Acórdão nº 50008139520218210146 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 10-03-2023

Data de Julgamento10 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50008139520218210146
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003122141
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000813-95.2021.8.21.0146/RS

TIPO DE AÇÃO: Práticas Abusivas

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: ANELISE LAMB TEMPASS (AUTOR)

APELADO: TELEFONICA BRASIL S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por ANELISE LAMB TEMPASS contra a sentença proferida na ação declaratória ajuizada em face de TELEFONICA BRASIL S.A., com o seguinte dispositivo (Evento 39 da origem):

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação.

Sucumbente, a autora suportará as custas e alcançará h.a.aos procuradores da ré, que fixo em R$ 1.000,00, dada a singeleza do valor da causa e o bom trabalhos dos profissionais, ficando em suspenso a sucumbência, enquanto vigorar a AJG concedida à suplicante.

A parte-autora, declinando suas razões (Evento 45 da origem), requer a reforma da sentença que julgou improcedentes os pedidos da exordial. Defende a incidência de prescrição decenal ao caso. Tecendo considerações sobre violações ao direito do consumidor realizada pela ré, alega a existência de cobrança de serviços não contratados da telefonia móvel e a ocorrência de alteração unilateral do plano de telefonia pela empresa-ré. Destaca que o pacote contratado com a inclusão de serviços de terceiros representa a venda casada vedada pelo CDC, o que é vedado. Assim, aduz ser cabível a repetição do indébito de forma dobrada. Ainda, relata a ocorrência da danos morais, pelos quais deve ser indenizada. Por fim, pugna pelo provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 54 do processo originário).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC/2015.

É o relatório.

VOTO

PRESCRIÇÃO. PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL.

O prazo prescricional da pretensão de repetição de indébito de serviços telefônicos é decenal, aplicando-se a norma geral do art. 205 do Código Civil, conforme EREsp 1523744/RS da Corte Especial do STJ, o qual transcrevo:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. TELEFONIA FIXA. COBRANÇA INDEVIDA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL/2002 (ART. 205). EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 1. Trata-se de embargos de divergência interpostos contra acórdão em que se discute o lapso prescricional cabível aos casos de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia. 2. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.113.403/RJ, de relatoria do Ministro Teori Albino Zavascki (DJe 15/9/2009), submetido ao regime dos recursos repetitivos do art. 543-C do Código de Processo Civil e da Resolução STJ 8/2008, firmou o entendimento de que, ante a ausência de disposição específica acerca do prazo prescricional aplicável à prática comercial indevida de cobrança excessiva, é de rigor a incidência das normas gerais relativas à prescrição insculpidas no Código Civil na ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto. Assim, tem-se prazo vintenário, na forma estabelecida no art. 177 do Código Civil de 1916, ou decenal, de acordo com o previsto no art. 205 do Código Civil de 2002. Diante da mesma conjuntura, não há razões para adotar solução diversa nos casos de repetição de indébito dos serviços de telefonia. 3. A tese adotada no âmbito do acórdão recorrido, de que a pretensão de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia, configuraria enriquecimento sem causa e, portanto, estaria abrangida pelo prazo fixado no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil/2002, não parece ser a melhor. A pretensão de enriquecimento sem causa (ação in rem verso) possui como requisitos: enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos; ausência de causa jurídica; inexistência de ação específica. Trata-se, portanto, de ação subsidiária que depende da inexistência de causa jurídica. A discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil/2002, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica. Doutrina. 4. Embargos de divergência providos, de sorte a vingar a tese de que a repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia, deve seguir a norma geral do lapso prescricional (10 anos - art. 205, Código Civil/2002), a exemplo do que decidido e sumulado (Súmula 412/STJ), no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de indébito de tarifas de água e esgoto.

(STJ - EREsp: 1523744 RS 2015/0070352-0, Relator: Ministro OG FERNANDES, Data de Julgamento: 20/02/2019, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 13/03/2019)

Para a Corte Superior, a tese de que a pretensão de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia, configuraria enriquecimento sem causa e, portanto, estaria abrangida pelo prazo fixado no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil/2002, não se mostra adequada.

Segundo a decisão em destaque “a pretensão de enriquecimento sem causa (ação in rem verso) possui como requisitos: enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos; ausência de causa jurídica; inexistência de ação específica. Trata-se, portanto, de ação subsidiária que depende da inexistência de causa jurídica. A discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil/2002, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica”.

Ademais, ao alcançar tal conclusão, o julgado é amparado no Recurso Repetitivo REsp 1.113.403/RJ (Temas 153, 154 e 155), o qual afasta a natureza indenizatória da pretensão de repetição de indébito, apontando a não incidência do prazo prescricional quinquenal do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor à pretensão de ressarcimento por cobranças indevidas em prestação de serviço.

Transcrevo:

ADMINISTRATIVO. SERVIÇOS DE FORNECIMENTO DE ÁGUA. COBRANÇA DE TARIFA PROGRESSIVA. LEGITIMIDADE. REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS.
APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DO CÓDIGO CIVIL.
PRECEDENTES.
1. É legítima a cobrança de tarifa de água fixada por sistema progressivo.
2. A ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil.
3. Recurso especial da concessionária parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. Recurso especial da autora provido. Recursos sujeitos ao regime do art. 543-C do CPC.
(REsp 1113403/RJ, Rel.
Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2009, DJe 15/09/2009)

Nos termos do voto do Min. Teori Albino Zavascki, condutor do acórdão:

Ora, o que se tem presente no caso é uma pretensão de restituir tarifa de serviço para indevidamente. Não se trata, pois, de ação de reparação de danos causados por defeitos na prestação de serviços. Não há como aplicar à hipótese, portanto, o prazo do referido art. 27 do CDC. Também não se pode supor aplicável o prazo quinquenal estabelecido no Código Tributário Nacional - CTN, para restituição de créditos tributários, eis que a tarifa (ou preço) não tem natureza tributária. Quanto a esse aspecto, há mais de um precedente da própria Seção (EResp 690.609, Min. Eliana Calmon, DJ 07/04/08; REsp 928.267, Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 21/08/09). Não havendo norma específica a reger a hipótese, aplica-se o prazo prescricional estabelecido pela regra geral do Código Civil, ou seja: de 20 anos, previsto no art. 177 do Código Civil de 1916 ou de 10 anos, previsto no art. 205 do Código Civil de 2002.

Na hipótese dos autos, a parte-autora promove pretensão de repetição de indébito em dobro decorrente de cobrança que reputa indevida de serviço alegadamente não solicitado.

Nessas circunstâncias, tratando-se de pretensão de repetição de indébito por cobrança alegadamente indevida em prestação de serviço de telefonia, tem-se aplicável o prazo prescricional decenal.

RESPONSABILIDADE DAS COMPANHIAS TELEFÔNICAS. SERVIÇOS NÃO SOLICITADOS. TELEFONIA MÓVEL.

Consoante o art. 22, caput, da Lei n. 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor – CDC – os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”.

Já o parágrafo único do mesmo dispositivo reza que “nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas e cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código”.

A ré explora serviços de telecomunicações mediante concessão da União, motivo pelo qual as normas previstas no CDC são aplicáveis aos serviços de telefonia por ela fornecidos.

Os fornecedores de produtos e serviços respondem pelos vícios que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor (arts. 18 e 20 do CDC).

A responsabilidade da companhia telefônica é objetiva quanto aos defeitos/vícios verificados na prestação de serviços.

Ademais, nota-se que entre as práticas abusivas vedadas pelo CDC, encontra-se o ato de ...

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