Acórdão nº 50009235420168210022 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 21-03-2022

Data de Julgamento21 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50009235420168210022
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001846166
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5000923-54.2016.8.21.0022/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

RECORRENTE: RUDINEI ALVES GULARTE (ACUSADO)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra RUDINEI ALVES GULARTE, dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, §2º, incisos I e IV, do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso (ev. 2, PROCJUDIC1, fls.01/03):

"No dia 28 de dezembro de 2014, por volta das 16h40min, em via pública, na Rua Lázaro Zamernhoff, n° 785, Navegantes II, nesta cidade, o denunciado RUDINEI ALVES GULARTE, em acordo de vontades e unidade de desígnios com indivíduo não identificado pela Autoridade Policial, matou Valdoir Barbosa da Silva, desferindo-lhe disparos de arma de fogo, logrando atingi-lo, causando as lesões letais descritas no Auto de Necropsia de fls. 19/20 do Inquérito Policial, o qual refere como causa da morte "desorganização da massa encefálica por projétil de arma de fogo".

Na ocasião, a vítima estava pilotando sua bicicleta em via pública quando o denunciado, acompanhado de outro indivíduo, aproximou-se, tripulando uma motocicleta. O indivíduo não identificado, então, passou a efetuar disparos de arma de fogo contra Valdoir, causando sua morte.

Rudinei concorreu para o delito na medida em que pilotou a motocicleta enquanto o outro indivíduo disparava contra a vítima.

O crime foi praticado de maneira que dificultou a defesa da vítima, uma vez que os denunciado agiu de inopino, sem oportunizar reação de Valdoir.

Rudinei praticou o fato impelido por motivo torpe, uma vez que matou Valdoir movido por sentimento de vingança. pois a vítima teria, anteriormente, furtado um televisor da casa do denunciado."

A denúncia foi recebida em 22/08/2011 (ev. 2, PROCJUDIC6, fls. 02/03).

O acusado foi pessoalmente citado (ev. 2, PROCJUDIC6, fl. 10) e apresentou resposta à acusação através da Defensoria Pública (ev. 2, PROCJUDIC6, fls. 14/15).

Durante a instrução processual, foram ouvidas as testemunhas e interrogado o acusado (ev. 40, TERMOAUD1 e ev. 77, TERMOAUD1).

Encerrada a instrução, as partes apresentaram memoriais em substituição aos debates orais (ev. 80, MEMORIAIS1 e ev. 83, MEMORIAIS1).

Em 19/11/2021, sobreveio a decisão, de lavra do Dr. Régis Adriano Vanzin, eminente Juiz de Direito, pronunciando Rudinei Alves Gularte, como incurso nas sanções do artigo 121, §2º, incisos I e IV, do Código Penal, a fim de submetê-lo a julgamento perante o Tribunal do Júri da Comarca de Pelotas (ev. 85, SENT1).

A defesa interpôs Recurso em Sentido Estrito (ev. 93, RSE1). Arrazoando, requereu a despronúncia por ausência de indícios de autoria, em especial quanto à prova judicializada. Subsidiariamente, requestou a exclusão das qualificadoras, uma vez que seriam manifestamente improcedentes(ev. 99, RAZRECUR1).

Com as contrarrazões (ev. 102, PROM1), a decisão foi mantida em juízo de retratação (ev. 104, DESPADEC1) e os autos foram remetidos a esta Corte.

Nesta instância, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Airton Zanatta, firmou parecer opinando pelo desprovimento do recurso defensivo (ev. 10, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Conheço do recurso, uma vez que adequado e tempestivo.

Despronúncia

A defesa sustentou tese negativa de autoria, requerendo a despronúncia, o que não merece prosperar.

Primeiramente, cabe destacar que pronúncia é mero juízo de admissibilidade acusatória, e não condenatório. Logo, se após a instrução criminal, existirem elementos, mesmo que indiciários, a apontar a autoria/participação, provada substancialmente a materialidade, cabe ao juiz remeter a acusação a exame pelos jurados.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. LEGÍTIMA DEFESA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. PRONÚNCIA. FUNDAMENTAÇÃO. REVISÃO FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Tendo a Corte de origem, ao manter a pronúncia, concluído pela presença dos indícios suficientes de autoria e prova da materialidade do crime, salientando não haver prova cabal e irrefutável da prática da conduta sob legítima defesa, não é possível rever tal posicionamento, por demandar revisão do conteúdo fático-probatório dos autos, providência incabível em habeas corpus.
2. A sentença de pronúncia não encerra juízo de procedência acerca da pretensão punitiva, tão somente viabilizando a competência para o Tribunal do Júri, a quem competirá apreciar o pleito de reconhecimento da legítima defesa, decidindo a lide de acordo com os elementos probatórios produzidos.
3. Nos termos do art. 385 do Código de Processo Penal, nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição. O artigo 385 do Código de Processo Penal foi recepcionado pela Constituição Federal (AgRg no REsp 1612551/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 02/02/2017, DJe 10/02/2017).
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no HC 605.748/PI, Rel.
Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 24/11/2020, DJe 27/11/2020)

