Acórdão nº 50008430520218210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 24-06-2022

Data de Julgamento24 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50008430520218210026
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002307294
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000843-05.2021.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: Comodato

RELATORA: Desembargadora MYLENE MARIA MICHEL

APELANTE: ALCERI DA SILVA LAWISCH (RÉU)

APELANTE: DARCILO LUIZ LAWISCH (RÉU)

APELADO: DORIVALDO DA SILVA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por ALCERI DA SILVA LAWISCH e DARCILO LUIZ LAWISCH contra sentença de procedência proferida nos autos da Ação de Despejo proposta por DORIVALDO DA SILVA e de improcedência da reconvenção que aqueles apresentaram em face deste.

Eis o dispositivo da sentença (evento 93 da origem):

"Isso posto, JULGAR PROCEDENTE a ação ajuizada por DORIVALDO DA SILVA contra DARCILO LUIZ LAWISCH e ALCERI DA SILVA LAWISCH para:
A) REINTEGRAR, liminarmente, o autor na posse do imóvel descrito na inicial, concedendo aos réus o prazo de 15 (quinze) dias, contados da ciência da presente decisão, para desocupação voluntária, sob pena de expedição de mandado de reintegração de posse;
B) CONSOLIDAR a posse do demandante no imóvel;
C) Condenar os requeridos ao pagamento de taxa única, despesas processuais e honorários advocatícios em favor do(s) patrono(s) do autor, os últimos fixados em R$ 1.000,00, com fundamento no art. 85, § 2º, do CPC.
Suspensa a exigibilidade, por força do benefício da gratuidade da justiça a eles deferido.
JULGO IMPROCEDENTE a pretensão deduzida na reconvenção proposta por DARCILO LUIZ LAWISCH e ALCERI DA SILVA LAWISCH contra DORIVALDO DA SILVA.

Condeno os reconvintes ao pagamento da taxa única, despesas processuais e honorários advocatícios em favor do(s) patrono(s) do reconvindo, os últimos fixados em R$ 1.000,00, com fundamento no art. 85, § 2º, do CPC.
Suspensa a exigibilidade, por força do benefício da gratuidade da justiça a eles deferido.
Publique-se, registre-se e intimem-se, eletronicamente."

Nas razões recursais (evento 100 da origem), os apelantes suscitam preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, uma vez que indeferida a produção da prova oral postulada visando comprovar a realização de acessão. Afirmam que a sentença julgou improcedente a reconvenção por ausência de provas. Argumentam que os "depoimentos são imprescindíveis à demonstração dos fatos constitutivos do direito dos apelantes, demonstrando que, por meios e recursos próprios, eles edificaram a residência onde moram, na faixa de terreno cedida pelo autor, pai da apelante". Ponderam que a "existência da acessão é incontroversa nos autos, tanto que nela residiram os apelantes durante anos". Afirmam que a prova testemunhal era imprescindível para o deslinde do feito, e que foram prejudicados pelo seu indeferimento. Aduzem que no caso dos autos não estão configuradas quaisquer das hipóteses do art. 355 do CPC. Ainda, apontam a inadequação da ação de despejo para a retomada do imóvel, típica ação locatícia, já que existente entre as partes comodato verbal. Defendem que a demanda adequada no caso em apreço seria a ação de reintegração de posse. Quanto ao mérito, afirmam ter exercido posse de boa-fé sobre o imóvel, com a anuência do apelado em razão de contrato de comodato verbal existente entre as partes, tendo nele edificado a sua residência. Asseveram que "o próprio Juízo de Primeiro Grau admitiu ser incontroversa a realização de benfeitorias pelos apelantes, o que, por si, lhes confere direito à indenização e de retenção, não reconhecidos na sentença". Afirmam que "a nota fiscal apresentada resta pouco nítida considerando a restrição de atendimentos presenciais imposta à Defensoria Pública, em razão da pandemia pela COVID-19, que impôs aos apelantes a remessa dos documentos dentro de suas condições técnicas" e que "todas as alegações poderiam ser corroboradas com a oitiva de testemunhas, dentre elas, pedreiros responsáveis pela edificação do imóvel e demais depoentes com conhecimento dos responsáveis pelos pagamentos e custas da construção". Nesse contexto, afirmam fazer jus a indenização pela acessão introduzida no imóvel. Requerem o provimento do recurso para que seja acolhida a preliminar de inadequação da via eleita e extinto o feito sem resolução de mérito, ou, sucessivamente, acolhida a preliminar de cerceamento de defesa e desconstituída a sentença. No mérito, requerem o provimento do recurso para que seja julgada improcedente a ação de despejo e procedente a reconvenção.

