Acórdão nº 50006203120188210067 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoNona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50006203120188210067
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001987976
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000620-31.2018.8.21.0067/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR: Desembargador TASSO CAUBI SOARES DELABARY

APELANTE: JOSE FRANCISCO DE SOUZA (RÉU)

APELADO: VERONI LINDEMANN PETER (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação e recurso adesivo interpostos por JOSE FRANCISCO DE SOUZA e VERONI LINDEMANN PETER , nos autos da ação de indenização por danos morais ajuizada por aquele em face deste, contra sentença [Evento 3, PROCJUDIC5, fls. 22/33] que julgou procedente a pretensão, condenando a parte ré ao pagamento de compensação por danos morais no valor de R$ 2.000,00, atualizados e corrigidos monetariamente pelo IGP-M a contar da data do arbitramento e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da data do fato, bem como ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios fixados em 12% sobre o valor da condenação, suspensa a exigibilidade por litigar sob o amparo da gratuidade judiciária. Ainda, julgou extinta a reconvenção por ilegitimidade passiva, condenando o reconvinte ao pagamento das custas processuais e de honorários fixados em R$ 500,00, suspensa a exigibilidade por litigar sob o amparo da gratuidade judiciária.

A parte ré, em suas razões recursais [Evento 3, PROCJUDIC5, fls. 35/37], sustenta que não há provas nos autos contra ele para haver um juízo condenatório, apenas o depoimento de um funcionário da parte autora ouvido como informante. Alega que foi o verdadeiro prejudicado ao ser surpreendido quando constatou que a empresa para qual prestou serviço, de propriedade da parte autora, não havia efetuado os devidos depósitos fundiários. Narra que se dirigiu à empresa para tentar entender a situação e buscar uma solução e quem se alterou na realidade foi a parte autora. Requer o provimento do recurso para que sejam julgados improcedentes os pedidos.

A parte autora apresentou contrarrazões e interpôs recurso adesivo [Evento 3, PROCJUDIC5, fls. 42 ao Evento 3, PROCJUDIC6, fls. 2]. Em suas razões recursais, defende a majoração do valor fixado a título de danos morais e dos honorários advocatícios, requerendo o provimento do recurso.

Decorrido in albis o prazo para apresentar contrarrazões pela parte ré, foram os autos remetidos a esta Corte e vieram a mim redistribuídos por prevenção. Foi inserida no sistema e-proc a mídia da audiência de instrução referida nas fls. 155/156 do processo físico.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Conheço dos recursos, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Reclama a parte autora a condenação da demandada ao pagamento de indenização por danos morais, sofridos em decorrência de alegada difamação e injúria dirigidas à sua pessoa. Narra, em sua inicial, que, no dia 06/03/2017, a parte ré esteve nas dependências de sua empresa e, sem justo motivo, passou a lhe ofender na frente de todos os seus funcionários, chamando-a de "caloteira", "sem vergonha" e "sem caráter". Ainda, informa que, após esse episódios, o réu passou a ligar frequentemente para a sua empresa e abordar seus funcionários cobrando uma suposta dívida. Alega acreditar que, na verdade, a parte ré pretende vingar-se por ter sido demitido em decorrência inúmeras irregularidades por ele cometidas quando era seu funcionário, culminando na confissão de dívida juntada aos autos.

A demandada, em sua peça defensiva, nega ter proferido qualquer ofensa à parte autora, afirmando que ela é devedora de FGTS não depositado pelo período que trabalho na sua empresa, de 02/05/2011 a 05/12/2011. Narra que se dirigiu amigavelmente à empresa para cobrar-lhe os referidos depósitos e que, exaltada, a autora rasgou seus extratos. Nega que manteve conduta sistemática de ligar para a empresa da autora, apenas o fazendo em duas ocasiões.

Diante da sentença de procedência, recorre o demandado devolvendo à apreciação desta Corte a totalidade das questões controvertidas, ao passo que o recurso adesivo da parte autora apenas tem o escopo de majorar o valor da condenação.

Com efeito, a responsabilidade civil consubstanciada no dever de indenizar é oriunda do ato ilícito resultante da violação da ordem jurídica, com ofensa ao direito alheio, exigindo-se, necessariamente, a presença dos seguintes pressupostos legais, quais sejam: a ação do agente, o resultado lesivo e o nexo causal entre o ato danoso e o resultado. A culpa, por sua vez, também deve estar presente, caracterizando um elemento nuclear da responsabilidade civil subjetiva.

