Acórdão nº 50005804720168210155 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 27-01-2022

Data de Julgamento27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50005804720168210155
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001406773
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000580-47.2016.8.21.0155/RS

TIPO DE AÇÃO: Interpretação / Revisão de Contrato

RELATORA: Desembargadora LIEGE PURICELLI PIRES

APELANTE: FATIMA JANETE FLORES DA SILVA (AUTOR)

APELADO: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL (RÉU)

RELATÓRIO

Inicialmente, adoto o relatório da sentença (Evento 4, SENT9):

Sobreveio o dispositivo da decisão supracitada:

A parte autora recorre por meio das razões constantes do Evento 4, APELAÇÃO11. Requer o deferimento das liminares. Sustenta a abusividade dos juros remuneratórios. Defende a ausência de capitalização de juros. Menciona a necessidade de descaracterização da mora. Argui a inviabilidade da cobrança das taxas administrativas. Busca o reconhecimento da existência de venda casada. Alega a desproporcionalidade dos honorários advocatícios arbitrados. Argumenta a ilegalidade da cobrança do IOF. Pugna pelo provimento de seu apelo.

Contrarrazões ao recurso de apelação no Evento 15, CONTRAZAP1.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

A ação, em síntese, versa sobre a revisão contratual de dois pactos firmados entre a parte autora e a instituição financeira com base na alegação de erro. A demandante destaca ser pessoa de baixa instrução, o que teria contribuído para a ocorrência do vício de vontade mencionado. Devolve, em sede recursal, os tópicos relativos aos juros remuneratórios, à capitalização de juros, à comissão de permanência, às tarifas administrativas, à descaracterização da mora e aos impostos sobre as operações financeiras.

JUROS REMUNERATÓRIOS

O Superior Tribunal de Justiça, uniformizando a divergência que existia no âmbito de suas Turmas, passou a entender de forma pacífica que os juros remuneratórios pactuados em contratos bancários não configuram abusividade, salvo se estipulados em patamares superiores à taxa média de mercado.

A questão restou abordada no âmbito de julgamento em recursos repetitivos:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO.

Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da ADI n.º 2.591-1. Exceto: cédulas de crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos celebrados por cooperativas de crédito; contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, bem como os de crédito consignado.

Para os efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC, a questão de direito idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o incidente de processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida no acórdão recorrido e nas razões do recurso especial, preenchendo todos os requisitos de admissibilidade.

Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios;

ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. [...]

I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.

ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; [...]

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. [...]

Os juros remuneratórios contratados encontram-se no limite que esta Corte tem considerado razoável e, sob a ótica do Direito do Consumidor, não merecem ser revistos, porquanto não demonstrada a onerosidade excessiva na hipótese. [...]

(REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009)

No caso, os contratos foram estipulados nos percentuais de 26,76% a.a. (contrato das fls. 27 - 29) e 27,55% a.a. (fls. 32 - 34), enquanto a média constante do BACEN na época das contratações foi de 26,45% a.a. e 26,33% a.a. Assim, os juros remuneratórios contratados não desbordam substancialmente das médias constantes do Banco Central.

Nego provimento ao recurso, no ponto.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS

Segundo o Art. 5º da Medida Provisória nº 2.170-36 de 26 de janeiro de 2001, não declarado inconstitucional e ainda vigente, plenamente possível à incidência da capitalização dos juros remuneratórios, na periodicidade mensal, para os contratos bancários firmados após 31.03.2000, pois autorizada a capitalização em periodicidade inferior a um ano.

Ainda o STJ, no REsp 973.827-RS, observou que a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual, quando pactuada de forma clara e expressa não é abusiva, in verbis:

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO.
1. A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros.
2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de "taxa de juros simples" e "taxa de juros compostos", métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933.
3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada".
4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios.
5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado de inadimplência, que decorre da falta de demonstração da abusividade das cláusulas contratuais questionadas.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido.
(REsp 973827/RS, Rel.
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 24/09/2012)

No caso, a capitalização mensal de juros está expresamente pactuada nos acordos de vontade das fls. 7 - 29 e das fls. 32-34, não existindo abusividade a ser declarada.

COMISSÃO DE PERMANÊNCIA

Segundo entendimento consolidado do STJ, conforme julgamento do Recurso Especial nº 1.058.114 – RS, admitida a cobrança de comissão de permanência do consumidor em mora, conforme a média de mercado reconhecida pelo Banco Central do Brasil, não podendo ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, senão vejamos:

DIREITO COMERCIAL E BANCÁRIO. CONTRATOS BANCÁRIOS SUJEITOS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. VALIDADE DA CLÁUSULA. VERBAS INTEGRANTES. DECOTE DOS EXCESSOS. PRINCÍPIO DA CONSERVAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS. ARTIGOS 139 E 140 DO CÓDIGO CIVIL ALEMÃO. ARTIGO 170 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO. 1. O princípio da boa-fé objetiva se aplica a todos os partícipes da relação obrigacional, inclusive daquela originada de relação de consumo. No que diz respeito ao devedor, a expectativa é a de que cumpra, no vencimento, a sua prestação. 2. Nos contratos bancários sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor, é válida a cláusula que institui comissão de permanência para viger após o vencimento da dívida. 3. A importância cobrada a título de comissão de permanência não poderá ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, ou seja: a) juros remuneratórios à taxa média de mercado, não podendo ultrapassar o percentual contratado para o período de normalidade da operação; b) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; e c) multa contratual limitada a 2% do valor da prestação, nos termos do art. 52, § 1º, do CDC. 4. Constatada abusividade dos encargos pactuados na cláusula de comissão de permanência, deverá o...

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