Acórdão nº 50008731120198210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 23-03-2022

Data de Julgamento23 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50008731120198210026
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001195078
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000873-11.2019.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: Relações de Parentesco

RELATOR: Juiz de Direito ROBERTO ARRIADA LOREA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Vistos.

Trata-se de recurso de Apelação interposto por N. K., irresignada com a sentença que julgou improcedente a pretensão deduzida nos autos da Ação de Reconhecimento de Filiação Pós-Morte, movida em face do espólio de R. W., H. W. e E. W., representados pela inventariante V. L. W., com fim de que fosse declarada a filiação da autora com relação aos extintos R. e H. (evento 34-SENT1).

Em suas razões recursais, a apelante sustenta que as provas produzidas nos autos comprovam a posse do estado de filha, bem como o afeto que existia além do vínculo socioafetivo e familiar, reconhecidos também pela comunidade na qual se inseriram.

Assevera que não restam dúvidas de que a apelante possuía nome, fama e tratamento de filha, não apenas perante os apelados, mas também perante a sociedade. Alega que, embora inexista documento formal registrado pelos falecidos promovendo o reconhecimento da filiação, é inequívoca a prova produzida que havia manifestação no sentido de querer ver reconhecido o vínculo paterno-filial perante a filha socioafetiva e a sociedade.

Pugna pelo reconhecimento da filiação socioafetiva entre a apelante e os de cujus Rudi e Hedy. Em caráter subsidiário, requer a desconstituição da sentença vergastada, determinando o retorno dos autos à origem para produção de todas as provas em direito admitidas visando demonstrar a existência de vínculo paterno-filial entre a apelante e os apelados (evento 38-APELAÇÃO1).

Não foram ofertadas contrarrazões ao recurso interposto.

Sobreveio parecer do Ministério Público, manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento7-PARECER1).

É o relatório.

VOTO

O recurso foi interposto tempestivamente, estando preenchidos os requisitos de admissibilidade, razão pela qual o conheço.

Adianto, não merece provimento o recurso.

Com efeito, em situações como a dos autos, necessária a verificação da existência, ou não, de vínculo afetivo entre as partes envolvidas, a fim de se aferir concreta e devidamente a posse do estado de filiação, e, também, no intuito de afastar ações de cunho eminentemente patrimoniais ou de qualquer outra ordem, sendo eles contrários à situação de fato previamente estabelecida.

Da análise acurada dos autos, na esteira da sentença recorrida, tenho que inexiste prova segura de que os apelados desejavam, no sentido jurídico da expressão, formalizar a situação de fato, inobstante tenham assumido a responsabilidade pela criação da apelante.

No ponto, cumpre referir que a existência de afeto, acompanhamento na escola, participação em festividades, existência de fotos comuns, não se confundem com a paternidade socioafetiva.

Para tanto, necessária a comprovação da ocorrência de alguma diligência concreta para fins de legalizar a paternidade socioafetiva, como, por exemplo, início de processo de adoção, ou o reconhecimento da condição de filha por testamento ou documento declaratório dessa intenção, capaz de servir como prova de que era inequívoca a vontade de reconhecer formalmente a paternidade da autora, o que não ocorreu no presente caso, já que transcorreu mais de 30 anos sem o implemento oficial e registral da filiação.

Dito isso, inexistem motivos a ensejar a reforma do julgado, aos efeitos de julgar procedente a pretensão ou mesmo desconstituir a sentença, com consequente reabertura da instrução, na esteira do parecer ministerial da lavra da eminente Procuradora de Justiça, Juanita Rodrigues Termignoni, cujas razões acresço às de decidir:

"(...)

2. No mérito, contudo, não merece prosperar a insurgência.

Não há como ser acolhido o pedido de reconhecimento de filiação socioafetiva formulado por Nair em relação ao casal Rudi e Hedy, já falecidos, pois ausente no caderno processual prova inequívoca acerca da vontade de ambos reconhecerem formalmente a maternidade e a paternidade em relação à autora.

Com efeito, só é possível a declaração de existência de parentalidade/filiação socioafetiva quando, em vida, os pretensos pais socioafetivos, de algum modo, por algum meio (lógico e/ou objetivo), manifestaram ou expressaram vontade de ter a autora como filha.

In casu, necessária se faz a análise da existência, ou não, de vínculo afetivo entre as partes envolvidas, no intuito de aferir devidamente a posse do estado de filiação e, ainda, afastar ações com interesses exclusivamente patrimoniais ou de qualquer outra ordem.

Na espécie, em que pesem os argumentos alinhavados pela requerente, nada há no feito a atestar, de forma segura, que os “de cujus” efetivamente desejavam formalizar, no sentido jurídico da expressão, a situação de fato estabelecida entre eles e a autora, ainda que não se descure que Nair possa ter sido acolhida e criada por longo período pelo casal.

Registre-se que, embora a apelante tenha alegado que os falecidos passaram a exercer a sua guarda fática em 1.959 (evento 1- Inic1, fl. 02, segundo parágrafo, do processo de origem), causa estranheza que os “de cujus” deixaram transcorrer in albis mais de trinta anos, toda uma relação, vindo a falecer, sem nunca terem reconhecido, oficial e registralmente, a apelada como filha.

Ademais, inobstante tenha constado no registro de óbito de Hedy que ela deixou uma filha, Nair, com 42 anos (evento CertObt8 do processo de origem), a declaração foi realizada com autorização da própria apelante.

O conjunto probatório, nos autos, não traz os requisitos caracterizadores da mencionada parentalidade socioafetiva, quais sejam: utilização do sobrenome paterno por parte da postulante; tratamento, à postulante, como se filha fosse; reconhecimento público e notório, no meio social e no seio familiar, como se a apelante fosse filha dos falecidos, Rudi e Hedy, situação que não pode ser afastada somente com a documentação apresentada aos autos. Como bem apontou a Magistrada a quo na sentença ora apelada, cujo registro calha transcrever, haja vista que serve a afastar, com mais razão, a tese ventilada pela apelante (evento 34 do processo de origem):

(...)

Dessa maneira, pressupõe uma expressa e formal manifestação de vontade de reconhecimento da filiação pelo suposto pai/mãe.

Por consequência, tal reconhecimento deve apenas valer para preservar uma...

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