Acórdão nº 50005682020218210038 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50005682020218210038
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002290173
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5000568-20.2021.8.21.0038/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSE MOESCH

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

APELADO: LEEVA TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Adoto o relatório do parecer do Ministério Público desta instância:

"Trata-se de apelação cível, interposta pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, de decisão (evento 35) que confirmou a medida liminar e julgou procedente o pedido no mandado de segurança interposto por LEEVA TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA.

Em razões (evento 165), o Estado refere que a impetrante atua no ramo de transporte rodoviário de cargas e que presta serviço de transporte de maçãs in natura com destino ao porto de Navegantes/SC, de onde a carga é exportada, sendo que o Fisco tem exigido o recolhimento do ICMS, relativo ao transporte da mercadoria até esse destino. Esclarece que o transporte internacional das mercadorias é fracionado em duas ou mais prestações de serviço de transporte, que requerem análise em separado para a apuração de sua inclusão ou não no campo de incidência do ICMS. Argumenta que a apelada transporta as mercadorias no território nacional, de onde se situa o estabelecimento do remetente, até o porto, para posteriormente, prosseguir, com transportador distinto, até o destino final no exterior. Portanto, a prestação do serviço tem início e fim dentro do território nacional. Analisa o art. 3º da Lei Complementar 87/96, aduzindo que “o vocábulo mercadorias, diz respeito unicamente ao substantivo operações. E serviços refere-se a prestações. Assim, o texto encerra duas espécies de não incidência: (1) as operações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, e, (2) as prestações que destinem ao exterior serviços. Não é sem motivo que operações e prestações têm como correspondentes, na mesma ordem, mercadorias e serviços” (sic). Assim, o texto dissocia a prestação do serviço do destino da mercadoria transportada. Concede a não incidência às operações que destinem mercadorias ao exterior e às prestações de serviços para o exterior. A impetrante faz prestação de transporte de mercadorias, em que incide o ICMS, nos termos do inc. I do art. 3º do Livro I do Regulamento do ICMS, vez que a prestação de serviços que faz ocorre dentro do território nacional. Aduz que a imunidade a que se refere o art. 155, § 2º, X, “a”, da CF não alcança operações ou prestações anteriores à operação de exportação”. Requer a reforma da sentença, com a revogação da liminar concedida.

Foram juntadas contrarrazões (evento 49).

Assim, os autos vieram com vista ao Ministério Público.

(...)"

Neste grau de jurisdição, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo.

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Recebo o presente recurso, porquanto cabível e tempestivo, preenchendo os requisitos previstos nos arts. 1.003, § 5º e 1.010 do CPC.

Conheço da remessa necessária, por ter sido concedida a segurança, ante a previsão expressa do art. 14, §1º da Lei nº 12.016/2009.

LEEVA TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA, prestadora de serviços de transporte, impetrou o mandado de segurança para ver afastada a incidência de ICMS sobre o transporte rodoviário de mercadorias com saída de Vacaria/RS até o Porto de Navegantes-Itajaí/SC, destinadas à exportação, com base no art. 3º, inciso II, e parágrafo único, da LC n.º 87/96 e no art. 11, inciso V, e parágrafo único, do RICMS.

A sentença concedeu a ordem pleiteada, motivo da interposição do presente recurso, que não merece ser provido.

Para as operações que destinem mercadorias e serviços ao exterior, a Constituição Federal prevê a imunidade de recolhimento do ICMS na forma do artigo 155, § 2º, X, a, da CF/88 e no art. 3º, II, da Lei Complementar nº 87/96:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

(...)

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

(...)

X - não incidirá:

a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

(...)

De fato, o STF ao julgar o Tema 475 firmou seguinte tese:

“A imunidade a que se refere o art. 155, § 2º, X, a, da CF não alcança operações ou prestações anteriores à operação de exportação.”

Assim, embora não haja a imunidade de ICMS para o serviços de transporte prestado em território nacional, ainda que de mercadorias que venham a ser destinadas ao exterior, o Constituinte outorgou para Lei Complementar o afastamento de incidência do imposto para outras hipóteses não previstas no 155, § 2º, X, a, conforme se extrai do inciso XI, alínea e, in verbis:

"(...)