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS DA AUTORIA. ANIMUS NECANDI. PRESENÇA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. NÃO CONHECIDO.
1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício.
2. A decisão de pronúncia não revela juízo de mérito mas apenas de admissibilidade da acusação, direcionando o julgamento da causa para o Tribunal do Júri, órgão competente para julgar os crimes dolosos contra a vida. Para tanto, basta a demonstração da materialidade do fato e a existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, conforme disciplina o art. 413 do Código de Processo Penal. 3. Dessa forma, havendo, na r. decisão de pronúncia, elemento indiciário da existência de crime doloso contra a vida, não se revela despropositada a submissão ao Conselho de Sentença, da imputação da conduta prevista nos artigo 121, § 2º, incisos V e VII, na forma do art. 14, inciso II, do Código Penal.
4. Habeas corpus não conhecido.
(HC 488.155/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 12/03/2019, DJe 29/03/2019)

Dessa forma, não é necessária a certeza, bastando apenas a existência elementos circunstanciais verossímeis da autoria e/ou do concurso para que o Juiz técnico acolha a acusação e remeta o processo a julgamento pelo júri. A avaliação das provas e sua credibilidade é competência dos jurados.

Nesse sentido, colaciono precedentes do STJ:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. INEXISTÊNCIA DE EXCESSO DE LINGUAGEM NA SENTENÇA DE PRONÚNCIA. PRETENSÃO DE DESPRONÚNCIA OU DE EXCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7 DO STJ. QUALIFICADORAS SOMENTE PODEM SER AFASTADAS QUANDO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos do art. 413, § 1º, do Código de Processo Civil, a decisão de pronúncia consiste em um simples juízo de admissibilidade da acusação, satisfazendo-se, tão somente, pelo exame da ocorrência do crime e de indícios de sua autoria, não demandando juízo de certeza necessário à sentença condenatória, uma vez que as eventuais dúvidas, nessa fase processual, resolvem-se em favor da sociedade - in dubio pro societate. 2. Não se cogita excesso de linguagem, uma vez que as instâncias ordinárias mantiveram postura absolutamente imparcial em relação aos fatos, somente apontando, com cautela e cuidado as provas constantes dos autos que justificaram a decisão de pronúncia, para que seja o agravante submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, órgão constitucionalmente competente para dirimir as dúvidas e resolver a controvérsia, nos termos do art. 5º, inciso XXXVIII, "d", da CF/88. 3. A Corte de origem confirmou a sentença de pronúncia por entender haver indícios de materialidade e autoria do delito de homicídio, pontuando que "vislumbra-se que o réu pode ter sido um dos autores do crime que lhe é imputado, devendo a questão ser submetida ao Juízo Natural dos Crimes deste gênero, em obediência ao brocardo do in dubio pro societate". 4. Para alterar a conclusão a que chegaram as instâncias ordinárias e decidir pela despronúncia do agravante, ou ainda, para excluir as qualificadoras, seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é vedado pela Súmula 7/STJ. 5. Esta Corte entende que, ao se prolatar a decisão de pronúncia, as qualificadoras somente podem ser afastadas quando se revelarem manifestamente improcedentes, o que não é o caso dos autos. (Precedentes). 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 1387190/PE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 03/06/2020).

REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. IMPRONÚNCIA. LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO. INDÍCIOS DE AUTORIA.EXISTÊNCIA. REVISÃO INVIÁVEL. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO.SÚMULA 7/STJ. 1. Não há violação ao artigo 413 do Código de Processo Penal quando o Tribunal de origem, de forma fundamentada, considerando a inexistência de elementos que pudessem justificar o acolhimento da tese de negativa de autoria, entendeu que a decisão de pronúncia está devidamente justificada. 2. A pronúncia do réu para o julgamento pelo...

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