Acórdão nº 50007353020168210097 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50007353020168210097
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003205276
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000735-30.2016.8.21.0097/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATOR: Desembargador NIWTON CARPES DA SILVA

APELANTE: ICATU SEGUROS S/A (RÉU)

APELADO: CRISTIANE APARECIDA GRANDO CAVAGNOLLI (AUTOR)

APELADO: ALEXANDRE CAVAGNOLLI (AUTOR)

RELATÓRIO

CRISTIANE APARECIDA GRANDO CAVAGNOLLI e CRISTIANE APARECIDA GRANDO CAVAGNOLLI ajuizaram ação de cobrança com indenizatória contra ICATU SEGUROS S/A, alegando, em síntese, que são a viúva e filho, respectivamente, de Moesés Cavagnolli, falecido em 08/05/2013, em razão de um acidente de trânsito. Informaram que o de cujus havia contratado três seguros com a demandada, sendo eles: seguro de vida em grupo, n° 93.103.701 e n°77.000.0520, nº 77.000.090, sendo estes dois últimos seguros de vida prestamistas. Narraram que, entretanto, a requerida se recusou a indenizar o sinistro, ao argumento de que a vítima estava embriagada quando do acidente, negativa que entendem ser ilegal. Discorreram acerca do direito que afirmam lhes assistir. Invocaram as disposições do Código de Defesa do Consumidor. Ao final, postularam a procedência dos pedidos, para condenar a demandada ao pagamento dos valores das apólices, devidamente corrigidos, bem como à indenização pelos danos morais que alegam ter experimentado.

Sobreveio sentença que julgou parcialmente procedente a ação, condenando a parte ré ao pagamento dos valores do seguro de vida SICREDI Seguro Vida Mais Premiada e dos seguros prestamistas (operações de crédito nºs B21630718-8 e B00002754-5, apólice nº 77.000.090 e cheque especial, apólice 77.000.052), a ser devidamente corrigidos e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação. Condenou a requerida ao pagamento de metade das custas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em R$1.500,00 (...), segundo o art. 85, do CPC. Outrossim, condenou a parte autora ao pagamento do restante das custas e honorários advocatícios, fixados também em R$1.500,00 (...), restando suspensa, todavia, a sua exigibilidade em face de litigar sob o pálio da AJG (evento 3, PROCJUDIC7, fls. 19/32).

A parte ré opôs embargos de declaração no evento 3, PROCJUDIC7, fls. 36/45, que restaram desacolhidos no evento 3, PROCJUDIC8, fls. 18/19.

Irresignada, a parte ré apelou no evento 3, PROCJUDIC8, fls. 25/48. Em suas razões recursais, afirmou que o óbito do de cujus tem nexo de causalidade com a sua conduta ao dirigir embriagado. Discorreu acerca do agravamento de risco devido ao alto estado de embriaguez quando da condução do automóvel em questão, alegando que a negativa de pagamento da indenização securitária, na esfera administrativa, não foi baseada somente na cláusula de exclusão de riscos por condução de veículo estando alcoolizado, mas sim no art. 768, do Código Civil. Requereu, por fim, a limitação da condenação ao montante de R$15.609,30 (...), em relação a apólice nº 77.000.090 e R$5.750,000 (...) da apólice nº 77.000.052.

A parte autora apresentou contrarrazões no evento 3, PROCJUDIC9, fls. 19/24.

Os autos vieram-me conclusos em 07/12/2022.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, como visto do sumário relatório, de ação de cobrança de indenização securitária decorrente de contrato de seguro de vida e de seguros prestamistas, julgada parcialmente procedente na origem.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação interpostos.

Antecipo que o recurso não merece provimento.

O caso trazido à baila cinge-se na exclusão ou não da cobertura de seguro de vida e de seguros prestamistas em decorrência de acidente fatal, em que fora constatada como concausa a embriaguez do condutor.

Inicialmente destaca-se que, nos termos do disposto no art. 757, caput, do CCB, pelo contrato de seguro, o segurador se obriga a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Desta forma, os riscos assumidos pelo segurador são exclusivamente os assinalados na apólice, dentro dos limites por ela fixados, não se admitindo a interpretação extensiva, nem analógica.

Ressalte-se que os pressupostos do contrato de seguro são a cobertura de evento futuro e incerto capaz de gerar dano ao segurado, cuja mutualidade está consubstanciada na reparação imediata do prejuízo sofrido, ante a transferência do encargo de suportar este risco para a seguradora. Consideradas estas condições pelo elemento essencial deste tipo de pacto, qual seja, a boa-fé, nos termos do art. 422 do CC caracterizado pela sinceridade e lealdade nas informações prestadas pelas partes e cumprimento das obrigações avençadas.

