Acórdão nº 50008686620188210044 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50008686620188210044
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002336528
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000868-66.2018.8.21.0044/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR: Desembargador DILSO DOMINGOS PEREIRA

APELANTE: BRUNO ROCCHI (AUTOR)

APELANTE: DAGOBERTO CONZATTI (AUTOR)

APELANTE: LUIZ ALBERTO TRAMONTINI (AUTOR)

APELANTE: NELIDA INES TRAMONTINI KUMMER (AUTOR)

APELANTE: JORGE KUMMER (AUTOR)

APELANTE: JUSSARA AGOSTINI (AUTOR)

APELANTE: LILIANE TRAMONTINI CONZATTI (AUTOR)

APELANTE: NEUSA MARIA TRAMONTINI ROCCHI (AUTOR)

APELADO: EUGENIO ANTONIO TRAMONTINI NETTO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por LILIANE TRAMONTINI CONZATTI E OUTROS contra sentença que, reconhecendo a decadência do direito autoral, extinguiu a ação declaratória de nulidade contratual n. 044/1.18.0000877-7 (eproc n. 5000868-66.2018.8.21.0044), movida em desfavor de EUGENIO ANTONIO TRAMONTINI NETTO, constando no dispositivo (evento 3, DOC4, Página 9):

(...) Isso posto, forte no artigo 487, II, do Código de Processo Civil, JULGO EXTINTO o pedido formulado por LILIANE TRAMONTINI CONZATTI, DAGOBERTO CONZATTI, LUIZ ALBERTO TRAMONTINI, JUSSARA TRAMONTINI, NÉLIDA INÊS TRAMONTINI KUMMER, JORGE KUMMER, NEUSA MARIA TRAMONTINI ROCCHI e BRUNO ROCCHI em face de EUGÊNIO ANTONIO TRAMONTINI NETTO, reconhecendo a decadência do direito.
Condeno os autores ao pagamento das custas do processo e honorários do patrono do requerido que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, considerando o trabalho desenvolvido e o tempo de tramitação do processo, nos termos do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (...)

Em suas razões (evento 3, DOC4, p. 29 e ss.), discorrem sobre a situação fática envolvendo os litigantes. Afirmam que buscam ver declarada a nulidade de contrato particular de compra e venda celebrado entre ascendentes e descendente sem a anuência dos demais descendentes. Frisam a existência de outros vícios que tornariam nulo o negócio jurídico em questão. Apontam que a Magistrada a quo reconheceu que o negócio jurídico em questão seria anulável, aplicando o prazo decadencial de 2 (dois) anos, sendo o contrato celebrado no dia 21/05/2009 e a demanda proposta em 05/04/2018. Alegam que a sentença merece ser reformada. Pontuam que nunca houve anuência dos demais herdeiros. Acrescentam que o contrato nunca foi registrado. Asseveram que a avença também teria sido celebrada por incapaz, e que não se revestiu de forma prescrita em lei. Salientam ter comprovado que o Sr. Lino, ao tempo da venda, tinha dificuldade de discernimento, celebrando o pacto por valor inferior ao de mercado. Destacam o depoimento da testemunha MARÍLIA, a indicar que Lino sofria da doença de Alzheimer já no ano de 2007. Defendem que o contrato não fora levado a registro, pois indicaria a transferência de 100% do patrimônio dos genitores para o réu, a impor o chamamento dos demais herdeiros. Sustentam a ocorrência de simulação. Referem que era necessária a confecção de escritura pública.

Ao final, pugnam pelo provimento do recurso, para que seja reformada a sentença apelada, julgando-se procedente a ação.

Intimada, a parte ora recorrida apresentou contrarrazões (evento 3, DOC4, Página 38).

A seguir, subiram os autos a esta Corte, ocasião em que o Ministério Público opinou pelo parcial provimento do recurso (evento 16, PARECER1), para que seja afastado o reconhecimento da decadência e, quanto ao mérito, pela improcedência da ação.

Na sequência, vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Preliminarmente, quanto à necessidade de apresentação de documentos atualizados a respeito da pessoa jurídica Retífica de Motores Lino Ltda., conforme apontado pelo Ministério Público (evento 16, DOC1), entendo desnecessária tal providência, na medida em que, conforme informação pública disponível no site da Receita Federal1, a empresa em questão se encontra 'inapta', tendo falecido os respectivos sócios (MARIA IZALTINA WERNER TRAMONTINI e LINO ANTONIO TRAMONTINI), conforme alegam os demandantes. Logo, nada obsta que o polo passivo da demanda venha a ser integrado apenas pelo ora recorrido, EUGENIO ANTONIO TRAMONTINI NETTO, na qualidade de 'COMPRADOR' do imóvel objeto do litígio (evento 3, DOC1, Página 34).

