Acórdão nº 50009080320198210080 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Terceira Câmara Cível, 31-03-2022

Data de Julgamento31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009080320198210080
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001800281
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

13ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000908-03.2019.8.21.0080/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATORA: Desembargadora ELISABETE CORREA HOEVELER

APELANTE: BANCO DIGIMAIS S.A. (RÉU)

APELADO: MARGARETE PRUNZEL (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por BANCO DIGIMAIS S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos da ação revisional que lhe move MARGARETE PRUNZEL. Referido decisum (doc.3- fls.19 a 25) teve o dispositivo assim redigido:

Ante ao exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão do autor, nos termos da fundamentação, a fim de: a) revisar a cláusula contratual referente à taxa dos juros remuneratórios, reduzindo-a à taxa média de mercado, ou seja, 21,75% ao ano; b) determinar a compensação ou restituição simples dos valores pagos indevidamente a maior. Em razão da sucumbência recíproca em proporções similares, condeno o demandante ao pagamento de 50% das custas judiciais e de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade suspendo em razão da assistência judiciária gratuita. Outrossim, condeno o requerido ao pagamento da outra metade das custas judiciais e de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o montante pago a maior, a ser apurado. Os honorários advocatícios não se compensam (art. 85, § 14, do CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Nas suas razões de apelação (doc.3- fls.28 a 35) a parte ré alegou que não há falar em excessividade quanto aos juros remuneratórios praticados. Aduziu estar caracterizada a mora da fiduciante. Postulou o provimento do recurso.

Não houve contrarrazões.

Subiram os autos à Corte.

Vieram conclusos.

VOTO

Atendidos os requisitos de admissibilidade, recebo o presente recurso.

DO CONTRATO

Cuida-se da Cédula de Crédito Bancário n.00090000705110, garantida por cláusula de alienação fiduciária, firmada pelas partes em 28 de março de 2018 (doc.3- fls.11 a 14).

JUROS REMUNERATÓRIOS

Os juros remuneratórios são devidos como compensação ao mutuante pela disposição do dinheiro ao mutuário, sendo lícita a sua incidência. A discussão, pois, diz respeito ao limite de tais juros e sua abusividade, ou não.

O Sistema Financeiro Nacional (SFN) tem como regra a não aplicação das restrições da Lei da Usura (Decreto nº 22.626 de 1933), em se tratando de instituições financeiras, não as sujeitando, pois, à limitação dos juros remuneratórios. Ademais, o §3º do artigo 192 da Constituição Federal, que dispunha sobre a limitação dos juros, foi revogado pela Emenda Constitucional nº 40, de 29/05/2003.

A jurisprudência, com o tempo, encaminhou-se, maciçamente, pela livre pactuação, com restrições pontuais em casos de prova inarredável de abusividade (Resp nº 915.572/RS). Nesse sentido a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.

E mais recentemente, o REsp nº 1.061.530/RS - julgado de acordo com o rito dos recursos repetitivos - consolidou o posicionamento no sentido de que a taxa de juros remuneratórios somente se caracteriza como abusiva quando significativamente destoante da média do mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil (BACEN) à época da contratação.

Na sedimentação sobre o critério a ser adotado, por seu turno, também indicou o egrégio tribunal superior que a análise deve ocorrer de forma casuística.

Assim aquilatadas as diretrizes supra, entendo que no caso dos autos são regulares os juros remuneratórios pactuados (35,44% ao ano - doc.3- fl.11), porquanto não ultrapassam o dobro da taxa média de mercado estabelecida pelo BACEN para a data da contratação (21,75%1, em março/2018), critério esse que vem sendo amplamente aceito pelo STJ.

Mantenho, portanto, no caso concreto, a taxa de juros remuneratórios conforme pactuada em contrato firmado pelas partes (35,44% ao ano).

CARACTERIZAÇÃO DA MORA

A matéria da caracterização da mora já foi apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme o paradigma assentado no REsp. nº 1.061.530/RS, julgado em 22/10/2008, que assim dispôs:

I. Afasta a caracterização da mora:

(i) a constatação de que foram exigidos encargos abusivos na contratação, durante o período da normalidade contratual.

II. Não afasta a caracterização da mora:

(i) o simples ajuizamento de ação revisional;

(ii) a mera constatação de que foram exigidos encargos moratórios abusivos na contratação.

Ainda, mais recentemente, dito entendimento foi convalidado pela corte superior no Recurso Especial paradigma nº 1.639.320/SP, o qual fixou tese de que “a abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora”.

Dessa forma, no caso concreto, a mora não resta afastada, pois não revisados os encargos da normalidade contratual.

COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS E REPETIÇÃO DO INDÉBITO

A compensação é consequência lógica da existência de crédito e débito entre as partes. Ocorre que, no caso em tela, não tendo ocorrido revisão dos encargos contratuais, não há falar em compensação e/ou repetição de valores; o contrato e suas cobranças mantêm-se hígidos.

TUTELA ANTECIPADA

Inicialmente, impende referir que o simples ajuizamento da ação revisional não é suficiente ao afastamento da mora contratual (STJ, Súmula n.º 380), sendo necessária a demonstração, pela parte autora, das abusividades supostamente perpetradas no instrumento, em grau suficiente a conferir verossimilhança às suas alegações.

Encontram-se balizadas pelo Superior Tribunal de Justiça os...

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