qualificadora. Neste particular, assim constou no voto minoritário:

"A apuração do rompimento de obstáculo, efetivamente, se mostrava deveras singela, consistindo na mera verificação de que uma porta fora arrombada, circunstância que torna prescindível a sua submissão ao Instituto Geral de Perícias, porquanto dispensável capacidade técnica específica. Deste modo, não se observa nenhuma irregularidade no fato da atribuição ser confiada a agente policial, mormente quando ausentes elementos a denotar qualquer espécie de invalidade, distorção ou imprecisão técnica que indique tratar-se de laudo tendencioso.

No entanto, há que ser afastada a qualificadora prevista no art. 155, §4º, inciso I, do CP, porquanto o exame do local foi realizado de forma indireta, sem o comparecimento dos peritos à cena do crime."

Segundo a Desembargadora Bernadete, na medida em que o crime deixa vestígio, era imprescindível a realização de exame de corpo de delito modo direto, não havendo como suprir sua ausência pela prova oral, nem mesmo pela confissão, nos termos do art. 158 do CPP, só sendo admitido o exame indireto na hipótese de desaparecimento dos vestígios, o que não vem demonstrado tampouco noticiado.

Assim, o voto minoritário afastou a valoração negativa das circunstâncias do crime, tendo em vista que somente prevaleceu a qualificadora do concurso de pessoas, reduzindo a basilar para 02 anos de reclusão. Em razão da agravante da reincidência que incide em relação ao réu DANIEL, foi procedido o aumento da pena-base em quatro (04) meses, o que corresponde a 1/6 da basilar. Ausentes causas especiais modificadoras, restou a pena definitiva do réu WAGNER, pelo voto minoritário, em dois (02) anos de reclusão e a pena definitiva do réu DANIEL em dois (02) anos e quatro (04) meses de reclusão.

Já ao prolatar o douto voto majoritário, o Desembargador João Batista Marques Tovo ao analisar a questão objeto da divergência, assim se manifestou:

"Quanto à qualificadora do rompimento de obstáculo, tenho sustentado que se a diligência comprobatória da materialidade de uma infração for apenas inspecional, dispensando avaliação e expertise, a condição prevista no artigo 158 do CPP estará satisfeita com um auto descritivo ou um levantamento topográfico ou fotográfico, que pode ser lavrado pela autoridade policial ou seus agentes. E quando houver algum registro audiovisual comprobatório da materialidade da infração, desde que ele possa ser autenticado e evidencie sua ocorrência, dispensando avaliação e expertise, também. Mas, claro, para lavrar um auto ou tomar a termo de modo válido, não se dispensa ter contato sensível com o fato ou objeto inspecionado. O que pode ser indireto é o exame, não a inspeção. Todavia, se a ruptura houver sido reparada pelo ofendido desde logo, impossibilitando que a autoridade policial realize a diligência inspecional, aplica-se o disposto no art. 167 do CPP, a falta podendo ser suprida por prova testemunhal, sem olvidar o depoimento do ofendido não serve a esse desiderato, tampouco a confissão do acusado (art. 158, parte final, do CPP). Exponho a fonte do meu entendimento.

O Capítulo II do Título VII (artigos 158-184) do CPP dispõe a respeito do exame de corpo de delito e das perícias em geral. Nele não é vista referência a levantamentos topográficos (croquis) ou fotográficos ou registros de caráter inspecional como modalidade de perícia. Aliás, há expressa referência a provas fotográficas, esquemas ou desenhos (art. 165) como meios de prova diversos e, após, recomendação de os laudos serem instruídos (art. 169) ou ilustrados (art. 170) com esses registros documentais. Fácil perceber, não são tidos como resultantes do exame pericial, e sim meios paralelos de demonstrar o que o perito afirma ter observado no laudo. Disso retiro que, levantamentos topo-fotográficos e registros de caráter inspecional não são “exames periciais”, nem podem ser com eles confundidos quando desprovidos de...

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