Superada tal questão, cumpre ressaltar que os autores, ora apelantes, buscam ver declarado nulo o contrato dito de compra e venda de bem imóvel celebrado no dia 21/05/2009 entre RETIFICA DE MOTORES LINO LTDA (empresa da qual eram sócios os ora falecidos genitores dos litigantes) e o réu, EUGENIO ANTONIO TRAMONTINI NETTO, tendo por objeto a fração de 26,5% do imóvel identificado pela matrícula n. 1.192 do Registro de Imóveis de Encantando/RS.

Após a regular instrução do feito, sobreveio a sentença de improcedência ora apelada, reconhecendo a decadência do direito autoral nos seguintes termos (evento 3, DOC4, Páginas 6/8):

(...) Busca a parte autora a anulação de negócio jurídico consistente em contrato particular de compra e venda de imóvel celebrado entre o requerido e seus genitores, atualmente falecidos, argumentando que a transação padece de vícios, como a ausência de capacidade do contratante Lino, a ausência de escritura pública e de anuência dos demais herdeiros. Apontam ainda contradições na compra da área total do imóvel em questão.
Verifico primeiramente que se trata de contrato de compra e venda de imóvel firmado entre a empresa Retífica de Motores Lino Ltda., representada pelos seus sócios diretores Lino Antônio Tramontini e Maria Izaltina Werner Tramontini e o requerido, Eugênio Antônio Tramontini Netto, na data de 21/05/2009, tendo como objeto a fração de 26,5% de um imóvel (fls.
31-32).
Em segundo lugar, constato que os autores Luiz Alberto, Nélida, Neusa e Liliane são irmãos do requerido Eugênio, todos filhos de Lino Antônio Tramontini e Maria Izaltina Werner Tramontini.

Trata-se, portanto, de ato anulável, a teor do artigo 496 do Código Civil (...)
Tal norma, pôs fim a uma discussão anterior, sedimentando tratar-se de ato anulável.

Diante disso, deve ser observado o prazo decadencial de dois anos, de acordo com o artigo 179 do Código Civil (...)
No caso, a compra e venda ocorreu em 21 de maio de 2009 e a presente ação foi ajuizada somente em 05 de abril de 2018.

E não se diga que os herdeiros não tinham conhecimento da compra e venda, pois sua oitiva demonstra o contrário.

Com efeito, quando ouvida a autora Nélida Inês Tramontini Kummer, afirmou que estava trabalhando e Eugênio esteve lá pedindo para que fizesse um contrato, dizendo que vendeu um terreno para pagar uma dívida e sobrou R$ 110.000,00 e com esse dinheiro iria comprar a parte do prédio que estava em nome da empresa do pai.
Mencionou que Eugênio lhe perguntou onde depositar o dinheiro, então deu duas contas, para caso algum deles faltasse.
Ora, a mesma autora que ora postula a anulação do negócio foi quem tomou conhecimento dele, redigiu o contrato e forneceu o número das contas bancárias para depósito do pagamento, sendo difícil acreditar que manteve o fato oculto dos demais irmãos por nove anos.

Nesse contexto, indesviável reconhecer a ocorrência da prescrição do direito de anular o negócio jurídico realizado entre o demandado e os genitores.
(...)

Pois bem. Acerca dos vícios alegados pelos demandantes, como sabido, os negócios jurídicos nulos são insuscetíveis de confirmação, por força do art. 169 do Código Civil (CC):

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.

Por outro lado, as hipóteses de nulidade estão previstas no art. 166 do CC:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei;
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

No caso concreto, contudo, não é possível observar a ocorrência de tais situações. Quanto à prática de ato celebrado por pessoa absolutamente incapaz (a eventualmente afastar a incidência de prazo de prescrição ou de decadência), não se constata demonstração inequívoca sobre a afirmada incapacidade absoluta do vendedor LINO ANTONIO TRAMONTINI ao tempo da celebração do negócio jurídico (maio de 2009).

Sobre o tema, em que pese o esforço argumentativo da procuradora dos apelantes, o Relatório Médico apresentado (evento 3, DOC4, Página 43), datado de 19/04/2012, aponta que o diagnóstico de doença de Alzheimer ocorreu em junho de 2011.

Por outro lado, tenho que a indicação de que o de cujus teve episódios de esquecimento no ano de 2008, por si só, não evidencia incapacidade absoluta, que, nos termos do art. 3º do CC, com a redação vigente, se limita à hipótese de idade inferior a 16 (dezesseis) anos:

Art. 3 o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
Art. 4 o São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;
IV - os pródigos.

Assim sendo, forçoso concluir que não restou demonstrada a alegação de nulidade do negócio jurídico por incapacidade do falecido Sr. LINO ANTONIO TRAMONTINI.

Quanto à alegada ocorrência de simulação (evento 3, DOC4, Página 33), outra causa de nulidade,...

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