Acórdão nº 50007852020128210025 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 09-05-2022

Data de Julgamento09 Maio 2022
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50007852020128210025
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001543569
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000785-20.2012.8.21.0025/RS

TIPO DE AÇÃO: Receptação (art. 180)

RELATOR: Desembargador IVAN LEOMAR BRUXEL

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

MAURO COSTICHI, 39 anos na data dos fatos (DN 02/02/1974), foi denunciado por incurso nos artigos 180, caput, e 311, caput, do Código Penal, e acabou por ser condenado por incurso no artigo 180.

Os fatos, ocorridos em Santana do Livramento/RS, foram assim descritos na denúncia, recebida em 22/11/2013:

FATO 01

No período compreendido entre às 11h do dia 23 de fevereiro de 2012 (documento das fls. 33/34) e às 11h30min do dia 12 de março de 2012, em locais não bem determinados nos autos e na Rua Pedro Comas, nº 138, Vila João Martins, em Santana do Livramento-RS, o denunciado MAURO COSTICHI recebeu e ocultou, em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime, qual seja, a camioneta “NISSAN” modelo D21, de cor prata, placa uruguaia AAF-2146, ano de fabricação/modelo 2005, chassi nº 3N6ED135XZK853336, pertencente a Carlos Sebastian Giampietroa Aldaves (e que deste foi furtada por volta das 11h do dia 23.02.2012, na Rua Camino Molinos de Raffo, bairro Sayago, em Montevidéu-ROU – documento das fls. 33/34).

Na ocasião, o denunciado, após receber mencionada camioneta de uma pessoa que não identificou, ocultou-a consigo, sendo que, posteriormente, por volta das 11h30min do dia 12.03.2012, policiais militares, avisados por Jorge Luis Siqueira Pohlmann, pessoa que trabalhava na empresa de rastreamento de veículos “Tracker do Brasil”, que o veículo anteriormente subtraído se encontrava no local supraindicado, para lá se dirigiram, logrando apreendê-lo na posse de MAURO.

A circunstância de MAURO haver recebido e ocultado tal veículo, não possuindo documento idôneo algum comprovando sua posse legítima bem como não ter declinado adequadamente o nome junto a quem o recebeu, demonstra que detinha prévia ciência da sua origem ilícita.

A res foi avaliada em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), de acordo com o auto da fl. 42.

FATO 02

No período compreendido entre às 11h do dia 23 de fevereiro de 2012 (documento das fls. 33/34) e às 11h30min do dia 12 de março de 2012, em locais não determinados nos autos e na Rua Pedro Comas, nº 138, Vila João Martins, em Santana do Livramento-RS, o denunciado MAURO COSTICHI adulterou sinais identificadores da camioneta “NISSAN” modelo D21, de cor prata, placa uruguaia AAF-2146, ano de fabricação/modelo 2005, chassi nº 3N6ED135XZK853336, por meio (i) da gravação do chassi nº 3N6ED13S8ZK851066, bem como (ii) da colocação da “placa fria” uruguaia KDA-2749 (auto da fl. 23 e laudo pericial das fls. 70/71).

Na oportunidade, o denunciado, após receber a referida camioneta de uma pessoa que não identificou, nela transplantou a numeração identificadora do chassi para 3N6ED13S8ZK851066, bem como inseriu a placa uruguaia KDA-2749, buscando, com isso, circular livremente pela via pública (haja vista que não poderia fazê-lo, por se tratar de elemento de identificação obrigatório do veículo, sendo que este havia sido furtado anteriormente).

Contudo, por volta das 11h30min do dia 12 de março de 2012, na Rua Pedro Comas, nº 138, Vila João Martins, nesta cidade, policiais militares, avisados por Jorge Luis Siqueira Pohlmann, pessoa que trabalhava na empresa de rastreamento de veículos “Tracker do Brasil”, que o veículo anteriormente subtraído se encontrava no local supraindicado, para lá se dirigiram, logrando apreendê-lo na posse de MAURO e com as adulteração indicadas.

A DEFESA apelou, agitando preliminar de inobservância do artigo 212, do Código de Processo Penal, bem como ausência de proposta de suspensão condicional do processo.

No mérito, pretende absolvição, alegando insuficiência probatória. Subsidiariamente, busca a redução da pena e, caso reduzida para dois anos, ou menos, o reconhecimento da prescrição.

Oferecida contrariedade.

Parecer pelo parcial provimento.

É o relatório.

VOTO

- PRELIMINAR. AFRONTA AO ART. 212 DO CPP.

