Acórdão nº 50007970820158210032 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
ÓrgãoSétima Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50007970820158210032
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002263988
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000797-08.2015.8.21.0032/RS

TIPO DE AÇÃO: Apropriação indébita (art. 168, caput)

RELATORA: Desembargadora GLAUCIA DIPP DREHER

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Na Comarca de São Jerônimo, o Ministério Público denunciou CRISTIANE DA FONSECA MARTINS, nascida em 12 de janeiro de 1978, com 35 anos de idade à época dos fatos, por estar incurso no artigo 168, §1º, inciso III (em razão do ofício, emprego ou profissão), várias vezes, combinado com o artigo 71, caput, ambos do Código, pelos seguintes fatos delituosos:

No período compreendido entre os meses de dezembro de 2012 a fevereiro de 2014, na Rua Largo do Mineiro, n.º 225, Rodoviária de Arroio dos Ratos, Centro, em Arroio dos Ratos/RS, a denunciada CRISTIANE DA FONSECA MARTINS, reiteradas vezes, apropriou-se de valores pertencentes à Empresa Louzada de Transportes LTDA., valores estes que tinha a detenção em razão de sua profissão, vez que operadora de caixa da Rodoviária de Arroio dos Ratos.

Na ocasião dos fatos, a denunciada CRISTIANE, na função de operadora de caixa da Rodoviária de Arroio dos Ratos, emitia passagens para a linha Arroio dos Ratos X Porto Alegre manualmente, de modo a não ficar registrada a venda das passagens, apropriando-se dos valores que eram alcançados pelos passageiros da referida empresa de ônibus para o pagamento dos bilhetes.

A exemplo, no dia 04 de dezembro de 2012, entre as passagens de número 435610 a 440251, a denunciada CRISTIANE emitiu 04 (quatro) passagens manualmente, apropriando-se dos valores dos bilhetes, passagens n.º 435825, 435826, 435868 e 436000, conforme comprovam os documentos constantes no envelope número 1, em apenso.

No dia 08 de janeiro de 2013, entre as passagens de número 453781 a 458392, a denunciada CRISTIANE emitiu 22 (vinte e duas) passagens manualmente, apropriando-se dos valores dos bilhetes, passagens n.º 458124, 458145, 458150 e 458163, entre outras, conforme comprovam os documentos constantes no envelope número 1, em apenso.

No dia 14 de abril de 2013, entre as passagens de número 502093 a 502545, a denunciada CRISTIANE emitiu 05 (cinco) passagens manualmente, apropriando-se dos valores dos bilhetes, passagens n.º 502346, 502381, 502533, 502534 e 502492, conforme comprovam os documentos constantes no envelope número 1, em apenso.

No dia 07 de junho de 2013, entre as passagens de número 534250 a 534940, a denunciada CRISTIANE emitiu 08 (oito) passagens manualmente, apropriando-se dos valores dos bilhetes, passagens n.º 534846, 534874, 534894, 534911, 534926, 534672, 534915 e 534691, conforme comprovam os documentos constantes no envelope número 2, em apenso.

No dia 13 de outubro de 2013, entre as passagens de número 601407 a 601818, a denunciada CRISTIANE emitiu 08 (oito) passagens manualmente, apropriando-se dos valores dos bilhetes, passagens n.º 601419, 601420, 601500, 601502, 601522, 601523, 601546 e 601711, conforme comprovam os documentos constantes no envelope número 2, em apenso.

No dia 17 de janeiro de 2014, entre as passagens de número 654505 a 655099, a denunciada CRISTIANE emitiu 05 (cinco) passagens manualmente, apropriando-se dos valores dos bilhetes, passagens n.º 654882, 654883, 654942, 655039 e 655040, conforme comprovam os documentos constantes no envelope número 3, em apenso.

No dia 25 de fevereiro de 2014, CRISTIANE emitiu as passagens n.º 675250 (fl. 34), 675170 (fl. 39), 675125 e 675126 (fl. 38), 675185 (fl. 40), 675222 e 675223 (fl. 32), 675358 (fl. 35) e 675325 (fl. 33), manualmente, apropriando-se dos valores dos bilhetes, conforme as vias acostadas às fls. 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19 e 20, respectivamente.

Os valores apropriados não foram restituídos à vítima”.

Denúncia recebida em 30 de abril de 2019 (fl.16, ev. 3.3).

Citada, a ré apresentou resposta à acusação através da Defensoria Pública do Estado.

Durante a instrução processual, foram ouvidas 06 (seis) testemunhas de acusação,e 02 (duas) testemunhas de defesa, e, ao final, foi interrogada a ré.

Encerrada a instrução em audiência, foram oferecidos os memoriais, primeiro pelo Ministério Público e, após, pela Defesa.

