Acórdão nº 50009077220198210159 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 25-05-2022

Data de Julgamento25 Maio 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50009077220198210159
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002029290
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000907-72.2019.8.21.0159/RS

TIPO DE AÇÃO: Cédula de crédito bancário

RELATOR: Desembargador JORGE MARASCHIN DOS SANTOS

APELANTE: MARINEZ ETGETON (EMBARGANTE)

APELANTE: RAUL ETGETON (EMBARGANTE)

APELANTE: RAUL ETGETON EIRELI (EMBARGANTE)

APELADO: COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS OURO BRANCO - SICREDI OURO BRANCO RS (EMBARGADO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por MARINEZ ETGETON, RAUL ETGETON e RAUL ETGETON EIRELI, nos autos dos embargos à execução, que promovem em desfavor de COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS OURO BRANCO - SICREDI OURO BRANCO RS, em face da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos, com o seguinte dispositivo:

Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os embargos à execução opostos por RAUL ETGETON EIRELI, RAUL ETGETON e MARINEZ ETGETON, em face da COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO OURO BRANCO - SICREDI OURO BRANCO RS, para DECLARAR a impenhorabilidade do bem imóvel descrito na matrícula de n° 24.334 do Registro de Imóveis do Município de Teutônia/RS, determinando o levantamento da constrição judicial determinada nos autos do feito executivo (Evento 33 do processo 5000421-87.2019.8.21.0159), bem como para reconhecer o excesso de execução e DETERMINAR que seja excluído do cálculo a incidência dos juros pela variação do CDI divulgado pela CETIP, no período de inadimplência.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais na proporção pro rata, bem como de honorários advocatícios ao patrono da parte contrária que fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais) para cada parte, considerando o trabalho desenvolvido em demanda de cunho repetitivo, nos termos do art. 85 do NCPC. Suspendo a exigibilidade dos ônus sucumbenciais em relação aos embargantes, em face da AJG concedida.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Com o trânsito em julgado, extraia-se cópia da presente decisão e de eventual acórdão que venha a ser proferido, acostando-os na ação de execução de título extrajudicial em apenso.

(Dra. ANGELA LUCIAN, Juíza de Direito do Juízo da 1ª Vara Judicial da Comarca de Teutônia/RS

Opostos embargos de declaração pela parte embargada, os quais foram desacolhidos (evento 64).

Irresignada, a parte embargante apelou, sustentando:

a) a impossibilidade de penhora do veículo VW/Saveiro, utilizado como instrumento de trabalho;

b) a fixação dos honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa.

Foram apresentadas contrarrazões pela parte embargada ao evento 83

A parte embargada, por sua vez, apelou adesivamente, aduzindo:

a) preliminarmente, a revogação da gratuidade judiciária concedida na origem aos embargantes;

- no mérito:

b) a ocorrência de decisão extra petita quanto ao reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel de matrícula nº 24.334;

c) a possibilidade de penhora do imóvel de matrícula nº 24.334; e

d) a impossibilidade de afastamento da cobrança do CDI no período de inadimplência, tendo em vista que não há essa cobrança no cálculo que aparelha a execução.

Foram apresentadas contrarrazões pela parte embargante ao recurso adesivo (evento 89).

Foram cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 935 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE.

Após o julgamento dos embargos de declaração, o prazo para interposição de recurso de apelação pelos embargantes encerrou em 23/11/2021 (eventos 73, 74 e 75), sendo o recurso de apelação interposto na referida data (evento 78), sem preparo em razão da gratuidade judiciária gratuita (evento 3).

Assim, o recurso de apelação foi interposto, de forma tempestiva e preparada, no prazo concedido pelo art. 1.003, §5º, do CPC.

O prazo para apresentação de recurso adesivo pela parte embargada encerrou em 04/02/2022 (evento 80), sendo o recurso adesivo interposto no dia 02/02/2022 (evento 84).

Assim, o recurso adesivo foi interposto, de forma tempestiva e preparado, no prazo concedido pelo art. 997, §2º, I, do CPC.

RELAÇÃO CONTRATUAL SUB JUDICE.

Trata-se de embargos à execução que tem por objeto:

Cédula de Crédito Bancário nº B71034706-3, no valor de R$261.473,33, datada de 30/10/2017, sem previsão de encargos para o período da normalidade. Ao período de inadimplência, prevista cobrança de encargos calculados com base na CDI ou outro encargo financeiro que venha a substituí-la, acrescida de juros de 6,16% ao ano (0,50% ao mês), capitalizados mensalmente (contrato 3 - evento 1).

