Acórdão nº 50006859620218210042 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 01-03-2023

Data de Julgamento01 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50006859620218210042
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003278173
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000685-96.2021.8.21.0042/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

APELANTE: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

APELADO: ENIO KNABACH (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por ENIO KNABACH e COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE-D contra a sentença (evento 52, DOC1) que, nos autos desta ação indenizatória por danos materiais movida pelo primeiro em face da segunda, julgou parcialmente procedente a demanda.

Adoto o relatório da r. sentença, que bem narrou o presente caso:

ENIO KNABACH ingressou com a presente ação indenizatória em face de COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA – CEEE-D, ambos qualificados.

Em síntese, alegou que é pequeno agricultor, desenvolvendo suas atividades no Cerro da Boneca, 1° distrito deste Município, sendo que a sua renda advém do plantio de fumo, com a secagem do produto sendo feita em estufas elétricas. Afirmou que, em 07/02/2021, enquanto realizava a secagem de 800 kg de fumo, houve interrupção do fornecimento de energia das 08 horas às 02 horas do dia 08/02/2021, o que veio a se repetir no dia 12/02/2021, por volta das 18 horas, quando estava a secar 1.800 kg de fumo, retornando a energia elétrica no dia 13/02/2021, às 18h30min, razão pela qual não foi possível concluir os processos de secagem, ocasionando a danificação dos produtos e um prejuízo de R$ 17.224,10. Destacou que a interrupção na fase final do processo de secagem, devido a não evaporação correta da umidade, ocasionou uma alteração na qualidade do produto, o qual restou ardido, manchado e escurecido. Ao final, requereu a condenação da demandada ao pagamento de indenização pelos danos materiais experimentados. Anexou documentos.

Recebida a petição inicial e concedido o benefício da Justiça Gratuita ao autor (evento 3, DESPADEC1).

Citada (evento 08), a requerida apresentou contestação ao evento 12, CONT1, aduzindo, em suma, o cerceamento de defesa, em razão da ausência de pedido administrativo. Sustentou a ocorrência de uma das excludentes do dever de indenizar, qual seja, a força maior, em razão dos temporais que assolaram o Estado no período, com mais de 440 mil unidades atingidas. Sinalizou a inexistência de serviço de distribuição de energia elétrica sem interrupção. Arguiu a ocorrência de culpa exclusiva do autor, ou, no máximo, culpa concorrente, haja vista ter agido com negligência ao não possuir gerador de energia. Verbalizou a não comprovação de danos pela parte autora. Enfatizou a formação da indústria da indenização no setor fumageiro que envida o enriquecimento ilícito. Ao final, requereu a improcedência da demanda. Juntou documentos.

Réplica apresentada ao evento 15, RÉPLICA1.

Foi aberta a instrução (evento 17, DESPADEC1).

O autor requereu a produção de prova testemunhal (evento 22, TESTEMUNHAS1).

A requerida, ao seu turno, postulou a exibição das notas fiscais dos últimos dois anos para a comprovação da produção habitual e o prejuízo sofrido, a juntada de documento que demonstrasse a recusa da fumageira em receber a carga supostamente danificada, e/ou recebendo-a, com classificação inferior a esperada e a expedição de ofício à mesma associação para verificar se houve pagamento de indenização ao autor (evento 24, PET1).

Foram deferidos os pedidos de prova (evento 26, DESPADEC1).

O requerente juntou novas notas fiscais ao feito e informou que vendeu o fumo deteriorado para picaretas (evento 32, PET1 e evento 32, NFISCAL2).

A requerida se manifestou acerca das notas fiscais juntadas (evento 36, PET1).

Em audiência, foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo autor (evento 40, TERMOAUD1).

Memoriais pela requerida (evento 42, MEMORIAIS1).

A Afubra informou que o requerente não inscreveu a safra 2020/2021 no seu Sistema Mutualista (evento 43, RESPOSTA2).

Memoriais pelo autor (evento 49, MEMORIAIS1).

A CEEE apresentou nova manifestação ao evento 50, PET1.

Vieram os autos conclusos para sentença.

E o dispositivo sentencial foi exarado nos seguintes termos:

Ante o exposto, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por ENIO KNABACH em face de COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA – CEEE-D, com o fim de CONDENAR a demandada a pagar ao autor, a título de indenização pelos danos materiais experimentados, a quantia de R$ 1.831,12, com correção monetária pelo IGP-M, a contar de 07/04/2021 (data do laudo técnico), acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, a contar da citação.

Diante da parcial sucumbência, condeno o autor ao pagamento de 83% das custas processuais, ficando os 17% restantes a cargo da demandada.