Intimado, o apelado apresentou contrarrazões (evento 103 da origem). Inicialmente, rechaça a preliminar de cerceamento de defesa, invocando os fundamentos da sentença. Assevera que a prova testemunhal só tem cabimento quando houver início de prova escrita, conforme dicção do art. 444 do CPC e que, em se tratando de contrato de comodato, descabe qualquer espécie de indenização por força do disposto no art. 584 do CC. Afirma não estar configurada a inadequação da via processual eleita, na medida em que expôs os fatos em juízo de forma correta, cabendo ao magistrado qualificá-los juridicamente, que inclusive determinou a retificação da autuação para ação de reintegração de posse. Forte nesses argumentos, pugna pelo desprovimento do recurso.

Remetidos os autos a esta Egrégia Corte, o recurso foi distribuído.

Vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade aplicáveis à espécie.

Cuida-se de ação originalmente intitulada Ação de Despejo proposta pelo apelado em face dos apelantes visando à retomada do imóvel localizado na Rua Dona Carlotta, nº 1.239, fundos, Bairro Faxinal Velho, Santa Cruz do Sul.

Extrai-se da exordial que o apelado concedeu o referido imóvel em comodato verbal aos apelantes para que nele fixassem a sua residência por prazo indeterminado. Afirmou que, não logrando êxito na retomada amigável, promoveu a notificação judicial dos apelantes para que o desocupassem, o que não foi atendido.

Requereu a procedência da ação com o despejo dos apelantes.

Citados, os apelados apresentaram contestação e reconvenção (evento 12 da origem), apontando a inadequação da ação de despejo para a retomada do imóvel e postulando indenização pelo fato de haverem edificado uma residência no imóvel às suas expensas.

Em decisão de saneamento, o juízo a quo determinou a retificação da autuação para Ação de Reintegração de Posse e indeferiu a prova testemunhal postulada pelos apelantes (evento 74 da origem).

Conforme relatório supra, sobreveio sentença de procedência da ação e de improcedência da reconvenção.

Cinge-se a controvérsia recursal em verificar: i) a ocorrência de cerceamento de defesa; ii) a inadequação da Ação de Despejo para a retomada do imóvel; e iii) o direito a indenização por benfeitorias.

Inicio o julgamento do recurso pela preliminares invocadas pelos apelantes.

1. Da Inadequação da Ação de Despejo:

O recurso não comporta provimento.

Pretendem os apelantes a extinção do feito sem resolução de mérito com fundamento no art. 485, I, do CPC, ao argumento de que a Ação de Despejo não é o instrumento processual adequado para o caso em apreço, já que as partes têm entre si justo e contratado comodato verbal de imóvel.

Com efeito, a ação de despejo é o instrumento processual adequado para a retomada de imóveis cuja posse houver sido concedida em razão de contrato de locação ou de arrendamento rural, como deflui da intelecção do art. 5º da Lei nº 8.245/90 e do art. 32 do Decreto nº 59.566/66:

"Art. 5º Seja qual for o fundamento do término da locação, a ação do locador para reaver o imóvel é a de despejo.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica se a locação termina em decorrência de desapropriação, com a imissão do expropriante na posse do imóvel."

"Art 32. Só será concedido o despejo nos seguintes casos:
I - Término do prazo contratual ou de sua renovação;
II - Se o arrendatário subarrendar, ceder ou emprestar o imóvel rural, no todo ou em parte, sem o prévio e expresso consentimento do arrendador;
III - Se o arrendatário não pagar o aluguel ou renda no prazo convencionado;
IV - Dano causado à gleba arrendada ou ás colheitas, provado o dolo ou culpa do arrendatário;
V - se o arrendatário mudar a destinação do imóvel rural;
VI - Abandono total ou parcial do cultivo;
VII - Inobservância das normas obrigatórias fixadas no art. 13 dêste Regulamento;
VIII - Nos casos de pedido de retomada, permitidos e previstos em lei e neste regulamento, comprovada em Juízo a sinceridade do pedido;
IX - se o arrendatário infringir obrigado legal, ou cometer infração grave de obrigação contratual.

Parágrafo único. No caso do inciso III, poderá o arrendatário devedor evitar a rescisão do contrato e o conseqüente despejo, requerendo no prazo da contestação da ação de despejo, seja-lhe admitido o pagamento do aluguel ou renda e encargos devidos, as custas do processo e os honorários do advogado do arrendador, fixados de plano pelo Juiz. O pagamento deverá ser realizado no prazo que o Juiz determinar, não excedente de 30 (trinta) dias, contados da data da entrega em cartório do mandado de citação devidamente cumprido, procedendo-se a depósito, em caso de recusa."

Tratando-se de contrato de comodato, adequado o manejo de ação reivindicatória, quando a pretensão estiver fundada em domínio e na posse injusta, ou de ação de reintegração de posse, quando fundada na posse e no esbulho, conforme precedentes desta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. POSSE. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CONTRATO DE COMODATO VERBAL. COMODATO VERBAL. NOTIFICAÇÃO. ESBULHO. Tratando-se de comodato por prazo indeterminado, resulta constituído em mora o comodatário que deixa de restituir o imóvel após notificado para tal finalidade. A recusa em devolver o imóvel implica esbulho possessório, ensejando a reint...

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