Saliente-se que a seguradora somente restará desonerada se a condição sinistro não estiver prevista no contrato ou na hipótese de comprovado dolo ou má-fé do segurado para a implementação do risco e obtenção da referida indenização.

No caso em análise não merece guarida a pretensão da seguradora de querer se eximir do dever de indenizar, em razão de o segurado estar conduzindo automóvel embriagado.

Além disso, cumpre colacionar excerto da acertada r. sentença proferida pelo douto magistrado, Dr. ENZO CARLO DI GESU, ad litteram:

Inicialmente destaca-se que, nos termos do disposto no art. 757, caput, do CCB, pelo contrato de seguro, o segurador se obriga a garantir interesse legítimo do segurado, relativo à pessoa ou à coisa, contra riscos predeterminados. Dessa forma, os riscos assumidos pelo segurador são exclusivamente os assinalados na apólice, dentro dos limites por ela fixados, não se admitindo a interpretação extensiva, nem analógica.

Observa-se que o segurado faleceu em 08/05/2013 ( certidão de óbito de fl. 19), em decorrência de "hemorragia interna lesão pulmão e fígado - Poiitraumatismo' proveniente de acidente de trânsito no qual se envolveu. Na situação em evidência, da análise dos autos, denota-se que a embriaguez do segurado é incontroversa, tendo sido comprovada através do exame toxicológico que instruiu a própria inicial (fl. 27), o qual apontou a existência de 34,1 decigramas de álcool etílico por litro de sangue.

Entretanto, embora esteja comprovada a embriaguez do segurado na ocasião do acidente de trânsito que resultou seu óbito, de acordo com a recomendação jurídica contida no Parecer n° 26.522/2007, da Procuradoria Federal junto à SUSEP, cujo teor foi repassado às seguradoras pela Carta Circular SUSEP/DETEC/GAB 08/2007, "é vedada a exclusão de cobertura na hipótese de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados peio segurado em estado de insanidade mentai, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas" nos seguros de pessoas e seguros de danos, in verbis:

Comunicamos que, conforme recomendação jurídica contida no PARECER PF - SUSEP/ COORDENADORIA DE CONSULTAS, ASSUNTOS SOCIETÁRIOS E REGIMES ESPECIAIS - N'’ 26.522/ 2007, da Procuradoria Federal junto à SUSEP, a sociedade seguradora que prevê a exclusão de cobertura na hipótese de "sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelos segurados em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob o efeito de substâncias tóxicas”, deverá promover, de imediato, alterações nas condições gerais de seus produtos, com base nas disposições abaixo:

1) Nos Seguros de Pessoas e Seauros de Danos, é VEDADA A EXCLUSÃO DE COBERTURA na hipótese de "sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas”, (grifei)

Assim, em não se tratando de seguro de veículo, mas sim, de seguro de vida, não há relevância para o pagamento da indenização securitária se o segurado estava ou não sob efeito de álcool ou se a embriaguez foi determinante para a ocorrência do acidente. Nessas circunstâncias, é devido o pagamento da indenização securitária.

É o que também dispõe a Súmula n° 620, do STJ, in verbis:

'A embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida".

Assim sendo, tenho que a seguradora não comprovou o agravamento do risco contratado, ônus que lhe cabia e do qual não se desincumbiu, a teor do que estabelece o art. 373, inciso II, da legislação processual civil.

Portanto, é jurídica e perfeitamente possível a pretensão deduzida na exordial, no que diz respeito à cobrança da indenização securitária, diante do implemento do risco contratado.

Ainda que a causa expressa da negativa de cobertura não tenha sido a embriaguez, mas frise-se que o tema veio aos autos, através da defesa e documentação juntada aos autos, este relator tecerá fundamentação no ponto.

Não tenho dúvida de que o segurado deve suportar os ônus decorrentes de dirigir embriagado ou permitir que terceiro (embriagado ou que se embriague) dirija o automóvel segurado, pois tal praxe ou conduta viola a moralidade e boa-fé contratual, haja vista que os efeitos nocivos do álcool são por todos conhecidos, ainda àqueles que beberam (bebem) poucas quantidades, posto que está comprovado clinicamente que os reflexos, o controle e o equilíbrio são diretamente atingidos pela ingestão alcoólica, sem falar na capacidade de adotar raciocínios e ações rápidas, como as exigíveis muitas vezes no trânsito.

Sublinhe-se que o álcool e a direção são uma combinação extremamente perigosa e sabidamente afeta os reflexos e a coordenação motora do motorista, além de causar dificuldade de concentração. Os efeitos podem até variar em sua intensidade, de acordo com o tipo físico e estatura, mas o fato é que todos são afetados após a ingestão de bebidas alcoólicas. Por isso, a existência de intensa campanha a respeito da não ingestão de álcool antes e durante a condução de veículo automotor, a...

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