- Recurso da parte embargante:

NULIDADE PARCIAL DA SENTENÇA – CITRA PETITA.

Com efeito, como é sabido, o pedido deve ser certo e determinado porquanto o julgamento fica restrito à pretensão deduzida, corolário do princípio da congruência previsto no art. 141 do CPC que assim determina:

“O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.

Já o caput do art. 492 do CPC determina que:

“É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantia superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.”.

Em vista disso, imprescindível que haja a correlação entre o pedido, a causa de pedir e a sentença.

No caso concreto, a parte embargante, postulou na inicial dos embargos à execução, o reconhecimento da impenhorabilidade do veículo, por se tratar de bem utilizado como instrumento de trabalho.

Ocorre que, na sentença, não houve enfrentamento de tal questão, configurando-se como decisão citra petita, sendo passível de nulidade, por não haver sido prestada integral jurisdição.

Assim, é de ser decretada a nulidade parcial da decisão.

Diante da desnecessidade de qualquer outro ato instrutório, estando o processo apto para julgamento, nos termos do art. 1.013, § 3º, III, do CPC, passo à análise do mérito do recurso na sua integralidade, em vista dos princípios da primazia da decisão de mérito e da razoável duração do processo, na forma do artigo art. 4º do CPC.

UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO AUTOMÓVEL COMO INSTRUMENTO DE TRABALHO. IMPENHORABILIDADE.

No ponto, a parte embargante sustentou a impenhorabilidade do veículo VW/Saveiro, pois este é utilizado como instrumento de trabalho.

Conforme dispõe o art. 833, do CPC:

Art. 833. São impenhoráveis: (...)

V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado; (...)

Assim, para que seja reconhecida a impenhorabilidade, com fundamento no art. 833, V, do Código de Processo Civil, sob o argumento de que o veículo é essencial e indispensável para o exercício de atividade laboral, é necessária a demonstração da utilidade do bem à atividade profissional, para que se possa, então, aferir a existência de vinculação entre este e a profissão.

Nesse sentido, ilustrativo o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IMPENHORABILIDADE DE BEM. ART. 649, V, DO CPC. AUSÊNCIA DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. ART. 332 DO CPC. PROVA TESTEMUNHAL. OBJEÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. DILAÇÃO PROBATÓRIA. DESCABIMENTO.

1. As diversas leis que disciplinam o processo civil brasileiro deixam claro que a regra é a penhorabilidade dos bens, de modo que as exceções decorrem de previsão expressa em lei, cabendo ao executado o ônus de demonstrar a configuração, no caso concreto, de alguma das hipóteses de impenhorabilidade previstas na legislação, como a do art. 649, V, do CPC, verbis: "São absolutamente impenhoráveis (...) os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão".

2. Cabe ao executado, ou àquele que teve um bem penhorado, demonstrar que o bem móvel objeto de constrição judicial enquadra-se nessa situação de "utilidade" ou "necessidade" para o exercício da profissão. Caso o julgador não adote uma interpretação cautelosa do dispositivo, acabará tornando a impenhorabilidade a regra, o que contraria a lógica do processo civil brasileiro, que atribui ao executado o ônus de desconstituir o título executivo ou de obstruir a satisfação do crédito.

3. Assim, a menos que o automóvel seja a própria ferramenta de trabalho, como ocorre no caso dos taxistas (REsp 839.240/CE, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ de 30.08.06), daqueles que se dedicam ao transporte escolar (REsp 84.756/RS, Rel. Min. Ruy Rosado, Quarta Turma, DJ de 27.05.96), ou na hipótese de o proprietário ser instrutor de auto-escola, não poderá ser considerado, de per si, como "útil" ou "necessário" ao desempenho profissional, devendo o executado, ou o terceiro interessado, fazer prova dessa "necessidade" ou "utilidade". Do contrário, os automóveis passarão à condição de bens absolutamente impenhoráveis, independentemente de prova, já que, de uma forma ou de outra, sempre serão utilizados para o deslocamento de pessoas de suas residências até o local de trabalho, ou do trabalho até o local da prestação do serviço.

4. No caso, o aresto recorrido negou provimento ao agravo do ora recorrente, porque ele não fez prova da "utilidade" ou "necessidade" do veículo penhorado para o exercício profissional. Assim, para se infirmar a tese adotada no aresto recorrido - de que o recorrente não fez prova da "utilidade" ou "necessidade" do bem penhorado para o exercício de sua profissão - será necessário o reexame de matéria fática, o que é incompatível com a natureza do recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ.

5. Tendo sido a discussão sobre a impenhorabilidade do bem travada no âmbito da própria execução,...

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