Acórdão nº 50005969320178210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
ÓrgãoSexta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50005969320178210016
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001982151
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000596-93.2017.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

APELANTE: IVO FRANCISCO BESCHORNER (AUTOR)

APELADO: UNIMED NOROESTE/RS - SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVICOS MEDICOS LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

IVO FRANCISCO BESCHORNER ajuizou ação revisão de contrato em face de UNIMED IJUÍ LTDA. Disse que é usuário do plano de saúde desde 13/05/1994, sendo um plano familiar/individual. Informou que a partir do ano de 2008 o contrato sofre reajustes desproporcionais, de modo que o autor vem arcando com uma mensalidade de R$ 1.039,08(...), comprometendo sua renda mensal. Requereu a procedência do feito, com a aplicação do CDC, a declaração de abusividade dos aumentos na mensalidade a partir de 2008, a determinação de reajuste dos percentuais nos limites autorizados pela ANS ou IGP-M e a condenação da requerida ao ressarcimento dos valores pagos em excesso.

Sobreveio sentença que julgou parcialmente procedente a ação ajuizada para o fim de declarar a ilegalidade do aumento da mensalidade da segurada, nos percentuais mencionados na exordial e para o fim de limitar o reajuste de mensalidade da parte demandante ao limite estabelecido no período pela ANS, com devolução do valor pago em excesso, a partir de Março/2014, corrigido pelo IGP-M e com juros de mora de 1% ao mês desde o desembolso. Diante da sucumbência recíproca, arcará a parte autora com o pagamento de 50% das custas processuais e a parte ré com o pagamento dos outros 50%. Fixo honorários advocatícios em R$ 3.000,00, com base no artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil, considerando o labor desenvolvido e a curta tramitação processual, devendo ser dividido na mesma proporção, qual seja 50% para cada procurador pago pela parte contrária, suspensa a exigibilidade dos ônus sucumbenciais da parte autora em face da AJG deferida.

Irresignado, o autor apresentou recurso de apelação (evento 78). Em suas razões recursais defendeu em síntese, que o contrato de plano de saúde objeto do presente litígio tem renovação automática a cada ano e é considerado como de trato sucessivo. Assim, estando a contratação entabulada vigente até a atualidade, pode o contratante discutir as suas cláusulas em Juízo, ante a imposição levada a efeito pela operadora, consistente em reajustes abusivos. Assim, não merece subsistir a declaração de prescrição do direito de ação do autor no presente feito, pois, na espécie, a prescrição incide somente sobre as parcelas a serem eventualmente restituídas, considerando a data em que implementados os reajustes abusivos. Ao final requereu o provimento do recurso da apelante, para o fim de julgar que imprescritível o fundo de direito, aplicando-se a prescrição trienal unicamente para a devolução de valores pela apelada.

A requerida também apela, em suas razões de apelo (evento 80). defendeu que eventual condenação ao ressarcimento de valores considerados excessivos deverá respeitar a prescrição trienal, por se tratar de alegação de uma intenção de enriquecimento sem causa, na forma do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil. Quanto ao reajuste anual aplicado ao plano de saúde da parte apelada defende que este se deu a título de reposição da inflação e custos de medicina, em razão do aumento da utilização do contrato. Dito de outra maneira, fora gasto mais do que se arrecadou, tornando o plano negativo, gerando resultados negativos para com o equilíbrio financeiro do contrato, ressaltando que nenhum reajuste fora abusivo. Afirmou ainda que a sentença a reconheceu a nulidade sobre a cláusula que permite o “reajuste” com base na faixa etária, todavia tal determinação está equivocada pois tal clausula não configura abusividade, eis que se encontra em conformidade com as normas legais. Disse que tal diferença de valores não se trata de um reajuste e sim de um reenquadramento etário do usuário que ingressa em faixa etária superior, o que se encontra devidamente previsto no contrato. Asseverou que o Superior Tribunal de Justiça tem entendido por ser notória nos planos de saúde a necessidade de majoração do valor do prêmio em função da idade mais avançada dos usuários, vez que indiscutível a maior utilização dos serviços contratados. Realizada perícia, ficou evidente a inviabilidade da continuidade da prestação de serviços, bem como a quebra do princípio do mutualismo e da solidariedade intergeracional, caso não ocorram os reajustes nas faixas etárias mais avançadas. Mencionou que o reajuste pela faixa etária dos 70 anos não foi desarrazoado, eis que aplicado no patamar de 30%, o que é perfeitamente admitido pela jurisprudência vigente. No quadro apresentado, consta como 48,32%, o que representa a soma dos 30% com o reajuste anual de aniversário do contrato, o que paira em torno de uma média de 15%. Com relação às normas expedidas pelos órgãos governamentais, verifica-se que os percentuais se encontram em conformidade com a Resolução Normativa – RN nº 63/2003 da ANS. Postulou ao final provimento do presente recurso, com a reforma da sentença, para o fim de julgar totalmente improcedentes os pedidos veiculados na inicial, como medida de justiça, condenando a parte apelada ao pagamento da totalidade dos encargos de sucumbência, na forma do art. 85 do CPC.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 83 e 84).

