Acórdão nº 50009154820198210127 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009154820198210127
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002186692
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000915-48.2019.8.21.0127/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATORA: Desembargadora NAELE OCHOA PIAZZETA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra DOUGLAS GALVAGNI DO PRADO, nascido em 14-3-1999, com 19 anos de idade, dando-o como incurso nas sanções do artigo 157, caput, c/c o artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, pelo fato assim narrado na peça acusatória:

[...] No dia 21 de novembro de 2018, por volta das 02 horas, na rua Ângelo Baldissera, próximo ao Mercado Planalto, Cacique Doble/RS, o denunciado tentou subtrair, para si, mediante violência física contra Verônica Vieira de Camargo Lima, coisa alheia móvel consistente em bens existentes no interior da residência da ofendida.

Para tanto, Douglas dirigiu-se até a casa da vítima por onde ingressou através de uma janela, com o intuito de subtrair bens do interior da morada.

Entretanto, o crime não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do agente eis que, no instante em que se encontrava na cozinha para arrecadar bens e objetos, foi surpreendido pela vítima, a qual havia ouvido barulhos, oportunidade em que a empurrou, causando a sua queda e consequente ferimento em sua cabeça. A segui, diante dos gritos de Verônica e em razão do comparecimento do vizinho José Bruno Mioranza, o qual havia ouvido os gritos de socorro, pôs-se o acusado em fuga sem levar consigo nenhum objeto da casa. [...]

Denúncia recebida em 15-5-2019 (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 22-23).

Citado pessoalmente (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 26-28), apresentou resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 30-31).

Não havendo hipótese ensejadora de absolvição sumária, nos termos do artigo 397 do Código de Processo Penal, foi determinado o prosseguimento do feito (evento 3, PROCJUDIC1, fl. 32).

Durante a instrução, foram colhidas as declarações da vítima e inquirida uma testemunha, sendo decretada a revelia do réu (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 45-46).

Atualizados os antecedentes criminais (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 48-50).

Apresentados memoriais pelo Ministério Público (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 02-05) e pela defesa (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 08-15).

Sobreveio sentença (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 16-25), publicada em 10-2-2020 (evento 3, PROCJUDIC2, fl. 25), julgando procedente a pretensão punitiva, para condenar o acusado como incurso nas sanções do artigo 157, caput, c/c os artigos 14, inciso II, e 61, inciso II, alínea "h", todos do Código Penal, às penas de 02 (dois) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) de reclusão, em regime inicial aberto, e de 12 (doze) dias-multa à razão unitária mínima1. Custas por ele suportadas, suspensa a exigibilidade, e deferido o direito de recorrer em liberdade.

Intimado da sentença pessoalmente (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 32-33), interpôs recurso de apelação (evento 3, PROCJUDIC2, fl. 29).

Em suas razões, postula a absolvição ante a ausência de prova da materialidade e autoria do crime ou, alternativamente, pela incidência do princípio da insignificância. Subsidiariamente, a desclassificação para furto, o reconhecimento da figura da desistência voluntária, o afastamento da agravante etária e o aumento da fração de redução pela tentativa, prequestionando a matéria ao final (evento 3, PROCJUDIC2, fls. 36-45).

Recebida (evento 3, PROCJUDIC2, fl. 34) e contrariada a inconformidade (evento 3, PROCJUDIC2 fls. 48-50; evento 3, PROCJUDIC3, fls. 01-07), vieram os autos a esta Corte, manifestando-se o ilustre Procurador de Justiça, Paulo Antonio Todeschini, pelo desprovimento do recurso defensivo (evento 7, PARECER1).

Conclusos para julgamento.

Breve relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pela DEFENSORIA PÚBLICA em favor de DOUGLAS GALVAGNI DO PRADO no qual se insurge da condenação pela prática de roubo simples na forma tentada às penas de 02 (dois) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) de reclusão, em regime inicial aberto, e de 12 (doze) dias-multa à razão unitária mínima.

Postula a absolvição ante a ausência de prova da materialidade e autoria do crime ou, alternativamente, pela incidência do princípio da insignificância. Subsidiariamente, a desclassificação para furto, o reconhecimento da figura da desistência voluntária, o afastamento da agravante etária e o aumento da fração de redução pela tentativa, prequestionando a matéria ao final.

Inicio pelo exame do pleito absolutório.

Não colhe.

A materialidade e autoria vieram demonstradas por meio do registro de ocorrência policial (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 07-08), bem como da prova oral colhida em ambas etapas persecutórias.

