Acórdão nº 50007219020198210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50007219020198210016
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003307198
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000721-90.2019.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito de Vizinhança

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: DARNEZ BURTET GHISLENI (RÉU)

APELADO: MARCIA REGINA CALVAITIS PADILHA (AUTOR)

RELATÓRIO

DARNEZ BURTET GHISLENI apela da sentença que julgou a ação de obrigação de fazer c/c indenização que lhe move MÁRCIA REGINA CALVAITIS PADILHA, assim lavrada:

Trata-se de ação de OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C TUTELA DE URGÊNCIA ajuizada por MÁRCIA REGINA CALVAITIS PADILHA contra DARNEZ BURTET GHISLENI, alegando que está infiltrando água em uma das suas salas comerciais em decorrência da atividade de lavagem realizada pelo réu no imóvel lindeiro. Disse que após acessar o terreno ocupado pelo requerido, verificou a existência de um problema ambiental, e que a origem dos problemas deu-se em decorrência da lavagem dos veículos. Acrescentou que conforme laudo técnico realizado, a parede do imóvel da autora está sendo usada como muro de divisa pelo réu, como contenção para o aterramento, criando carga não considerada quando da execução da parede. Discorreu acerca dos danos materiais, já tendo gasto R$4.134,72 na tentativa de resolver a infiltração, e lucros cessantes, em razão da desocupação do imóvel pela inquilina em 10/08/2019, que pagava R$3.226,00 mensais. Requereu, liminarmente, que fosse determinado ao requerido que adequasse o sistema de drenagem e aterro às normas de engenharia civil e ambiental, bem como realizasse obras necessárias para suportar a carga do aterro que realizou, sem escorar na parede do imóvel da autora, realizando ainda a correta contenção do aterro, na estrutura e realizando a correta impermeabilização e drenagem das águas oriundas da lavagem de veículos, e ao final, postulou a procedência da ação, com a confirmação da liminar, e a condenação do réu a indenizar-lhe os danos materiais já suportados, R$4.134,72, e os que vier a suportar, e lucros cessantes, no valor mensal de R$ 3.226,00, desde 10/08/2019. Juntou documentos.

A autora pagou as custas (evento 02).

Foi indeferida a tutela de urgência e remetido o feito ao CEJUSC para designação de audiência conciliatória (evento 05).

Designada audiência conciliatória, foi cancelada em razão do risco de propagação do novo coronavírus (evento 43).

Citado, o requerido contestou (evento 52), dizendo que a lavagem não estava mais em funcionamento e que os problemas de infiltração ocorriam apenas em dias de chuva. Disse que contratou uma engenheira, a qual elaborou laudo técnico e constatou que existia um cano de PVC que saía do imóvel da autora e coletava as águas da chuva, e que a infiltração poderia ser em razão deste cano. Referiu que no seu imóvel nunca foi realizada qualquer movimentação da terra. Postulou a improcedência dos pedidos. Juntou documentos.

Houve réplica (evento 56).

Remetido o feito ao CEJUSC e tentada a conciliação, restou inexitosa (evento 71).

Instadas acerca das provas que pretendiam produzir (evento 75), a autora postulou prova pericial e testemunhal (evento 80), e o réu arrolou testemunhas (evento 83).

Foi deferida a prova pericial (evento 85) e as partes apresentaram seus quesitos (eventos 89 e 90).

Sobreveio laudo pericial (evento 111), do qual se manifestaram as partes.

Com vista, o Ministério Público disse não intervir no feito (evento 123).

Foi deferida a prova testemunhal.

Tentada a conciliação, restou exitosa em parte, comprometendo-se o réu a retirar a terra que encostou na parede do imóvel da autora e construir muro de contenção, com a devida impermeabilização, o que foi homologado. As partes desistiram do depoimento pessoal uma da outra. Durante a instrução foram ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes. O réu desistiu da oitiva das testemunhas Izaias e Mauri, o que foi homologado ante a concordância da autora. Foi deferido prazo para juntada de documentos (evento 143).

As partes juntaram documentos (eventos 146 e 147) e posteriormente, apresentaram memoriais.

O réu informou o cumprimento do acordo parcial (evento 154).

A parte autora postulou o julgamento.

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório.

Passo a decidir.

No que tange aos pedidos referentes à obrigação de fazer, houve acordo entre as partes, restando pendentes os pedidos indenizatórios, referentes aos danos materiais de R$4.134,72, e os que vier a suportar, e lucros cessantes, no valor mensal de R$ 3.226,00, desde 10/08/2019.

Procedem tais pleitos, pois comprovado que os danos dizem respeito a reparos feitos pela autora em seu imóvel, em decorrência de infiltração causada pelo imóvel do réu, lindeiro àquele, assim como os lucros cessantes, já que a locatária desocupou o imóvel em razão dos problemas causados pela referida infiltração.

