Acórdão nº 50007220520168210138 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 17-02-2023

Data de Julgamento17 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50007220520168210138
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002685889
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000722-05.2016.8.21.0138/RS

TIPO DE AÇÃO: Vias de fato

RELATORA: Desembargadora FABIANNE BRETON BAISCH

RELATÓRIO

Adoto, de início, o relatório constante na sentença (evento 3 dos autos originários - PROCJUDIC2: fls 29/34), publicada em 16.06.2020, que passo a transcrever:

"(...)

MINISTÉRIO PÚBLICO, no uso de suas atribuições legais, com base no Inquérito Policial n.º 28/2016/152445/A, oriundo da Polícia Civil de Tenente Portela/RS, ofereceu denúncia contra E.S., qualificado na denúncia, dando-o como incurso nas sanções do artigo 21, caput, do Decreto Lei nº 3.688/41, com incidência do artigo 7º, da lei nº 11.340/06, conforme exordial acusatória (fls. 02x-3x).

A denúncia foi recebida à fl. 27.

O réu foi citado pessoalmente (fls. 29/30) e apresentou resposta à acusação por meio da Defensoria Pública (fls. 31/32).

Em audiência de instrução foi realizada a oitiva da vítima, de uma testemunha de acusação e interrogado o réu (mídia de fl. 44).

Em memoriais, o Ministério Público, sustentando comprovadas a autoria e materialidade da contravenção, diante do conjunto probatório colhido e alegando inexistência de causas de exclusão de ilicitude ou isenção de pena, pugnou pela procedência da ação penal, para que seja o réu condenado nos exatos termos da exordial acusatória (fls. 45/48).

A Defesa Técnica, em memoriais, requereu a absolvição do réu pela insuficiência probatória e pela aplicação do princípio da insignificância. Subsidiariamente, em caso de condenação, requereu a fixação da pena no mínimo legal e o reconhecimento da atenuante da confissão (fls. 49/53).

(...)"

Acresço ao relatório que o réu contava 27 anos na data do fato, bem como a íntegra da denúncia, que foi recebida em 30.06.2017:

“(...)

No dia 22 de janeiro de 2016, por volta das 10hs, Avenida Itapiranga, (...) n.º 323, Centro, em Tenente Portela/RS, interior da residência do casal, o denunciado E.S. praticou vias de fato contra a vítima E.S., sua então companheira.

Na ocasião, o denunciado E.S., após discutir com a vítima, entrou em vias de fato com a ofendida, empurrando-a e a jogando ao chão.

A infração penal foi cometida prevalecendo-se das relações domésticas e de coabitação, com violência contra a mulher, nos termos da lei n.º 11.340/06.

(...)"

No ato sentencial, o magistrado singular JULGOU PROCEDENTE A DENÚNCIA para CONDENAR E.S. como incurso nas sanções do art. 21 da Decreto Lei n.º 3.688/41, à pena de 17 DIAS DE PRISÃO SIMPLES (pena-base de 15 dias, agravada em 2 dias, pelo prevalecimento das relações domésticas), no regime inicial ABERTO. Denegada a substituição da corporal por restritiva de direitos. Concedido ao réu o sursis, pelo período de 2 anos, bem como o direito de apelar em liberdade.

Inconformada, a defesa apelou do decisum (evento 3 dos autos originários - PROCJUDIC2: fl. 37).

Em razões, arguiu, preliminarmente, a nulidade do processo, diante da ausência do Ministério Público em audiência de instrução, violado o sistema acusatório. No mérito, sustentando as teses de insuficiência probatória e aplicação do princípio da insignificância, postulou a absolvição do acusado (evento 3 dos autos originários - PROCJUDIC2: fls. 37/48).

Contra-arrazoado o recurso (evento 3 dos autos originários - PROCJUDIC3: fls. 2/12), os autos subiram a esta Corte.

Aqui, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Fábio Costa Pereira, manifestou-se pela rejeição da preliminar e, no mérito, o improvimento do apelo (evento 7).

