Acórdão nº 50006812220168210014 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50006812220168210014
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001784201
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000681-22.2016.8.21.0014/RS

TIPO DE AÇÃO: Pagamento

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: MTK EQUIPAMENTOS INDUSTRIAIS LTDA (RÉU)

APELADO: BANCO DO BRASIL S/A (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por MTK EQUIPAMENTOS INDUSTRIAIS LTDA em face da sentença prolatada nos autos da ação monitória em que contende com BANCO DO BRASIL S/A. Constou na sentença apelada (Evento 3, PROCJUDIC4, p. 49-50, e PROCUJUDIC5, p. 01):

“[...] Diante do exposto, REJEITO os embargos monitórios para, com fundamento no art. 702, § 8º, do Código de Processo Civil, DETERMINAR O PROSSEGUIMENTO da ação pela importância de R$ 739.097,47, valor atualizado até a data de 30.09.16, conforme cálculo de fl. 33.

Sucumbente, condeno a parte embargante ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios ao patrono da parte embargada, que vão fixados em 10% do valor atualizado da dívida, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.”

Em suas razões recursais, a parte apelante argui, preliminarmente, a nulidade da sentença, pois não teria analisado os termos e argumentos apresentados, não levou em consideração a memória de cálculo, não deferiu as provas solicitadas e não foi fundamentada. No mérito, pede a aplicação do CDC ao caso concreto. Alega que o réu aumentou as taxas periodicamente de forma ilegal e unilateral, quase dobrando o percentual cobrado. Menciona a nulidade de pelo direito do § 7º da cláusula 9ª do contrato, dada abusividade e ilegalidade da alteração unilateral do percentual de juros. Pleiteia o provimento do presente recurso a fim de anular a sentença ou, subsidiariamente, o afastamento do disposto no do § 7º da cláusula 9ª do contrato em questão. Requer a condenação da parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Pede o provimento do recurso (Evento 3, PROCJUDIC5, p. 06-15).

Foram apresentadas contrarrazões no Evento 3, PROCJUDIC5, p. 21-31.

É o relatório.

VOTO

A presente apelação, interposta no Evento 3, PROCJUDIC5, p. 6-15, é tempestiva, pois a NE de intimação da sentença recorrida foi disponibilizada em 04/09/2020 (Evento 3, PROCJUDIC5, p. 3-4), sendo que o recurso foi interposto no dia 25/09/2020 (Evento 3, PROCJUDIC5, p. 07). Além disso, a parte apelante comprovou o recolhimento do preparo (Evento 3, PROCJUDIC5, p. 16-17).

Dessa forma, considerando que é própria e tempestiva, recebo a apelação, a qual passo a examinar.

Inicialmente, saliento que é objeto da ação monitória o Contrato de Abertura de Crédito BB Giro Recebíveis nº 076.406.624 (Evento 3, PROCJUDIC1, p. 21/42), firmado em 05/12/2012, no limite de R$700.000,00, com vencimento final em 30/11/2013. Foram previstos juros de 14,925% ao ano. Em caso de inadimplemento, há previsão de cobrança de comissão de permanência, em substituição aos encargos de normalidade (cláusula décima).

1. PRELIMINAR RECURSAL. NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E OMISSÃO. INOCORRÊNCIA.

A parte apelante argui a nulidade da sentença, na medida em que o juízo singular teria deixado de fundamentar a sua decisão, bem como, não teria analisado os termos e argumentos apresentados nos embargos à monitoria, deixando de considerar a memória de cálculo apresentada.

De fato, a Constituição Federal exige que todas as decisões dos órgãos do Poder Judiciário sejam fundamentadas. Tal previsão está preconizada no inciso IX do art. 93:

"Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade..."

