Acórdão nº 50008051320208210160 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 13-04-2022

Data de Julgamento13 Abril 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50008051320208210160
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001976401
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000805-13.2020.8.21.0160/RS

TIPO DE AÇÃO: Cédula de crédito rural

RELATOR: Desembargador DILSO DOMINGOS PEREIRA

APELANTE: BANCO DO BRASIL S/A (EMBARGADO)

APELADO: LOTAR TORNQUIST (EMBARGANTE)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por BANCO DO BRASIL S/A contra sentença que julgou procedentes os embargos à execução autuados sob o n. 5000805-13.2020.8.21.0160, oferecidos por LOTAR TORNQUIST, constando no dispositivo (Evento 25):

(...) III – DISPOSITIVO
Diante do exposto, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo PROCEDENTES os embargos à execução, para declarar a impenhorabilidade do imóvel registrado sob matricula nº 1.607, do livro nº 2, do Registro de Imóveis da Comarca de Vera Cruz.

Condeno o embargado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes últimos fixados em 10% do valor da causa, conforme art. 85 do CPC.

Com o trânsito em julgado, translade cópia desta decisão para os autos em apenso e arquive-se.

Após, determino a continuidade da execução correspondente.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (...)

Em suas razões (Evento 30), discorre sobre a situação fática envolvendo os litigantes. Alega que o embargante não logrou êxito em demonstrar o preenchimento dos requisitos atinentes à impenhorabilidade da pequena propriedade rural. Aduz que a impenhorabilidade não recai automaticamente. Colaciona precedentes. Indica que a pequena propriedade rural somente pode ser considerada impenhorável quando destinada a trabalho familiar.

Ao final, pugna pelo provimento do recurso, para que seja reformada a sentença apelada, julgando-se improcedentes os embargos à execução.

Intimada, a parte ora recorrida apresentou contrarrazões (Evento 33).

A seguir, subiram os autos a esta Corte e vieram-me conclusos para julgamento.

Em razão da adoção do sistema informatizado, os procedimentos ditados pelos artigos 931 e 934, ambos do CPC, foram simplificados, sendo, no entanto, observados em sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

De plano, antecipo o voto no sentido de que não merece guarida a irresignação.

No caso concreto, o Juízo a quo reconheceu a impenhorabilidade do imóvel matriculado sob o nº 1.607, ilvro 2, do RI da Comarca de Vera Cruz/RS (Evento 25 na origem).

A propósito do tema, dispõe o art. 5º, XXVI, da CF:

XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;

No mesmo sentido, prevê o art. 833, VIII do CPC:

Art. 833. São impenhoráveis:
(...)
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;

Já o conceito de pequena propriedade rural é disciplinado pelo art. 4º, II, “a”, da Lei nº 8.629/93, “in verbis”:

Art. 4º Para os efeitos desta lei, conceituam-se:
I- Imóvel Rural - o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial;
II - Pequena Propriedade - o imóvel rural:

a) de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento;

Como visto, a pequena propriedade rural possui proteção constitucional e legal, não podendo ser penhorada caso cultivada pela família.

Na hipótese, como bem observado pela respeitável Magistrada a quo, incumbia à instituição financeira ora apelante o ônus de comprovar que o imóvel em questão não seria impenhorável (Evento 25):

(...) Importa referenciar que o módulo fiscal varia de município a município, sendo que no município de localização do imóvel sobre o qual o embargante busca a declaração de impenhorabilidade, qual seja, Vera Cruz, um módulo fiscal corresponde a 20 hectares (https://www.gov.br/incra).
Ou seja, é considerada pequena propriedade rural, aquela que possui até 80 hectares, que correspondem a 800.000 m².

A cláusula quarta da cédula firmada entre as partes prevê como substituição de garantia, uma área de terras contendo 170.000,00 m², matrícula nº 1607, livro 2, do registro geral da Comarca de Vera Cruz.

Portanto, o referido imóvel enquadra-se na definição legal de pequena propriedade rural e há comprovação de que o embargante é produtor rural (pequeno agricultor).
(...)
Ademais, é ônus do exequente/embargado demonstrar que a terra não é explorada pelo núcleo familiar, ou de que dela não depende o seu sustento, conforme podemos ver através da jurisprudência:
(...)
Não se desincumbiu o embargado do ônus de comprovar que o imóvel suprarreferido não é explorado pela família.

Ademais, igualmente conforme entendimento jurisprudencial, presume-se que o imóvel rural é utilizado para trabalho e sustento da família, sendo o executado agricultor.
Vejamos:
(...)
Assim, preenchidos os requisitos, a procedência dos embargos é medida que se impõe.
(...)

Neste contexto, cuidando-se de pequeno imóvel rural destinado à exploração direta pelo agricultor, opera-se presunção juris tantum em seu favor, transferindo-se ao exequente a prova de que não a área em questão não é trabalhada pela família, aos efeitos de afastar a proteção da pequena propriedade rural.

A propósito, menciono precedente do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. IMPENHORABILIDADE. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. REQUISITOS E ÔNUS DA PROVA.
1. A proteção da pequena propriedade rural ganhou status Constitucional, tendo-se estabelecido, no capítulo voltado aos direitos fundamentais, que a referida propriedade, "assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento" (art. 5°, XXVI). Recebeu, ainda, albergue de diversos normativos
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT