Acórdão nº 50006202420188210037 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-06-2022

Data de Julgamento15 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50006202420188210037
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002160685
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000620-24.2018.8.21.0037/RS

TIPO DE AÇÃO: Pagamento

RELATOR: Desembargador CARLOS CINI MARCHIONATTI

APELANTE: FLAVIO ANDRE MAIDANA VERDEJO (RÉU)

APELANTE: FLAVIO ANDRE MAIDANA VERDEJO (RÉU)

APELADO: COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO ESSENCIA RS/ES SICREDI ESSENCIA (AUTOR)

RELATÓRIO

A sentença julgou improcedentes os embargos à ação monitória opostos por FLAVIO ANDRE MAIDANA VERDEJO e FLAVIO ANDRE MAIDANA VERDEJO ME a COOPERATIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DE ASSOCIADOS DE CARLOS BARBOSA - SICREDI SERRANA RS (Evento 26 do 1º Grau).

O embargante à monitória apela (Evento 31) e requer a reforma da sentença para: a) acolhimento da questão preliminar de nulidade da sentença por inexistência de análise e consideração das provas apresentadas nos autos; b) a improcedência da ação monitória.

Em contrarrazões (Evento 34), a cooperativa demandante requer a reafirmação da sentença.

Transcrevo a sentença para servir ao relatório e ao voto:

I – RELATÓRIO:

COOPERTIVA DE CRÉDITO DE LIVRE ADMISSÃO DE ASSOCIADOS PAMPA GAÚCHO – SICREDI PAMPA GAÚCHO ajuizou ação monitória contra FLÁVIO ANDRÉ MAIDANA VERDEJO ME, pessoa jurídica, e FLÁVIO ANDRÉ MAIDANA VERDEJO, pessoa física, todos qualificados. Relatou ser credor da parte ré do valor de R$ 31.169,58, referente a saldo devedor de cédula de crédito bancário para abertura de limite de crédito rotativo, por meio do qual foi concedido crédito no valor de R$ 25.000,00. Postulou a citação da parte requerida para, no prazo de quinze dias, efetuar o pagamento da importância de R$ 31.169,58 ou oferecer embargos e, posteriormente, a constituição de pleno direito do título em executivo judicial. Instruiu a inicial com documentos (documento 01, evento 03).

A parte requerida ofereceu embargos à monitória (documento 08, evento 03). Defendeu a inexigibilidade da dívida. Reconheceu a existência do débito. Argumentou a existência de abusividade na forma de correção e imposição no recebimento do valor. Justificou que enfrenta problemas financeiros. Narrou que procurou a agência local propondo parcelamento. Todavia, foi-lhe imposto como condição para parcelar o débito o parcelamento também de outra dívida que possui junto à Instituição Financeira, o que entende ser abusivo. Aventou que a autora, a fim de demonstrar a evolução do débito, limitou-se a juntar aos autos a ficha gráfica. Invocou a incidência do Código de Defesa do Consumidor. Postulou o acolhimento dos embargos para reconhecimento das abusividades impostas ou, alternativamente, para declaração de impossibilidade de cobrança de juros acima do pactuado e de cobrança de capitalização de juros, juros moratórios e multa contratual. Juntou documentos.

Intimada, a parte autora apresentou impugnação aos embargos monitórios (documento 10, evento 03). Impugnou o pedido de gratuidade de justiça formulado. Referiu que a parte requerida não indicou o valor incontroverso, tampouco depositou o montante nos autos. Defendeu que a cédula que aparelha a ação e a ficha gráfica que acompanha a inicial demonstram a adequada evolução do débito. Disse que para facilitar a negociação seria aceita uma compensação parcial do crédito existente referente a um consórcio, o que não se concretizou por falta de interesse do devedor. Destacou que não foi demonstrada qualquer ilegalidade praticada, na medida em que a parte requerida sequer apontou cláusula em que tivesse ocorrido o mencionado abuso. Aventou a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Requereu, ao final, a rejeição dos embargos à monitória.

Após determinação de comprovação documental de hipossuficiência econômica a justificar o requerimento de gratuidade judiciária, devidamente cumprida, foi deferida a gratuidade de justiça à parte requerida (documento 11, evento 03).

Intimadas sobre o interesse na dilação probatória, a parte requerida postulou a produção de prova pericial e prova oral (documento 12, evento 03).

Virtualizado o feito (eventos 01 e 03).

Foi indeferido o pedido de produção de prova formulado pela parte requerida (evento 09).

A seguir, vieram os autos conclusos para julgamento.

