Acórdão nº 50007999720198210141 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50007999720198210141
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003254340
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000799-97.2019.8.21.0141/RS

TIPO DE AÇÃO: Financiamento Privado do Ensino Superior e/ou Pesquisa

RELATOR: Desembargador LEO ROMI PILAU JUNIOR

APELANTE: GRACIEMA BORGES ZAMPIERI (AUTOR)

APELADO: SOCIEDADE EDUCACIONAL LEONARDO DA VINCI LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por GRACIEMA BORGES ZAMPIERI em face da sentença de seguinte conteúdo (evento 57, SENT1):

Vistos.

GRACIEMA BORGES ZAMPIERI ajuizou a presente ação indenizatória em face de SOCIEDADE EDUCACIONAL LEONARDO DA VINCI S/S LTDA. Narrou a autora ter formado com a empresa ré contrato de prestação de serviços - Ensino Superior - referindo que firmou renegociação do débito em atraso, referentes aos vencimentos originais entre os meses de 17/04/2017 à 01/2018, acordado que pagaria o valor em 12 parcelas de R$ 499,87. Disse que as parcelas estão sendo adimplidas dentro do prazo estipulado, conforme comprovantes em anexo. Afirmou, contudo, que ao tentar efetuar uma compra a prazo teve seu crédito negado em razão de que seu nome estava inscrito junto ao SERASA pela demandada, referente a parcela de 04/2017, a qual estava inclusa na renegociação do débito realizada e devidamente adimplida. Discorreu acerca da ilicitude da inscrição de seu nome por dívida paga, gerando dever de indenizar pelos danos morais causados. Pugnou pela aplicação do CDC com a inversão do ônus da prova e a procedência dos pedidos com a declaração de inexigibilidade do débito inscrito com condenação da demandada ao pagamento de danos extrapatrimonial no valor de R$10.000,00. Pugnou, em sede liminar, a imediata retirada de seu nome dos órgãos restritivos ao crédito. Requereu a gratuidade judiciária. Juntou documentos (Ev. 01).

Foi concedida gratuidade judiciária à requerente, sendo postergada análise do pedido de tutela de urgência para depois da contestação (Evento 8), sendo as partes encaminhadas para tentativa de composição, sem entendimento (Ev. 23).

Citada (Ev 14), a parte ré apresentou contestação. Confirmou a existência da contratação, afirmando que o débito é legítimo, pois decorrente de cadeiras cursadas e não adimplidas pela demandante. Disse que de fato houve renegociação da dívida e que o sistema não lançou o débito como renegociado, mantendo a cobrança e encaminhamento do nome da autora para registro no cadastro de inadimplentes. Afirmou, contudo, que tão logo informada acerca do registro procedeu o cancelamento, bem como correção das informações no sistema. Afirmou que não há conduta ilícita indenizável, em especial porque não demonstrada ocorrência de fato causador de abalo moral e por ter sido a demandada mal pagadora durante o período do curso. Requereu a improcedência da ação e a condenação, com a perda do objeto em relação a tutela de urgência requerida, considerando o cancelamento do registro negativo do nome da autora, pela demandada. Requereu a condenação da demandante ao pagamento dos ônus de sucumbência. Juntou documentos (Ev. 21).

Houve decisão no sentido de prejudicada análise da tutela requerida, considerando que cancelada a restrição pela demandada (Ev. 32), restando a autora intimada para réplica, deixando decorrer o prazo sem manifestação (Ev. 36).

Instadas as partes acerca do interesse na produção de outras provas (Ev. 39), requereu o demandado o julgamento antecipado do feito, não requerendo outras provas (Ev. 43), ao passo que a autora não se manifestou (Ev. 45).

Foi encerrada a instrução, vindo os autos conclusos para julgamento (Ev. 47).

É o relatório.

Decido.

O feito teve tramitação regular e encontra-se apto para julgamento, não existindo questões preliminares e prejudiciais a serem apreciadas, razão pela qual passo de imediato a análise do mérito.

Trata-se de ação declaratória de inexigibilidade de débito e pedido de indenização extrapatrimonial ajuizada pela autora arguindo, em síntese, que teve seu nome inscrito nos cadastros negativadores de crédito por divida paga através de renegociação do débito realizado com a demandada, devidamente adimplido.

A demandada, a seu turno, arguiu que a requerente sempre foi mal pagadora, possuindo inúmeras renegociações, sendo que a última renegociação, apesar de realizada, seguiu constando o débito junto ao sistema informatizado, ocasionando a inscrição do nome da devedora nos órgãos de proteção ao crédito, que de imediato retirado tão logo houve conhecimento do fato. Disse que não há conduta ilícita indenizável, diante do histórico de má pagadora da autora e que não comprovado abalo moral.

