Acórdão nº 50007882020218210005 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-06-2022
Data de Julgamento | 15 Junho 2022 |
Órgão | Vigésima Câmara Cível |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50007882020218210005 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001733737
20ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5000788-20.2021.8.21.0005/RS
TIPO DE AÇÃO: Práticas Abusivas
RELATORA: Desembargadora WALDA MARIA MELO PIERRO
APELANTE: ACADEMIA LUVISON LTDA (REQUERENTE)
APELANTE: STONE SOCIEDADE DE CREDITO DIRETO S.A. (REQUERIDO)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação e recurso adesivo interpostos, respectivamente, por STONE SOCIEDADE DE CRÉDITO DIRETO S/A e por ACADEMIA LUVISON LTDA. contra a sentença que, nos autos da ação revisional de contrato ajuizada em desfavor da instituição financeira, julgou-a parcialmente procedente, ao efeito de limitar os juros remuneratórios à taxa média mensal do Bacen, descaracterizar a mora e permitir a compensação/repetição. As custas foram atribuídas em 80% ao réu e 20% à parte autora, sendo os honorários fixados em 10% e 15% do valor da condenação aos respectivos procuradores. Suspensa, porém a exigibilidade ao demandante em razão da AJG concedida.
Em suas razões, o requerido sustenta a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, razão pela qual impositiva a observância da cláusula de eleição de foro. Declara, também, a legalidade das cláusulas pactuadas, não havendo falar em limitação dos juros. Por fim, requer a vedação da compensação/repetição.
Já a parte autora, a seu turno, apresentou contrarrazões e interpôs recurso adesivo no qual objetiva a vedação da capitalização mensal e das tarifas administrativas, além da modificação do decaimento sucumbencial.
Apresentadas contrarrazões ao recurso adesivo, por redistribuição, vieram os autos conclusos.
VOTO
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos, apreciando-os de forma conjunta.
De pronto, cumpre sinalar que aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras, questão pacificada neste Tribunal de Justiça e sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme o verbete nº 297.
Nesse sentido:
“APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. A proteção de determinados interesses sociais passa a ser exigência do ordenamento jurídico baseado na relação de consumo, de maneira a valorizar a boa-fé contratual e a legítima confiança do consumidor ou, mesmo, a afastar a lesividade como fator do desequilíbrio negocial. Aplicação da Súmula nº 297 do STJ, cuja redação do verbete é a seguinte: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." (...) APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70033837014, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Glênio José Wasserstein Hekman, Julgado em 17/03/2010)”
Nesta linha, inviável a cláusula de eleição de foro, visto que deve ser facilitada a defesa do consumidor, mormente no caso, visto que obrigaria a parte autora a demandar em outro estado da federação.
De outra banda, sobre os juros remuneratórios, a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça é uníssona ao entender que com o advento da Lei 4.595/1964, restou suplantada a incidência do Decreto nº. 22.626/33 (Lei de Usura), ficando o poder normativo delegado para limitar as referidas taxas ao Conselho Monetário Nacional, salvo as exceções legais, entendimento este explicitado pela Súmula 596 do Supremo Tribunal de Federal:
“As disposições do Decreto 22626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional.”
De referir, ainda, que embora as normas inseridas no Código de Defesa do Consumidor sejam aplicáveis aos contratos entabulados com as instituições financeiras, pois que patente a relação de consumo, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 407.097/RS, publicado no DJ 29.09.2003, proclamou que a alteração da taxa de juros pactuada depende da demonstração cabal da sua abusividade, em relação à taxa média do mercado, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou de lucros excessivos, sendo insuficiente o simples fato de a estipulação ultrapassar 12% ao ano ou de haver estabilidade inflacionária no período (REsp's ns. 271.214/RS, 407.097/RS e 420.111/RS).
Dentre os inúmeros precedentes do STJ, destaco:
Bancário. Agravo no agravo de instrumento. Ação de revisão
contratual. Juros remuneratórios. Limitação. Inadmissibilidade. Capitalização mensal de juros. Possibilidade.