II – FUNDAMENTAÇÃO:

Impugnação ao pedido de gratuidade de justiça.

A parte autora impugna o benefício de gratuidade de justiça concedido à parte requerida.

Todavia, não traz provas aptas a se desincumbir do ônus a seu cargo de provar a alegação o que não é suficiente para afastar a conclusão acerca da situação econômica da parte identificada, em um primeiro momento.

Diante do exposto, rejeito a impugnação em epígrafe.

Mérito.

Trata-se de ação monitória na qual busca a parte autora a condenação da empresa requerida ao pagamento da dívida de R$ 31.169,58, originada em cédula de crédito bancário para abertura de limite de crédito rotativo, bem como extratos evolutivos do débito, conforme documentos que acompanham a inicial (documento 01, evento 03).

A documentação juntada pelo autor preenche os requisitos para o manejo da ação monitória, conforme Enunciado nº 247 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça:

O contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória.

No mesmo sentido, a jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS. PRETENSÃO REVISIONAL. JUROS. CAPITA-LIZAÇÃO. ABUSIVIDADE NÃO CONFIGURADA. Inicial instruída com o contrato de abertura de crédito em conta corrente firmado entre as partes, acompanhado do extrato evolutivo do débito, documentos hábeis a instruir a ação monitória, bem como a permitir que o devedor deduza pretensão revisional, não havendo qualquer incongruência com o procedimento escolhido pelo Banco. Taxa anual e mensal dos juros remuneratórios contratados (37,849% e 2,711%, respectivamente) inferiores à média mensal anual e mensal do Banco Central (40,85% e 2,90%, respectivamente) para o tipo de contrato firmado entre as partes, não se verificando a abusividade alegada. Capitalização mensal dos juros que não se mostra abusiva quando contratada, considerando-se expressa previsão quando o contrato prevê taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal. Súmula 541, do STJ. Honorários majorados nos termos do §11º., do art. 85, do CPC. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70079080784, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em 30/01/2019)”

Cabe destacar, ainda, que não se aplicam as disposições do Código de Defesa do Consumidor à relação contratual encetada entre as partes.

A classificação de consumidor deve, em regra, ser obtida mediante a aplicação da teoria finalista, que, em uma interpretação restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica, ficando excluído da proteção o consumo intermediário.

Não se desconhece que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem evoluído para uma aplicação temperada da teoria finalista em relação às pessoas jurídicas, admitindo que, em determinadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente de um produto ou serviço possa ser equiparada à condição de consumidora, quando apresentar em relação ao fornecedor alguma vulnerabilidade técnica, jurídica, fática ou informacional. Para tanto, compete à própria pessoa jurídica o ônus da comprovação.

A propósito:

CONSUMIDOR. DEFINIÇÃO. ALCANCE. TEORIA FINALISTA. REGRA. MITIGAÇÃO. FINALISMO APROFUNDADO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. VULNERABILIDADE. 1. A jurisprudência do STJ se encontra consolidada no sentido de que a determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica. 2. Pela teoria finalista, fica excluído da proteção do CDC o consumo intermediário, assim entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (e, portanto, o preço final) de um novo bem ou serviço. Vale dizer, só pode ser considerado consumidor, para fins de tutela pela Lei nº 8.078/90, aquele que exaure a função econômica do bem ou serviço, excluindo-o de forma definitiva do mercado de consumo. 3. A jurisprudência do STJ, tomando por base o conceito de consumidor por equiparação previsto no art. 29 do CDC, tem evoluído para uma aplicação temperada da teoria finalista frente às pessoas jurídicas, num processo que a doutrina vem denominando finalismo aprofundado, consistente em se admitir que, em determinadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente de um produto ou serviço pode ser equiparada à condição de consumidora, por apresentar frente ao fornecedor alguma vulnerabilidade, que constitui o princípio-motor da política nacional das relações de consumo, premissa expressamente fixada no art. 4º, I, do CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumidor. 4. A doutrina tradicionalmente aponta a existência de três modalidades de vulnerabilidade: técnica (ausência de conhecimento específico acerca do produto ou serviço objeto de consumo), jurídica (falta de conhecimento jurídico, contábil ou econômico e de seus reflexos na relação de consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica do consumidor o coloca em pé de desigualdade frente ao fornecedor). Mais recentemente, tem se incluído também a vulnerabilidade informacional (dados insuficientes sobre o produto ou serviço capazes de influenciar no processo decisório de compra). 5. A despeito da...

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