Sobreveio sentença proferida pela Juíza de Direito, Dra. Carla Cristina Ortnau Cirio e Santos, que julgou improcedente a denúncia, nos termos do art. 386, inc. VII do CPP.

Sentença proferida em 05 de novembro de 2020.

Partes intimadas: Ministério Público (fl. 30, ev. 3.5), a Defesa (fl.50, ev. 3.5) e a parte ré pessoalmente (fl.18, ev. 3.6).

Inconformado, apelou o Ministério Público. Em razões, sustenta que há prova suficiente da autoria e da materialidade do delito, tendo a ré se apropriado indevidamente dos valores da empresa, em razão do exercício da sua profissão. Requer a reforma da sentença para que seja a ré condenada nos termos do art. 168, §1º, III, combinado com o art. 71, caput, do Código Penal (fls.34/49, ev. 3.5).

Foram apresentadas as contrarrazões pela Defesa.

Os autos físicos foram digitalizados.

Subiram os autos a esta Corte e, vieram distribuídos a minha Relatoria em substituição Des. José Conrado Kurtz de Souza.

Nesta instância, o Ministério Público opinou pelo provimento do apelo ministerial.

Vieram os autos aptos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas:

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo interposto pela acusação.

CRISTIANE DA FONSECA MARTINS foi denunciada por incursa nas sanções do artigo 168, §1º, inciso III (em razão do ofício, emprego ou profissão), várias vezes, combinado com o artigo 71, caput, ambos do Código, sendo absolvida com fundamento no art. 386, VII do CP.

Dispõe o art. 168, §1º do Código Penal:

Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Aumento de pena

§ 1º - A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa:

(...)

III - em razão de ofício, emprego ou profissão.

A conduta do art. 168 do Código Penal deve ser compreendida como tomar para si, inverter a natureza da posse do bem do qual se tem a posse ou a detenção, agindo como se dono fosse.

Depreende-se da denúncia que a ré era operadora de Caixa da Rodoviária de Arroio dos Ratos e teria, reiteradamente, se apropriado indevidamente, no período de dezembro de 2012 a fevereiro de 2014, de valores pertencentes à empresa Louzada. No exercício da profissão, a ré emitia passagens manuais para a linha Arroio dos Ratos-Porto Alegre a fim de se apropriar dos valores, pois em sendo a emissão de forma manual não ficava registrada a venda das passagens e, assim, apropriava-se indevidamente dos valores.

Os fatos foram noticiados à Autoridade policial, pelo Procurador da Empresa Louzada, em 15.08.2014, relatando que um fiscal teria informado que as passagens estavam sendo emitidas manualmente e, em contato com o responsável pela Rodoviária, este teria informado que "quem poderia estar emitindo as passagens manuscritas seria a funcionária Cristiane". Consta, ainda, no Boletim de Ocorrência, que o responsável, Sr. Eloi, teria solicitado que fosse realizado o levantamento do valor para posterior acerto, mas o valor não foi reembolsado (fls.10/11, ev. 3.1).

No auto de arrecadação consta que foram entregues à Autoridade Policial 20 formulários de passagens emitidas de forma manuscrita e a cópia de 36 formulários de passagens que mostram a falha da emissão das passagens (fl.12, ev.3.1).

Pois bem.

De fato, a ré era funcionária da Rodoviária de Arroio dos Ratos, contratada para ser balconista, conforma consta do seu Registro de Empregado (fl.14, ev. 3.1) e, em juízo confirmou que era responsável pela emissão das passagens da Rodoviária no turno das 5h às 10h, de intenso movimento - de acordo com a palavra da ré e das testemunhas - o que, por vezes, revelava a necessidade de emissão de passagens de forma manual para dar vazão a quantidade de usuários do transporte coletivo naquele horário.

A ré confirmou a emissão de algumas passagens de forma manual, já que atendia em média 800 pessoas por dia no seu turno, manual em razão do movimento intenso da Rodoviária, justificando que o sistema era lento e para não deixar de fazer a venda preenchia manualmente, sendo que tal prática era de conhecimento da rodoviária. A ré negou que tenha se apoderado de algum valor pertencente à empresa Louzada, e justificou a emissão das passagens de forma manual.

A fim de evitar desnecessária tautologia, reproduzo os termos da sentença acerca da prova oral colhida no curso da instrução processual:

A testemunha, FERNANDA LOPES ÁVILA, referiu que era quem fazia o pagamento para a empresa Vítima e que na verdade não houve reclamação, mas um pedido de informação da empresa; inclusive, tinha um período que a Ré não estava laborando e este período foi apontado pela Vítima; que no caixa da rodoviária nunca faltou valores, sempre fechou tudo de maneira correta;...

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