Condeno o autor ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos da parte adversa, estes fixados em 15% sobre o valor atualizado da causa, em atenção aos vetores do § 2°, do artigo 85, do Código de Processo Civil.

Condeno a demandada, por sua vez, ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono do autor no patamar de 15% do valor da condenação.

Resta vedada a compensação, nos termos do artigo 85, § 14, do CPC.

A exigibilidade de tais verbas, em relação ao autor, resta suspensa, em razão da gratuidade judiciária deferida ao evento 3, DESPADEC1, com fundamento no artigo 98, § 3°, do CPC.

Em suas razões recursais (evento 57, DOC2), a parte autora destaca que não houve insurgência da ré, em contestação, quanto às datas e aos horários de início e fim das interrupções de energia elétrica. Aduz que a mera juntada de telas sistêmicas por parte da demandada não tem condão de elidir as suas alegações, que foram corroboradas pela prova testemunhal. Nesse norte, sustenta estarem comprovadas as duas interrupções do fornecimento de energia elétrica, que perduraram por período superior a 24 horas. Quanto à ocorrência de força maior, alega que a simples juntada de informações contidas nos sistemas internos da demandada acerca das condições climáticas não se mostram suficientes para atestar a excludente de responsabilidade, especialmente porque não trazem nenhuma prova de que tenha ocorrido evento severo ou extraordinário na região. Destaca, ainda, não haver nos documentos trazidos pela ré qualquer comprovação de que tenha sido declarado estado de emergência na localidade em questão, não havendo fato impeditivo do acesso das equipes da demandada para que procedessem o conserto da rede elétrica em tempo razoável. Sustenta que a demandada poderia evitar os prejuízos em questão, caso investisse na manutenção constante da sua rede elétrica, bem como na poda de árvores próximas às linhas de transmissão e na troca de antigos postes de madeira. Por fim, destaca que o religamento da energia deu-se em prazo superior ao estipulado pela ANEEL, eis que a parte autora restou sem energia por mais de 24 horas em cada um dos incidentes de interrupção do serviço. Requer o provimento do recurso.

Por sua vez, a parte ré, em suas razões de apelação (evento 61, DOC1), defende que os autores permaneceram por curto período sem energia, de modo que o prazo para religação estabelecido pela ANEEL restou atendido, não havendo falar em dever de indenizar. Salienta que a parte autora não trouxe ao feito documentos que comprovassem a recusa da empresa fumageira em receber o produto, de modo que os valores apontados na exordial só podem ser tidos como estimativos. Destaca, ainda, que o laudo trazido pela parte autora não pode, por si só, ensejar o deferimento do pleito indenizatório, consistindo em prova unilateral. Aduz que a parte autora, ao não comunicar administrativamente o dano que alega ter experimentado, agiu com abuso de direito, violando os deveres de boa-fé e cooperação. Aduz a ocorrência de culpa exclusiva da parte autora, eis que se absteve de adotar medidas capazes de evitar os prejuízos que alega ter experimentado, vez que a suspensão no fornecimento de energia constitui fato previsível. Nesse norte, destaca que os prejuízos alegados poderiam ser facilmente evitados, ou, ao menos, mitigados, pela utilização de geradores de eletricidade capazes de manter operante a estufa durante o período necessário para o restabelecimento do fornecimento pela concessionária. Sucessivamente, postula seja reconhecida a culpa concorrente da parte autora, determinando-se a reparação dos danos na ordem de 1/3 para a concessionária ré e 2/3 para a parte autora. Aduz a não caracterização de relação de consumo, não sendo aplicáveis as disposições do Código de Defesa do Consumidor. Destaca que não estão presentes os pressupostos para a inversão do ônus da prova. Em caso de manutenção da condenação, requer que seja aplicado o índice IPCA-E, a contar da data da confecção do laudo que apontou prejuízos, e, a partir da citação, a taxa SELIC quanto à atualização monetária. Pugna pela pugna pela redução dos honorários sucumbenciais fixados em 15%. Requer o provimento do recurso.

Apresentadas as contrarrazões por ambas as partes (evento 30, CONTRAZ1 e evento 31, CONTRAZAP1), vieram os autos conclusos para julgamento.

Tendo em vista a adoção do sistema informatizado, os procedimentos previstos nos artigos 931, 932 e 934 do Código de Processo Civil foram simplificados, porém cumpridos na sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Os recursos apresentados devem ser conhecidos, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade, sendo tempestivos e estando comprovado o preparo do recurso da parte ré, bem como dispensado o preparo do recurso da parte autora pela concessão da gratuidade da justiça, passando a analisá-los conjuntamente.

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