Inicialmente, é de se atentar que a relação estabelecida entre as partes se trata de relação consumerista e, portanto, incidente a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC.

A autora juntou comprovante da renegociação do débito realizada com a demandada(evento 1, OUT8), bem como a regularidade dos pagamentos das parcelas pactuadas (evento 1, COMP15, evento 1, COMP16, evento 1, COMP17 e evento 1, COMP18), estando a dívida inscrita, portanto, regularmente adimplida.

Ainda, restou comprovada a cobrança do numerário no aporte de R$ 4.884,33, em favor da parte ré e face da autora, inclusive com negativação, conforme documento anexado pela requerente (evento 1, COMP7).

Assim, logrou a autora em demonstrar fato constitutivo do direito vindicado, pois demonstrou a renegociação do débito negativado, com as prestações pagas regularmente em dia, razão pela qual cabia à parte requerida produzir provas que elidissem os fatos constitutivos deduzidos na inicial, a teor do disposto no artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil, ônus do qual não se desincumbiu.

Ao contrário, a própria demandada confirma em sua contestação a renegociação do débito e adimplência das prestações pactuadas, referindo que houve falha no sistema da demandada que não deu baixa no débito, mantendo a autora como inadimplente, o que ocasionou a inscrição de seu nome nos cadastros negativadores.

Portanto, confirma a demandada a ocorrência de inscrição indevida do nome da requerente nos órgãos negativadores, tanto que procedeu a imediata retirada/cancelamento do registro negativo, assim referindo em sua contestação (evento 21, CONT1, p. 03):

Dessa forma, singela a questão trazida à apreciação, posto que não negada a negativação indevida pela demandada, uma vez que confirmada a negativação e a ocorrência da renegociação do débito com regularidade dos pagamentos, razão pela qual a inexigibilidade da dívida é medida inafastável.

E, acerca da tese arguida pela demandada quanto a inexistência de ilícito e de dever de indenizar a requerente, sustentando que se trata de má pagadora, que inadimplente em vários momentos durante o curso, não se trata de fato a justificar, ou minimizar, a falha na prestação do serviço pela demandada.

E mais, o fato da autora não ter apontado, de plano, a negativação de seu nome, não significa má-fé ou agir ilícito desta, uma vez que esclarecido pela requerente que somente teve conhecimento da inscrição negativa quando tentou realizar compras a prazo, pois acreditava estar regular seu débito junto à demandada em razão da renegociação realizada, que devidamente adimplida.

Assim, comprovada a falha na prestação do serviço, é a demandada responsável por indenizar a autora pelos danos causados, nos termos do art. 14 do CDC, que consagra a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores no caso de eventuais danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, referindo aludida norma:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

(...)

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Portanto, delimitando a análise do caso em concreto, dentro dos contornos do artigo 373, I e II, do CPC e também à luz do CDC, cabia à ré a prova acerca da regularidade do débito e sua exigibilidade, de modo a afastar os argumentos trazidos na peça pórtica, do que não se desincumbiu a demandada.

E, a inscrição indevida do nome do consumidor nos órgãos negativadores ao crédito é fato indenizável, tratando-se de dano moral in re ipsa, nos termos da remansosa jurisprudência, que colaciono:

AÇÃO ORDINÁRIA DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. CASO CONCRETO. MATÉRIA DE FATO. NULIDADE DA SENTENÇA RECONHECIDA. INCONGRUÊNCIA COM A CAUSA DE PEDIR FIXADA NOS LIMITES DA EXORDIAL. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. CAUSA MADURA PARA JULGAMENTO. ART. 1.013, § 3º, II, DO CPC/15. MÉRITO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM ROL DE MAUS PAGADORES. ANOTAÇÃO EFETUADA EM DATA POSTERIOR À RENEGOCIAÇÃO DA DÍVIDA ORIGINAL. DANOS MORAIS. DEMONSTRADA A INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTROS DE INADIMPLENTES, O COROLÁRIO LÓGICO É A EXISTÊNCIA DE DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, QUE SE PRESUME, PRESCINDINDO DA PROVA DO PREJUÍZO. PRECEDENTES DO STJ. QUANTUM INDENIZATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE DE REFORMATIO IN PEJUS, NA ESPÉCIE. APELO PROVIDO EM PARTE.(Apelação Cível, Nº 50308318320208210001, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vicente Barrôco de Vasconcellos, Julgado em: 15-09-2021)

RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM DANOS MORAIS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS. RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA. QUITAÇÃO DO DÉBITO. PERSISTÊNCIA NA...

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