Os autos foram distribuídos ao ilustre Juiz Convocado Dr. Alexandre Kreutz, que determinou o retorno do feito à origem, para correta intimação do réu sobre a sentença condenatória (evento 9).

Cumprida a diligência (evento 14 dos autos originários).

Em razão do término da convocação do magistrado, os autos foram redistribuídos à minha Relatoria.

Vieram conclusos em 17.11.2022.

Esta Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, tendo sido atendido o disposto no art. 207, II do RITJERGS.

É o relatório.

VOTO

Há questão que deve ser enfrentada por revelar-se prejudicial ao mérito, porque, na sentença, olvidou o magistrado a análise da tese defensiva de nulidade do processo, pela ausência do Ministério Público em audiência de instrução, vertida em sede preliminar, nos memoriais.

Senão, vejamos.

Nos memoriais (evento 3 dos autos originários - PROCJUDIC2: fls. 17/28), a defesa deduziu expressamente, em preliminar, tese de nulidade processual, por ausência do Ministério Público na audiência de instrução.

Ocorre que nenhuma linha da sentença foi dedicada a tal questão.

Com efeito, o magistrado singular ingressou diretamente no exame do mérito, deixando de enfrentar a questão preambular aventada, afirmando a presença da materialidade e da autoria, detalhando a prova oral coligida, consistente nos relatos da vítima, da testemunha e interrogatório do réu, na sequência lançando o dispositivo, passando, depois, à dosimetria da pena e demais provimentos sentenciais.

Reza o inciso IX do art. 93 da CF, in verbis:

“Art. 93.

[...]

IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e advogados, ou somente a estes;“ (grifei)

Do diploma processual penal em vigor, transcrevo a seguinte norma:

“Art. 381. A sentença conterá:

[...]

III – a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;”

É, pois, da Constituição e das leis a necessidade de serem as decisões judiciais fundamentadas.

Em sede doutrinária, colhe-se o seguinte ensinamento do mestre Julio Fabbrini Mirabete (Processo Penal. 6.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 1996. p.441-442):

“Em resumo, a sentença deve ser completa, ou seja, deve o juiz examinar toda a matéria articulada pela acusação e pela defesa. É nula a sentença que deixa de considerar todos os fatos articulados na denúncia contra o réu, pois, nesse caso não haverá, a rigor, sentença com relação ao fato ou fatos não apreciados no decisório, com a conseqüente supressão de um grau de jurisdição na hipótese de recurso (sentença citra-petita). A Superior Instância não pode apreciar originariamente a matéria não enfrentada pelo juiz de 1º grau. Da mesma forma, é eivada de nulidade a sentença que não responde às alegações expedidas pela defesa, seja de mérito, seja de preliminares argüidas oportunamente.”

Da leitura dos fundamentos judiciais, nem mesmo é possível extrair exame implícito da tese de nulidade processual, lembrando que, de qualquer modo, a análise deve ser direta e explícita, refutando-se de modo fundamentado todas as teses defensivas esgrimidas.

Está, pois, eivada de nulidade a sentença que não responde à totalidade das alegações defensivas arguidas tempestivamente, gerando prejuízo à defesa, pelo cerceamento verificado.

Nesse sentido, é a Jurisprudência desta Corte:

APELAÇÃO. FURTO. FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA INSUBSISTENTE. NULIDADE. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. A fundamentação das decisões judiciais é garantia prevista expressamente no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, e tem por finalidade, para além de assegurar a legitimidade das decisões proferidas pelo Poder Judiciário, também assegurar o exercício pleno do direito de defesa, nele considerado o direito ao recurso. Precedentes desta Colenda Câmara. Toda decisão judicial deve observar os limites estabelecidos pela acusação e, também, as teses trabalhadas pela defesa, na resistência apresentada à acusação formulada pelo Estado. A não explicitação dos motivos da decisão, inequivocamente, gera prejuízos aos acusados, tendo em vista que obsta a interposição de um recurso efetivo, com o adequado enfrentamento dos argumentos hostilizados e, por conseguinte, enfraquece o direito ao duplo grau de jurisdição. É justamente nesse ponto que está a evidência do prejuízo, a impor a desconstituição do julgado. No...

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