Acórdão nº 50006616720218210107 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 09-05-2022

Data de Julgamento09 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50006616720218210107
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001948699
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000661-67.2021.8.21.0107/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATORA: Desembargadora VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

ADEMAR R.D.S., com 40 anos de idade à época do fato, foi denunciado, na Vara Judicial da Comarca de Jaguari, como incurso nas sanções do artigo 217-A, na forma do artigo 61, inciso II, alíneas “f” e “h”, todos do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

"No dia 13 de setembro de 2021, por volta das 10h45min, na Rua Ipiranga, em via pública, nas proximidades da “Associação Couro Cru”, em Nova Esperança do Sul/RS, o denunciado ADEMAR R.D.S. praticou atos libidinosos diversos da conjunção carnal com menor de quatorze anos de idade, qual seja a vítima H.Q.d.F., criança com apenas 11 (onze) anos de idade à época do fato.

Na ocasião, após forçá-la a entrar em seu veículo, começou o imputado a acariciá-la, momento em que passou as mãos em suas pernas e tentou beijá-la; ato contínuo, no Bairro Vila Nova, após breve parada, logrou a ofendida desvencilhar-se e sair do veículo, pedindo socorro a Marilei Fumaco Carvalho. Acionada a Brigada Militar, repassou-lhes a vitimada as características físicas do agressor, o qual foi localizado próximo à praça central da cidade e preso em flagrante delito.".

O acusado foi preso em flagrante em 13.09.2021, cujo auto foi homologado, oportunidade em que convertida em preventiva, respondendo ao processo segregado (evento 14, DESPADEC1).

A inicial acusatória foi recebida em 06.10.2021 (evento 3, DESPADEC1).

Regularmente processado o feito, sobreveio sentença da lavra da ilustre magistrada, Dra. Ana Paula da Silva Tolfo, condenando o denunciado como incurso nas sanções do artigo 217-A, caput, do Código Penal, à pena de 08 (oito) anos de reclusão, em regime inicial fechado.

A pena privativa de liberdade foi assim fixada: pena-base no mínimo legal, definitivizada neste quantum diante da ausência de causas modificadoras.

A sentença foi publicada em 31.01.2022 (evento 94, SENT1).

Inconformada, a Defensoria Pública interpôs recurso de apelação, buscando a absolvição, diante da insuficiência de provas. Subsidiariamente, pugnou pela desclassificação do delito para importunação sexual, prevista no artigo 215-A, do Código Penal. Caso mantida a condenação pelo delito de estupro, pleiteou o reconhecimento da minorante da tentativa. Postulou o provimento do apelo.

O Ministério Público ofereceu contrarrazões, propugnando pelo desprovimento do apelo (evento 115, CONTRAZAP1).

Neste grau de jurisdição, o nobre Procurador de Justiça, Dr. Renato Vinhas Velasques, opinou pelo parcial provimento do recurso de apelação, desclassificando a conduta praticada pelo recorrente para o delito de importunação sexual, previsto no artigo 215-A do Código Penal (evento 8, PARECER1).

Vieram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas, trata-se de recurso de apelação interposto pela douta defesa técnica de ADEMAR R.D.S, inconformada com a decisão que o condenou pela prática do crime previsto no artigo 217-A do Código Penal.

Deve ser parcialmente provido o pleito recursal, desclassificando-se a conduta praticada pelo recorrente para o delito de importunação sexual.

A prova constante nos autos é plenamente suficiente para ensejar a condenação do recorrente, porém, por crime diverso.

Neste ponto, tem-se que a questão submetida à análise deste Colegiado restou devidamente analisada pelo eminente Promotor de Justiça, Dr. Ricardo Vinhas Velasques, em seu parecer (evento 89), a cujos fundamentos me reporto e passo a transcrever para evitar desnecessária tautologia:

(...)

Em Juízo, a vítima, Helena Q.d.F. (Evento 49), apenas 11 anos de idade, ouvida mediante a técnica de "depoimento sem dano", declarou, em suma, que acordou pela manhã e saiu de casa para ir comprar um pote e uma garrafinha e, quando estava indo, um homem saiu do carro e falou “tu quer carona?”, tendo respondido que não queria. Afirmou que, então, o homem continuou seguindo de carro, ele parou, veio para o meu lado e me puxou e colocou dentro do carro. Em sequência, disse a vítima "Aí eu fiquei meio assustada, fiquei paralisada, aí quando ele parou o carro eu tentei abrir a porta e saí correndo, torci meu pé e pedi socorro. Aí como ali perto onde eu saí correndo morava minha amiga eu fui até ali, aí a hora que eu falei o que tinha acontecido ela me levou para o conselho tutelar e uns minutos depois o cara chegou e se entregou, começou a chorar e disse que não queria fazer isso. Aí a hora que ele chegou eu fiquei com mais medo ainda, aí o conselho queria chamar minha avó que era minha responsável." Que o réu lhe puxou pelo pulso, no banco da frente. Que tocou nas pernas, pegou, puxou e tentou dar um beijo. Que bateu nele com um guarda-chuva.