- A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade. Súmula 382/STJ.
- Nos contratos bancários celebrados após à vigência da Medida Provisória nº 1.963-17/2000 (reeditada sob o nº 2.170/36), admite-se a capitalização mensal de juros,, desde que pactuada.
Agravo no agravo de instrumento não provido. (AgRg no Ag 1058094 / RS; Ministra NANCY ANDRIGHI; DJe 23/11/2009)
Imprescindível mostra-se a expressa convenção acerca da taxa praticada, visto que a sua ausência enseja o livre arbítrio do credor de exigir cobrança de juros no percentual que bem entender, o que faz com que o consumidor assuma uma obrigação futura e incerta. (AgRg REsp 689.819/RS, AgRg no Ag 585.754/RS e REsp 551.932/RS).
Ademais, a partir do julgamento do REsp nº 1061.530/RS, restou pacificado pela jurisprudência que a limitação da taxa de juros remuneratórios em 12% ao ano, imposta pela Lei de Usura, não é aplicável às instituições financeiras.
A ementa restou assim redigida:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. (...) ORIENTAÇÃO 1 – JUROS REMUNERATÓRIOS.
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...)
(Recurso Especial n. 1.061.530 – RS (2008/0119992-4,) Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008). (grifei)
Esse posicionamento, inclusive, ensejou a edição da Súmula 382, in verbis:
“A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.”
Por outro lado, eventual abusividade no caso concreto pode determinar a revisão dos juros contratados com base na Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC).
Tem entendido o STJ que, para a aferição da excessiva onerosidade dos juros remuneratórios, é necessário, apenas, o cotejamento da taxa contratada com a taxa média de mercado, sendo possível a revisão da taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato no caso de restar comprovado que o percentual cobrado apresenta significativa discrepância em relação à taxa média de mercado para operações da mesma espécie - a qual se configura mais condizente com a atual situação econômica do país -, mensalmente disponibilizada pelo BACEN.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO. CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS LIMITADOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. IMPROVIMENTO.
1.- Mantém-se a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado quando comprovada, no caso concreto, a significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa de mercado para operações da espécie.
2.- O agravante não trouxe qualquer argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, o qual se mantém por seus próprios fundamentos.
3.- Agravo Regimental improvido.
(AgRg no AREsp 504021 / RS
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL2014/0089812-6, Rel. Min. SIDNEI BENETI, Terceira Turma, Julgado em 27.05.2014, DJe em 09.06.2014) grifado
No caso em tela, necessário o cotejo entre a taxa de juros contratada (7,99% ao mês) e a taxa de juros disponibilizada pelo BACEN (1,14% ao mês), as quais são facilmente extraídas das tabelas presente em seu site (http://www.bcb.gov.br), cujo acesso é livre ao público, e foram devidamente demonstradas nos autos.
Ao realizar tal comparativo, conclui-se a existência de abusividade em relação ao contrato objeto de revisão, razão pela qual possível a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado.
Nesse sentido, já decidiu esta Corte e inclusive este órgão fracionário, conforme se observa dos seguintes precedentes jurisprudenciais:
APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS. NULIDADE SENTENÇA CITRA PETITA. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 515, § 3 do CPC/73: (...) JUROS REMUNERATÓRIOS: Em relação aos contratos de Abertura de Conta Corrente-Cheque Lis para Saque e na Cédula de Crédito bancário-Capital de Giro, aplica-se a taxa média de mercado do Banco Central no período da contratação, pois a taxa contratada excessivamente refoge à média. Readequação dos juros. CAPITALIZAÇÃO: Em contratos formalizados após a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, a capitalização mensal não é ilegal e abusiva. Admitida a capitalização mensal nas Cédulas de Crédito Bancário. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA: Permitida, quando contratada, desde que não cumulada com correção monetária e demais encargos moratórios e remuneratórios. O montante exigido como comissão de...
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