Os autos vieram-me conclusos em 14/04/2024.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação de revisão de contrato, na qual o autor narra ser usuário do plano de saúde desde 13/05/1994, sendo um plano familiar/individual, mencionou que a partir do ano de 2008 o contrato sofreu reajustes desproporcionais, de modo que o autor vem arcando com uma mensalidade de R$1.039,08(...), julgada parcialmente procedente na origem.

Preenchidos os pressupostos processuais, recebo o apelo.

Relativamente ao prazo prescricional para fins de reconhecimento de nulidade e abusividade de reajuste de parcela devida a título de pagamento de plano de saúde destaco que é trienal, nos termos do disposto o art. 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil, conforme decidiu o Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.361.182/RS1 (Tema 610).

Ademais, a prescrição trienal atinge apenas as parcelas vencidas e não o próprio fundo do direito, assim, eventual nulidade de cláusula acarreta reflexos apenas quanto a valores vencidos dentro do prazo prescricional.

Destaca-se, inicialmente, que os contratos firmados com as operadoras de planos de assistência à saúde são compostos por dois grupos: o primeiro refere-se aqueles contratos firmados após a vigência da Lei nº 9.656/1998 (janeiro de 1999), sendo estes "regulamentados" e, o segundo, alude aos contratos firmados antes da entrada em vigor da referida Lei, denominados "não regulamentados".

Aos contratos não regulamentados e operados por entidades que não são de autogestão aplicam-se apenas as disposições neles pactuadas e as normas do CDC, sendo descabida a incidência das normas previstas na Lei nº 9.656/1998, observado o verbete nº 608 da súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

Por sua vez, no julgamento do REsp 1.568.244/RJ (Tema 952) pelo Superior Tribunal de Justiça foi analisada a questão concernente à legalidade dos reajustes por faixa etária dos planos de saúde, nos seguintes termos:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. MODALIDADE INDIVIDUAL OU FAMILIAR. CLÁUSULA DE REAJUSTE DE MENSALIDADE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. LEGALIDADE. ÚLTIMO GRUPO DE RISCO. PERCENTUAL DE REAJUSTE. DEFINIÇÃO DE PARÂMETROS. ABUSIVIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EQUILÍBRIO FINANCEIRO-ATUARIAL DO CONTRATO. 1. A variação das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde em razão da idade do usuário deverá estar prevista no contrato, de forma clara, bem como todos os grupos etários e os percentuais de reajuste correspondentes, sob pena de não ser aplicada (arts. 15, caput, e 16, IV, da Lei nº 9.656/1998). 2. A cláusula de aumento de mensalidade de plano de saúde conforme a mudança de faixa etária do beneficiário encontra fundamento no mutualismo (regime de repartição simples) e na solidariedade intergeracional, além de ser regra atuarial e asseguradora de riscos. 3. Os gastos de tratamento médico-hospitalar de pessoas idosas são geralmente mais altos do que os de pessoas mais jovens, isto é, o risco assistencial varia consideravelmente em função da idade. Com vistas a obter maior equilíbrio financeiro ao plano de saúde, foram estabelecidos preços fracionados em grupos etários a fim de que tanto os jovens quanto os de idade mais avançada paguem um valor compatível com os seus perfis de utilização dos serviços de atenção à saúde. 4. Para que as contraprestações financeiras dos idosos não ficassem extremamente dispendiosas, o ordenamento jurídico pátrio acolheu o princípio da solidariedade intergeracional, a forçar que os de mais tenra idade suportassem parte dos custos gerados pelos mais velhos, originando, assim, subsídios cruzados (mecanismo do community rating modificado). 5. As mensalidades dos mais jovens, apesar de proporcionalmente mais caras, não podem ser majoradas demasiadamente, sob pena de o negócio perder a atratividade para eles, o que colocaria em colapso todo o sistema de saúde suplementar em virtude do fenômeno da seleção adversa (ou antisseleção). 6. A norma do art. 15, § 3º, da Lei nº 10.741/2003, que veda "a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em...

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