Conforme artigo 186 e 927 do Código Civil Brasileiro:

Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927 - Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

De acordo com o laudo pericial (evento 111), a infiltração ocorrida no imóvel da autora tem origem no imóvel do réu, sendo irrelevante o ano em que a lavagem passou a funcionar, pois constatada a origem no imóvel do réu, e não na lavagem propriamente dita.

O proprietário da lavagem instalada no imóvel do réu, Pedro Mello de Oliveira, disse que iniciou com a lavagem em 2007 e saiu em 2019, mas que nesse período não fez nenhuma obra no local, e que quando locou o imóvel os banheiros já estavam lá. Disse que não foi feito aterramento. Afirmou que após sair da lavagem, outra pessoa ficou no local. Disse que foram colocadas duas caixas, uma para receber água e outra para largar os rejeitos de lavagem. Referiu que a água do banheiro ia para um sumidouro. Afirmou que o nível do terreno sempre foi o mesmo e que a autora nunca fez nenhuma impermeabilização na parede. O cano que coletava água do terreno da autora foi fechado por outro vizinho e a partir disso, começou a alagar.

A testemunha Jose Crippa disse que soube dos problemas com uma das salas que confrontavam com o imóvel do réu. Disse que no seu conhecimento como arquiteto, a infiltração não se dá de cima para baixo e se existe infiltração ali, é por que o alicerce da parede não possui um isolamento adequado e não por contato com a parede do vizinho. Afirmou que a autora deveria ter feito drenagem na parte de baixo do imóvel quando realizou a reforma e que a lona que foi colocada possui durabilidade muito reduzida. Teoricamente, referiu que a lavagem de carros precisa de projeto de drenagem específico, o que não foi realizado no presente caso, pois o laudo não mencionava qualquer impermeabilização feita no local da sala. Afirmou que as tomadas podem ser um canal que a água encontrou para sair.

Não obstante tais relatos, a perita concluiu que a infiltração no imóvel da autora teve origem no imóvel do réu, impondo-se que seja acolhida a perícia.

Bastaria, em verdade, ver as fotos acostadas à inicial (evento 1 foto 35, onde se vê atividade com água nas proximidades da divisa, sem a devida impermeabilização e estrutura da parede divisória, contra a qual o réu aterrou o imóvel.

Segundo a perita, deve ser corrigido o aterro existente em cima do muro e contra a parede da autora, o qual foi realizado sem impermeabilização e reforço estrutural, podendo afetar a estrutura do imóvel da requerente, bem como a instalação elétrica. Além disso, verificou-se a inexistência de tubulação de drenagem na extensão da divisa, o que se fazia necessário, em razão do declive existente quanto ao nível dos imóveis.

A alegação do réu de que o imóvel da autora havia se utilizado do muro existente na divisa não restou comprovada, conforme apurado pela perita, estando a parede da autora há 15 cm do referido muro divisório.

O mesmo se aplica quanto ao cano externo verificado pela perita no imóvel da autora, o qual está desativado, segundo a requerente, desde a reforma realizada em 2014, e que não teria como alcançar a sala em que ocorreu a infiltração, que fica há quase 05 metros do referido cano.

Deste modo, deve ser acolhido o pedido de indenização por danos materiais, no valor indicado na inicial, de R$4.134,72, conforme notas fiscais acostadas à inicial (evento 01).

Quanto ao pedido de indenização de outros danos materiais que viesse a suportar, não restaram comprovados nos autos, impondo-se

Os valores devem ser corrigidos pelo IGP-M desde cada pagamento (emissão das notas), e acrescidos de juros de mora a contar da citação.

Também o pedido de indenização por lucros cessantes merece acolhida.

Dispõe o art. 402 do Código Civil:

Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.

No caso, a autora comprovou que uma das salas comerciais edificadas sobre o imóvel estava alugada (evento 01 CONTR5), e foi desocupada pela inquilina em 10/08/2019 em razão dos problemas decorrentes da infiltração (evento 1 FOTO 6, ATA 7), conforme termo de entrega das chaves (evento 1 OUT8).

A locatária Laide Marina Arruda da Silva referiu que em 2017 alugava uma peça da autora, na Rua 13 de maio. Disse que teve infiltração na sala, e que saiu de lá em agosto de 2019 por este motivo. Afirmou que a infiltração ocorria apenas quando chovia e que a autora nunca tentou resolver o problema com ela. Disse que na frente, na calçada, havia um cano que ia até a rua, mas estava obstruído e então a água não saía. Confirmou que a água saía pela tomada da sua cozinha.

No entanto, conforme apurado pela perita, o problema...

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