Questão assim enfrentada na sentença, descartadas as referências jurisprudenciais:

1. Quanto à preliminar de nulidade processual por violação ao disposto no art. 212 do CPP.

Primeiramente, afasto a arguição de nulidade processual por inobservância das disposições do art. 212 do Código de Processo Penal, haja vista que o Superior Tribunal de Justiça, ao examinar a questão, assentou que a não-observância da regra, por se tratar de simples inversão da ordem de inquiridores da testemunha, enseja, no máximo, nulidade relativa, e em sendo assim, a configuração da nulidade resta obstada pela ausência no caso concreto de demonstrado prejuízo à parte interessada (art. 563 do CPP) e, também, pela irrelevância da ocorrência à apuração da verdade substancial e ao julgamento da causa (art. 566 do CPP). Sobre o tema, vejamos julgado do Superior Tribunal de Justiça que bem elucida a matéria:

.../...

Ora, embora a redação atual do art. 212 do CPP possibilite que as partes formulem suas indagações diretamente à testemunha, ao juiz é dado interferir nos questionamentos, nada impedindo que as argua primeiramente, sem que, com isso, esteja a imiscuir-se na função de acusador, pois o texto legal não obsta que o juiz, destinatário da prova trazida pelas partes, inicie os questionamentos. Neste sentido, colaciona-se precedente do e. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

.../...

E parte do parecer:

3. Preliminarmente, em relação à nulidade pela afronta ao artigo 212, do Código de Processo Penal[1], entendo que não merece prosperar a alegação do apelante, posto que a ordem da pessoa que inicia as perguntas à vítima e/ou testemunhas, juiz ou partes, não produz qualquer nulidade, pois se não questionar a testemunha ao início, está o juiz expressamente autorizado a questioná-la ao final, com o que o resultado prática da ordem de inquirição não produzirá qualquer irregularidade ou prejuízo às partes.

Outrossim, mesmo na nova redação do artigo 212, do Código de Processo Penal, manteve a lei o papel judicial de zelar pela regularidade e qualidade da prova e pelo devido esclarecimento dos fatos, dentro da inteligência das alterações introduzidas pela Lei nº 11.690/2008, como se verifica, também, da nova redação do artigo 156, do Código de Processo Penal[2], como bem elucidou a sentença vergastada.

Ademais, não restou demonstrado pelo apelante a existência de prejuízo e, por se tratar de nulidade relativa, cuja decretação, pelo sistema da instrumentalidade das formas, adotado pelo Código de Processo Penal, em seus artigos 563 e 566, depende da demonstração de prejuízo por quem a alega, descabida a declaração de nulidade do referido ato processual.

Dessa forma, atribuiu a lei ao juiz o poder para, de ofício, determinar a produção de provas que considerar relevantes, mesmo antes de iniciada a ação penal, no curso dessa e antes da sentença.

Evidente que, nesse contexto, ao estabelecer, na oitiva das testemunhas, a inquirição direta pelas partes, com a possibilidade, ainda, de, ao final, complementar o juiz a inquirição sobre pontos que, porventura, ainda não tenham sido esclarecidos, não retirou o artigo 212, do Código de Processo Penal do juiz a possibilidade de, no início da inquirição, fazer à testemunha os questionamentos que entender primordiais.

Por conseguinte, não pode ser interpretada a norma do artigo 212 isoladamente, levando a equívoco, mas, ao contrário, deve sê-lo sistematicamente, inclusive, com as demais alterações realizadas no Código de Processo Penal.

No mesmo sentido, a jurisprudência do Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CRIME. DELITO DE AMEAÇA. ART. 147, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. ORDEM DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS. A ordem de quem inicia às perguntas à vítima e/ou testemunhas, juiz ou partes, não produz qualquer nulidade, pois se não questionar a testemunha ao início, está o juiz expressamente autorizado a questioná-la ao final, com o que o resultado prático da ordem de inquirição não produzirá qualquer nulidade. Destinatário da prova é o magistrado, que deve ser esclarecido sobre os fatos, o que se afigura indispensável para o julgamento da lide penal, estando o mesmo autorizado a buscar a verdade real para a formação de sua convicção. Diante da prova judicializada resta demonstrada a existência do fato e a autoria do delito de ameaça, bem como o temor da vítima, impondo-se a confirmação da sentença condenatória. Substituição da pena readequada de ofício. APELAÇÃO IMPROVIDA. (Recurso Crime Nº 71001889096, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Angela Maria Silveira, Julgado em 24/11/2008) (grifei)

Assim, a preliminar suscitada merece ser afastada.

Efetivamente, consagrou-se o entendimento de que o Juiz não está impedido de, ao conduzir a instrução, questionar as testemunhas.

Entendimento contrário, ou seja, de que deve limitar-se a ouvir o relato espontâneo, reiteradamente tem sido rechaçado.

Voto por rejeitar a preliminar.

- SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO.

Outra parte do parecer:

3.2. Da Suspensão Condicional do Processo:

Em relação à ausência de proposta de suspensão condicional do processo, observa-se que o recorrente possui processo criminal em curso (025/2.18.0004427-0), situação que impede a concessão do beneficio. Assim, nos termos do disposto no artigo 89, da Lei nº 9.099/95, não é possível a concessão do beneficio da suspensão condicional do processo ao apelante.

Nos termos do artigo 89 da Lei n. 9.099/1995:

Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que...

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