Acórdão nº 50007843520128210025 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 13-12-2022

Data de Julgamento13 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50007843520128210025
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002909802
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000784-35.2012.8.21.0025/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATOR: Juiz de Direito VOLNEI DOS SANTOS COELHO

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra LUÍS HENRIQUE DA SILVA DA ROSA , com 43 anos, como incurso nas sanções do art. 217-A, do Código Penal (duas vezes), pelos seguintes fatos delituosos (abreviações ausentes no original):

FATO 01

No dia 15 de abril de 2012, por volta das 20h, na residência localizada na Rua M.P.G., no 1391, bairro Wilson, em Santana do Livramento-RS, o denunciado L.H.S.R. constrangeu a infante M.E.S.M., que contava 08 anos de idade (certidão de nascimento da fl. 12 do inquérito policial no 025/2.12.0002391-3), a com ele praticar atos libidinosos diversos da conjunção carnal, ao passar suas mãos lascivamente na vagina da vítima.

FATO 02

Na ocasião, o denunciado dirigiu-se à residência de sua sobrinha L.S.R., localizada no endereço supra e, aproveitando-se da circunstância de que esta necessitou sair por alguns instantes, convidou algumas crianças que se encontravam no local para fecharem a casa e brincarem no escuro, desligando, em seguida, todas as luzes da residência e saindo, juntamente com elas, para fora. Logo em seguida, o denunciado convidou a vítima para, juntamente com ele e com a amiga dela, A.L.D.N. (vítima do 2o fato), ingressaram no interior da residência sob o pretexto de mostrar a elas "um boneco de pano, feito com roupas", sendo que, no momento em que entrou na cozinha juntamente com a vítima, aproveitando-se de que estava escuro no local, passou lascivamente as suas mãos na vagina de M.E., tudo como forma de satisfazer seus instintos libidinosos.

A infante, logo em seguida, assustada com a conduta perpetrada pelo réu, saiu correndo para fora de casa.

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar mencionadas no 1o fato da denúncia, o denunciado L.H.S.R. constrangeu a infante A.L.D.N., que contava 07 anos de idade (certidão de nascimento da fl. 14 do inquérito policial no 025/2.12.0002392-1), a com ele praticar atos libidinosos diversos de conjunção carnal, ao passar suas mãos lascivamente na vagina da vítima e beijá-la na face.

Na ocasião, o denunciados dirigiu-se à residência de sua sobrinha L.S.R., localizada no endereço descrito no fato anterior e, aproveitando se da circunstância de que esta necessitou sair por alguns instantes, convidou algumas crianças que se encontravam no local para fecharem a casa e brincarem no escuro, desligando, em seguida, todas as luzes da residência e saindo, juntamente com elas, para fora. Logo em seguida, o denunciado convidou a vítima para, juntamente com ele e com a amiga dela, M.ES.M. (vítima do 1o fato), ingressaram no interior da residência sob o pretexto de mostrar a elas "um boneco de pano, feito com roupas", sendo que, já no interior da residência, pegou a vítima pelos braços e a levou até o quarto de C.S.R. (filha de L.S.R.), momento em que, aproveitando-se de que estava escuro no local, baixou o "short" de A. até a altura dos joelhos, passou lascivamente, com força, as suas mãos na vagina da infante, beijou-a na face e disse que "ela era gostosa e o amor da vida dele", tudo como forma de satisfazer seus instintos libidinosos.

A infante, logo em seguida, assustada com a conduta perpetrada pelo réu, saiu correndo e dirigiu-se até a sua residência, contando imediatamente o ocorrido à sua mãe P.G.G.D.

A denúncia foi recebida em 24.09.2012 (Evento 3 PROCJUDIC2, fl. 12).

O réu foi citado (Evento 3 PROCJUDIC2, fls. 24/25) e apresentou resposta (Evento 3 PROCJUDIC2, fls. 28/34).

Realizada a instrução, foram ouvidas testemunhas, a vítima e interrogado o réu.

Foram apresentados memoriais.

Sobreveio sentença, publicada em 07.05.2020 (Evento 3 – PROCJUDIC6, fls. 23/39) julgando parcialmente procedente a ação penal, para condenar o réu LUÍS HENRIQUE DA SILVA DA ROSA como incurso nas sanções do sanções do art. 217- A, caput, do Código Penal (2º fato), à pena de 08 (oito) anos de reclusão, em regime inicialmente semiaberto, e desclassificando o 1º fato para a contravenção do artigo 65 da LCP, após o que reconheceu a prescrição da pretensão punitiva pela prescrição.

Inconformados apelaram a Defesa e o Ministério Público.

Em suas razões (Evento 3 – PROCJUDIC6 fls. 46/50 e PROCJUDIC7, fls. 01/16 ) a Defesa, requer a absolvição do réu, alegando, em síntese, insuficiência de provas, asseverando as contradições nas declarações das vítimas e testemunhas, bem como no indeferimento de perícias solicitadas, como avaliação psicológica que demonstraria que as acusações são falsas. Alternativamente, postula a desclassificação do delito para contravenção do artigo 65.