Quanto ao primeiro elemento, deve haver a noção de voluntariedade, de modo que a conduta pode ser positiva ou negativa. A ação ou a omissão trata-se de aspecto físico da conduta, sendo a vontade o seu aspecto subjetivo, sua carga de energia psíquica que impele o agente. Em outras palavras, é o impulso causal do comportamento humano. Além disso, em regra, a conduta deve ser ilícita, considerando que os casos de indenização por ato lícito são excepcionalíssimos, só tendo lugar nas hipóteses expressamente previstas em lei. Enquanto o dolo se constitui na “vontade consciente de violar direito1”, a culpa em stricto sensu se traduz no comportamento equivocado, açodado, exagerado ou excessivo da pessoa, despido da intenção de lesar ou de violar direito, mas da qual se poderia exigir outro comportamento.

De se ressaltar, ainda, que a violação de um dever jurídico possibilita formular dois juízos de valor. O juízo sobre o caráter antissocial ou socialmente nocivo do ato ou do seu resultado e um juízo de valor sobre a conduta do agente, sendo necessário, sobre este aspecto, que o ato seja imputável ao ofensor, isto é, a quem tenha procedido culposamente2.

Sobre a culpa como pressuposto do dever de indenizar, ensina com maestria Sergio Cavalieri Filho3, verbis:

Não basta a imputabilidade do agente para que o ato lhe possa ser imputado. A responsabilidade subjetiva é assim chamada porque exige, ainda, o elemento culpa. A conduta culposa do agente erige-se, como assinalado, em pressuposto principal da obrigação de indenizar. Importa dizer que nem todo comportamento do agente será apto a gerar o dever de indenizar, mas somente aquele que estiver revestido de certas características previstas na ordem jurídica. A vítima de um dano só poderá pleitear ressarcimento de alguém se conseguir provar que esse alguém agiu com culpa; caso contrário, terá que conformar-se com a sua má sorte e sozinha suportar o prejuízo.

Rui Stoco4, ao seu turno, também assevera:

[...] quando o legislado, na Parte Geral do Código Civil, conceituou o ato ilícito, fê-lo com as seguintes exigências: a existência de uma ação ou omissão voluntária; que essa ação ou omissão tenha sido pratica mediante negligência ou imprudência e que tal comportamento viole o direito preexistente, que quer dizer, que seja contra jus.

Exigiu-se, como se verifica, para que nasça o ato ilícito, além da ofensa ao ordenamento jurídico, que essa conduta tenha ocorrido intencionalmente ou por imprudência ou negligência.

Conclui-se, assim, que não basta a prática de um ato prejudicial aos interesses de outrem, sendo imprescindível a ilicitude, consubstanciada na violação de dever jurídico preexistente.

O nexo de causalidade é o liame que une a conduta humana ao resultado danoso. Trata-se, igualmente, de elemento essencial da responsabilidade civil. Como destaca Sérgio Cavalieri Filho5, “o conceito de nexo causal não é exclusivamente jurídico; decorre primeiramente das leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado”. Por outro lado, não basta que as possibilidades de dano tenham sido acrescidas pelo fato alegado. É necessário ficar suficientemente demonstrado que, sem o fato alegado, o dano não teria ocorrido.

O dano, ao seu turno, é a lesão a um interesse jurídico tutelado, material ou imaterial, este ligado aos direitos da personalidade. Dano possui um sentido de diminuição do patrimônio do ofendido, por ato ou fato estranho à sua vontade, equivalendo à perda ou prejuízo. O dano é elemento fundamental da responsabilidade civil. Conforme ressalta Sérgio Cavalieri Filho6, “sem dano não haverá o que reparar, ainda que a conduta tenha sido culposa ou até dolosa”.

A responsabilidade aquiliana, ademais, rege-se pelo princípio denominado de neminem laedere, segundo o qual a ninguém é facultado causar prejuízo a outrem, extraído do disposto no artigo 186, do Código Civil Brasileiro, o qual trata sobre o ato ilícito, verbis:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Do ato ilícito, deflui o inexorável dever de indenizar, a teor do disposto no artigo 927 do Código Civil, verbis:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Sabe-se, ainda, que a honra deve ser examinada sob dúplice aspecto. O subjetivo é constituído pelo juízo que cada indivíduo faz de si próprio, ou seja, o sentimento de seu próprio valor social. O aspecto objetivo, por sua vez, é representado pela consideração que cada indivíduo tem na comunidade.

Na seara penal, são considerados crimes contra a honra a calúnia (art. 138, CP), a difamação (art. 139, CP) e a injúria (art. 140, CP). A calúnia, por certo, é o mais grave dos crimes contra a honra, pois a imputação falsa versa sobre fato concreto, determinado e criminoso. Aqui, o ofensor, mesmo sabendo ser o ofendido inocente, imputa à vítima um fato definido como criminoso. Diversamente da calúnia, a difamação consiste na imputação de um ato determinado que, sem revestir-se do caráter de delito, significa uma ofensa à...

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