Acórdão nº 50007783920198210136 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50007783920198210136
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002297896
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000778-39.2019.8.21.0136/RS

TIPO DE AÇÃO: Sistema Remuneratório e Benefícios

RELATORA: Desembargadora MATILDE CHABAR MAIA

APELANTE: IVANOR JOAO PICCININI (AUTOR)

APELADO: MUNICÍPIO DE COLORADO (RÉU)

RELATÓRIO

IVANOR JOÃO PICCININI interpõe apelação da sentença (evento 1, PROC6, fls. 4-10, autos originários) que julgou improcedentes os pedidos formulados na demanda que move em face do MUNICÍPIO DE COLORADO.

Em suas razões (evento 1, PROC6, fls. 14-22, autos originários), relata que foi eleito Conselheiro Tutelar do Município demandado em 15/03/2012. Alega que o art. 134 do ECA, na redação dada pela Lei nº 12.696, de 25/07/2012, garante aos Conselheiros Tutelares direito a cobertura previdenciária, gozo de férias anuais remuneradas, acrescidas de um terço do valor da remuneração mensal, licença-maternidade, licença-paternidade e gratificação natalina.

Nega seja necessária previsão na legislação municipal para o pagamento das referidas vantagens. Aduz que tal condicionamento afronta a Constituição Federal e o princípio da dignidade da pessoa humana. Acrescenta que o subsídio pago aos Conselheiros Tutelares do Município era inferior ao salário mínimo nacional, afirmando fazer jus ao recebimento dessa diferença.

Menciona que o veículo fornecido pelo Município para ser utilizado nos deslocamentos necessários durante o serviço estava em péssimas condições, bem como que o ente público não disponibilizava pessoal para a manutenção da limpeza da sede do Conselho Tutelar. Sustenta que tais fatos demonstram a ocorrência de dano moral, que deve ser indenizado.

Requer o provimento do recurso.

Contra-arrazoando, o Município pugna pela manutenção da sentença (evento 1, PROC6, fls. 24-40, autos originários).

Nesta instância, o Ministério Público declinou de intervir (evento 7).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

O autor foi eleito Conselheiro Tutelar do Município de Colorado para mandato de 3 anos, de 2012 a 2015 (evento 1, PROC1, fl. 30) e reeleito em 2016 (evento 1, PROC2, fl. 33). Na presente demanda, postula a condenação do ente público ao pagamento de férias não gozadas, terço constitucional, gratificação natalina, vale-alimentação e danos morais.

Primeiramente, cumpre referir que os Conselheiros Tutelares, a despeito de exercerem um munus público, não são servidores públicos e, portanto, não fazem jus aos direitos elencados no artigo 39 da Constituição Federal.

Conforme lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro1, são “particulares em colaboração com o Poder Público” que, sem vínculo empregatício, exercem funções públicas relevantes, tal como se dá com os jurados e os convocados para prestação de serviço militar ou eleitoral.

Já conforme Hely Lopes Meirelles2, poderíamos classificar os Conselheiros Tutelares como agentes públicos, isto é, aqueles que exercem alguma função estatal, da categoria agentes honoríficos, os quais são assim descritos:

Agentes honoríficos: são cidadãos convocados, designados ou nomeados para prestar, transitoriamente, determinados serviços ao Estado, em razão de sua condição cívica, de sua honorabilidade ou de sua notória capacidade profissional mas sem qualquer vínculo empregatício ou estatutário e, normalmente, sem remuneração. Tais serviços constituem o chamado múnus público, ou serviços públicos relevantes, de que são exemplos a função de jurado, de mesário eleitoral, de comissário de menores, de presidente ou membro de comissão de estudo ou de julgamento e outros dessa natureza.
Os agentes honoríficos não são servidores públicos, mas momentaneamente exercem uma função pública (...).
Somente para fins penais é que esses agentes são equiparados a funcionários públicos quanto aos crimes relacionados com o exercício da função, nos expressos termos do art. 327 do CP.

Portanto, os Conselheiros Tutelares não são servidores públicos, mas sim particulares em colaboração com o Poder Público. As vantagens a eles devidas, assim, não encontram assento constitucional ou no Regime Jurídico dos servidores municipais. Há necessidade de uma lei específica prevendo as vantagens dos membros do Conselho Tutelar.

Esse o entendimento que se pode colher do disposto do art. 134 da Lei nº 8.069/90Estatuto da Criança e do Adolescente –, verbis:

Art. 134. Lei municipal ou distrital disporá sobre o local, dia e horário de funcionamento do Conselho Tutelar, inclusive quanto à remuneração dos respectivos membros, aos quais é assegurado o direito a:
I – cobertura previdenciária;
II – gozo de férias anuais remuneradas, acrescidas de 1/3 (um terço) do valor da remuneração mensal;
III – licença-maternidade;
IV – licença-paternidade;
V – gratificação natalina.

Parágrafo único. Constará da lei orçamentária municipal e da do Distrito Federal previsão dos recursos necessários ao funcionamento do Conselho Tutelar e à remuneração e formação continuada dos conselheiros tutelares.

No âmbito do Município de Colorado, a Lei Municipal nº 571/2004 fixou a remuneração dos Conselheiros Tutelares em R$ 250,00, não prevendo o pagamento de férias, terço constitucional, gratificação natalina e vale-alimentação aos Conselheiros Tutelares, vejamos:

Art. 23 – Na qualidade de membro eleito, por mandato, os Conselheiros Tutelares não serão Servidores do Quadro de Cargos do Município, mas terão direito à uma remuneração, fixada por Lei e reajustável na mesma data e nos mesmos índices dos Servidores Municipais.
§ 1º - A remuneração dos Conselheiros Tutelares será de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) mensais.

§ 2º - O Conselheiro Tutelar será exonerado automaticamente ao findar o mandato para o qual foi eleito.

Tais vantagens só foram asseguradas pela Lei Municipal nº 1.168/2015, que, além de alterar o valor da remuneração para R$ 650,00, assim passou a prever:

Art. 49 Os Conselheiros Tutelares receberão, a título de remuneração mensal, o valor de R$ 650,00 (seiscentos e cinqüenta reais) reajustável na mesma data e no mesmo índice dos Servidores Municipais do Quadro Geral de Cargos e Funções do Município.

Art. 50 Ficam assegurados ao Conselheiro Tutelar, ainda, os seguintes direitos:
I - gozo de férias anuais remuneradas, com acréscimo de um terço sobre a remuneração mensal;
II - afastamento por ocasião da licença-maternidade, custeada pelo regime de previdência a que estiver vinculado;
III - licença-paternidade de 5 (cinco)
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