Especificamente quanto aos elementos produzidos em fase inquisitorial, tem-se o relato da vítima Verônica sustentando ter escutado barulhos no interior da sua residência durante a madruga, constatando o ingresso do réu no local através de uma janela, reconhecendo-o como "Douglas, filho de Sandra". Mencionou que neste momento foi empurrada por ele, vindo a cair e bater a cabeça, ao que passou a gritar por socorro, ocasião em que seu vizinho José atendeu ao chamado e retirou o inculpado da casa, frisando que nada restou subtraído (evento 3, PROCJUDIC1, fl. 09). O relato foi confirmado pela testemunha José, confirmando a dinâmica dos fatos e a identificação do acusado (evento 3, PROCJUDIC1, fl. 10).

Inquirido DOUGLAS pela autoridade policial, este confessou a prática delitiva, aduzindo que "resolveu entrar na casa da pessoa de Verônica para furtar alguma coisa". Todavia, em razão dos gritos da ofendida, aportou ao local seu vizinho, pelo que desistiu da empreitada (evento 3, PROCJUDIC1, fl. 18).

Tocante à prova angariada em juízo, transcrevo trecho da sentença a fim de evitar desnecessária repetição:

[...] A vítima Veronica Vieira de Camargo Lima, ao ser ouvida em sede judicial (mídia, fl. 97), relatou que estava deitada e o réu adentrou em sua residência pela janela da cozinha. Falou que o réu não subtraiu nada de sua residência comentando que apenas fazia sinais para ficar em silêncio, bem como a empurrou sobre uma mesa. Por fim, quando ela chamou seu vizinho o réu abriu fuga.

A testemunha José Bruno Mioranza, ao ser ouvido em sede judicial (mídia, fl. 97), disse que a vítima, por volta dás 01:40, pediu por socorro e após abrir a janela viu que algo não estava certo e perguntou se estava tudo certo onde escutou a vítima pediu por socorro novamente. Quando o mesmo chegou na residência pediu para que abrisse a porta até que a vítima abriu a porta com certa dificuldade onde falou para ele que havia um homem dentro de sua casa. Relatou que pediu para que o réu saísse de dentro da casa da senhora e relatou que o mesmo saiu com a mãos para sima afirmando que não estava armado, saindo em definitivo da propriedade da vítima. [...]

Esta é a síntese dos elementos colhidos no curso da instrução, cuja análise determina a confirmação do decreto condenatório proferido em desfavor do denunciado.

De plano destaco que a partir do exame do material probatório, tem-se que o denunciado empregou violência contra a ofendida ao empurrá-la, fazendo com que caísse, comportamento que encontra correspondência no tipo penal do artigo 157 do Decreto-Lei nº 2.848/1940, dispensável a demonstração de eventuais lesões, pois podem nem mesmo ter ocorrido.

Consequentemente, inarredável a conclusão acerca da sua materialidade a partir da prova oral colhida à luz do contraditório e da ampla defesa, sendo necessário frisar que, com a adoção do sistema da persuasão racional em seu artigo 155, o Código de Processo Penal afastou a ideia de hierarquia e prévia tarifação entre os meios probantes.

A orientação ganhou reforço na Exposição de Motivos do mencionado Estatuto2 ao pontuar que nenhum substrato terá valor decisivo ou necessariamente maior prestígio que outro, podendo o juiz convencer-se, fundamentadamente, a partir do exame dos elementos que compuserem os autos.

Logo, a alegada ausência de exame de corpo de delito não determina seja o réu absolvido, manifesta a sua prescindibilidade, podendo-se concluir a partir de elementos outros que se utilizou de força física durante a empreitada, ao que inviável cogitar de ausência de demonstração da materialidade delitiva.

No sentido indicado, cito precedente deste Órgão Fracionário:

APELAÇÃO-CRIME. ROUBO MAJORADO. CONCURSO DE AGENTES. PRELIMINAR. [...] AUTORIA E MATERIALIDADE. Devidamente demonstradas a materialidade e a autoria do crime, não há falar em insuficiência de provas para a condenação. DESCLASSIFICAÇÃO. FURTO. EMPREGO DE VIOLÊNCIA. INVIABILIDADE. A ausência de auto de exame de corpo de delito resta suprida, para fins de caracterização do emprego de violência na consecução do crime, pela palavra firme da vítima no sentido de que foi agredida pelo réu e seus comparsas, corroborada pelas declarações dos policiais que atenderam à ocorrência policial, bem como pelo laudo médico particular que atestou a presença de lesões no ofendido, o que inviabiliza a desclassificação da conduta do agente para o crime de furto. [...] PRELIMINAR REJEITADA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Crime Nº 70027509595, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Danúbio Edon Franco, Julgado em 25/03/2009) (grifei).

Lado outro, a autoria igualmente veio cabalmente comprovada, na medida em que a vítima em ambas oportunidades em que ouvida foi firme ao imputar ao réu a conduta criminosa descrita na denúncia, confirmando ter ele ingressado em sua residência durante a madrugada e a empurrado, tudo com a finalidade de subtrair objetos, animus inclusive confessado pelo acusado quando inquirido pela...

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