XII - cabe à lei complementar:

(...)

e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, "a"

(...)"

E no caso, o art. 3º, inciso II, e parágrafo único, da LC n.º 87/96 prevê a isenção do imposto para a prestação de serviço de transporte das mercadorias que venham a ser destinadas ao mercado externo:

"Art. 3º O imposto não incide sobre:

(...)

II - operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços;

Parágrafo único. Equipara-se às operações de que trata o inciso II a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a:

(...)

II - armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro."

Redação semelhante consta no art. 11, inciso V, e parágrafo único, do RICMS.:

Art. 11. O imposto não incide sobre:

(...)

V – operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços;

(...) Parágrafo único. Equiparam-se às operações destinadas ao exterior, referidas no inciso V, as saídas de mercadorias realizadas com o fim específico de exportação para o exterior destinadas a:

(...)

b) armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.

Portanto, ainda que se trate de trecho percorrido em território nacional, não deve haver a tributação pelo ICMS, pois o STJ já definiu que "a isenção tributária de ICMS, concernente a produtos destinados ao exterior, contempla toda a cadeia de deslocamento físico da mercadoria, o que abarca, inclusive, trechos eventualmente fracionados, percorridos dentro do território nacional, não sendo possível, portanto, a tributação das fases intermediárias do itinerário." (REsp 1793173/RO)

A orientação deu origem ao enunciado da Sumula nº 649 do STJ, publicada em 03.05.2021:

“Não incide ICMS sobre o serviço de transporte interestadual de mercadorias destinadas ao exterior”.

Nesta senda, o Ministério Público desta instância bem ponderou quanto à diferença entre a imunidade concedida constitucionalmente e a isenção outorgada mediante Lei Complementar:

"(...) Dessa forma, a Constituição Federal estabelece que não incidirá ICMS “sobre operações que destinem mercadorias para o exterior” (art. 155, X, “a”), contudo, no inc. XII, “e”, estabelece que caberá à lei complementar “excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, ‘a’” (caso de isenção).

Não há contradição entre as duas posições, porquanto, no julgamento do Tema 475, o STF analisou a imunidade ao ICMS, com base no disposto no art. 155, X, “a”, da CF, enquanto que a Súmula do STJ se reporta ao permissivo contido no art. 155, XI, letra, “e”, da CF e trata da isenção do imposto, como uma possibilidade aberta à Lei Complementar.

(...)"

Cito, por oportuno precedentes do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ICMS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE DE MERCADORIAS DESTINADAS AO EXTERIOR. ISENÇÃO TRIBUTÁRIA. ART. 3º, II, DA LC N. 87/1996.
1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar os EREsp n. 710.260/RO, entendeu que não incide ICMS nas operações de transporte interestadual de mercadorias destinadas ao exterior, nos termos do art. 3º, II, da LC 87/1996.
2. Agravo interno não provido.
(AgInt no REsp 1840199/PA, Rel.
Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/10/2020, DJe 28/10/2020)

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ICMS. TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE MERCADORIAS DESTINADAS À EXPORTAÇÃO. ISENÇÃO. MODIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DEPENDERIA DA INTERETAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL (ART. 155, § 2.º X, A, DA CF/1988). NO QUE REMANESCE NO PLANO INFRACONSTITUCIONAL, O JULGADO ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO DO ESTADO DE SANTA CATARINA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Da leitura do acórdão recorrido observa-se que as conclusões do julgado, quanto à incidência de ICMS sobre operações de transporte de mercadorias destinadas à exportação, levaram em consideração o teor do texto constitucional (art. 155, § 2.º, X, a da CF), de sorte que sua revisão, no ponto, é tarefa defesa nesta Corte. A propósito: AgRg no AREsp. 316.882/SC, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 27.8.2015.
2. Outrossim, no âmbito infraconstitucional, constata-se que, ao conferir interpretação ao art. 3.º, II da LC 87/1996, o
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