Já a Acusação postulou a condenação do réu pelo delito do artigo 217-A, descrito no primeiro fato, por entender estar suficientemente comprovado o estupro, afastando a desclassificação para perturbação da tranquilidade (Evento 3 – PROCJUDIC6, 7 e 8, págs. 248 e 274/92, verso).

Foram apresentadas contrarrazões.

Nesta instância, o Ministério Público opinou pelo desprovimento do apelo defensivo e pelo provimento da apelação do Ministério Público.

É o relatório.

VOTO

A existência dos fatos restou comprovada pelo registro de ocorrência, relatos da vítima, da testemunha, laudos periciais e demais provas acostadas aos autos.

Da mesma forma, nenhuma dúvida quanto à autoria dos delitos, que recai sobre o réu.

Transcrevo o resumo da prova oral contida na sentença e parte de sua fundamentação para melhor elucidar os fatos (abreviações ausentes no original):

1. Quanto ao delito de estupro de vulnerável (art. 217-A, caput, do Código Penal) narrado no primeiro fato da denúncia.

A ocorrência delitiva restou devidamente demonstrada através do registro de ocorrência no 3448/2012 (fls. 07/08), da cópia da certidão de nascimento da ofendida dando conta de que contava com 08 (oito) anos de idade na época do fato (fl. 16), bem como indiretamente pelo restante do conjunto probatório colhido, sendo oportuno ressaltar que tratando-se de imputação de prática de ato libidinoso que não deixa vestígios, como é a hipóteses dos autos, pode ser comprovada por outros meios de prova, sendo desnecessária a prova pericial, senão vejamos.

Por seu turno, a AUTORIA restou suficientemente esclarecida pelo conjunto probatório colhido nos autos, em especial, pela firme e coerente palavra da vítima, a qual, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo, confirmou o abuso cometido pelo acusado de forma detalhada.

Importante salientar que, em se tratando de crimes sexuais, a palavra da vítima é de vital importância, sendo, muitas vezes, a única prova a determinar a condenação do réu, na medida que, pela sua natureza, tais infrações normalmente são cometidas de forma clandestina, longe dos olhos de qualquer testemunha. Assim, em regra, quando o relato do ofendido mostra-se firme e coerente, deve prevalecer no confronto com a versão defensiva.

A vítima M.E.S.M. (fls. 135/138), ao ser ouvida em juízo, quase três anos depois do ocorrido, confirmou que na data descrita na denúncia estava brincando com outras crianças quando o acusado chegou ao local e, então, começou a participar da brincadeira, consistente em ingressar na residência com as luzes apagadas para ver um boneco de pano. Asseverou que ao ingressar no imóvel, acompanhada de A. e do acusado, ocasião na qual este, na cozinha, pegou a sua mão, tendo dito-lhe "me solta”, momento no qual, então, L.H. passou a mão em sua vagina, por sobre a roupa, razão pela qual saiu da residência chorando e contou o ocorrido para C.

Denota-se, portanto, que a vítima, criança com 11 (onze) anos de idade na data da audiência de instrução, relatou de forma segura e coerente o abuso perpetrado pelo acusado.

Importante salientar, ainda, não se logrou evidenciar a presença de quaisquer motivos espúrios para falsa imputação por parte da ofendida.

Outrossim, necessário mencionar que pequenas contradições no depoimento da ofendida em relação a circunstâncias periféricas, por si só, não são suficientes para enfraquecer o valor probatório de sua palavra, haja vista o longo decurso de tempo desde a data do fato.

Tecidas tais considerações entendo que no caso em concreto mostra-se evidente que as declarações da ofendida devem ser valoradas para a formação do convencimento do Julgador segundo o princípio da livre apreciação da prova e cotejadas com o restante dos elementos probatórios produzidos.

A respeito do depoimento da vítima, Guilherme de Souza Nucci refere (Código de Processo Penal Comentado 13a ed. p. 481-482):

"Trata-se de ponto extremamente controverso e delicado na avaliação da prova. Primeiramente, convém mencionar que as declarações do ofendido constituem meio de prova, tanto quanto é o interrogatório do réu, quando este resolve falar ao juiz. Entretanto, não se pode dar o mesmo valor à palavra da vítima, que se costuma conferir ao depoimento de uma testemunha, esta, presumidamente imparcial. Por outro lado é importante destacar que a prática forense nos mostra haver vítimas muito mais desprendidas e imparciais do que as próprias testemunhas, de forma que suas declarações podem se tornar fontes valorosas de prova. (...) Ao magistrado só resta exercitar ao máximo a sua capacidade de observação, a sua sensibilidade para captar verdades e inverdades, a sua particular tendência de ler nas entrelinhas e perceber a realidade na linguagem figurada ou propositadamente distorcida. Acima de tudo não deve o juiz permitir que qualquer forma de preconceito seu interfira na avaliação da palavra da vítima, nem para ser com esta rigoroso demais, nem tampouco para desacreditá-la por completo. (...) Em...

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