Enrico Tullio Liebman Libmann assim leciona acerca do tema:

"Em um estado de direito, tem-se como exigência fundamental que os casos submetidos a Juízo sejam julgados com base em fatos provados e com aplicação imparcial do direito vigente; e, para que se possa controlar se as coisas caminharam efetivamente dessa forma, é necessário que o juiz exponha qual o caminho lógico que percorreu para chegar à decisão a que chegou. Só assim a motivação poderá ser uma garantia contra o arbítrio. Seria de todo desprovida de interesse a circunstância de o juiz sair à busca de outras explicações que não essa, ainda que eventualmente convincente."1

Trago à colação precedente desta Corte, de minha relatoria, no mesmo sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. NULIDADE. OCORRÊNCIA. A decisão agravada, ao homologar o cálculo pericial, deixou de aplicar qualquer fundamentação, ofendendo ao disposto nos artigos 489, §1º, do CPC/2016 e 93, IX, da Constituição Federal. Nulidade da decisão agravada. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. DECISÃO DESCONSTITUÍDA.” (Agravo de Instrumento Nº 70069591477, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fernando Flores Cabral Junior, Julgado em 30/11/2016)

No caso em exame, o juízo a quo fundamentou adequadamente a sentença ao rejeitar os embargos à monitória, por entender que a revisão de cláusulas contratuais deve ser postulada em ação autônoma e que devem ser observados os encargos pactuados entre as partes.

Destarte, a sentença está de acordo com o artigo 489, §1º, do Código de Processo Civil que assim dispõe:

“Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

(...)

§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

(...)”

Assim já decidiu esta Câmara em casos semelhantes:

APELAÇÕES CÍVEIS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE CRÉDITO PESSOAL. I - APELAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - Preliminar de nulidade de sentença. A alegação de nulidade de sentença não merece acolhimento, haja vista que a decisão foi devidamente motivada, atendendo ao disposto nos artigos 93, IX, da Constituição Federal, e 489, § , do CPC. Preliminar rejeitada. II - APELAÇÃO DA PARTE AUTORA - Mora. Diante da ocorrência de abusividades nos contratos revisando no período da normalidade (no caso, juros remuneratórios), resta descaracterizada a mora da parte autora até o recálculo do débito. Provido no tópico. - Repetição de indébito/compensação de valores. Cabimento da repetição do indébito, na forma simples, e compensação de valores diante das modificações impostas na revisão do contrato. Provido no ponto. - Honorários advocatícios. Não comporta majoração a verba honorária fixada na sentença, pois guarda proporcionalidade com o trabalho realizado pelo profissional, levando-se em conta, ainda, as variantes do art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC e os parâmetros adotados pela Câmara em hipóteses semelhantes. Desprovido no particular. III - PONTO COMUM DOS RECURSOS - Juros remuneratórios. A aplicação de taxa substancialmente superior à média de mercado divulgada pelo BACEN (30% acima, conforme entendimento desta Câmara) é abusiva, sendo passível de limitação à referida taxa média. Na hipótese, há abusividade dos juros pactuados, devendo ser limitados à taxa média de mercado para as operações de crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dividas, sem o acréscimo disposto na sentença. Apelo da parte autora provido e desprovido o apelo da instituição financeira no ponto. APELAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DESPROVIDA, REJEITADA A PRELIMINAR, E APELO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 50026520720198214001, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cairo Roberto Rodrigues Madruga, Julgado em: 29-09-2021) (grifei)

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURIDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. A DECISÃO QUE ATENDENDO AO PRINCÍPIO DA PERSUASÃO RACIONAL ENFRENTA E DECIDE COM RAZÕES LÓGICO-JURÍDICAS A QUESTÃO POSTA EM JUÍZO NÃO PADECE DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AO DISPOSTO NO ART. 489, CPC. PRELIMINAR AFASTADA. JUROS REMUNERATÓRIOS. ADOÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN PARA AFERIÇÃO DO ALEGADO EXCESSO. CRITÉRIO JURISPRUDENCIAL PACÍFICO E PREVALENTE. EXCESSO CONFIGURADO. LIMITAÇÃO DEFERIDA. PRETENSÃO PARA UTILIZAÇÃO DE TAXA DE JUROS DIVERSA, EM RAZÃO DO SEGMENTO DE MERCADO, NÃO MERECE GUARIDA POR MANIFESTA AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL OU ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DOMINANTE CAPAZ DE AUTORIZAR A PRETENSA DISTINÇÃO. ADEMAIS,COMO FORNECEDOR, PARTE HIPERSSUFICIENTE DA RELAÇÃO JURÍDICA, INEGÁVEL SEU PRÉVIO CONHECIMENTO DOS RISCOS DO NEGÓCIO, ESSES JÁ EXISTENTES POR OCASIÃO DA CONTRATAÇÃO, JUSTAMENTE EM RAZÃO DO SEGMENTO QUE ATUA, NÃO PODENDO TAL FATO SER TIDO COMO EXCEÇÃO...

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