A vítima, portanto, com suas palavras, confirmou a ocorrência dos fatos em Juízo, quais sejam a prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal pelo acusado, bem demonstrando o trauma que o fato delituoso lhe causou.

MARILEI F.C., mãe da amiga de Helena, ao ser ouvida em Juízo (Evento 50, vídeo7), em resumo, declarou que Helena chegou chorando em sua casa, desesperada, quase desmaiando, dizendo que um homem "me botou a força para dentro do carro e me passou as mãos." Afirma que, então, levou Helena para o Conselho Tutelar local, e quando estava chegando até a sede do Conselho, o réu Ademar chegou e entrou atrás. Ao chegar, a conselheira perguntou o que ele estava fazendo ali e ele respondeu "que não tinha feito nada, que apenas tinha passado as mãos nas mãos delas e nas pernas dela”. Que quando Ademar chegou no conselho, este disse que "ela olhou para ele rindo e ele achou que ela tava tenteando ele". Mencionou a testemunha, ainda, que se ele quisesse apenas dar carona, ele teria apenas conduzido até à praça, mas ele estava conduzindo ela para a Vila Nova.

NEIVA D.R., avó de Helena, relatou, em suma, que Helena estava se deslocando na manhã dos fatos até a loja "multi 10" para adquirir uma garrafinha. Disse que a vítima relatou que quando ele a colocou dentro do carro foi em direção ao bairro da Vila Nova. Que no momento em que ele passou a mão na perna dela e tentou beijar ela conseguiu sair. Que a Vila Nova fica em direção contrária a Multi10. Afirmou que após os fatos a vítima sentia muito medo de sair de casa, ficava só trancada dentro do quarto, chorando e sem comer. Que Helena estava apresentando sintomas de depressão, levada ao médico, restou comprovado o diagnóstico de depressão.

RONALDO FUMACO REOLON, policial militar lotado em Nova Esperança do Sul, afirmou que, quanto à ocorrência que envolveu as partes, recebeu um telefonema da conselheira tutelar que estava de plantão informando que uma menor de idade havia sido vítima de estupro, estão saíram para realizar as buscas dos suspeitos, sendo que ADEMAR se encontrava na frente do quartel, onde foi realizada a prisão em flagrante. Já na delegacia, ADEMAR, informou que havia entendido errado a situação, pois entendeu que a menina estava "dando bola para ele" e por isso deu carona e ocorreu a situação. Quando à vítima Helena, estava chorando bastante e dizendo estar com medo do acusado.

SUELEN SANTOS DA SILVA REOLON, policial militar lotada em Nova Esperança do Sul, relatou que estava de serviço e foram acionados pelo Conselho Tutelar, tomando conhecimento da ocorrência e do suspeito, quando foram sair em busca de ADEMAR esse estava na frente da delegacia, foi dada voz de prisão e encaminhado para os procedimentos de praxe. Que a vítima se encontrava nervosa, com bastante medo e chorando. Que ADEMAR, afirmou ter entendido tudo errado, pelo fato de que a menina passava e olhava para ele na rua.

As testemunhas de defesa, BRUNA MINHOS BITTENCOURT, BRUNO SANTOS DE ALMEIDA, CANDIDA LORENI DE LIMA NORONHA e SIMONE MINHOS BITTENCOURT (EVENTO 50), limitaram-se a abonar a conduta do acusado.

Interrogado, o réu ADEMAR R.D.S. (EVENTO 50, vídeo1) negou os fatos. Afirmou que havia ido comprar alface "e aí essa Helena vinha vindo na rua, eu ofereci carona, ela aceitou, levei até o centro, dei a carona porque o tempo tava pra chuva. Que só conheci Helena de vista na rua." (...) Nota-se da prova contida no feito que o recorrente teria tocado nas perna da ofendida e tentado dar-lhe um beijo.

Assim, embora reprovável a conduta do réu, tal fato não é o suficiente para que ele reste condenado pela prática do crime e estupro de vulnerável, devendo ser desclassificado para o delito de importunação sexual. Acerca da possibilidade da desclassificação, o Superior Tribunal de Justiça, em 06/12/2021 afetou os Recursos Especiais nºs 1.959.697/SC, 1.957.637/MG, 1.958.862/MG e 1.954.997/SC, como paradigma da controvérsia repetitiva descrita no Tema 1.1211 , no qual busca definir a “possibilidade ou não de se desclassificar o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP) para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP).”

Diante do exposto, o Ministério Público manifesta-se pelo conhecimento e parcial provimento do recurso de apelação em debate, desclassificando a conduta praticada pelo recorrente para o delito de importunação sexual, previsto no artigo 215-A do Código Penal.

Pelos depoimentos que aportaram os autos, restou incontroverso que o acusado estava em seu automóvel quando ofereceu carona para a menor.

A vítima, Helena, contou que um homem lhe ofereceu carona. Inicialmente, não aceitou, porém, ele continuou lhe seguindo, a pegou pelo pulso e a colocou dentro do carro, onde passou a mão nas suas pernas e tentou dar-lhe um beijo, oportunidade em que conseguiu se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT